Motivação para leitura sob os parâmetros construtivistas e sócio-históricos.



A motivação é um processo de importância evidente, estudado por diversos ramos da ciência; entre eles a pedagogia e a psicologia da aprendizagem. Definida, em geral, como um estado interno que resulta de uma necessidade, ativador de comportamentos geralmente dirigidos para a satisfação de uma necessidade instigadora (DAVIDOFF, 2003).
Duas são as correntes clássicas da psicologia da aprendizagem que se ocupam de descrever a motivação como forma de instigar os alunos ao desconhecido: o construtivismo de Piaget e a Teoria Sócio-Histórica de Vygotski. A principal diferença entre essas correntes é que uma vê a motivação e o aprendizado como conseqüência do desenvolvimento cognitivo normal do ser humano enquanto a outra defende uma relação social mediada entre os dois processos. Para os construtivistas a motivação e o aprendizado devem ser trabalhados de dentro do aluno para fora enquanto que para os defensores de Vygotski tudo acontece na interação aluno-professor, ambas as teorias serão detalhadas no segundo capítulo da presente monografia.
Dentro do escopo no qual a motivação se insere, a leitura é componente indispensável, pois, como descrito por Foucambert (1997) o acesso à leitura é o único meio e alcance da democracia e da capacidade de compreender porque as coisas são como são. A leitura é ferramenta de reflexão e teorização do real que confere ao sujeito o poder de fato para mudar a realidade.
A escolha do tema, particularizando a sétima série do ensino fundamental, surge da evidente importância desse período na vida escolar de todo e qualquer indivíduo, especificamente no que diz respeito aos processos motivacionais, alia-se a esse dado o fato de que os alunos da sétima série estão no meio do processo de puberdade no qual ocorrem muitas mudanças e as exigências acadêmicas aumentam consideravelmente. Segundo Castorina (1996) é nesta fase escolar que os processos motivacionais estão mais evidentes e a aprendizagem ocorre de forma muito mais clara, no entanto, é notório que os adolescentes apresentam uma postura de desmotivação no que se refere à leitura.
Ter a motivação como foco central se justifica pelo fato de que é através dela e de suas interações com o externo que os indivíduos agem dessa ou daquela forma e por isso estudar a motivação em diferentes correntes se torna uma maneira de entender o comportamento humano (Idem, 1996).
As duas correntes psicopedagógicas descritas como modelos para motivar o aluno, o construtivismo e a teoria sócio-histórica, foram selecionadas por serem amplamente difundidas e unirem em torno de si mesmas assuntos pertinentes à psicologia, à pedagogia e às demais ciências que se ocupam dos processos educativos, assim como pelo fato de que quando utilizadas de forma adequada permitem que o professor e o aluno hajam de forma significativa (BAQUERO, 1998).
Sendo a motivação um estado presente em todos os indivíduos, a questão é: diferentes maneiras de trabalhar a motivação para o hábito de leitura produzem diferentes padrões de comportamento ou cada sujeito possui o seu próprio ritmo motivacional independente das técnicas utilizadas?
Diante disso, a presente monografia tem como objetivo geral descrever as práticas para a motivação dos alunos em relação à leitura, detectando o que tem de construtivismo e de teoria sócio-histórica nas ações dos professores bem como definir até onde vai a influência da postura dos mesmos na formação de bons leitores. Sendo os objetivos específicos: identificar as diferentes práticas para a motivação à leitura bem como detectar padrões de comportamento dos alunos em resposta às práticas utilizadas em sala de aula.
Para tanto, foram realizados registros de observação num total de cinco registros. No dizer de Castorina (1996) esta é a melhor forma de observar grupos com grande variedade de comportamentos e consiste em registrar comportamentos, de maneira discursiva, num tempo de cinqüenta minutos. A fim de alcançar os objetivos, os seguintes comportamentos foram selecionados: tempo que o aluno dedica a leitura em sala de aula, conversas paralelas durante as atividades relacionadas à leitura e interação professor-aluno, pois, de acordo com Solé (1999) estes são os comportamentos que melhor revelam a motivação em sala de aula. Para que haja maior clareza também foi feito um diagrama, desenho esquemático com legendas informativas, como forma de registrar de maneira sistemática o ambiente físico onde as observações foram realizadas. Como forma de contrastar realidade e discurso, uma entrevista semi-estruturada foi realizada com a professora da disciplina Língua Portuguesa da turma observada.
Uma revisão bibliográfica foi feita com o objetivo de agregar o maior número possível de autores que tratem sobre o assunto discutido na pesquisa para que aliada ao registro de observação e por fim à análise dos dados dêem subsídios à comprovação ou não das hipóteses aqui levantadas.
Para a realização da presente pesquisa escolhemos o estudo de caso como o método mais adequado para o alcance dos objetivos da mesma, pois, se caracteriza por ser um estudo profundo de um ou poucos objetos de maneira a permitir um conhecimento amplo e detalhado do mesmo, sendo recomendável para as fases iniciais de investigações sobre temas complexos.
De acordo com Macedo (2004) os estudos de caso visam à descoberta característica que se fundamenta no pressuposto de que o conhecimento não é algo acabado, haverá sempre um acabamento provisório, portanto, o conhecimento é visto como algo que se constrói constantemente. Assim, os estudos de caso valorizam a interpretação do contexto buscando retratar a realidade de forma densa, refinada e profunda.
Trata-se de ver o objeto estudado como único e especial mesmo sabendo que outros âmbitos e realidades o compõem (Idem, 2004). No trabalho aqui exposto, escolhemos como objeto de estudo uma turma de sétima série do ensino fundamental de um colégio particular no município de Aracaju.
Dentre as técnicas possíveis para a realização do estudo escolhemos a observação contínua não-estruturada, também chamada de observação participante periférica, pois não há envolvimento do observador nas atividades realizadas pelo grupo estudado, registrada através de anotações de campo (apêndice A) descritivas e reflexivas contabilizando um total de cinco observações.
Os registros da observação contínua não estruturada se compõem de anotações feitas em discurso livre, geralmente feitas através de períodos curtos nos quais o observador capta tudo o que lhe é possível dentro do seu campo de visão, no entanto, o processo de observação não se restringe ao ato mecânico do registro porque o observador, apesar da especificidade de seu trabalho, está inserido em um processo de interação e atribuição de sentidos, ou seja, à medida que a interação progride podem ocorrer modificações nos estados iniciais das informações, mas, isso não implica invalidade dos dados colhidos.
Para uma maior clareza, foi feito um mapa descritivo (em anexo) da sala de aula como forma de localizar espacialmente o ambiente em que as observações foram realizadas. A visualização do espaço aliada aos registros dá subsídios para a análise baseada no que foi coletado pela pesquisa bibliográfica.
Visando contrastar realidade e discurso, realizamos uma entrevista semi-estruturada (apêndice-B) com a professora da turma escolhida como objeto de estudo tendo a mesma duração de trinta minutos. A entrevista semi-estruturada é aquela que o entrevistador planeja previamente as perguntas que deseja fazer, mas que não descarta o uso de questões que possam aparecer no decorrer da entrevista, a partir do discurso do entrevistado.
A entrevista tornou-se, nos últimos anos, um instrumento do qual se servem constantemente os pesquisadores, em especial aqueles que procuram estudar o funcionamento das relações sociais. Recorre-se à entrevista quando se tem necessidade de obter dados que não podem ser encontrados em registros ou fontes documentais e que podem ser fornecidos por certas pessoas, tais dados podem ser utilizados tanto para o estudo de fatos como de casos ou opiniões.
Todavia, numa pesquisa envolvendo atores sociais a entrevista ultrapassa a simples função de fornecimento de dados, diz Macedo (2004) e continua:


Poderoso recurso para captar representações, na entrevista os sentidos construídos pelo sujeito assumem para o etnopesquisador o caráter da própria realidade, só que do ponto de vista de quem a descreve. A linguagem aqui é um forte fator de mediação para a apreensão da realidade e não se restringe apenas à noção de verbalização. Há toda uma gama de gestos e expressões densas de conteúdos indexais importantes para a compreensão das práticas cotidianas. Verifica-se, inclusive, que o tipo de entrevista mais adequada para a etnopesquisa em educação aproxima-se mais dos esquemas livres e flexíveis [...] (p.164).

Apesar do caráter flexível da entrevista semi-estruturada, recomenda-se que o pesquisador tenha algumas atitudes pré-estabelecidas, tais como: obter conhecimento prévio sobre o entrevistado, esquematizar perguntas, obter a confiança do entrevistado e principalmente ouvir mais que falar (Idem, 2004).
A análise dos dados foi realizada de maneira reflexiva contrapondo o discurso obtido em entrevista com os registros das observações realizadas em sala de aula, contudo, é preciso pontuar que a análise de entrevista é um processo longo que exige extrema atenção fazendo-se necessário o debate entre estudiosos da área, ou seja, as possíveis conclusões feitas sob a análise não devem ser tomadas como verdades absolutas.
Ratifica-se também que a escolha do método e dos materiais aqui empregados está em pleno acordo com os princípios éticos que devem constar em toda e qualquer pesquisa. As observações foram realizadas com o consentimento da diretora da instituição de ensino, bem como da professora e dos pais dos alunos. No que se refere à entrevista, a mesma consta aqui transcrita ipsis literis e com a devida autorização da entrevistada.
No dizer de Camino (2004), a ética é essencial à pesquisa científica e deve-se tratar o objeto de pesquisa com justiça e respeito, em especial, nas pesquisas que se referem à sociedade e que possuem seres humanos como foco central. A divulgação de resultados sem a devida autorização dos sujeitos estudados é contra as normas éticas da pesquisa científica.
Tomando como base tudo o que foi dito até aqui, passaremos à análise dos dados coletados. A partir das observações realizadas em sala de aula pudemos perceber que a relação dos alunos com a leitura está bastante distante daquilo que se tem como o padrão de comportamento do bom leitor.
A turma em questão manifestou comportamentos de rejeição às atividades de leitura em todas as aulas assistidas, sendo estes demonstrados principalmente pelas conversas paralelas durante a leitura em sala de aula, bem como pelo uso freqüente de frases do tipo: "poxa professora, a gente tem que ler tudo isso?" Por outro lado, em conversas informais com os alunos, pudemos observar que os mesmos mantêm práticas de leitura em ambientes extra-escolares. Revelaram os livros de ação, os livros-jogos, as revistas para adolescentes, em destaque, as especializadas em assuntos como música e futebol como os tipos preferidos de leitura, citando ainda sites voltados para eles. Ao serem questionados sobre a importância dessas leituras, responderam que a escola classifica como besteira, mas que eles acabam aprendendo, pois esses livros possuem palavras e idéias desconhecidas além de tratar de assuntos interessantes.
Revelaram ainda que a escola não reconhece o gosto dos seus alunos e os professores, por causa disso, não trabalham em sala de aula os assuntos que interessam aos estudantes e assim a leitura, que segundo eles, era para ser agradável torna-se obrigação. Desta forma, pode-se inferir que a fala dos alunos aqui descrita ratifica a idéia de Marcuschi (2000) de que para motivar a leitura é necessário levar em conta o interesse do aluno caso contrário, a escola cria uma linguagem da escola para a escola e que para o aluno não faz sentido algum.
Pergunta-se então por que a escola não admite trabalhar esse tipo de leitura em sala de aula? Por que a escola insiste que para ser leitor precisa ler o que se classifica como clássico? Todos nós para alcançarmos a capacidade de andar tivemos que engatinhar, ou seja, para tudo há um primeiro passo, assim como refinamos nossa capacidade de andar, os alunos refinarão seu gosto pela leitura se no começo lhes derem a oportunidade de ler, entender, discutir e refletir sobre aquilo que lhes interessa.
Pode-se notar também que o interesse dos adolescentes está voltado para a prática. Quando a leitura do texto envolve a idéia da construção de uma peça teatral, a simulação de um programa de rádio ou mesmo da televisão, os alunos manifestam comportamentos de motivação e se empenham para que a tarefa seja realizada com êxito. Contudo, o padrão de comportamento motivacional não é uniforme, alguns alunos demonstraram maior motivação que outros confirmando a noção de diferença própria do ser humano.
Contrapondo-se ao discurso da turma, foi notado o fato de que os alunos ao serem questionados sobre a leitura efetuada em sala de aula poucos foram o que manifestaram opinião utilizando-se de palavras próprias, em sua grande maioria os alunos recorriam ao texto para responder questões feitas diretamente a eles, isto demonstra que mesmo realizando práticas de leitura os alunos adolescentes não sabem ler apenas decodificam os textos, o que ratifica o pensamento de Yunes (1996) descrito mo capítulo dois.
Dentro dos fatores observados, o que mais impossibilita atividades de leitura em sala de aula, se refere à indisciplina dos alunos. Uma aula de cinqüenta minutos torna-se curta por conta do tempo que se gasta tentando organizar a sala, manter a concentração dos alunos ou mesmo reclamando e pedindo silêncio. O comportamento indisciplinado da turma limita o fluxo da aula e interrompe atividades de leitura, questiona-se então se a indisciplina é conseqüência da desmotivação ou o contrário. Para Solé (1999) a indisciplina de uma sala de aula está diretamente relacionada com a desmotivação causada talvez pela fraca relação existente entre o professor e os seus alunos.
Defendemos então que mesmo a professora tendo todo o conhecimento e consciência necessários para efetuar uma relação de motivação com os alunos, o que acontece é que grande parte das posturas em sala de aula obtém respostas negativas mostrando que há uma falha na relação professor-aluno fruto talvez do pouco tempo de aula ou de fatores como a diferença de interesses e posturas da professora e da turma, ademais não é nosso papel determinar aqui as possíveis causas da mesma.
No que se refere à posição da professora, apesar de a mesma lançar mão de recursos motivadores, poucas foram as respostas positivas, o que mostra que a relação de mediação professor-aluno vai além dos instrumentos de motivação utilizado pelo mesmo, como deixamos claro no capítulo quatro. Faz-se necessário pontuar que a professora, que aqui chamaremos de professora P., durante todas as aulas assistidas se utilizou sempre das atividades propostas no livro didático incluindo o uso dos cartazes e dos vídeos, esse comportamento vai de encontro ao pensamento de Resende (1993) que postula que o livro didático deve servir de instrumento colaborador, mas não norteador das atitudes tomadas pelo professor.
Em entrevista com a professora, o que se pôde observar é que discurso e realidade mantêm uma distância considerável, uma vez que pouco do que foi dito pela mesma pôde ser visto em sala de aula. A professora P. diz que a maior participação do professor na formação de bons leitores é através do incentivo, como revela em sua fala:
a gente não deve incentivar o aluno a ler somente pra ter a nota...Como a maioria dos professores tem feito nesses períodos de tempo então eles: ah então vou ler só porque é obrigado, porque é pra nota e tal...Não. A motivação tem que vir assim, por exemplo, um dia na semana...Eu peço para eles trazerem esses livros assim...Livros de literatura, aí eu dou uma olhadinha e faço uma...Uma aula diferente, então é a aula da leitura, aí eles trocam livros entre eles...E isso vai despertando então quem não gostava de ler nada já lê dois capítulos de um livro desse...Então motiva. A gente motiva assim na troca de livros, eu trago bastante os que eu tenho em casa pra eles lerem esse tipo de livro e aí a gente vai motivando na medida do possível porque isso é um processo lento, não é de uma hora para outra que eles vão começar a ler não! (P, 2006).


O discurso da professora revela a sua consciência de que o processo de motivação à leitura é lento e gradual bem como o seu conhecimento sobre as técnicas de motivação, todavia, em nenhum momento durante as aulas assistidas foi possível notar a utilização deste instrumento motivador descrito na fala da mesma, pode-se dizer até que a escassez de instrumentos motivadores seja fator relevante para a desmotivação dos alunos.
O contraste entre o dito e o observado prossegue durante toda a fala da professora, pois, a mesma sugere o uso das dramatizações e das leituras de livros adaptados como forma de instigar os alunos, no entanto, em outro momento confirma a idéia de que a leitura clássica, reflexiva é cansativa, bem como defende a criação de um horário exclusivo para aula de leitura, mas, a justifica como forma de fazer o aluno entender a linguagem necessária para alcançar êxito no vestibular, ou seja, o pensamento é que lê-se não para a vida, não como uma forma de estabelecer relação com o mundo mas como uma ferramenta através da qual se alcança um sucesso palpável.
Ainda sobre a criação do horário para a aula de leitura, a professora diz que o aluno valorizaria mais porque ele iria para a escola sabendo que teria uma aula de leitura e que ele seria avaliado naquele momento, deixando evidente a importância da participação do aluno no processo de aprendizado e diz:
"Eu sempre falo para eles: ó vocês estão sendo avaliados dia a dia porque muitas vezes o aluno não é bom na parte escrita, mas ele é ótimo no teatro, na comunicação... apresentar um trabalho, então ele tem que pegar essas coisas e valorizar para que ele se destaque e não fique isolado na sala de aula". (P, 2006).

Pudemos notar também a existência da noção de que para aprender a língua portuguesa é necessário manter uma relação direta com os textos e mais uma vez a professora justifica a idéia fazendo valer a aprovação no vestibular e diz que diferente do tradicional, hoje o vestibular trabalha com teatro, com tirinhas, com charges e que até a parte gramatical é tirada do texto e por isso, eles precisam conhecer os diversos tipos de texto, precisam manter uma relação com a leitura e com os livros porque não existe gramática separada do texto.
E prossegue defendendo a idéia de que a gramática quando é ensinada através do texto é assimilada facilmente porque o aluno tem a tendência de decorar, mas, não é para decorar regras gramaticais e diz que o aprendizado acontece quando o aluno olha para o texto de maneira reflexiva para ver a importância da palavra dentro do texto, porém, pontua que é preciso lembrar que os adolescentes vivem no mundo da televisão, da internet e isso por um lado prejudica a relação com os livros e a leitura porque eles pegam trabalhos prontos na internet. Essa facilidade faz com que o aluno não queira sentar, não queira pesquisar, ou seja, a tecnologia facilita o acesso a informação, mas, cria uma massa de alunos acomodados. A internet deve ser utilizada com equilíbrio e com uma atitude critica do professor que deve ser passada para o aluno.(P, 2006). Pontuamos então que este trecho da fala da professora concretiza as idéias de Marcuschi (2000), Baktin (1992) e Possenti (1996) descritas durante toda a construção da presente monografia.
No contato com o cotidiano da sala de aula pudemos detectar que não há o uso demarcado de nenhuma das duas correntes aqui abordadas, isto significa que nas atitudes da professora havia um misto de ambas as teorias, ora podíamos ver a influência do construtivismo ora da teoria de Vygotski. Por outro lado, foi possível ver que ao utilizar aquilo que se chama de instrumentos mediadores a resposta dos alunos era real, positiva e imediata o que mostra que a aprendizagem monitorizada em que o professor age diretamente na zona de desenvolvimento proximal do aluno é mais eficaz do que o pensar o aprendizado como conseqüência natural dos processos maturacionais. O fato de não conseguirmos demarcar as teorias nas atitudes da professora ratifica a nossa crença de que a teoria de Vygotski é tão construtivista quanto a de Piaget, tendo como principal diferença o enfoque dado às relações sociais como já dissemos no capítulo três.
O convívio social e a relação com os colegas de classe demonstraram ser relevantes para o processo motivacional da leitura, quando instigados a ler em grupo e trabalhar em equipe a turma conseguia executar a tarefa mesmo com toda a agitação que um grupo de adolescentes é capaz de fazer, um outro ponto que confirma este fato é a influência que um aluno exerce sobre outro, em diversas vezes pudemos observar a troca de revistas e livros-jogos entre os alunos. Ao que parece, a aprovação do colega sobre o material é ponto fundamental para a motivação de outros alunos, o fato de um deles ter lido e aprovado a leitura acaba despertando o desejo no outro de efetuar a mesma leitura.
Isto prova que mesmo admitindo a importante participação do professor no processo de formação de bons leitores é interessante que aqueles que estão relacionados diretamente com a escola e os alunos façam dos mesmos um instrumento mediador do aprendizado. É preciso que os professores estejam atentos para as relações que existem entre seus alunos, se o professor não consegue estabelecer um vínculo suficiente com seus alunos a ponto de influencia-los que ele seja, no mínimo, capaz de administrar e utilizar, de forma benéfica, o convívio diário da turma. Este pressuposto vale para leitura tanto quanto vale para as demais atividades desenvolvidas em sala de aula, não se restringindo apenas às aulas de língua portuguesa.

A motivação para leitura é um processo complexo que envolve diversos fatores desde o desejo interno do aluno à participação efetiva do professor na construção de vínculo com seus alunos. Partindo desta idéia podemos considerar que motivar à leitura é muito mais que ensinar o aluno a ler ou cobrar deste uma postura de leitura nos padrões aos quais estamos acostumados a ver.
Levamos em conta os diversos fatores que interferem na formação de bons leitores entre eles a falta de tempo dos professores para efetuar atividades mais eficazes em sala de aula, a influência da tecnologia principalmente da internet que acaba retirando do aluno o desejo de sentar-se com um livro e gastar energia com a reflexão bem como o fato da escola não aceitar trabalhar os materiais de interesse dos alunos em sala de aula.
No caso da turma de sétima série que observamos podemos dizer que os alunos se mostraram motivados quando a atividade de leitura estava relacionada com alguma praticidade vivida no cotidiano dos mesmos, em compensação a desmotivação foi detectada quando havia uma atitude de cobrança por parte da professora. Isto nos leva a crer que o aluno não responde positivamente quando a leitura é tida como obrigação, ou seja, a motivação à leitura não é uma instância estanque na qual o individuo permanece sempre motivado ou desmotivado. Tal como as demais áreas componentes do comportamento humano, a motivação também possui suas variações em cada individuo não sendo possível estabelecer um padrão comportamental.
No entanto, pode-se afirmar que o uso dos instrumentos mediadores aliado à postura de incentivo tomada dentro da sala de aula reflete positivamente nas respostas dos alunos à atividade de leitura e compreensão textual levando-nos a defender a posição de que, no que foi visto, a teoria de Vygotski se mostra mais próxima da realidade do que a teoria piagetiana que desconsidera as relações sociais na aquisição de comportamento. Desta forma, afirmamos que a motivação em sala de aula deve ser vista sob a ótica das ações mediadas sugerindo que diferentes técnicas motivacionais provocam diferentes padrões de respostas comportamentais.
A influência do professor isoladamente não constitui fator relevante para a formação de bons leitores, contudo, adquire sentido se trabalhada juntamente com outros fatores, entre eles o estabelecimento de vínculo entre professores e alunos, a construção de diálogos entre escola e comunidade e principalmente quando há condições para professores e alunos compreenderem os atos de leitura como um todo. Ou seja, não é porque um professor lê em sua casa que, em sala de aula, ele sozinho será capaz de formar admiradores de obras literárias.
Defendemos aqui que o ato de leitura adquire significado quando o leitor se vê enquanto construtor de significados e reflexões sobre o texto e para isso é necessário o mínimo de interesse do mesmo diante daquilo que lê. Assim, a leitura é um ato de dedicação que deve ser instigado, mas não imposto. Não se deve ler para obter nota na prova ou aprovação no vestibular, ler deve ser visto como um ato de possibilidade de mudança e compreensão do mundo que nos cerca e se para isso o adolescente necessita que a sala de aula discuta aquilo que lhe apetece e está impresso naquilo que ele classifica como importante, que assim seja. Quando o mesmo for capaz de refletir sobre as suas leituras se dará conta de que elas não sejam mais suficientes para a construção do pensamento sobre o mundo e si mesmo e desta forma, naturalmente ele passará a desejar outros tipos de texto incluindo a leitura clássica.
Os professores enquanto formadores de consciência devem respeitar os alunos enquanto indivíduos dotados de particularidades e ser antes de tudo um observador para assim adquirir a capacidade de agir de acordo com o interesse dos alunos, uma vez que mesmo não sendo um Machado de Assis as leituras efetuadas pelos adolescentes possuem tanta gramática quanto o primeiro, guardando as devidas diferenças de refinamento lingüístico. Lembrando que o principal objetivo de uma aula de língua vernácula é ensinar ao aluno que além das regras gramaticais ele precisa compreender a língua como um todo incluindo as suas variações de forma a torna-lo capaz de adaptar o próprio discurso às diversas situações sociais e aqui defendemos que a única maneira de alcançar este patamar é trabalhando todo tipo de texto em sala de aula.
Partindo deste pressuposto dizemos que a presente monografia alcançou os seus objetivos de maneira clara e objetiva uma vez que conseguimos descrever as práticas motivacionais e refletir sobre a influência do professor na formação de bons leitores. Concluímos que diferentes formas de se trabalhar a motivação, seja ela intrínseca ou extrínseca, produz diferentes respostas em sala de aula. No que se refere às teorias aqui discutidas, ratificamos que na prática há um acoplamento entre ambas e que para a efetivação da leitura enquanto hábito, a teoria escolhida pelo professor não se constitui em fator relevante.
Todavia, o que consideramos aqui não deve ser tomado como verdade absoluta, pois, muito ainda precisa ser feito e a presente monografia deve ser utilizada como premissa para futuras pesquisas sobre o tema discutido.
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Autor: Marcia Oliveira Moura


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