Muitas mães, muitas histórias; muita impunidade



Muitas mães, muitas histórias; muita impunidade


O acontecido com a atriz Cissa Guimarães que perdeu de forma trágica o filho Rafael, atropelado e morto no túnel Zuzu Angel, irmana ? em dois tempos ? a história de duas mulheres numa mesma briga: justiça aos seus filhos, acrescida de punição e condenação dos algozes. O caso do jovem Rafael Mascarenhas, de 18 anos, filho da atriz Cissa Guimarães, morto na descida do Túnel Acústico (extensão do túnel Zuzu Angel), nos leva a outra situação, irmã siamês dessas e outras histórias de sofrimento mais dolorosas que o parto, cujo desfecho é anestesiado pela candura de levar ao seio o recém-nato. Em 1971, nos anos de chumbo, a estilista Zuzu Angel buscou ? até a morte ? respostas ao assassinato de seu filho Stuart Edgar Angel Jones, morto sob torturas pelo regime militar num clima de dita ordem de segurança nacional. Zuzu buscou, morreu. E nada!
A dualidade da história tem como elemento chave a corrupção de agentes das forças de segurança, evolvidos até o pescoço nos dois episódios, agigantados por outras narrativas idênticas, temperadas com o mesmo horror ? como é o caso da Chacina de Acari. O episódio aconteceu em 26 de julho de 1990. Onze jovens, dentre eles sete menores, moradores da favela do Acari, no Rio de Janeiro, após retiradas de um sítio onde passavam o dia, por um grupo que se identificava como sendo policiais, "desapareceram." Nem eles nem seus corpos até hoje foram encontrados. Da morte de dezenas de filhos nasceram as "Mães de Acari", reivindicando, até hoje, justiça, punição e condenação dos algozes. E nada!
Do aleitamento materno ao derramamento de sangue existe uma linha tênue, no país onde aviltar contra os direitos humanos é um problema crônico que afeta mais os que deveriam exorcizar e punir tal prática, acabando eles próprios sendo os promotores do holocausto.
Em Maio de 2006, próximo aos "Dia das Mães", o Estado de São Paulo estremeceu por um dos maiores massacres da história brasileira. Em menos de um mês perto de 493 pessoas (entre mortos e desaparecidos, que em sua grande maioria eram jovens pobres e negros) foram assassinados. As circunstâncias das mortes apontavam para execução sumária: tiros pelas costas a curta distância, vestígios de pólvora e estilhaços de bala nas palmas das mãos, etc. Da morte de centenas de filhos nasceram as "Mães de Maio". Versão brasileira das Mães da Praça de Maio, na Argentina, reivindicando, até hoje, justiça, punição e condenação dos algozes. E nada!
No país vizinho as mulheres se reúnem na Praça de Maio, Buenos Aires, para exigir notícias de seus filhos desaparecidos durante a ditadura militar argentina (1976-1983). Alguns pais, considerados subversivos, tiveram seus filhos retirados de sua guarda e colocados para a adoção durante os cinco anos de ditadura. Findado o período negro, muitos filhos estavam sob guarda de famílias de militares. Adotados, possivelmente, pelos prováveis assassinos de seus pais. O extremo da crueldade.
Mães, filhos, assassinos e impunidade. Mães de Acari, Mães de Maio, Cissa Guimarães, Zuzu Angel, outras mães e também as mães dos próprios algozes que não os puseram no mundo para semear a maldade, pois, melhor seria o aborto. Mudam-se os tempos, os regimes e a figura do carrasco continua a fazer rolar lágrimas nessa "terra adorada, entre outras mil, és tu, Brasil, ó pátria amada! dos filhos deste solo és mãe gentil...! pátria amada, Brasil!

Autor: Valmir Barros


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