VIOLÊNCIA ESCOLAR NA BAIXADA FLUMINENSE: memórias e movimentos instituintes entre o espaço urbano-rural de Nova Iguaçu e Seropédica.



UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO
VIOLÊNCIA ESCOLAR NA BAIXADA FLUMINENSE: memórias e movimentos instituintes entre o espaço urbano-rural de Nova Iguaçu e Seropédica.

Alessandra de Oliveira Pereira
Licenciatura Plena em Educação Física
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Aloisio Jorge de Jesus Monteiro
Doutor em Educação
Professor adjunto
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
CNPq/UFRuralRJ


Resumo
Esse trabalho foi uma iniciativa do Grupo Aleph, pólo UFRRJ, formado por pesquisadores da UFF, UERJ, UFRRJ, um programa interinstitucional, sendo parte do projeto de pesquisa Experiências Instituintes em Escolas Públicas, Memórias e Projetos para a Formação de Professores, financiado pelo CNPq, através do Edital Universal 2002. Teve continuidade em 2004 através do PIBIC/CNPq/UFRRJ. Trata-se de um relato completo das experiências e resultados obtidos durante um ano de pesquisa sobre a violência escolar na Baixada Fluminense.


Como Tudo Aconteceu
Inicialmente foi feito um de levantamento bibliográfico, onde fundamentamos nossa pesquisa basicamente nos seguintes autores: Jean-Claude Chesnais e Bernard Charlot no que diz respeito ao conceito de violência, Walter Benjamin falando sobre memórias, violência e poder.

Conceito de Violência: Jean-Claude e Bernad Charlot
Para Chesnais existem diversas concepções do conceito de violência, que segundo a realidade dos custos sociais por ela provocados, devem, necessariamente, ser hierarquizadas em três domínios, que apresentamos em linhas gerais:
1.A violência física ? que seria a referência empírica deste fenômeno;
2.A violência econômica ? que se referenciariam exclusivamente aos prejuízos à propriedade e ao patrimônio individual e comum, como conseqüência da criminalidade, delinqüência e vandalismo;
3.A violência Moral ou Simbólica ? que estaria focada na idéia de autoridade e, segundo Chesnais, encontra-se muito em moda.
Para este autor, somente o primeiro domínio possui uma base de definição conceitual etimologicamente apropriada. (apud, ABRAMOVAY, 2002).
Já Charlot, toma como ponto de partida, a enorme complexidade presente quando da tentativa de definição do conceito de violência, devido ao fato de que este nos remete a fenômenos heterogêneos, com complexos níveis de interações, e por isso, extremamente difíceis de ordenar e delimitar.
As linhas tênues que demarcam as fronteiras de conceitualização do fenômeno da violência para Charlot, aumentam em dificuldade, principalmente, devido ao fato de que seu significado é fortemente relativizado e não consensual.
Mesmo assim, Charlot a divide em três tipos:
1.Violência: roubos, crimes, vandalismos, violência sexual, golpes, etc;
2.Incivilidades: falta de respeito, humilhação, arrogância, ofensas e palavras agressivas;
3.Violência Simbólica ou Institucional: são violências gestadas e geradas no interior dos relacionamentos humanos e sociais hierárquicos, bem como, as produzidas pelas relações de poder instituído.
Para Bernad Charlot, a violência física e a psicológica são as que mais são destacadas e identificadas, muitas vezes, de maneira espetacular. Mas, são as incivilidades, que para ele representam o principal fator de manifestação da violência no relacionamento humano. (apud, ABRAMOVAY, 2002).

Memórias, Poder e Violência em Walter Benjamin.
O autor aguça a reflexão sobre a relação entre violência e poder nos projetando para o mundo das entrelinhas, do ver além, e dessa forma nos permiti o nascedouro de críticas plausíveis à realidade empírica do cotidiano social.
"A crítica da violência, ou seja, a crítica do poder, é a filosofia de sua história. É a "filosofia" dessa história, porque somente a idéia do seu final permite um enfoque crítico, diferenciador e decisivo de suas datas temporais. Um olhar dirigido apenas para as coisas mais próximas perceberá, quando muito, um movimento dialético de altos e baixos nas configurações do poder enquanto instituinte e mantenedor do direito. A lei dessas oscilações consiste em que todo poder mantenedor do direito, no decorrer do tempo, acaba enfraquecendo indiretamente o poder instituinte do direito representado por ele, através da opressão dos antipoderes inimigos. Isso dura até que novos poderes ou os anteriormente oprimidos vençam o poder até então instituinte do direito, estabelecendo assim um novo direito sujeito a uma nova decadência. A ruptura dessa trajetória, que obedece a formas míticas de direito, a destituição do direito e dos poderes dos quais depende ( como eles dependem dele), em última instância, a destituição do poder do Estado, fundamenta uma nova era histórica. Se a dominação do mito em alguns pontos já foi rompida, na atualidade, o Novo não se situa num ponto de fuga tão inconcebivelmente longínquo, que uma palavra contra o direito seja supérflua. Se a existência do pode, enquanto poder puro e imediato, é garantida, também além do direito, fica provada a possibilidade do poder revolucionário, termo pelo qual deve ser designada a mais alta manifestação do poder puro, por parte do homem. A decisão, porém, se o poder puro, num determinado caso, era real, não é possível da mesma maneira, nem igualmente urgente para o homem. Pois com certeza, apenas o poder mítico será identificado com a violência, não o poder divino, a não ser através de efeitos incomensuráveis, já que o poder que absolve da culpa é inacessível ao homem."
Uma das vias mantenedoras do poder por parte do opressor é o conhecimento. A manipulação do mesmo privando o outro da busca do saber ou determinando saberes aceitáveis ou inaceitáveis impossibilita o vislumbrar de nossas próprias histórias caindo no "erro" de substituir as experiências por notícias prontas, podando assim, a participação autônoma do processo de recepção dos fatos.
"A arte de narrar está definhando porque a sabedoria ? o lado épico da verdade ? está em extinção... Cada manhã recebe notícias de todo mundo. E, no entanto, somos pobres em história surpreendentes. A razão é que os fatos já nos chegam acompanhados de explicações".(1994 p.201-03).
Dessa forma adotamos uma postura de desveladores da realidade escolar na Baixada Fluminense a fim de descortinar histórias que ilustre o dia a dia dos alunos, professores, pais e todos os envolvidos no processo educacional inclusive o Estado a partir das políticas adotadas, que na nossa concepção deveria possibilitar a cidadania e o respeito às diferenças de forma que a alteridade possa existir de fato.

Continuando

Após a fase de levantamento bibliográfico definimos que o instrumento de pesquisa e o público participante, então selecionamos por posicionamento geográfico as escolas que seriam visitadas tanto em Seropédica quanto em Nova Iguaçu.(questionário em anexo).
Alunos de quinta a oitava série foram ouvidos, sendo que, uma turma de cada série participou o que totaliza 676 alunos ouvidos.


Resulatados Estatísticos

Seropédica

Números de escolas visitadas: 3
Número de alunos ouvidos: 345

Escola 1 - Escola Municipal Santa Sofia

121 alunos responderam ao questionário.
Da pergunta número um (P 1) 73% responderam que moram em casa própria;
Da pergunta numero dois (P 4) 70% responderam que não presenciaram brigas, ameaças e agressões dentro da escola;
Da pergunta número seis (P6) 79% nunca viram uma arma dentro da escola.







Da pergunta cinco as situações de brigas, ameaças e agressões com maior incidência foram:
G-entre estudantes e
A-de estudante para professor

A-de estudante para professor
B-de professor para estudante
C-de diretores e coordenadores para estudantes
D-diretores e coordenadores para professores
E-de estudantes para diretores e coordenadores
F-de professores para diretores e coordenadores
G-entre estudantes
H-entre professores


Sobre a presença de armas e drogas na escola:
11% afirmaram ter visto algum tipo de droga dentro da escola
9% afirmaram ter visto algum tipo de arma na escola

Escola 2- Escola Municipal José Maria de Brito

119 alunos responderam ao questionário.
Da pergunta número um (P 1) 84% responderam que moram em casa própria;
Da pergunta numero dois (P 4) 71% responderam que não presenciaram brigas, ameaças e agressões dentro da escola;
Da pergunta número seis (P6) 84% nunca viram uma arma dentro da escola.

















Da pergunta cinco as situações de brigas, ameaças e agressões com maior incidência foram:
G-entre estudantes


A-de estudante para professor
B-de professor para estudante
C-de diretores e coordenadores para estudantes
D-diretores e coordenadores para professores
E-de estudantes para diretores e coordenadores
F-de professores para diretores e coordenadores
G-entre estudantes
H-entre professores

Sobre a presença de armas e drogas na escola:
11% afirmaram ter visto algum tipo de droga dentro da escola
9% afirmaram ter visto algum tipo de arma na escola

Escola 3- Escola Municipal Pastor Gerson

91 alunos responderam ao questionário.
Da pergunta número um (P 1) 23% responderam que moram em casa própria;
Da pergunta numero dois (P 4) 19% responderam que não presenciaram brigas, ameaças e agressões dentro da escola;
Da pergunta número seis (P6) 26% nunca viram uma arma dentro da escola.








Da pergunta cinco as situações de brigas, ameaças e agressões com maior incidência foram:
G- entre estudantes




A-de estudante para professor
B-de professor para estudante
C-de diretores e coordenadores para estudantes
D-diretores e coordenadores para professores
E-de estudantes para diretores e coordenadores
F-de professores para diretores e coordenadores
G-entre estudantes
H-entre professores

Sobre a presença de armas e drogas na escola:
2% afirmaram ter visto algum tipo de droga dentro da escola
2% afirmaram ter visto algum tipo de arma na escola


Nova Iguaçu

Números de escolas visitadas: 3
Número de alunos ouvidos: 331

Escola 1 ? São Francisco de Paula

77 alunos responderam ao questionário.
Da pergunta número um (P 1) 90% responderam que moram em casa própria;
Da pergunta numero dois (P 4) 92% responderam que não presenciaram brigas, ameaças e agressões dentro da escola;
Da pergunta número seis (P6) 80% nunca viram uma arma dentro da escola.




Da pergunta cinco as situações de brigas, ameaças e agressões com maior incidência foram:
G ? entre estudantes


A-de estudante para professor
B-de professor para estudante
C-de diretores e coordenadores para estudantes
D-diretores e coordenadores para professores
E-de estudantes para diretores e coordenadores
F-de professores para diretores e coordenadores
G-entre estudantes
H-entre professores



Sobre a presença de armas e drogas na escola:
27% afirmaram ter visto algum tipo de droga dentro da escola
12% afirmaram ter visto algum tipo de arma dentro da escola



Escola II? Yonne Maria Siqueira de Andrade

123 alunos responderam ao questionário.
Da pergunta número um (P 1) 93% responderam que moram em casa própria;
Da pergunta numero dois (P 4) 81% responderam que não presenciaram brigas, ameaças e agressões dentro da escola;
Da pergunta número seis (P6) 85% nunca viram uma arma dentro da escola.




Da pergunta cinco as situações de brigas, ameaças e agressões com maior incidência foram:
G ? entre estudantes
A ? de estudante para professor
B ? de professor para estudante

A-de estudante para professor
B-de professor para estudante
C-de diretores e coordenadores para estudantes
D-diretores e coordenadores para professores
E-de estudantes para diretores e coordenadores
F-de professores para diretores e coordenadores
G-entre estudantes
H-Entre professores


Sobre a presença de armas e drogas na escola:
27% afirmaram ter visto algum tipo de droga dentro da escola
22% afirmaram ter visto algum tipo de arma dentro da escola




Escola III ? Pêra Flor

145 alunos responderam ao questionário.
Da pergunta número um (P 1) 97% responderam que moram em casa própria;
Da pergunta numero dois (P 4) 46% responderam que não presenciaram brigas, ameaças e agressões dentro da escola;
Da pergunta número seis (P6) 62% nunca viram uma arma dentro da escola.




Da pergunta cinco as situações de brigas, ameaças e agressões com maior incidência foram:
G ? entre estudantes



A-de estudante para professor
B-de professor para estudante
C-de diretores e coordenadores para estudantes
D-diretores e coordenadores para professores
E-de estudantes para diretores e coordenadores
F-de professores para diretores e coordenadores
G-entre estudantes
H-entre professores

Sobre a presença de armas e drogas na escola:
13% afirmaram ter visto algum tipo de droga dentro da escola
28% afirmaram ter visto algum tipo de arma dentro da escola





Da pergunta dez (P10)

"Violência é uma coisa apavorante que da até morte".

"Violência para mim à pessoa que bate e que a criança não faz a coisa...".
"Uma falta de diálogo entre as pessoas"
"Muito ruim se todo mundo fosse unido não tinha violência"
"Qualquer coisa que venha ocultar a liberdade"
"Perca de amigo".
"É tudo que acontece no Brasil".
"É o que aconteceu em São Paulo"
"É uma pessoa que agride a outra e a falta de respeito entre o professo"
e o aluno não só em agressão também em palavras e os alunos quando se agridem."




Conclusão

Através das perguntas abertas foi identificado que os alunos e grande parte dos professores e funcionários não tem o conceito de violência definido, restringindo-a violência física. A compreensão é muito genérica e restrita a agressão, portanto ameaças são consideradas violência somente pela minoria dos participantes.
É justamente, na ausência de lucidez dessas estruturas instituídas, que, para Walter Benjamin, reside à fonte de manifestação do caráter mais violento presente em uma sociedade.
Pela nossa pesquisa percebemos que há uma clara omissão do Estado ilustrada na falta de infraestrutura básica para o pleno funcionamento das atividades escolares e pela não formação da cidadania, ou seja, dos direitos plenos e deveres e respeito às diferenças.
Por isso que nós acreditamos que a baixa expectativa de violência exposta em nossa perspectiva deve-se por conta da fragilidade da compreensão mais ampla do significado do conceito de violência, que no caso dessa pesquisa ficou claramente perceptível seu vinculo restrito ao significado de violência enquanto violência física em poucas situações a ameaça foi citada no sentido mais profundo da palavra, ou seja, não existe uma percepção dos autores institucionais do processo violento que ocorre dentro da escola.
Assim, quando falamos em violência, referimo-nos às condições institucionais de exclusão e opressão humanas e sociais, que desagregam trabalhos, culturas e sonhos, e a partir da qual podemos encontrar o nascedouro de outras formas de violências.

Referências
BENJAMIN, W. - Magia e Técnica, Arte e Política: ensaio sobre literatura e história da cultura. - 7ª ed. - São Paulo: Brasiliense, 1994. (Obras Escolhidas; v.1).

BHABHA, H. K. ? O Local da Cultura ? Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998.

CERTEAU, M. - A Invasão do Cotidiano. - Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1994.

ELIAS, N. - O Processo Civilizador. - Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1993, v.2.

GIDDENS, A. - As Conseqüências da Modernidade. - São Paulo: Editora Universidade Estadual Paulista, 1991.

LINHARES, Célia Frazão. - A Escola e seus Profissionais: tradições e contradições. - 2ª ed. revisada, Rio de Janeiro: Agir, 1997.

MATURANA, H. et VARELA,F. J. - The Tree of Knowledge: The Biological Roots of Human Understanding - Paperback:: Shambhala Publications, 1998. 

MONTEIRO, Aloisio J. de J. ? Violência ou Valores na Educação? A Política de Mahatma Gandhi e as experiências instituintes da Brahma Kumaris. Niteróri: UFF, Tese de Doutorado, 2004.

__________ ? Caminhos da Liberdade: uma perspectiva educacional do Oriente-Ocidente ? Rio de janeiro: DP& A editora, 2002.

VIRILIO, Paul. - Velocidade e Política. - São Paulo: Estação Liberdade, 1996.








Anexo
Violência escolar na Baixada Fluminense:
Questionário Para Pesquisa

Idade: ______ Série: _________ Escola: _______________________________ Sexo: ____

1-Você mora em casa própria?
( ) Sim
( ) Não

2- Com quem você mora?
( ) Pai e Mãe
( ) Só com o Pai
( ) Só com a Mãe
( ) Outros Quem? _________________________________________________

3- Qual é a profissão dos responsáveis?


4- Você já presenciou: brigas, agressões,ameaças, dentro da escola?
( ) Sim
( ) Não

5-Se a resposta foi sim, defina:
( ) de estudante para professor
( ) de professor para estudante
( ) de diretores e coordenadores para estudantes
( ) de diretores e coordenadores para professores
( ) de estudantes para diretores e coordenadores
( ) de professores para diretores e coordenadores
( ) entre estudantes
( ) entre professores

6- Você já viu uma arma na escola?
( ) Sim
( ) Não

7- Se sim, que tipo de arma?


8- Sobre as drogas, você já, viu dentro da escola:
( ) alguém vendendo
( ) usando
( ) te oferecer
( ) Nunca vi

9- Quais os tipos de drogas você já viu na escola?

10- O que é violência para você?
Autor: Alessandra De Oliveira Pereira


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