A ninhada



Tínhamos uma pequena criação de galinhas que, graças aos cuidados da Dona Ceiça, minha mãe, era mantida com muito zelo. O poleiro delas era bem perto de casa, onde se acomodavam para o descanso diário. Meu pai fizera uma escada de madeira, meio improvisada, para facilitar-lhes o acesso aos galhos daquela árvore.

Uma das boas recordações que tenho da minha infância, é a lembrança das poedeiras que minha mãe "deitava". Alguns ovos daquela modesta criação eram consumidos em deliciosas farofas ou estrelados na manteiga; outros, ainda, eram utilizados para gemadas, pela crença de que os ovos de galinha caipira, ou galinha pé-duro, como ouvia muito naquela época, eram muito eficazes na cura dos resfriados mais dolorosos, fazendo o doente se restabelecer mais rápido.

Não sei se justo era, mas por falta daqueles dos quais nos servíamos, minha mãe reunia os ovos restantes e, para não ocupar duas galinhas, designava apenas uma para cuidar da ninhada. Pela quantidade de ovos que a ave abarcaria era definido, pelo menos supostamente, o tamanho da ninhada. Para arrumar o ninho, em esforço extremo tento recordar agora, acho que minha mãe se utilizava de pedaços de estopa, capim seco, sei lá, não posso precisar essa informação. Posta no ninho, a galinha acomodava-se de maneira a cobrir todos os ovos, talvez crendo que eram todos seus.

A um certo tempo de aquecimento dos ovos minha mãe examinava-os, um por um, para ver se havia algum goro. Parece que posso ver: no escuro, utilizando-se apenas da luz de uma lamparina, ela segurava o ovo pela base, pondo a mão direita sobre ele, fazendo sombra, para visualizar o embrião. Se estivesse morto era retirado e lançado fora. Após o exame os que estavam vivos voltavam para debaixo da galinha, que emitia um som estranho, como se murmurasse, manifestando seu incômodo.

Em absoluta dedicação, a galinha continuava a chocar seus ovos, esperando a chegada dos pintinhos. Findando o período da incubação, era a hora de dar uma forcinha à natureza. Minha mãe sabia exatamente o momento. Agachava-se junto ao ninho e começava a retirar os ovos da galinha que, outra vez, reclamava a perturbação.

Minha mãe incorporava uma autêntica parteira de galinhas. Pegava um ovo, batia-o cuidadosamente no chão duro, de modo que a casca se quebrasse, um pouquinho só, o bastante para que ela pudesse, com a unha do polegar, abrir um orifício. Feita a abertura, com o polegar e o indicador, em forma de pinça, ela puxava, pelo bico, o pequeno monstrinho, todo sujo, molhado, e nojento. Expunha somente a cabeça, deixando o resto do corpo ainda no ovo e o devolvia para debaixo da galinha. Assim fazia com todos os ovos.

Eu não entendia porque ela fazia isso. Eu cria que era função da galinha quebrar os ovos e ajudar os seus a saírem para o mundo. Ou, assim como ouvi dizer, que eles próprios, os filhotes, teriam dentes especiais para a quebra da sua morada, os quais, após o seu nascimento, eram perdidos. Acreditava que a própria natureza era responsável pelo processo do nascimento.

Minha mãe, certamente, estava ajudando aos pobres filhos do ovo que precisavam nascer. O importante é que no dia seguinte tínhamos uma festa de piados, que ecoavam, a chegar doer os ouvidos. Enturmados, os bichinhos seguiam ciscando, bicando algumas pequeninas coisas do lixo, acompanhados da mãe que, com seu instinto materno, se fazia valente ante a suspeita de qualquer risco.

Autor: Maria Celça Ferreira Dos Santos


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