VENI, VIDI, VICI



A noite me apresenta a farsa por detrás das faces. Todos aqueles que adoram me odiar e odeiam me adorar. Me transformo no totem embriagado da madrugada. Fico admirando com um sorriso sarcástico nos lábios a adolescência esparramada nas calçadas. A ideia de um é a discórdia do outro. Estou quase descobrindo a combinação do segredo que me levará para o outro lado do espelho. Serei o espectador da minha estranha existência. Não ser (re)conhecido e não (re)conhecer ninguém. Passos largos para o que se foi e curtos para o que vier. Minha vida não é um cartaz espalhado pela cidade anunciando uma mercadoria própria para o consumo de todos. Pela manhã eu lembro dos sonhos incríveis que tive e que fogem da minha compreensão me deixando suspenso no ar da inquietação. Estou jovem demais para desistir ou velho demais para prosseguir? Seria curioso se nascêssemos na velhice e morrêssemos na infância. Gastamos toda a nossa juventude aprendendo e quando nos damos conta o tempo arrastou com o vento a nossa rebeldia mais necessária. Vivemos então uma vida materialista. Enquanto todos se preocupam em ter, poucos se dedicam no fazer. Aqui (o) nada acontece. Um espetáculo seria um coro no Orco. Preciso de um lugar onde eu possa ser atacado pelo monstro sagaz da imaginação. Faço a minha viagem tendo o grande estrondo dos céus como trilha sonora. Paro, penso e vejo que as pessoas estão ocupadas demais com a vida para se preocuparem com a Vida. Minha paciência então perde suas forças com a rapidez de um gesto de quem luta para continuar respirando. Continuar sorrindo. E o tempo passa, contente por ter me proporcionado mais um dia dessa maldita rotina. Ao meu redor tudo é uniforme como se eu fosse um ímã para o tédio. Deixo tudo para trás. A viagem das palavras se torna agora a viagem das estradas.
Autor: Marcelo Moreira Grilo


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