O processo de leitura e escrita numa visão psicopedagógica
Rosiane Assunção Mendonça Cavalcante
RESUMO
Este artigo, cujo tema é: "o processo de leitura e escrita numa visão psicopedagógica", foi realizado com objetivo de compreender a Psicopedagogia como suporte para a solução das dificuldades no processo de alfabetização. A escolha para a fundamentação teórica implicou na relação de obras ligadas ao assunto tomando por base o pensamento de: Piaget (1993); Ferreiro (1985); Teberoski (1986); Paín (1985), dentre outros. Ele fez-se necessário devido a importância de todos os profissionais envolvidos na aquisição da leitura e da escrita, virem esta problemática como um processo contínuo, tendo a Psicopedagogia como aliada para a solução das dificuldades que surgem neste processo. A estratégia de pesquisa foi a revisão bibliográfica, revendo os conceitos que existem na literatura específica e a possibilidade destes conceitos serem colocados em prática. O estudo feito sobre o tema nos leva a pensar em uma prática educativa respaldada na teoria, porém jamais podendo esquecer que no dia-a-dia como profissional da Psicopedagogia, estará na companhia de indivíduos que são capazes de construir seu próprio conhecimento, agindo assim, como mediadores entre o sujeito e a aprendizagem. Foi visto, segundo os autores citados, que a aquisição da leitura e da escrita é dada por uma interação do sujeito com objeto, obedecendo a níveis de conhecimento, isto é, acontece de forma processual e contínua. O papel da Psicopedagogia não pode ser esquecido, cujo mesmo, é juntamente com as pessoas envolvidas neste processo, investigar, diagnosticar e intervir mediante as dificuldades de aprendizagem e ajudar os que estão prestes a serem alfabetizados a superá-las.
PALAVRA CHAVE: Leitura. Escrita. Processo. Conhecimento.
INTRODUÇÃO
O artigo científico em questão tem como tema: "O processo de leitura e escrita numa visão psicopedagógica". A abordagem deste assunto faz-se necessário porque o não entendimento dos alunos não aprenderem a ler e escrever é algo que deixa não só a escola, mas também a família e principalmente o sujeito, frustrados com o fracasso na aprendizagem. Fracasso este que muitas vezes não é assumido pela escola ou pela família, sendo a responsabilidade de ensinar, jogada de um lado para outro.
A prática pedagógica não é de forma alguma uma tarefa fácil, sendo os desafios freqüentes para saber lidar corretamente com a diversidade presente em sala de aula, isto quando o profissional da educação não atua de maneira reflexiva e consciente de suas limitações. Para solucionar difíceis problemas de aprendizagem é necessário um trabalho coletivo envolvendo não apenas: família; escola e aluno, mas outros profissionais atuantes tanto na área da Educação como em áreas afins, estando a Psicopedagogia dentro destas áreas e contribuindo significamente na superação de barreiras encontradas para o avanço na aprendizagem.
A Psicopedagogia pode atuar junto à Educação, facilitando o entendimento das dificuldades de aprendizagem, aqui em específico, as de leitura e de escrita, identificando-as, intervindo no processo de alfabetização, fornecendo mecanismos adequados para solução dos problemas encontrados, isto é, funcionando como mediadora na relação dos sujeitos citados.
O momento é mais do que adequado para se rever conceitos lançados na literatura, no tocante a esta problemática. Pesquisar, refletir, e comparar o que os autores escreveram sobre o assunto com a prática educacional atualmente existente nas escolas é de grande importância, já que enquanto houver caminhos a serem percorridos, por que não segui-los em busca de soluções? Aquele que tem objetivos voltados para uma Educação de qualidade, certamente os seguirão.
Já mencionado o porquê deste trabalho, agora sua necessidade dentro do mundo acadêmico e seu reflexo na prática educacional, vem se fortalecer através de seu objetivo, que é compreender a Psicopedagogia como suporte para a solução das dificuldades no desenvolvimento da leitura e da escrita.
A escolha para a fundamentação teórica implicou na relação de obras ligadas ao assunto tomando como por base o pensamento de: Piaget (1993); Ferreiro (1985); Teberoski (1986); Paín (1985); dentre outras. O tipo de metodologia utilizada foi à revisão bibliográfica.
Dentro do que foi citado, o trabalho tem em sua divisão, no início o estudo dos conceitos relacionados à aquisição da leitura e da escrita. Em seguida, serão apontadas e comentadas as dificuldades neste processo e finalizando com a exposição da função da Psicopedagogia na alfabetização.
AQUISICÃO DA LEITURA E DA ESCRITA
Na visão de Ferreiro (1985), o processo de leitura e de escrita tem seu início antes que a criança entre na escola, a mesma constrói seu conhecimento através de esquemas conceituais que permitam interpretar tanto as informações prévias como as atuais.
A escola e muitos professores têm dificuldades de aceitar que o sujeito possa ter adquirido o desenvolvimento da leitura e da escrita, fora de um ambiente escolar e assim tendem a desvalorizar as conquistas do aluno.
Não se pode dizer com isto, que a escola não tenha sua importância, a mesma deve se caracterizar como um ambiente que possibilite a transformação, onde sujeito e conhecimento estejam em interação e que se respeite os estágios de desenvolvimento cognitivo do mesmo.
Piaget, cuja teoria constitui atualmente, referência para as diversas áreas do saber, mudou a concepção de que a criança é um ser desprovido de experiências, segundo o mesmo desde muito cedo ela desenvolve relações inteligentes com o meio, ocorrendo trocas em busca do conhecimento, ou seja, do pensamento racional.
No entanto, para se chegar a este conhecimento, é preciso ultrapassar etapas. Estas faces foram denominadas por Piaget (1993), estágios de desenvolvimento cognitivo, onde a criança passa por uma contínua construção de seu conhecimento, elaborando esquemas que se acomodam aos já existentes e a partir da assimilação de conceitos novos sobre o objeto de conhecimento, possa então ocorrer à transformação cognitiva esperada em relação ao estágio em que o sujeito se encontre.
A teoria piagetiana, influenciou outros estudiosos no tocante à aprendizagem da criança. Em relação à aquisição da leitura e da escrita, temos: Ana Teberoski e Emília Ferreiro. Ana Teberoski resgatou os pressupostos epistemológicos da teoria de Piaget, para aplicá-los à análise do aprendizado da língua escrita, a nova forma de ver a alfabetização fez com que mitos vigentes fossem quebrados, como por exemplo, a prontidão para aprender, as crianças precisariam ter habilidades específicas e assim, receberem os conhecimentos já prontos, sem a chance de mostrar o que sabe. A esta nova forma de pensamento sobre o processo de leitura e de escrita, Teberoski deu o nome de Psicogênese da Língua Escrita.
Segundo Teberoski (1986), a criança produz sua escrita através de aplicação de esquemas de assimilação ao objeto, à mesma desde cedo elabora idéias próprias em relação aos sinais gráficos, sendo seu processo de aquisição da escrita baseado em hipóteses construídas sobre o que ela tenha acesso no tocante à língua escrita.
Na visão de Teberoski (1986) a escrita não é adquirida na escola, ela é um objeto cultural, resultante da necessidade humana de se comunicar e de dá suporte à linguagem não-verbal, sendo esta construída através de um processo com diferentes níveis de aquisição que se sucede em graus variados de complexidade.
Os grandes períodos da linha de evolução da escrita são: hipótese pré-silábica; hipótese silábica; hipótese silábico-alfabética e hipótese alfabética. O primeiro período se caracteriza por uma falta de compressão com relação entre ao registro gráfico e o aspecto sonoro da fala, assim não demonstra intencionalidade em registrar o tipo de linguagem sonora, porém dentro desta fase há certo avanço, quando a criança passa de escrita indiferenciada para uma diferenciação nos grafismos produzidos.
O segundo período é aquele cuja criança inicia o estabelecimento das relações entre o que se escuta e o que se escreve, ela passa atribuir a cada letra o registro de uma sílaba falada, outra característica marcante deste período é presença de potenciais conflitos entre a hipótese silábica e hipótese da quantidade mínima de caracteres e o acréscimo da escrita convencional.
O próximo período é o silábico-alfabético, neste a criança utiliza ao mesmo tempo as hipóteses silábica e alfabética com mudanças importantes no seu desenvolvimento, sendo um momento de transição à mesma agrega mais letras à escrita, aproximando-se ao princípio alfabético.
O último período apontado por Teberoski (1986) é o período alfabético, aqui a criança já deve ter vencido os obstáculos conceituais para a escrita, nesta face para ela cada letra corresponde a menor unidade da escrita, mas a mesma não alcançou as regras normativas da ortografia mesmo com a escrita compreensiva.
Outro aspecto importante no processo de alfabetização é a leitura. Uma das autoras e pesquisa no assunto é Solé (1987). Ler para a autora é a busca de satisfazer objetivos diversificados, que a interpretação do que se ler dependerá do objetivo e que o leitor e texto devem está sempre no processo de interação. Ao ler, o leitor deve ter habilidades de decodificação e simultaneamente a isto, buscar no texto novas idéias, novos objetivos a partir de seus conhecimentos prévios.
Ler não é um ato simplesmente de decodificação de sinais gráficos. A prática da leitura verdadeiramente significativa baseia-se na capacidade de conciliar destreza de decodificação de letras, palavras e frases, com o que elas significam dentro de um texto, com a capacidade de indicar, no mesmo, novas idéias e hipóteses sobre o que se ler.
Colocando em prática estratégias, métodos para uma leitura interativa, o professor levará o aluno à compreensão de sua leitura. Algumas formas para se obter uma leitura compreensiva estão no fato de considerar e valorizar os conhecimentos prévios do mesmo, ou melhor, os professores devem ativar estes conhecimentos. A simples exibição de gravuras para uma turma de alunos poderá levar à construção de inúmeras idéias sobre o que há numa história ou outro texto qualquer. Elaborar predição, fazer inferências são outras estratégias de leitura que podem levar ao aluno a compreender o que está lendo.
Leitura é algo que nos traz prazer e pode ser também necessária quando buscamos nela, informações ou confirmações sobre o que ouvimos falar. Chegar a este entendimento é a razão da alfabetização.
Para que o processo de construção da leitura e da escrita ocorra com sucesso para as crianças na sua vida escolar é preciso que agentes envolvidos, acima de tudo acreditem que todos os alunos são capazes de aprender, entre os agentes engajados temos um que sem dúvida estará mais presente na vida do alfabetizante, este agente é o professor.
Alguns pontos a serem considerados pelo alfabetizador são: ser para o aluno uma referência de leitor; instigar os saberes prévios dos alunos e conhecê-los; ser um agente desafiador, planejando sempre atividades produtivas por parte do aprendiz; saber realizar intervenções adequadas; compreender a importância do incentivo à leitura e a escrita antes da alfabetização; reconhecer a necessidade de constantes estudos e debates com outros professores para a exposição e trocas de idéias sobre o assunto em questão; compreender a importância da interação entre alunos com diferentes níveis de conhecimento para o melhor favorecimento da aprendizagem.
É necessário que todos os pontos citados acima sejam colocados em prática, mas para que os mesmos aconteçam de forma enriquecedora, o professor deve ser valorizado no seu ambiente de trabalho, que o mesmo se sinta seguro no que faz que não esteja só nesta tarefa árdua, porém prazerosa, que é ajudar a criança abrir as portas para mundo da leitura.
DIFICULDADES NO PROCESSO DE LEITURA E ESCRITA
Quando nos deparamos na prática pedagógica com alunos que ainda não sabem ler nem escrever mesmo com idade cronológica dita adequada para a leitura, quando todos os esforços foram usados para que o bom desempenho do aluno seja completo e mesmo assim ele não alcança os objetivos dentro de uma turma com a maioria de alunos ditos avançados, vem por fim os questionamentos. Porque ele não aprende? Qual procedimento se deve ter perante este desafio? Quais as causas reais para que o sujeito em questão não aprenda?
A resposta para tais questionamentos sem dúvida não vem de repente, ela virá através de um trabalho de: investigação; identificação e intervenção, mediante as dificuldades que existirão no desenvolvimento da leitura de uma criança. Dificuldades estas consideradas normais dentro de qualquer processo em construção, o que importa é a forma como as mesmas são trabalhadas, não permitindo que o ambiente se torne desestimulante para quem aprende.
Segundo Nunes (1992), a criança entra na escola em meio a um clima de expectativas no tocante à tarefa de aprender a ler e a escrever, a alfabetização é, sem dúvida, a meta que deve ser alcançada por ela, deixando pais e professores ansiosos. Não se pode desacreditar no sucesso da criança sadia, que ingressa na escola, já sabendo falar, que reconhece objetos, capaz de executar tarefas que coincidem com sua idade cronológica e cognitiva, porém o que deve ser considerado pela família e pelos professores é que ler e escrever requer da criança novas habilidades, habilidades estas que não faziam parte do seu cotidiano até então.
Como aprender a ler é para a criança enfrentar novos desafios em relação ao conhecimento lingüístico, esta tarefa se torna complexa para todas as crianças, sem exceção. O aspecto que diferencia as crianças nesta tarefa é que algumas terão mais dificuldades que as outras. No geral as habilidades necessárias para leitura mais afetadas são: decodificação; compreensão do significado da palavra; relações estabelecidas entre palavras.
Ainda citando Nunes (1992), as dificuldades existentes neste processo são esperadas, pois a relação do sucesso na aprendizagem da leitura e das habilidades intelectuais deve ser considerada. Crianças que apresentam grandes habilidades intelectuais, com certeza terão maiores facilidades para aprender a ler e escrever aos compararmos com as que têm menores habilidades, sendo estas habilidades comprovadas através de testes de inteligência.
Varias causas apontam para as dificuldades de leitura, na visão de Condemarin e Marlys (1989), são: problemas emocionais; carência cultural; métodos de aprendizagem defeituosos; alterações no estado sensorial e físico; imaturidade na iniciação da aprendizagem da leitura; incapacidade geral para aprender, sendo estas causas responsáveis por um retardamento secundário na leitura, diferente da dislexia específica que é considerada a causa mais conhecida de dificuldade para a aprendizagem da leitura e da escrita.
"... a dislexia é um termo que se refere às crianças que apresentam sérias dificuldades de leitura e, consequentemente de escrita, apesar de seu nível de inteligência ser normal ou estar acima da média. Por outro lado, a criança dislexia não apresenta distúrbios a nível sensorial ou físico, a nível emocional, ou desvantagens sócio-econômicas, culturais ou instrucionais, que possam ser causas das dificuldades para aprender a ler." (Morais 1997, p. 94).
A dislexia é uma dificuldade específica na linguagem, onde o indivíduo apresenta uma evolução bastante lenta em relação ao desenvolvimento de leitura e escrita, comparado com outros indivíduos de mesma idade cognitiva e cronológica e para melhor detectar um leitor disléxico é importante observar certas características como: história pessoal; leitura e escrita; alterações de memória e aspectos emocionais, sendo o último considerado o mais complicado para se trabalhar em grupo, devido sua conseqüência que é a baixa auto-estima.
Esta síndrome pode ser entendida por um conjunto de sintomas, em geral de origem hereditária ou poucas vezes adquirida, que acarreta a aprendizagem de leitura no seu desenvolvimento, afetando também a aprendizagem da escrita: ortografia; gramática; produção textual. Os meninos são os mais afetados em relação às meninas. A dislexia apresenta-se de forma leve ou severa de acordo com a incidência dos sintomas.
No modo de ver de Condemarin (1989), o sintoma mais marcante de um disléxico é o acúmulo e a persistência de seus erros na leitura e na escrita, esta dificuldade para ler persiste até a idade adulta do sujeito. Há uma confusão entre letras, sílabas ou palavras com diferenças sutis de grafia ou com grafia similar, mas diferentes na orientação espacial. As letras que têm um ponto de articulação comum e com sons próximos, também confundem os disléxicos. Estes sintomas e outros, no tocante à leitura e a escrita, fazem com que a criança que tem dislexia, obrigue-se a realizar uma leitura muito analítica, isto é, há um esforço significativo para decifrar o material a ser lido e com isto diminui a compreensão leitora e sua velocidade.
A dislexia também afeta a criança emocionalmente, fazendo com que a mesma se sinta triste, deprimida e culpada, devido o temor de fracassar mediante as dificuldades, outras características apresentadas neste aspecto são: agressividade diante seus professores e colegas; antipatia e repulsa a leitura. Todos estes sintomas emocionais levam a uma baixa auto-estima por parte do disléxico, afastando-se da aprendizagem.
Em suma a dislexia é um transtorno contínuo na vida de uma criança, que serão necessários acompanhamentos específicos e freqüentes e que acontece em crianças que: não apresentam problemas visuais, auditivos ou motores significativos; com inteligência dentro dos padrões normais; sem problemas emocionais significativos; que sempre estiveram em ambientes escolares e familiares adequados e com boas oportunidades sociais.
Outros transtornos de leitura e escrita que podem ou não virem acompanhados pela dislexia é: a disortografia; a disgrafia e a discalculia. O primeiro está relacionado com: a confusão; a omissão; a inversão; a dificuldade em transcrever letras e palavras, também há um impedimento ao aplicar os aspectos gramaticais como: gênero e número das palavras. Mediante a estas dificuldades existirá como conseqüência uma compreensão difícil do que se escreve.
O segundo transtorno citado acima, tem haver com a deficiência na qualidade do aspecto gráfico da escrita, sem que sujeito tenha um diagnóstico para qualquer problema físico ou neurológico. Na visão de Ajuriaguerra (1984), as principais características de um portador de disgrafia são: dificuldade em organizar sua escrita no papel; traçado da letra irregular em sua dimensão, com hastes deformadas e anéis empelotados; letras demasiadamente grandes ou pequenas.
Por último temos a dificuldade na: conceitualização; reconhecimento de números e falhas nas operações aritméticas, a este conjunto de sintomas, dá-se o nome de discalculia.
Para melhor esclarecer as dúvidas a respeito das dificuldades de leitura e escrita é importantíssimo a priori que as pessoas envolvidas no trabalho de alfabetização tenham conhecimento sobre a aquisição da leitura e da escrita; que os mesmos considerem erros, como a construção de hipóteses por parte da criança a respeito dos símbolos escritos e que aprendizagem da mesma dependerá muito do seu conhecimento global e por isto, deve ser valorizada toda forma de expressão escrita elaborada pela mesma.
Os desafios devem ser lançados para quem está aprendendo, porém devem ser colocados com cautela, já que se deve considerar a evolução de cada aluno. Como diz Scoz (2007), os desafios colocados para a criança devem ser uma forma de contribuição, para que ela passe pelo processo de leitura e escrita sem nenhuma espécie de sofrimento, sendo encarado pela mesma como algo prazeroso e tranqüilo.
A FUNÇÃO DA PSICOPEDAGOGIA NO PROCESSO DE LEITURA E ESCRITA
Antes de decorremos sobre a função da Psicopedagogia na aquisição da leitura e da escrita é necessário analisarmos alguns aspectos que compõem esta área de estudo. Os tópicos apontados a seguir serão vistos de forma a entendermos a real importância deste estudo para a Educação. Serão comentados os itens: surgimento da Psicopedagogia; o conceito de Psicopedagogia; aprendizagem para a Psicopedagogia; sobre os problemas de aprendizagem e Psicopedagogia: diagnóstico dos transtornos da aprendizagem na leitura e na escrita.
O início da Psicopedagogia
Segundo Scoz (2007), a Psicopedagogia, só a partir da década de 80 é que se estruturou como corpo de conhecimentos, transformando-se em campo de estudos multidisciplinares, porém esta área de estudo percorreu caminhos importantes para que a mesma fosse conhecida nos dias atuais, ela trilhou estes caminhos sempre influenciados pelo pensamento educacional vigente.
Ainda citando Scoz (2007), os profissionais começam a buscar as causas do fracasso escolar, na década de 60, sondando os aspectos: físicos e psicológicos do sujeito em desenvolvimento.
Antes da contribuição da Psicopedagogia os professores viam as causas das dificuldades apenas de forma patológica, isto é, os indivíduos eram encarados como portadores de alguma doença que os impediam seu desenvolvimento escolar. Com isto muitas crianças eram encaminhadas para consultórios médicos e passavam a ter um tratamento medicamentoso.
Barbosa (2006) também aponta um dado histórico importante para o desenvolvimento da Psicopedagogia no Brasil que se assemelha com o comentado acima que é isenção da escola da responsabilidade perante as dificuldades, fato este que ocorreu na década de 70 para a de 80. A escola ficava sem saber o que fazer para solucionar os problemas de aprendizagem de seus alunos, encaminhando-os para especialistas, assim a mesma começou a perder seu espaço pedagógico.
Foi com o movimento de resgate da função da escola no Brasil que surgiu a Psicopedagogia, este movimento pedia o fortalecimento através do conhecimento e então se abriram novos cursos de espacialização, cujo objetivo principal era o estudo da aprendizagem.
As contribuições de pesquisa e as literaturas estrangeiras: Johnson & Myklebust (1987); Cypel (1986); Ajuriaguerra & Marcelli (1986) apud in Scoz (2007), foram indispensáveis para o avanço da Psicopedagogia no Brasil. Hoje em dia temos mais uma mão amiga ajudando no diagnóstico das causas das dificuldades de aprendizagem, chamando atenção para a necessidade de definir limites claros e objetivos entre os conceitos de normalidade e de patologia na aprendizagem escolar. A Psicopedagogia mostra-se neste contexto responsável e capaz de exercer papel importantíssimo no processo de aprendizagem dentro ou fora da escola.
O conceito de Psicopedagogia
Na visão de Scargo (1994), a função da Psicopedagogia é atuar junto aos alunos de forma diferenciada, isto é, através de atendimentos individuais ou grupais e investigar, diagnosticar e intervir nas dificuldades de aprendizagem, de forma a permitir a transformação em todo âmbito educacional.
Já Barbosa (2006), a Psicopedagogia é a área que está em parceria com a família e a escola para enfrentar desafios relacionados com o processo de aprendizagem, procurando compreender as dificuldades; o que se aprende; o processo ensino/ aprendizagem e agir sobre estes aspectos de forma a proporcionar o avanço da prática educativa.
Mônica apud in Sargo (1994) define a Psicopedagogia como práxis, ação sobre a aprendizagem, observando sua aquisição, desenvolvimento e distorções. Este trabalho é realizado através de processos e estratégias que levam em conta a individualidade do sujeito.
A Psicopedagogia trabalha junto à família e à escola, buscando solucionar os problemas decorrentes do processo de aprendizagem, considerando o aprender como conseqüência de uma boa integração dos fatores: cognitivos; afetivos; familiares; orgânicos e sociais. Aspectos estes que muitas vezes são esquecidos pela educação
A aprendizagem e a Psicopedagogia
Sendo a aprendizagem a primeira preocupação da Psicopedagogia, é necessário no momento termos alguns conceitos sobre a mesma para que assim possamos nos dedicar ao estudo das dificuldades de leitura e de escrita, certos atores argumentam:
? PIAGET (1976) encara a aprendizagem como um processo de constante equilíbrio entre os esquemas já existentes e os novos esquemas, na busca de formas para interpretar e compreender o real pelo indivíduo em desenvolvimento.
? PAIN (1985), a aprendizagem é um efeito das articulações elaboradas entre as estruturas teóricas já existentes do sujeito com outras novas dentro do processo que leva em conta os aspectos: biológico; cognitivo; social e emocional.
? BARBOSA (2006), a aprendizagem é o resultado da ação do aprendiz sobre o mundo e dos elementos deste mundo que agem sobre ele, isto é, há uma troca e interação com objetos de aprendizagem e sujeito de forma dialética.
A aprendizagem pode ser vista por muitos atores como algo que deve ser alcançado por todos os sujeitos em desenvolvimento normal, porém no caminho que o sujeito percorre para isto surgem também obstáculos a serem vencidos, estes obstáculos são chamados de problemas de aprendizagem que quando trabalhados dentro de uma forma correta pela educação, são superados por quem aprende sem sofrimento ou qualquer outra espécie de exclusão do processo ensino/ aprendizagem.
Sobre os problemas de aprendizagem
Na visão de Paín (1985), pode-se considerar o problema de aprendizagem como um sintoma do não-aprender, sendo um quadro não permanente, porém provoca um descompasso no processo ensino/aprendizagem.
Ainda citando Paín (1985), ele afirma que existem fatores fundamentais que precisam ser considerados no diagnóstico sobre algum problema de aprendizagem. Estes fatores são:
1. FATORES ORGÂNICOS:
"Nestes são considerados os esquemas de ação desdobrados mediante o corpo, que a origem da aprendizagem está nestes esquemas e que dependem do bom funcionamento dos órgãos e dos dispositivos que garantem a coordenação do sistema nervoso central." (Paín 1985, p. 29)
Os fatores orgânicos estão relacionados diretamente ao funcionamento dos órgãos que garantem o exercício da aprendizagem, é necessário garantir a saúde do indivíduo que aprende.
2. FATORES ESPECÍFICOS:
"Existem certos tipos de transtornos na área da adequação perceptivo--motora que, embora possa suspeitar-se de sua origem orgânica, não oferecem qualquer possibilidade de verificação neste aspecto. Tais transtornos aparecem especialmente no nível da aprendizagem da linguagem, sua articulação e sua lecto-escrita, e se manifestam numa série de perturbações, tais como a alteração da seqüência percebida, a impossibilidade de construir imagens claras de fonemas, sílabas e palavras, a inaptidão gráfica, etc. Encontramos dificuldades especiais de outra ordem, no nível da análise e síntese dos símbolos, na aptidão sintática, na atribuição significativa. Desta forma, certos processos da ordem das afasias podem apresentar-se sem que possam ser relacionadas com qualquer dano cerebral localizado que justifique esta perturbação." (Paín 1985, p. 30)
Os transtornos de aprendizagem que não podem ser comprovados que sua origem seja orgânica, estão ligados aos fatores específicos. A linguagem neste caso é a mais afetada, dentre as dificuldades específicas temos a dislexia.
3. FATORES PSICÓGENOS:
"O fator psicógeno do problema de aprendizagem se confunde então com sua significação, entretanto é importante destacar que não é possível assumí-lo sem levar em consideração as disposições orgânicas e ambientais do sujeito. Desta forma, o não-aprender se constitui como inibição ou como sintoma sempre que se dêem outras condições que facilitem este caminho." (Paín 1985, p. 32)
Quando há todas as condições para aprender e isto não acontece é porque a razão do não-aprender está relacionado a não satisfação com aprendizagem, devido as situações que levem a traumas, sendo estes caracterizados por atitudes de inibição e de medo de errar por parte de quem aprende.
4. FATORES AMBIENTAIS:
"O fator ambiental é especialmente determinante no diagnóstico do problema de aprendizagem, na medida em que nos permite compreender sua coincidência com a ideologia e os valores vigentes no grupo."(Paín 1985, p.33)
O ambiente pode ou não contribuir com os problemas de aprendizagem, levando em conta as possibilidades materiais que o meio oferece sujeito.
Assim o autor citado acima define o problema de aprendizagem numa perspectiva multifatorial e alerta para a importância de obter os dados necessários para compreender o significado, a causa e a modalidade dos transtornos mediante um diagnóstico psicopedagógico.
Scoz (2007), também considera os problemas de aprendizagem como um processo, caracterizando-se num estado particular de um sistema que para equilibrar-se procurou adotar um determinado tipo de comportamento, considerando o não-aprender como algo positivo.
Ainda Scoz (2007) afirma que o processo de aprendizagem e os problemas de aprendizagem devem ser vistos de maneira pluricausal de fatores e apresenta o ser humano numa concepção mais completa, evidenciando a necessidade de um conhecer multidisciplinar da Psicopedagogia.
Barbosa (2006) concorda que a dificuldade de aprender é estar diante de um obstáculo que tem características culturais, cognitivas, afetivas ou funcionais, porém a mesma afirma que estas dificuldades fazem parte do processo de aprendizagem de forma processual.
Como foram vistos, os autores concordam em parte que os transtornos de aprendizagem podem ser conseqüência de vários fatores, englobando desde o aspecto físico até o emocional, já que o indivíduo deve ser analisado como um todo e que os mesmos fazem parte da própria aprendizagem.
Psicopedagogia: diagnóstico dos transtornos da aprendizagem na leitura e na escrita
No tocante aos transtornos de aprendizagem na leitura e na escrita a Psicopedagogia não irá atuar de forma diferenciada em relação às outras dificuldades. O importante é estabelecer as diferenciações entre os erros de escrita e leitura decorrentes do processo de aprender e as dificuldades específicas como: a disgrafia; a discaligrafia; a disortografia; a dissintaxe; a discalculia e a dislexia.
O objetivo da Psicopedagogia é chegar a um diagnóstico adequado em relação aos problemas de linguagem. A intervenção psicopedagógica deve se caracterizar por uma ação sistemática, partindo de um plano geral que incidirá sobre: o aluno; a escola e a família.
O atendimento psicopedagógico deve atender: crianças; adolescentes e adultos, tentando detectar no processo de aprendizagem dos mesmos a presença de dificuldades de leitura e de escrita.
Já que a Psicopedagogia é uma área de estudo e de atuação mediante o processo de aprendizagem, deve-se apropriar de conhecimentos que estejam ligados a este processo e aos transtornos que podem aparecer neste processo.
Quem investiga as dificuldades de leitura e de escrita deve estudar vários tipos de textos e a função social da linguagem, considerando os aspectos sintáticos e semânticos, os mecanismos utilizados na leitura, a coesão e a coerência do texto.
Utilizar-se das pesquisas de Ferreiro (1982) e de provas através do método clínico, tornam-se indispensáveis para uma boa investigação do desenvolvimento da linguagem, porém estas provas não devem ser colocadas como instrumento que rotule ou discrimine o sujeito, elas devem estar o mais próximo da realidade do mesmo.
Dentre as provas, que são frutos das teorias construtivas, temos as que Ferreiro (1982) elaborou a partir da teoria piagetiana do conhecimento. Através do teste das quatro palavras e da frase escritas pela a criança são analisados os níveis de evolução da escrita, níveis que já foram citados neste trabalho.
Segundo Paín (1985) para o diagnóstico do problema de aprendizagem é necessária também a aplicação de provas, porém posterior a uma entrevista com os pais do cliente, buscando dados da vida do mesmo que possam está contribuindo para as dificuldades, isso mediante o método clínico. Paín (1985) cita: provas psicométricas; provas projetivas e provas específicas.
Dentre as provas específicas é relevante ressaltar a de lecto-escrita, que pode a vir identificar o tipo de dificuldade determinante para o fracasso na aquisição da leitura e da escrita. É o exame do caderno que permitirá saber se o problema é de nível ortográfico, se há ausência de letras, junção de palavras, inversões, substituições de fonemas e outros problemas.
Exemplos de exercícios que ajudam a discriminar a índole da perturbação na leitura e na escrita apontados por Paín (1985, p. 66) são:
"(A) Reconhecimento de letras e fonemas: usam-se duas lâminas, uma escrita com letras de imprensa e outra com cursiva". Em ambas diz: ao passar pela casa eu disse pra ele até amanhã. O sujeito deve indicar onde diz ma, pa, sa, as, la, ao."
Neste caso é testada a possibilidade do aluno em distinguir a escrita dos sons produzidos por cada letra e também as diferentes formas da escrita das letras.
"(B) Geração de palavras (função analítico-sistemática). Com cartões para montar constrói-se mamãe e papai, e solicita-se ao sujeito compor mapa. Constrói-se casa e mamãe; solicita-se maca, cama, e saca, etc.".
A partir da identificação dos fonemas e da construção das sílabas, quem aprende pode sistematizar seus conhecimentos e compor novas palavras que fazem parte da mesma família silábica.
"(C) Compara-se o rendimento, na cópia, no ditado, na escrita espontânea e na leitura. Começa-se com a escrita espontânea e repete-se esta frase em outras circunstâncias."
A cópia, o ditado, a escrita espontânea e a leitura são exercícios que podem levar a identificação de algum problema na alfabetização, porém estes exercícios não devem ser colocados de forma isolada, desvalorizando conhecimentos prévios do aluno. É importante se valorizar as produções espontâneas.
É importante dizer que estes testes devem ser adaptados as dificuldades do sujeito em análise, geralmente são pedidas à opinião de especialistas para melhor detectar o problema de aprendizagem.
O que foi citado acima pode ser utilizado como recursos investigatórios, podendo ser usados de forma completa ou parcial. Isso porque o processo investigatório depende muito da queixa inicial, da idade e da escolaridade do sujeito investigado. O que também é considerado neste caso são as hipóteses formuladas pelo psicopedagogo mediante a entrevista feita com os pais e à Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem (EOCA).
CONCLUSÃO
Para uma melhor clareza sobre a verdadeira função da Psicopedagogia em relação ao processo de leitura e de escrita é importante uma discussão de todas as informações obtidas em conjunto com uma possível intervenção na prática.
A análise de um caso é algo que dará mais fundamentação ao tema pesquisado, não podendo esquecer que todas as informações adquiridas têm como fonte outras pesquisas executadas mediante os estudos de casos e de aplicação de testes, assegurando assim a sua veracidade.
Colocar em prática dos os dados desta pesquisa por quem é de interesse no assunto, é sem dúvida a complementação de um trabalho que deve unir teoria e prática na tentativa de solucionar os problemas de aprendizagem na alfabetização.
Tendo em mãos a teoria que leva ao conhecimento sobre como de dar: a alfabetização; o processo de aprendizagem e suas dificuldades; a contribuição da Psicopedagogia para a superação dos problemas de aprendizagem, à luz de autores importantes, sem dúvida dar ao profissional na área da Educação ou de áreas afins, mais segurança na sua prática educativa.
Estas informações são ainda mais necessárias para o Psicopedagogo, que vêm como novo agente envolvido no processo de aprendizagem, que para contribuir com a solução de problemas deve ter uma bagagem de informações bem consideráveis.
O psicopedagogo deve estar ciente que para diagnosticar um problema de aprendizagem na leitura e na escrita, não é fácil de ser feito. Para minimizar as dificuldades na alfabetização é necessário tirar da análise feita da aprendizagem do sujeito suas capacidades que serão utilizadas para ter um relacionamento com a mesma e a partir daí o psicopedagogo possa intervir, auxiliando para a superação dos problemas encontrados neste processo.
Espera-se da Psicopedagogia a contribuição parta melhor compreendermos o surgimento da linguagem nos indivíduos, intervindo de forma produtiva, preventiva e corretiva no processo de alfabetização.
Espera-se da Psicopedagogia a contribuição parta melhor compreendermos o surgimento da linguagem nos indivíduos, intervindo de forma produtiva, preventiva e corretiva no processo de alfabetização.
BIBLIOGRAFIA
AJURIAGUERRA, J. A Dislexia em Questão. Porto Alegre, Artes Médicas, 1984.
BARBOSA, L. M. Serrat. Psicopedagogia: um diálogo entre a psicopedagogia e a educação. Curitiba. Bolsa Nacional do Livro, 2006.
CONDEMARIN, Mabel & MARLYS, B. Dislexia ? Manual de Leitura Conectiva. Porto Alegre. Artes Médicas, 1989.
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 1985.
MORAIS, António Manuel Pamplona, 1959 ? Distúrbios de aprendizagem: uma abordagem psicopedagógica / António Manuel Pamplona Morais. ? São Paulo: EDICON, 1997.
NUNES, Terezinha. Dificuldades na Aprendizagem da Leitura: Teoria e Prática. São Paulo: Cortez, 1992.
PAÍN, Sara. Diagnóstico e tratamento dos problemas da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1985.
PIAGET, Jean. A Linguagem e o Pensamento da Criança. 6ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1993.
____________ A equilibração das estruturas cognitivas, problema central do desenvolvimento. Trad. Fernando Silva. Rio de Janeiro: Zahar, 1976.
SCARGO, Claudette et alli. ; A Práxis Psicopedagógica Brasileira, editor Herval Gonçalves Flores. São Paulo: ABPP. , 1994. Vários Autores.
SCOZ, Beatriz. Psicopedagogia e a realidade escolar: o problema escolar e a aprendizagem. Petrópolis, RJ: Vozes, 14ª ed., 2007.
SOLÉ, Isabel. Estratégias de Leitura. Editora: Artes Médicas, 1987.
TEBEROSKY, Ana & FERREIRO, Emília. Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986.
Autor: Rosiane Assunção
Artigos Relacionados
A Escrita E O Fracasso Escolar
Escrita E Leitura:como Tornar O Ensino Significativo
Avaliação Da Aprendizagem Escolar Abordando Leitura E Escrita
O Papel Da Gestão Escolar Nas Dificuldades De Aprendizagem: Leitura E Escrita
HipÓteses De AlfabetizaÇÃo Segundo Emilia Ferreiro E Ana Teberosky.
Psicopedagogia...
Como A AlfabetizaÇÃo Carencial Afeta A Leitura