Estudo do Gênero Mensagem via celular



Estudo do Gênero Mensagem via celular

Lucenilza Luana Silva BATISTA (ULBRA-PA)

INTRODUÇÃO

Milhões de pessoas em todo o mundo usam telefones celulares. Segundo pesquisas realizadas em 2006, o Brasil fechou o ano com mais de 100 milhões de linhas. Os telefones celulares são equipamentos fabulosos: podemos falar com qualquer pessoa no planeta, não importa onde se esteja. Nos últimos anos nos deparamos com uma "nova linguagem", ou uma nova variante do português, que conjuga a escrita a sons, imagens, números, etc. ? as mensagens de textos entre celulares.
As pesquisas realizadas por Jennifer Hord (2006) revelam que a mensagem de texto é usada por 49% de donos de celulares. Atualmente, as pessoas parecem que pararam de falar, no momento em que finalmente íamos nos acostumar a ver todo mundo falando o tempo todo em telefones celulares, agora, elas ficam digitando nos teclados, usando os celulares para enviar mensagens: os torpedos. O SMS (em inglês, é a sigla de serviço de mensagens curtas, basicamente, é um método de comunicação que envia texto entre telefones celulares) ou mensagem de texto, trocou as conversas de telefone por uma nova geração de usuários denominada por Jennifer Hord de "torpedeiros".
É proposta deste estudo descrever esse gênero do campo da tecnologia de comunicação que se constitui nas relações inter-pessoais, que apresenta, assim como no domínio virtual (e-mail) a presença da linguagem oral, abreviações, ícones, entre outros elementos que a tornam uma linguagem rápida, com resposta imediata.
Neste estudo, analisaremos as dimensões enumeradas por Maingueneau (2004) enfocando mais especificamente a organização textual do gênero bem como o estatuto de parceiros legítimos, (a relação entre locutor e interlocutor). Faremos isso através da análise de pequenas mensagens de textos via celular, com características distintas.

1 CARACTERIZANDO O GÊNERO

A Mensagem via celular pode ser definida como novo gênero advindo da tecnologia que facilita e agiliza a interação entre indivíduos. As mensagens via celular conjugam diferentes elementos semióticos como: imagens (mensagem multimídia), sons (mensagem de voz) e escrita (mensagem de texto). Nosso objetivo neste estudo é a análise deste último aspecto, que por sua vez constitui-se de abreviações (vc, tb, q, c), ícones (emoticon) : ) : { e supressões de fonemas (bjus, tard). Outra característica muito presente nesses enunciados é a falta de pontuação, que por muitas vezes acaba dando outro significado aos mesmos, deixando-os ambíguos: "t encontru amanha um abraçu amarela". Nesta mensagem amarela é o apelido do interlocutor. Além disso as marcas da oralidade também são bem visíveis: " t amu. vem pra ca". Assim como o uso de letras maiúsculas para enunciados que requerem destaque: " t AMU".

1.1 Finalidade e Suporte Material

Marcuschi (2002) diz que esses novos gêneros não são inovações absolutas e sim advindos de gêneros já existentes. No caso das mensagens de texto via celular podemos compará-las ao bilhete, por serem mensagens de textos breves e enunciados curtos com identificação ou assinatura de quem escreve. A diferença entre o bilhete e a mensagem via celular está no suporte material: enquanto o bilhete se caracteriza como um manuscrito com quantidades de vocábulos indeterminados que precisa ser levado ou deixado em local visível para o receptor; a mensagem de texto via celular tem como suporte material o painel digital do aparelho celular, que limita o número de caracteres . Além disso, o receptor recebe de modo mais ou menos "imediato" a mensagem. Assim, segundo Jennifer Hord, quando um amigo lhe envia um torpedo, a mensagem passa pelo Centro de SMS, vai para a torre e a torre envia a mensagem ao seu telefone na forma de um pequeno pacote de dados no canal de controle. Da mesma forma, quando você envia uma mensagem, o seu telefone a envia para a torre no canal de controle, de onde ela segue para o Centro de SMS e é redirecionada para o destinatário. Além disso, assim como no domínio virtual não há necessidade de assinatura como num bilhete, as funções tecnológicas do aparelho celular e da internet se responsabilizam por isso.

1.2 Estatuto de Parceiros Legítimos

As mensagens de texto via celular possuem uma diversidade de locutores visto sua dinamicidade. Recebemos mensagens de operadoras que oferecem serviços e promoções, mensagens de desconhecidos, e principalmente mensagens de pessoas próximas. Tomaremos como objeto de estudo as mensagens inter-pessoais, aquelas que recebemos de amigos, familiares, enfim, de pessoas próximas. Diante disso, podemos dizer que o locutor dessas mensagens são bem diversificados, são indivíduos de faixa etária, sexo, classe social diferentes e que usufruem dos serviços de um aparelho celular, visto que possuir atualmente um aparelho celular não é mais privilégio de alguns, mas de uma massa bem diferenciada de indivíduos, pelas facilidades de compra e pelo baixo custo. Isso faz com que sejam também diversificados os interlocutores.

1.3 Lugar e Momento legítimos

Os serviços do aparelho celular não podem ser usados em qualquer lugar, pois existem algumas restrições e algumas regras de etiqueta. Por exemplo, em hospitais, ao dirigir, em aeronaves, postos de gasolina são lugares perigosos ou ilegais para tal uso, enquanto que em sala de aula, em uma palestra, na missa, e em outras ocasiões em que por elegância não é recomendável que se utilizem as funções de um celular, como enviar mensagens ou até mesmo receber e realizar ligações. Diante do exposto, verificamos que há indeterminação em relação ao lugar onde circula esse gênero, ou seja, os lugares devem ser adequados ao uso do aparelho. A temporalidade dessas mensagens de textos é imediata, o receptor, dependendo das condições do seu aparelho, ligado, fora da área de serviço, recebe-a em seguida à produção da mesma, mas se analisarmos a duração de validade, item citado por Maingueneau (2004), veremos que será por um determinado tempo, dependendo da tecnologia e funcionalidade do aparelho, que a armazenará por algumas semanas ou em decorrência da memória de status da caixa de mensagem se esgotar, lembrando ainda que poderá ser apagada imediatamente pelo receptor, por isso, a validade não pode ser presumida.

1.4 Organização textual

Nas mensagens de textos via celular há uma diversidade em relação às seqüências textuais, que se constituem de enunciados: descritivos, "narrativos, injuntivos e principalmente conversacionais. Apresentam enunciados religiosos: "t amu deus t abençoe"; amorosos: "tenho um baú chamado coração, dele transborda o único tesouro que possuo e que posso te oferecer, o meu AMOR!!!" , ditos populares: "quem v carro não v coraçao"; enunciados cômicos: "as vzes sinto vontad de t ligar e ouvir a tua voz!!! Mas vem uma voz do alem m dizndo...SALDO INSUFICIENTE; enunciados afeivos: "no mundo existe 4 tipos de amizades >a grande >a media >a pekena a mais important de todas A NOSSA; entre outros. Enfim, esse é um novo gênero utilizado no dia-a-dia por muitos usuários de celulares com os mais variados objetivos e conteúdos.

2 A ORGANIZAÇÃO TEXTUAL DO GÊNERO

Dentre os critérios de êxito (Maingueneau, 2004) aos quais estão submetidos os gêneros do discurso, este trabalho enfocou a organização textual do gênero mensagem via celular, abordando também o estatuto de parceiros legítimos como constituinte não menos importante nesse gênero.
Todo gênero do discurso apresenta uma organização textual. Reconhecer um gênero do discurso passa por identificar também, como se estruturam seus enunciados. Em se tratando da mensagem de texto via celular, essa organização textual assemelha-se à de um bilhete, confirmando a idéia de Bakhtin, sobre assimilação de um gênero por outro ou a transmutação, originando um novo gênero. O diálogo entre o gênero bilhete e o gênero mensagem via celular, na variante mensagem de texto, dá-se exatamente na semelhança de sua organização textual, ambos apresentam textos breves, com sintaxes curtas, normalmente. O que denota a praticidade de uso dos dois gêneros. A seguir, temos uma mensagem de texto enviada por celular, ilustrando essa afirmação.

Ex.: "GEFF O MEU CELULAR ESTÁ BLOQUEADO ESTOU AQUI NA CASA DE MINHA IRMÃ CHEGO
EM CASA DEPOIS DAS 1OHS.
BEIJOS.
RÔ." (sic)

Outros aspectos relevantes na organização textual do gênero analisado aqui, são, em alguns casos, a falta de pontuação e a ortografia diferenciada, com presença de abreviações, supressões de letras no meio e no final das palavras, bem como letras representando palavras inteiras ou sílabas("c" por "se"; "d" por "de"; "q" por "que" etc.). Como por exemplo:

? Ex."Ferd to aqui na igreja c/ a lisia agente vai chegar tard não c preocup." (sic)

? Ex. "t adoro sabia? D verdad!
t admiro e t considero pa kct!
otimo dia pa ti!
Bjinhos."
? Ex.
L1.: "bm dia! t amo!"

L2.: "tô cum xaudade.
tenha um dia abençoado.
t amo."

Observando o conteúdo e a ortografia das mensagens, percebe-se grande aproximação entre oralidade e escrita. As marcas da oralidade aparecem mormente em expressões como: "to" (estou); "dodói" (doente); "xaudade" (saudade); "xerim" (cheirinho); "tava" (estava); "pa" (para); "cum" (com); "mekitá?" (como é que está?), denotando intimidade e um conhecimento do código utilizado, por parte dos interlocutores. Há ainda marcas que demonstram sentimentos, como "rsrs" (risos); "haushaushausha, "hahaha", "kkkkkkkkkk" (gargalhadas); "grgrgrgrrrr" (raiva), entre outros.
Além disso, constata-se a presença de semioses diversas em mensagens via celular, integrando signos verbais, imagens, sons e animações (imagens em movimento). No caso específico da mensagem de texto, é mais comum, usarem-se símbolos, caracteres de texto, para formar ícones, os chamados emoticons que tornam as mensagens mais vivas, mais convincentes, mais interessantes.
Alguns exemplos de emoticons utilizados nas mensagens de texto:

? :-) sorrindo;
? :-( triste;
? >:-( chateado;
? :-* beijando;
? :-O surpresa;
? :-() gritando;
? :-@ confuso;
? :-{ o quê?;
? :D gargalhando;
? (_)3 caneca;
? \_/P xícara;
? +:-) médico;
? :-B dentuça.

Quanto às seqüências textuais, o gênero mensagem via celular, na variante mensagem de texto, apresenta seqüências expositivas, narrativas, dialogais (conversacionais), injuntivas ou descritivas, predominando sempre uma delas conforme a temática dos textos. Pode-se, por exemplo, observar uma tímida seqüência injuntiva nas seguintes mensagens:

? Ex. "@>--- receba esta rosa como sinal do meu amor e da minha fidelidade.
Te amo!"

? Ex. "Ajeite o almoço.
Estou chegando. Beijos."

A seqüência descritiva apresenta uma estrutura simples com verbos estáticos no presente ou imperfeito como observamos claramente neste outro exemplo:

Ex. "ontem vc estava bela c/ seus cabelos negros, aquela calça jeans e um top pretinho.bjos."

Uma breve seqüência narrativa pode-se perceber a seguir:

Ex. "ontem qdo Elen chegou em casa percebeu q tinha deixado a porta dos fundos aberta kkkkkkk "

A prevalência da seqüência expositiva que segundo Werlich (Marcuschi, 2002), deve possuir uma base textual onde aparece um sujeito, um predicado (no presente) e um complemento com um grupo nominal, pode ser ilustrada no exemplo a seguir:

Ex. " uma parte do meu coração é vc ."

Observa-se a seguir um exemplo de seqüência conversacional que se caracteriza por ser realizada por mais de um interlocutor, acontecendo a interação entre os parceiros legítimos.

Ex. L1.: "Vens mesmo hj?
Deu td certo?
L2.: "Quinta pela manha."

Adam (Bonini, 2005) chama a seqüência acima de dialogal, caracterizando-a de transacional, devido a predominância do padrão pergunta/resposta.

3 ESTATUTO DE PARCEIROS LEGÍTIMOS

Quanto ao gênero mensagem de texto via celular, é mister considerar o estatuto de parceiros legítimos (locutor/interlocutor) como outro determinante na caracterização do gênero analisado aqui. Este estudo optou por ilustrar mensagens com interlocutores conhecidos entre si, com certo grau de intimidade.
Questionamos, entretanto, qual o papel dos parceiros legítimos (locutor/interlocutor) mediante o envio e a recepção das mensagens. Dependerá da finalidade da mensagem, do grau de envolvimento dos parceiros e da importância do conteúdo da mensagem. A posição de locutor, como em qualquer ato comunicativo de interação, passa a ser de interlocutor e vice-versa, principalmente quando a mensagem de texto requer resposta.

4 SUPORTE MATERIAL

Outro aspecto de caracterização do gênero mensagem via celular relevante é o suporte material desse gênero. Sabe-se que determinados gêneros textuais não dependem somente de seus aspectos formais (estruturais ou lingüísticos) para se caracterizarem. Em muitos casos, o que determina o gênero é o suporte ou ambiente onde se apresentam os textos. (Marcuschi, 2002)
Quando se trata de gêneros textuais virtuais como é o caso das mensagens via celular, o suporte material é fundamentalmente importante. Como já foi dito, esse gênero dialoga com o gênero bilhete, devido à semelhança entre suas organizações textuais, entretanto o que marcará a diferença é o suporte. Ilustrando, imaginemos um mesmo texto escrito em um pedaço de papel afixado em um lugar a fim de ser lido por um interlocutor específico; depois digitado e enviado ao mesmo interlocutor por meio do celular. Embora possamos afirmar serem o mesmo texto, nas duas situações, não podemos afirmar serem o mesmo gênero, dado o suporte que é diferente. Nesse sentido, embora se tenha semelhante organização textual e até os mesmos interlocutores, o que os diferenciará, é o veículo por onde são emitidos. Até mesmo no que concerne à organização lingüística dos dois gêneros, há diferenças marcantes, pois dificilmente encontramos palavras suprimidas ou abreviadas no bilhete, quando isso é corriqueiro nas mensagens de texto via celular.
Ainda que se considere a expressividade do suporte material e do estatuto de parceiros legítimos dentro do gênero mensagem via celular, procuramos focalizar a organização textual haja vista determinadas particularidades estruturais e lingüísticas das mensagens, sua aproximação ao gênero bilhete e principalmente o hibridismo entre oralidade e escrita.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise feita não se encerra nos pontos considerados neste trabalho, ainda se pode atentar para as relações inter-pessoais no domínio da tecnologia da comunicação. Posto que, o gênero mensagem via celular, só é possível em função da existência de aparelhos de telefonia móvel, os aparelhos celulares.
Destacamos algumas questões decorrentes do estudo produzido acerca desse gênero. O estatuto dos parceiros legítimos não se fecha em interlocutores conhecidos entre si, posto que há as mensagens enviadas por operadoras de telefonia móvel a seus usuários, com conteúdos relacionados a créditos, conta telefônica, promoções dentre outros. No caso do informe sobre promoções da operadora, benefícios ao usuário, podemos dizer que há intercalação com o gênero peça publicitária, mas isso é objeto para estudos futuros.
Em suma, notamos que a análise realizada a respeito do gênero mensagem via celular tem muito a ser pesquisada e aprofundada, visto sua importância para o conhecimento na área da comunicação inter-pessoal, que evolui consideravelmente devido às descobertas no campo tecnológico. Nesse sentido, esse trabalho contribuiu para nossos conhecimentos em relação a ampla seara que envolve os estudos sobre Gêneros discursivos, sendo útil para a aplicação nas atividades pedagógicas no ensino de Língua Portuguesa.

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BONINI, Adair. A noção de Seqüência textual na análise pragmático-texual de Jean-Michel Adam. In: MEURER, J. L., BONINI, Adair; MOTTA-ROTH, Désireé (orgs.). Gêneros: Teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.
MAINGUENEAU, D. Análise de Textos da comunicação. São Paulo: Cortez, 2004.
MARCUSCHI, L. A. Gêneros Textuais: Definição e funcionalidade. In: DIONISIO, A. P., MACHADO, A. R. e BEZERRA, M. A. Gêneros Textuais e Ensino. Rio de Janeiro: Editora Lucerna, 2002.


Autor: Luana Silva Batista


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