Ensinar e aprender na educação do campo: processos históricos e pedagógicos em relação



Antonio, C. A.; Lucini, M. Ensinar e aprender na educação do campo: processos históricos e pedagógicos em relação. Educação do campo, cadernos do Cedes/Centro de Estudos Educação Sociedade ? Vol.27, n.72 (2007) ? São Paulo; Cortez; Campinas, CEDES, 2007.
*A educação do campo: a constituição de um campo de discussão
As práticas educativas se diferem de acordo com os grupos sociais. A educação rural é relacionada com à estrutura social, cultural e econômica gestada no e para o país, tendo uma concepção de pensamento em que as pessoas do campo não necessitam de conhecimentos socializados pela escola. As escolas no meio rural, geralmente multisseriadas e isoladas, eram poucas e questionadas quanto sua eficácia no ensino o que passou a preocupar alguns setores ligados a educação que solicitavam uma educação prática e utilitária, adaptada a vida rural.
A partir de 1930 é que os programas de escolarização do meio rural ganham andamento. O forte movimento rural migratório ocorrido no Brasil no período de 19910/1920 influenciou para um olhar mais atento para a educação rural.
Antes da Proclamação da República, foram fundadas bibliotecas populares e escolas operárias para crianças e adultos, mantidas pelas entidades operárias e também por recursos buscados no poder público.
Durante o Estado Novo houve o fechamento das escolas anarquistas. A partir da década de 1950-1960, se consolidam movimentos ligados as mais variadas instâncias sociais, como os Movimentos de Cultura Popular (MCP), do qual participou Paulo Freire, o Movimento de Educação de Base (MEB), criado pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e os Centros Populares da Cultura (CPC), criados pela União Nacional dos Estudantes (UNE). É NOS ANOS DE 1960 QUE Paulo Freire nota uma proposta de educação libertadora.
*A educação popular, a educação libertadora e a educação do campo
A educação popular, com base teórico-prática sobre a situação educacional do país, se insere nos movimentos sociais. É possível esperar transformação, uma educação inovadora, seja possível transformar a realidade, a dominação e a ação do dominador.
É nos anos de 1960, com Paulo Freire que se tem pela primeira vez no Brasil uma pedagogia das classes populares. Essa proposta de Paulo Freire sobreviverá à intensa repressão sofrida pelo povo brasileiro no período da ditadura militar. Anteriormente a educação popular estava vinculada ao movimento sindical, agora passa a ser assumida no espaço das comunidades Eclesiais de Base (CEB).
Na década de 1970, observou em toda América Latina o nascimento ou ressurgimento de movimentos sociais compostos por sujeitos sociais fortalecidos em sua consciência política, que desencadearão ações como os acampamentos zapatistas no México e as ocupações dos sem-terra no Brasil.
No Brasil, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) tornar-se-á, a partir da década de 1980, o mais combativo e forte movimento social do campo. A educação desenvolvida nos meios rurais torna-se preocupação dos sujeitos que a compõem, os educadores e camponeses, diferente de outros momentos em que a educação rural era objeto de discussão dos sujeitos sociais que nela atuam e de educação rural passa a ser (re) nominada como educação do campo.
Esta nova denominação compreende o campo não mais como lugar de atraso, mas de produção da vida em seus mais variados aspectos: culturais, sociais, econômicos e políticos, compreendendo diferentes povos do campo, como os indígenas e quilombas. Os povos do campo encontram na Pedagogia Libertadora um aliado para a discussão dos processos de exclusão e empobrecimento crescente dos trabalhadores.
A escola também deve ser transformada, pois contribui para a transformação social. Preparar para a vida caberia ao sujeito estabelecer a relação de sua formação com a realidade social e econômica. A educação popular é uma prática política constituindo-se num questionamento, para que a realidade se transforme a partir de propostas populares em educação; é uma prática coletiva das classes populares, onde se busca a transformação de um quadro histórico que é a educação do povo, em que trabalhadores urbanos e do campo enfrentam, por estar em diferente contexto da formação social.
*A prática pedagógica libertadora
A prática da educação escolar pode ser avaliada pelos condicionantes históricos. O trabalho pedagógico é organizado por Temas Geradores, como orientação as práticas das escolas se desenvolve aos devidos movimentos sociais, situados como político-pedagógico de alguns sistemas municipais e estaduais; a educação do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra, e iniciativas de programas de formação de professores do campo buscando superar os limites do currículo escolar.
Nesta prática o tema é decidido pela comunidade e não pelo educador com problemáticas vividas pela comunidade, os temas são aprovados em assembléias; as aulas ficam a cargo do educador.
Ao decidir pela distribuição de conhecimentos construção de uma "escola diferente", as comunidades definem sua própria trajetória teórica-metadológica transformadoras, sendo uma necessidade de selecionar o que e como ensinar, pela comunidade e pela escola contribuindo na transformação de uma realidade social. A razão social e pedagógica de construir a prática educativa libertadora entra em contradição com a organização do currículo escolar já estabelecido numa dinâmica que administra e domina os conhecimentos como elementos pré-estrturados.
*Consideração finais
As concepções tradicionais dos conhecimentos escolares revelam alguns problemáticos presentes na sua aplicabilidade. Os temas Geradores ainda precisam romper alguns vínculos deve ser entendido nas relações particulares de como os seres humanos estão no mundo, em seus níveis de compreensão, suas visões, seus valores, para que no ensino ocorra a análise e reflexão da prática social ser mais bem compreendida e transformada.
Pode-se destacar um problema para debate que são os temas selecionados para serem trabalhados, a origem dos conhecimentos nas áreas ou disciplinas escolares está deixando de ser questionadas em suas mais particulares representações sobre o conhecido. Outra questão é a relação educador-educando-escola-comunidade, quando a organização do currículo por Temas Geradores não há participação da comunidade, os elementos externos pressionam a escola e o educador questionando a eficácia das práticas pedagógicas desenvolvidas.
Não são poucas as questões de natureza de concepção educativa que os educadores e as escolas enfrentam, principalmente quando os Temas Geradores são trabalhados nos anos finais do ensino fundamental. Como educadores precisamos continuar a reinventar nossas práticas pedagógicas, para que se tornem temáticas em processo de conhecimento.
As práticas pedagógicas podem ser transformadas pelas mãos dos trabalhadores ou então, permitir que elas continuem sendo determinadas por agentes externos, desvinculados das problemáticas vividas pelos povos do campo.
A história da educação popular foi uma das geradoras da educação do campo, possibilitando-nos compreender que os anseios populares de transformar a sociedade em que vivemos encontraram nos Temas Geradores uma das formas de problematizar essa realidade e que os processos históricos estão sempre se fazendo. Uma reflexão que nos permite sempre reelaborar nossas práticas pedagógicas no sentido de uma educação libertária analisando a forma que produzimos e o seu significado.


Autor: Gilnara Guedes Dos Santos


Artigos Relacionados


Rumos Para Uma EducaÇÃo No Campo

Educação Popular

Como Pensar A Educação Do Campo

Políticas De Formação De Educadores(as) Do Campo

Anotações Sobre Ensino E Os “tipos” De Educação Em Paulo Freire

O Ensino De Português Na Zona Rural: Dificuldades E Perspectivas

Educação Popular