LÍNGUAS ESTRANGEIRAS MODERNAS: LEGISLAÇÃO E ENSINO NA EDUCAÇÃO BÁSICA



Bartolomeu Melo Brito (UFAL)
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Resumo
Neste texto apresentamos uma reflexão sobre a inclusão da disciplina de Línguas Estrangeiras Modernas (LEM) como disciplina obrigatória, no contexto das recentes reformas da educação brasileira, especificamente no nível médio de ensino. Num cenário em que o neoliberalismo da Terceira Via tem no aparelho escolar um dos seus aliados, por ter um papel pedagógico indispensável na conformação do novo homem coletivo. Nossa reflexão limita-se nesse âmbito, consubstanciada nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), como sustentação teórica e material de consulta na atual LDB, e na Lei 11.161 de 11 de agosto de 2005 que torna obrigatório a oferta da disciplina de Língua Espanhola no Ensino Médio nas escolas de todo o país a partir do ano de 2010, apontando possibilidades e inadequações na consecução desse objetivo.
Palavras-chave: Línguas Estrangeiras Modernas, Ensino Médio, PCNEM

Resumen
En este texto presentamos una reflexión sobre la inclusión de la disciplina de Lengua Extranjera Modernas (LEM) como disciplina obligatoria, en el contexto de las recientes reformas en la educación brasileña, específicamente en el nivel mediano de enseñanza. En un escenario en que el neoliberalismo de la Tercera Vía tiene en el aparato escolar uno de sus aliados, por tener un papel pedagógico indispensable en la conformación del nuevo hombre colectivo. Nuestra reflexión tiene límite en ese ámbito consubstanciada en los Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), como sustentación teórica y material de consulta en la actual LDB, y en la Ley 11.161 de 11 de agosto de 2005, que hace obligatoria la oferta de la disciplina de Lengua Española en la Enseñanza Mediana en las escuelas de todo país, a partir del año de 2010, apuntando posibilidades e inadecuaciones en la consecución de ese objetivo.
Palabras-clave: Lenguas Extrajeras Modernas, Nivel Mediano de Enseñanza, PCNEM
A construção deste texto tem como objetivo empreender uma reflexão sobre a inclusão da disciplina de Língua Estrangeira Moderna (LEM), como conhecimento indispensável à formação do educando no Nível Médio da educação escolar no Brasil. O Ensino Médio na educação brasileira, com a promulgação da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, é elevado à categoria de segunda etapa da educação básica, com duração mínima de três anos, sendo equivalente aos 10º, 11º e 12º anos da educação escolar.
Essas inovações ocorrem num cenário em que o neoliberalismo da Terceira Via tem no aparelho escolar um dos seus aliados, por ter um papel pedagógico indispensável na conformação do novo homem coletivo. As recentes reformas da educação no Brasil, ocorridas durante os dois mandatos do então presidente da República Fernando Henrique Cardoso, seguem as determinações internacionais dos países do chamado capitalismo central, concebendo um novo modelo de homem. Assim,

as reformas educacionais brasileiras já implementadas ou em processo de implantação visam, do ponto de vista técnico, à formação de um homem empreendedor e, do ponto de vista ético-político, à formação de um homem colaborador, características essenciais do intelectual urbano na atualidade, nos marcos da hegemonia burguesa. Esse intelectual urbano de novo tipo a ser formado pelo sistema educacional sob a hegemonia burguesa na atualidade deverá apresentar uma capacitação técnica, que implique uma maior submissão da escola aos interesses e necessidades empresariais e uma nova capacidade dirigente, com vistas a "humanizar" as relações de exploração e de dominação vigentes. (NEVES, 2005, p.105)

Tendo como referencial essa dupla perspectiva, nossa reflexão limita-se nesse âmbito consubstanciada nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (doravante PCNEM) e como sustentação teórica e material de consulta na atual Lei de Nº 9.394 de, 20 de dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que comporta em seu Artigo 36 inciso III a inclusão de uma língua estrangeira moderna, como disciplina obrigatória no currículo do Ensino Médio, segunda etapa da educação básica e na Lei 11.161 de 11 de agosto de 2005, que torna obrigatório a oferta do idioma espanhol no Ensino Médio nas escolas de todo o país a partir do ano de 2010.
De acordo com a LDB, com a inserção do Ensino Médio à educação de nível básico de escolaridade, objetivou-se uma satisfatória preparação dos educandos para sua vida em sociedade na produção de sua existência, em sintonia com o que preconiza as recentes reformas educacionais. Desse modo, para assegurar o cumprimento da referida Lei, ademais de pareceres, decretos, medidas provisórias, portarias e resoluções foram elaborados, por técnicos do Ministério da Educação (MEC), os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e Médio (PCN), como um dos seus aparatos regulatórios.
Estes documentos oficiais foram concebidos tendo como objetivo orientar os professores no tocante às práticas e conteúdos que deveriam ser trabalhados em sala de aula nas instituições de educação de nível básico no Brasil, sem que houvesse a participação desses docentes, principais representantes da educação escolar.
A instituição escolar é concebida por Gramsci (1976), como um dos ambientes em que se realiza a luta pela hegemonia e pelo consenso e a batalha de ideias, sendo a educação, compreendida como ponto estratégico de fundamental importância na formação do "novo homem" também na perspectiva da superação das relações em um sistema capitalista.
Para a construção do socialismo, esse novo homem, deve ter a educação que o capacite a pensar, agir e sentir por intermédio de uma escolarização que o conduza "como pessoa capaz de pensar, de estudar, de dirigir ou de controlar quem dirige" (GRAMSCI, 2000, p. 49). Assim, para que resulte em uma verdadeira transformação social, um dos conceitos fundamentais é o de hegemonia que, segundo o referido teórico, se dá por consenso e/ou coerção.
Nas sociedades divididas em classes, temos uma constante luta pela hegemonia política e a ideologia assume o caráter de convencimento, o primeiro recurso utilizado para a dominação. Do ponto de vista dos oprimidos, o embate ideológico contra a hegemonia burguesa se dá em todos os espaços em que esta se reproduz, como por exemplo, a escola. Temos então, uma luta de posição na escola, colocando a política, luta pelo poder, como o centro da ação pedagógica. A educação, portanto, é um espaço social de disputa da hegemonia; é uma prática social construída a partir das relações sociais que vão sendo estabelecidas; é uma "contra-ideologia".
Nesta perspectiva, é importante situar a posição do educador na sociedade, contribuindo para manter a opressão ou se colocando em contraposição a ela. Se o educador é um trabalhador em educação, parece coerente que este seja aliado das lutas dos trabalhadores enquanto classe, visto que as suas conquistas sociais, aparentemente mais imediatas, também dependem de vitórias maiores no campo social. Portanto, é coerente que a posição do educador seja em favor dos oprimidos, não por uma questão de piedade ou caridade, mas de identidade de classe, já que a luta maior é a mesma. Desse modo, cabe-nos descobrir qual é a função do educador como intelectual comprometido com a transformação do seu meio social.
Entender bem a realidade parece ser o primeiro passo no desafio da construção de uma nova perspectiva social. Assim, nossa reflexão gira em torno da compreensão dessa realidade que se apresenta para sociedade brasileira no tocante ao ensino de línguas estrangeiras modernas na atualidade.
No âmbito dos conhecimentos de Línguas Estrangeiras Modernas, os PCNEM preceituam que o aluno ao concluir o ciclo da educação básica tenha desenvolvido um conhecimento comunicativo , que lhe garanta contato e acesso a distintas culturas e sociedades:
É preciso pensar-se o ensino e a aprendizagem das línguas Estrangeiras Modernas no Ensino Médio em termos de competências abrangentes e não estáticas, uma vez que uma língua é o veículo de comunicação de um povo por excelência e é através de sua forma de expressar-se que esse povo transmite sua cultura, suas tradições, seus conhecimentos. [...] Entender-se a comunicação como ferramenta imprescindível no mundo moderno, com vistas à formação profissional, acadêmica ou pessoal, deve ser a grande meta do ensino de Línguas Estrangeiras Modernas no Ensino Médio. (BRASIL, 1998, p.152)

De acordo com a citação acima, podemos afirmar que, para um indivíduo possuir competência comunicativa em uma dada língua estrangeira, tal como preceituado dos PCNEM, torna-se necessário que ele desenvolva um bom domínio de cada uma dos seus componentes (gramatical, cultural, estratégico e discursivo). Permitindo ao mesmo aproximar-se de várias culturas e propiciando sua integração num mundo globalizado.
O fenômeno da globalização (e as decorrentes políticas econômicas) se difundiu atrelado ao discurso neoliberal ? veiculado por instituições internacionais como o FMI e o Banco Mundial ? que é disseminador de um discurso do pragmatismo e exige de todos os membros participantes da sociedade em geral e do sistema educacional em particular, seu ajuste às demandas do mercado em constante mutação. Desse modo, como nos adverte Cavalcante (2002, p.72), nessa perspectiva,
Seus tentáculos se estendem por todo o globo rearticulando, mesclando, confundindo povos, culturas, significados; controlando políticas econômicas, meios de comunicação, sistemas de ensino; paralisando e desqualificando toda e qualquer iniciativa que se oponha à sua lógica.
Dessa forma, seguindo o mesmo raciocínio, aos indivíduos são impostas ações de adequação que coadunem com o ideário que defende a liberdade de mercado e restringe a intervenção estatal sobre economia, tornando a educação mais uma mercadoria e um setor de poderosa demanda de aferição de lucros
Na concepção de Mercado (2003, p.72), "é função da escola, hoje, preparar os alunos para pensar; resolver problemas e responder a mudanças contínuas". Assim sendo, a necessidade de estudo de Línguas Estrangeiras Modernas no Ensino Médio para uma comunicação efetiva entre os participantes do discurso, como sendo parte integrante da formação geral dos alunos, se apresenta com uma dimensão ainda maior, uma vez que o desenvolvimento do conhecimento científico-tecnológico de um povo, de uma nação, pode ser medido pela quantidade e qualidade das informações que circulam nessa sociedade que faz parte de uma comunidade ainda maior e internacionalizada.
O ensino e aprendizagem de Línguas Estrangeiras Modernas, tal como preceituado nos PCNEM, longe de ter um direcionamento reducionista, aponta para uma abordagem intercultural, na qual o aprendiz não estaria tão somente apto a comunicar-se na língua-alvo, como também, a interagir com distintas culturas, dado o seu grau de percepção e respeito à alteridade, desenvolvidos ao longo do período do Ensino Médio.
Na Abordagem Comunicativa de ensino de línguas estrangeiras a que nos filiamos e que os PCNEM comunicam, o ensino de LEM para fins comunicativos, em contraposição ao ensino tradicional, a língua é concebida como um exercício destinado à realização das interações sociais. Para que se possa interagir com eficiência necessita-se desenvolver uma competência comunicativa que envolve o conhecimento do uso social da língua, conhecimento gramatical e lexical. Entendemos para o propósito dessa reflexão, o termo ensino tradicional de línguas estrangeiras, aquele que tem como método o ensino/aprendizagem de aspectos que se limitam ao ensino da gramática e tradução da língua em estudo, no qual o aprendiz adquire apenas uma competência metalinguística.
Conforme Falleiros (2005), a concepção dos textos dos PCN contou com a assessoria técnica de César Coll, principal ideólogo da reforma educacional espanhola. Ocorreu que à época de sua efetiva elaboração e posterior difusão, distribuição, às escolas de todo país, não houve uma consistente discussão sobre as implicações e inadequações da importação do modelo de reforma curricular implantada na Espanha, portanto, de natureza eurocêntrica, para o contexto educacional brasileiro, inclusive no tocante à realidade dos sistemas de ensino e das condições materiais das instituições escolares de educação básica do país.
É fato comprovado que, na atualidade, o ensino e a aprendizagem das LEM no Ensino Médio, notadamente na escola pública, estão centrados no Método da Gramática e Tradução e têm por objetivo principal a preparação do aluno para o ingresso nos cursos de nível superior através do exame do vestibular com provas de múltipla escolha e questões que abordam temas gramaticais e/ou metalinguísticos.
Na escola da rede privada de ensino, o aluno do nível médio vive uma experiência diferenciada, ademais da possibilidade de estudar línguas estrangeiras com material didático, recursos e equipamentos modernos, laboratório de línguas e em muitos casos pode vivenciar a experiência da imersão, ainda conta em algumas escolas com a oferta de educação bilíngue. É a materialização da escola dualista, precária para a classe subalterna e eficiente para as elites.
No intuito de amenizar essas discrepâncias e de algum modo atender as exigências postas pela sociedade brasileira contemporânea, a atual LDB torna obrigatório o ensino da disciplina de LEM, o que motivaram a obrigatoriedade de oferta, a ênfase dada ao ensino e aprendizagem da disciplina nos PCNEM, sendo finalmente incluída na grande area das Linguagens, Códigos e sua Tecnologias. Neste documento oficial encontramos, ainda que:
No âmbito da LDB e do Parecer do CNE as línguas estrangeiras modernas recuperam, de alguma forma a importância que por muito tempo lhe foi negada, consideradas muitas vezes e de forma injustificada, como pouco relevante, elas adquire, agora, a configuração de disciplina importante como qualquer outra, do ponto de vista da formação do aluno. (BRASIL, 1998, p.11)
De fato, no texto da segunda Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de Nº 5.692, de 11 de agosto de 1971 ? oficialmente denominada de Lei da Reforma do Ensino de 1º e 2º graus ? impermeável ao debate e à participação da sociedade civil, em função do contexto em que foi gestada: período do governo militar, discricionário com as liberdades civis cerceadas, e em nome de um falso nacionalismo, a única referência que faz ao ensino de LEM é encontrada no seu Artigo 8º, parágrafo 2º, onde encontramos:
Em qualquer grau poderão organizar-se classes que reúnam alunos de diferentes séries e de equivalentes níveis de adiantamento, para o ensino de línguas estrangeiras e outras disciplinas, áreas de estudo e atividades em que tal solução se aconselhe. (BRASIL, 1971, p.31)
A legislação anterior não levava em consideração que, utilizando essa prerrogativa poderia haver perda de conteúdo programático da disciplina e negligenciada a necessária utilização de teste de nível de conhecimento em língua estrangeira.
Em contraposição a essa pouca importância ao ensino e aprendizagem de LEM, a atual LDB de Nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 em seu Artigo 36, inciso III, que transcrevemos na íntegra revela-nos,
Art. 36 O currículo do Ensino Médio observará o disposto na Seção I deste Capítulo e as demais diretrizes:

[...]

III. será incluída uma Língua Estrangeira Moderna, como disciplina obrigatória, escolhida pela comunidade escolar, e uma segunda, em caráter optativo, dentro das disponibilidades da instituição.
Desse modo, o texto do Inciso III estabelece a inclusão, no currículo do Ensino Médio, de duas línguas estrangeiras: uma em caráter obrigatório e outra facultativa. Trata-se de uma exigência de valor indiscutível, pois, com o advento da globalização da economia e a planetarização das relações internacionais a tendência é que cada um se torne, a sua maneira e de modo adicional, ascendente, cidadão do mundo.
O Brasil, como membro integrante da América do Sul e como um dos países mais importante do bloco, sob o aspecto político, econômico e comercial, participa também do desenvolvimento de políticas linguísticas para atender aos interesses educacionais e comerciais mútuos com seus parceiros do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). O referido bloco econômico teve sua criação na década de 1990, através do Tratado de Assunção no Paraguai, assinado pelos países signatários em 26 de março de 1991.
Conforme Savedra (2008), os Estados-membros que assinaram o protocolo de adesão ao MERCOSUL foram Argentina, Brasil, Paraguai e o Uruguai. Após 15 anos de sua existência o bloco é ampliado com a adesão da Venezuela em 2006 e como países associados participam o Chile, Equador, Colômbia, Peru e Bolívia. De acordo com a referida autora, nas Constituições Federais dos referidos países são reconhecidas como línguas oficiais o português no Brasil, o espanhol para a Argentina e Uruguai, o espanhol e o guarani para o Paraguai.
No mesmo ano de criação do MERCOSUL, é elaborado um protocolo de intenções, onde encontramos no seu artigo 4 o interesse dos países membros em difundir a aprendizagem dos idiomas oficiais ? Português, Espanhol e o Guarani ? por meio dos seus sistemas educacionais, desse modo declaram o interesse em implementar o ensino das línguas oficiais em todos os níveis e modalidades na educação básica.
Essa demanda motivou o governo brasileiro a promulgar no dia 5 de agosto de 2005 a Lei Nº 11.161 que, como encontrado no texto do artigo 1º, torna a Língua Espanhola uma disciplina de oferta obrigatória pela escola de Nível Médio e de matrícula facultativa para o aluno. É facultativa também a inclusão da matéria nos currículos dos quatro últimos anos do ensino fundamental, a partir da 5ª série (6º ano). Sua implantação será gradativa, nos currículos plenos do Ensino Médio.
Ademais, preconiza o texto da referida Lei que esse processo de implantação deverá ser concluído no prazo de cinco anos, a partir de sua implantação, o que ocorrerá no segundo semestre do ano de 2010, para tanto a União, no âmbito da política nacional de educação, estimulará e apoiará os sistemas estaduais e do Distrito Federal na execução da referida legislação.
Ocorre que, em pleno curso do segundo semestre do ano de 2010 esse processo de implantação encontra-se apenas iniciado no país. A título de exemplificação, na região nordeste brasileira, mais especificamente no Estado de Alagoas, no universo de 362 escolas publicas de ensino básico e em funcionamento na rede estadual de ensino, apenas 26 unidades escolares têm nos currículos a oferta da língua espanhola como LEM dentre as disciplinas obrigatórias, o que representa menos de 10% do total dos estabelecimentos oficiais de ensino
Nas outras unidades da federação que compõem a região nordeste, esse índice se mostra muito próximo ao que ocorre no Estado de Alagoas, com escolas destituídas de condições mínimas para abrigar a oferta da disciplina de língua espanhola, compondo um cenário em que urge medidas efetivas na implementação de ações que possibilitem o efetivo cumprimento das legislações vigentes.
Considerações Finais
Os aspectos abordados no presente artigo, envolvendo as Línguas Estrangeiras Modernas: Legislação e Ensino na Educação Básica permitem-nos tecer algumas considerações. De modo introdutório, no presente texto nos propomos a uma reflexão no tocante ao ensino de línguas estrangeiras modernas e ao conjunto da legislação que norteia as práticas educacionais nas instituições de ensino de nível médio em âmbito nacional.
As recentes reformas do ensino iniciadas na década de 1990, refletem de modo inequívoco aspectos das políticas neoliberais a que estão submetida a educação nacional, notadamente no nível básico de ensino. As referidas políticas, que tem nos Estados Unidos da América do Norte, seu maior representante, são impostas pelos países do chamado capitalismo central e incorporadas por países do chamado capitalismo periférico como o Brasil.
A ideologia neoliberal retoma o já antigo discurso econômico burguês, em atuação na gênese do capitalismo, e o resignifica em condições históricas atuais e diferenciadas. Desse modo, é essencialmente, um liberalismo econômico, que evidencia o mercado, a concorrência e a liberdade de iniciativa empresarial, deixando de lado de maneira agressiva a intervenção do Estado na economia e a quem se oponha a sua lógica.
Nesse contexto, a instrução escolar converte-se em mercadoria e um setor significativo de fonte de lucros, deixando à margem uma imensa parcela da população que não pode ter acesso à educação de qualidade por não dispor de condições financeiras para adquiri-la, sendo a educação ofertada pelo poder público a única opção a que pode ter acesso, ainda que sob vários aspectos se mostre deficitária.
As recentes reformas da educação no Brasil tinham dentre outras intenções conformar a educação nacional aos interesses dos seus financiadores, quais sejam, o FMI e o Banco Mundial, que ditam regras para o desenvolvimento desse setor e exige maiores investimentos e adequação da educação nacional às demandas da globalização em âmbito mundial.
Das referidas reformas resultou, dentre outras ações, no surgimento na legislação brasileira da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB de 1996 que contempla dentre outras inovações, a oferta da disciplina de LEM como disciplina obrigatória no currículo do Ensino Médio.
Cumpre ressaltar que, esta inovação constitui-se num paradoxo sem precedentes na história da educação nacional, qual seja a obrigatoriedade de uma disciplina no currículo de um nível de ensino que, na educação brasileira não se configura como sendo de oferta obrigatória por parte do poder público.
Desse modo, no final da primeira década dos anos 2000, a própria LDB foi alterada em seu Art. 4º, que trata do dever do Estado com a educação escolar pública de nível médio, o referido artigo apontava no seu inciso II para uma "progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio"; a partir da redação dada pela Lei nº 12.061, de 27 de outubro de 2009, trata agora da "universalização do ensino médio gratuito", sob a ótica da interpretação literal, a que deve ser submetida toda Lei, significa estar apenas assegurado a todos os estudantes brasileiros o direito de acesso à última etapa da educação básica, ou seja, o poder público continua sem a incumbência de oferecê-la em caráter obrigatório
Para assegurar o cumprimento da atual LDB, ademais de pareceres, decretos, medidas provisórias, portarias e resoluções foram elaborados, nas dependências do Ministério da Educação e do Desporto (MEC), os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e Médio, (doravante PCN), sem a participação dos docentes da área, conhecedores das necessidades próprias de uma sala de aula de LEM, no Ensino Médio.
O primeiro mandato do referido presidente (FHC) apresenta-se como o contexto que gerou a formulação do referido documento para o Ensino Fundamental: os Parâmetros Curriculares para o Ensino Fundamental - PCNEF, e no segundo mandato, foi formulado outro documento tendo como meta a reforma do Ensino Médio, os PCNEM. Estes documentos oficiais foram concebidos tendo como objetivo orientar os professores, no tocante às práticas e conteúdos em sala de aula nas escolas de todo o país.
Posteriormente, com a promulgação da Lei 11.161, em 05 de agosto de 2005, que torna obrigatório no Ensino Médio a oferta da disciplina de língua espanhola como LEM, objetiva-se no país, pela via da educação formal, através de políticas de planejamento linguístico voltadas aos países do continente, à busca da integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, oportunizando a formação de uma comunidade latino-americana de nações, e no âmbito regional ao atendimento de expectativas político-econômicas e linguísticas do governo brasileiro no contexto do MERCOSUL.


REFERÊNCIAS
ANTUNES Ricardo. Outubro: Revista do Instituto de Estudos Socialistas, nº 3, 1999.
BRASIL. Lei nº 11.161, de 5 de agosto de 2005. Dispõe sobre o ensino da língua espanhola. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 5 de agosto de 2005.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Parâmetros curriculares nacionais: linguagens, códigos e suas tecnologias: língua estrangeira. Brasília: MEC/SEM, 1998.
______. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 20 de dezembro de 1996.

CAVALCANTE, Maria do Socorro Aguiar de Oliveira. Ensino de qualidade e cidadania nos parâmetros curriculares nacionais: o simulacro de um discurso modernizador. Tese de Doutorado. UFAL, 2002.
ESPINET, Montserrat Dejuán. La comunicación en la clase de español como lengua extranjera. Madrid: España : La facoría de ediciones, 1997.
FALLEIROS, Ialê. "Parâmetros curriculares nacionais para a educação básica e a construção de uma nova cidadania" in: NEVES, Lúcia Maria Wanderley (org.) A nova pedagogia da hegemonia: estratégias do capital para educar o consenso. São Paulo: Xamã, 2005.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere. V.2. Os intelectuais. O principio educativo. Jornalismo. Tradução de Carlos Nélson Coutinho. Orelha de Leandro Konder. Quarta capa de Norberto Bobbio. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 2000 .
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SILVEIRA, Maria Inez Matoso. Línguas estrangeiras: uma visão crítica das abordagens, métodos e técnicas de ensino. Maceió: Catavento, 1999.




Autor: Bartolomeu Melo Brito


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