Cobrança abusiva de juros



COBRANÇA ABUSIVA DE JUROS EM CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO AO CONSUMIDOR

SUMÁRIO


INTRODUÇÃO. 1
1. RELAÇÃO DE CONSUMO. 2
1.1 Conceito de relação de consumo. 2
1.2. Conceito de Consumidor 3
1.3. Instituição bancária como Fornecedora. 6
2. CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO. 7
2.1. Conceito 7
2.2. Tutela Legal. 9
3. JUROS 11
3.1 - Conceito 11
3.2 - Das espécies de juros. 12
3.3 - Dos limites legais das taxas de juros em contratos de mútuo bancário. 13
3.4. Anatocismo 17
CONCLUSÃO 18
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. 19













INTRODUÇÃO.


Com a crescente oferta de produtos e serviços no mercado de consumo, e diante do baixo poder aquisitivo da grande maioria da população brasileira, o crédito bancário se torna um importante mecanismo na busca de realização de sonhos na vida dos consumidores.
O presente estudo pretende trazer a baila breves considerações sobre a taxa de juros que é cobrada nos contratos de mútuo oferecidos pelas instituições financeiras e bancárias, avaliando se a remuneração pelos valores emprestados ao consumidor possui limites impostos pela legislação vigente.
Dentro desta perspectiva, abordar-se-á os contornos do conceito de consumidor quando se valem da "venda de dinheiro" a prazo, bem como serão analisados os motivos que levam as instituições bancárias a serem consideradas fornecedoras de crédito, tutelando-se tal relação pelas regras Consumeiristas.
Verificar-se-á quais as modalidades de juros se colocam nos contratos de mútuo bancário, analisando a legislação que se aplica ao caso em comento, traçando um perfil das práticas que podem ser consideradas abusivas no mercado de consumo.
Despretensiosamente o texto tem como foco trazer a lume, de maneira simples e objetiva, quais as práticas devem ser repelidas pelo consumidor no momento de aderir a um crédito bancário, fugindo das armadilhas impostas pelas instituições financeiras, formando uma opinião crítica e esclarecendo o consumidor que pretende se valer deste tipo de serviço.





1. RELAÇÃO DE CONSUMO.


1.1 Conceito de relação de consumo.

A lei 8.078/90, conhecida entre nós como Código de Defesa do Consumidor, tem por escopo tutelar as relações que são travadas entre o consumidor e o fornecedor de produtos e serviços.
Para que se forme uma relação de consumo imprescindível que estejam presentes requisitos subjetivos e objetivos, sendo os primeiros entendidos como a presença das partes desta relação e o segundo o objeto que será intermediado.
Roberta Densa diz que
" a relação jurídica de consumo possui três elementos, a saber: o subjetivo, o objetivo e o finalístico. Por elemento subjetivo devemos entender as partes envolvidas na relação jurídica, ou seja, o consumidor e o fornecedor. Já por elemento objetivo devemos entender o objeto sobre o qual recai a relação jurídica, sendo certo que, para a relação de consumo, este elemento é denominado produto ou serviço. O elemento finalístico traduz a idéia de que o consumidor deve adquirir ou utilizar o produto ou serviço como destinatário final" .
Dessa forma o que distinguirá a relação de consumo da relação civil comum é a presença dos seus elementos caracterizadores próprios. Uma vez presentes esses requisitos, aplicar-se-á a esta relação o Código de Defesa do Consumidor.
Oportuno ressaltar que a Codificação Consumeirista nasce com suas bases fixadas nos princípios constitucionais e visa proteger o consumidor, vez que este é a parte considerada com vulnerável nesta relação. A legislação civil, ao contrário, se aplica aos que contratam de maneira igual, sendo que nestas relações não há que se falar em parte mais frágil.
O Código de Defesa do Consumidor, elenca nos arts. 2º e 3º os conceitos dos envolvidos na relação de consumo. Passaremos a analisar de maneira mais detida cada um desses conceitos.


1.2. Conceito de Consumidor

A lei Consumeirista conceitua o consumidor como sendo " toda pessoa física ou jurídica, que adquire ou utiliza, produto ou serviço, como destinatário final."
A primeira vista nos parece simples compreender quem seria aquele denominado parte vulnerável na relação de consumo, vez que a própria legislação tratou de determinar quando uma pessoa deverá ser considerada consumidora.
Ao optar, o legislador, por conceituar um instituto, corre o risco de determinar limites ao intérprete da norma. No caso exposto, a leitura do dispositivo já agrega uma interpretação vasta, não, porém, sem discussões. Rizzato Nunes diz que "apesar de algumas dificuldades, a definição de consumidor tem grande virtude de colocar claramente o sentido querido na maior parte dos casos".
A definição trazida pelo art. 2º do CDC pode ser compreendida como conceito de consumidor stricto sensu, vez que o parágrafo único deste artigo entre outros dispositivos constantes na referida legislação traz definições de consumidor equiparado, assim entendido como os terceiros que por força de lei ganharam o status de consumidores.
Da análise do conceito de consumidor elencado na norma, depreende-se que este poderá ser uma pessoa física, jurídica ou toda a coletividade.
Ponto importante que deve ser ressaltado é o fato de que o termo "adquirir", constante no conceito ora estudado, não se cinge apenas a "comprar". Nessa esteira, quem adquire, a que título for, seja pagando o preço pessoalmente para o fornecedor, seja sendo agraciado por um presente, ou apenas utilizando do produto ou serviço, faz nascer a possibilidade de se integrar a uma relação de consumo.
O fato que cria maior embaraço para determinar a presença de um consumidor dentro de uma relação jurídica está na interpretação do termo "destinatário final". Quem poderá ser considerado destinatário final?
Na intenção de responder essa pergunta, a doutrina se dividiu em três correntes, a saber: finalista (minimalista ou subjetiva), maximalista e finalista temperada (ou híbrida).
A primeira corrente diz que destinatário final é o consumidor que retira de forma definitiva do mercado de consumo, produto ou serviço, para suprir uma necessidade própria, sem colocar o bem adquirido em processo de produção ou desenvolvimento de atividade empresarial, seja de maneira direita ou indireta.
A segunda corrente defende que destinatário final é aquele que compõe o último elo da cadeia de distribuição de riquezas, não importando qual a finalidade que será dada ao bem adquirido.
Por fim, a última corrente afirma que para ser considerado consumidor a finalidade da retirada do produto do mercado poderá até estar voltada ao fomento uma atividade econômica, porém, o consumidor deve ser considerado vulnerável diante da análise do caso concreto. Essa vulnerabilidade poderá ser técnica, econômica ou jurídica e tal conceito deve ser aplicado analisando a situação de fato.
Essas correntes ajudam a compreender, principalmente, quando uma pessoa física empresária ou uma pessoa jurídica será considerada consumidora, e passará a receber o tratamento dado pelo Código de Defesa do Consumidor à relação da qual ela participa ao adquirir um produto ou serviço.
A guisa de exemplo imagine-se que uma pessoa jurídica que tenha como atividade principal à venda automóveis, adquire um sofá para colocar a disposição dos seus clientes, a fim de trazer maior conforto aos mesmos. Para a corrente finalista, indiretamente tal conforto patrocinado aos clientes pode ter relação direta com aumento das vendas e dessa forma, a relação entre o fabricante de sofá e a revendedora de automóveis não será de consumo. Já para doutrina maximalista, sendo a revendedora de automóveis a pessoa que adquiriu como último elo na cadeia de produção, o sofá, nasceria entre esta e o fabricante do bem uma relação de consumo. Para doutrina finalista temperada, falar-se-ia em relação de consumo, tendo em vista que a revendedora de automóveis é vulnerável tecnicamente em relação a fábrica de sofá e por isso entre elas, travada estaria, uma relação de consumo.
Dessa forma, resta evidente que o termo destinatário final, ao ter várias formas de interpretação, ganha importante relevo no papel de se delimitar a figura do consumidor.


1.3. Instituição bancária como Fornecedora.

Quando da edição do Código de Defesa do Consumidor, muito se discutiu se as instituições financeiras e bancárias se sujeitariam a nova lei, tendo em vista que o Sistema Financeiro Nacional (SFN) possui legislação específica, e, portanto seria lei especial que já teria o condão de tutelar as relações onde às tais instituições figurassem como parte.
Ocorre que o art. 3º do CDC , determina que todas as pessoas jurídicas e físicas que desenvolvem atividade de venda de produtos ou serviços, devem ser consideradas fornecedores, bem como, afirma categoricamente, que são considerados serviços as atividades fornecidas no mercado de consumo, inclusive as de natureza bancária.
Mesmo diante da clareza da legislação Consumeirista, a Confederação Nacional das Instituições Financeiras moveu ação direta de Inconstitucionalidade , sendo certo que por maioria de votos o STF entendeu que as instituições financeiras e Bancárias sujeitam -se ao dispositivo Constitucional que prevê como direito fundamental do cidadão a defesa do consumidor, e desta feita, julgou improcedente a ação, determinando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos bancos.
Assim, uma vez verificada a existência do consumidor de um lado e de outro a figura de uma instituição bancária que presta serviços ou vende produtos, estar-se-á diante de uma relação de consumo que deve ser regida pela norma Consumeirista.


















2. CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO.


2.1. Conceito

As operações bancárias têm como instrumento de concretização de seus objetivos os contratos bancários. Dessa forma, esses contratos são o esquema jurídico que contém as obrigações e direitos das partes que o constituem.
Para que possamos conceituar o contrato de mútuo bancário, primeiramente far-se-á necessário traçar as principais características do gênero contrato bancário, no qual a espécie mútuo se encaixa.
Sérgio Carlos Covello afirma que para conceituar contratos bancários devemos adotar dois critérios fundamentais, quais sejam, o critério subjetivo, sendo contrato bancário aquele realizado por um banco, e o critério objetivo, pelo qual é contrato bancário aquele que tem por objeto a intermediação do crédito. Aponta o autor que para termos um contrato bancário, tais critérios devem se apresentar em conjunto. Em suas palavras, o contrato bancário é "[...] o acordo entre Banco e cliente para criar, regular ou extinguir uma relação que tenha por objeto a intermediação do crédito."
Rodrigues Alves , pondera que "[...] em verdade, há operação bancária se existe suporte fático que se traduz empiricamente em atividades nas quais o banco opera com o cliente, atendendo-se ao fim comercial do banqueiro" . Nessa ótica, os contratos bancários que são regidos pela atual legislação importam em venda de crédito ou gestão de valores depositados em instituições financeiras, não se encaixando nessa conceituação os contratos que tais instituições fazem, por exemplo, com seus empregados.
Vale ressaltar as considerações acerca do tema, feitas por Orlando Gomes , que diz:
"Distinguem-se as operações bancárias em principais e acessórias. Melhor, porém, qualificar as primeiras como operações típicas, para evitar-se ambigüidade. As operações acessórias não dependem das outras, existem sobre si mesmas, assim se denominando, não obstante, porque não constituem a principal atividade dos bancos sob o ponto de vista da função econômica que exercem"
Serão, portanto, considerados contratos bancários, aqueles em que a Instituição financeira realiza sua finalidade, oferecendo ao mercado um produto ou serviço que fomente sua principal atividade.
No que tange ao mútuo, também conhecido com empréstimo, pode-se afirmar que nesta modalidade de contrato uma pessoa entrega determinada coisa a outrem, que se compromete a devolver o que fora emprestado ou algo que o valha. Flávio Tartuce diz que o contrato de empréstimo pode ser conceituado como negócio jurídico onde ocorre a entrega de coisa a alguém que se compromete a devolver a coisa emprestada ou seu equivalente. Neste contexto, o contrato de empréstimo é gênero do qual fazem parte o mútuo e o comodato.
Tratando -se de mútuo, o objeto é uma coisa fungível que deve ser de propriedade do mutuante, sendo o domínio de tal bem temporariamente transferido a outrem (mutuário). Nesse contrato há transferência da posse e propriedade, e por isso o mutuário suporta o ônus e riscos de eventual perecimento ou perda do objeto do contrato.
Para nosso estudo, o contrato de mútuo a ser analisado é o oneroso, também conhecido como feneratício. Essa modalidade contratual será vislumbrada todas as vezes que estivermos diante de um pacto com conteúdo econômico e for remunerado por juros. Será bancário, todas as vezes que o mutuante for uma instituição financeira ou bancária.

2.2. Tutela Legal.

Ao analisarmos o conceito de relação de consumo no início de nosso estudo, ficou evidenciado que somente teremos a incidência das normas Consumeiristas quando de um lado identificarmos a figura do consumidor e do outro a presença de um fornecedor de produtos e serviços.
Em se tratando de contrato de mútuo bancário, este será regido pelas regras inseridas código consumeirista, quando o mutuário puder ser enquadrado no conceito consumidor.
Relembra-se que há três doutrinas que se colocam a disposição do ordenamento jurídico na intenção de determinar quem será o destinatário final de um bem adquirido, e no âmbito do contrato de mútuo bancário, deverá ser analisado o caso concreto para determinação da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.
A guisa de exemplo suponha uma pessoa jurídica de pequeno porte que adquira de um banco um empréstimo para investir na compra de equipamentos que aumentarão sua produção. Para alguns, tal crédito será usado para fomentar a atividade fim da empresa e, portanto afastar-se-ia a existência de uma relação de consumo. Para outros, dada a vulnerabilidade da empresa diante da instituição bancária, haveria a presença do consumidor para atrair a aplicação das normas Consumeirista.
Importante ressaltar o fato de que caso não se veja presente os critérios para formação de uma relação de consumo, aplicar-se-ão as leis civis.
No âmbito do Código Civil, os dispositivos que cuidam de tutelar os contratos de mútuo encontram-se entre os artigos 579 a 592 do Código Civil de 2002, e prevêem duas espécies de empréstimos, quais sejam o comodato e o mútuo. O contrato de comodato caracteriza-se pelo empréstimo de coisas não fungíveis, de forma gratuita e se perfaz com a tradição do objeto. O mútuo, como já referido anteriormente, é o empréstimo de coisas fungíveis, como é o caso do dinheiro, no qual o mutuário (devedor) é obrigado a restituir ao mutuante (credor) o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade. Dessa forma, uma vez não caracterizada uma relação de consumo, incidirão as normas civis ao contrato de mutuo.
Já no Código de Defesa do Consumidor, o artigo 52 traz a tutela dos contratos ao consumidor que envolva outorga de crédito ou financiamento. Diz a norma que deve o fornecedor expor de forma prévia e adequada ao consumidor, o preço do produto ou serviço, o valor que será somado ao crédito periodicamente e ao final do contrato referente aos juros aplicados ao contrato, mostrando claramente ao consumidor qual valor terá o mutuário pago no término do contrato.
Frisa-se que com relação à multa de mora, a Lei 9.298/96 alterou o parágrafo primeiro do art. 52 e determinou que a sanção pelo inadimplemento não poderá ser superior a 2% do valor da prestação.
Importante deixar claro que se o consumidor, nesse contrato de outorga de crédito, pretender pagar o débito de forma antecipada, a instituição financeira deverá proceder ao abatimento do valor dos juros proporcionalmente a antecipação do pagamento.
Nesse contexto, nos contratos de mútuo bancário ao consumidor deverá a instituição financeira se voltar para todo o microssistema que envolve essa codificação, observando na formação deste contrato os princípios que norteiam as relações de consumo.










3. JUROS


3.1 - Conceito

Dada a disseminação da outorga de crédito no mercado de consumo e as facilidades que são oferecidas pelas instituições que figuram como mutuantes, tem-se esse bem como principal produto imaterial atualmente posto a venda.
O lucro das instituições financeiras advém da cobrança dos juros remuneratórios, espécie do gênero juros.
Plácido e Silva , ao conceituar o instituto diz que "Juros, no sentido atual, são tecnicamente os frutos do capital, ou seja, os justos proventos ou recompensas que deles se tiram, consoante permissão e determinação da própria lei, sejam resultantes de uma convenção ou exigíveis por faculdade inscrita em lei."
João Roberto Parizatto preleciona que o juro "pode ser conceituado como sendo o rendimento auferido pelo uso do dinheiro durante um determinado período, privando-se o credor de seu uso em tal período."
Dessa forma, podemos afirmar que juros são os frutos do dinheiro, sendo acessórios de uma obrigação principal.


3.2 - Das espécies de juros.

Os juros podem ser classificados de várias formas, a saber, compensatórios ou moratórios, convencionais ou legais, simples ou compostos. Serão convencionais os juros pactuados entre as partes e legais os determinados em lei. Serão simples os juros calculados apenas sobre o capital inicial, e compostos aqueles calculados sobre o capital inicial acrescidos de juros, também chamados de "juros sobre juros".
Os juros compensatórios, também conhecidos como juros remuneratórios, são os frutos do capital emprestado, ou seja, é o preço pago pela utilização do capital alheio.
Silvio Rodrigues define os juros remuneratórios como "(...) o fruto produzido pelo dinheiro, pois é como fruto civil que a doutrina o define. Ele a um tempo remunera o credor por ficar privado de seu capital e paga-lhe o risco em que incorre de os não receber de volta".
No mesmo sentido, ensina Silvio de Salva Venosa " Os juros (ou interesses) são, pois, uma obrigação acessória da dívida principal. Seguem a sorte desta. Deve ser lembrado que a relação de dependência dos juros surge quando do nascimento da dívida."
Afasta-se da noção de juros compensatórios a idéia de inadimplemento ou descumprimento de obrigação. Nesse diapasão, aquele que empresta determinada soma em dinheiro pode pactuar juros compensatórios com a intenção de ser remunerado pelo tempo em que teve o capital cedido indisponível.
Por juros moratórios deve-se entender aqueles que incidem sobre a obrigação principal quando esta não é cumprida na data ajustada entre as partes.
Para que incida juros moratórios é necessária a existência de uma obrigação vencida, e se fundam na demora em o devedor adimplir os valores com os quais se obrigou.
Nos contratos de mútuo bancário é possível que sejam pactuados juros remuneratórios e moratórios. A seguir proceder-se-á a análise da legislação que trata da limitação da taxa de juros.


3.3 - Dos limites legais das taxas de juros em contratos de mútuo bancário.

Pontes de Miranda ao tratar da limitação dos juros diz que:
" a estipulação e a percepção dos juros não são contra moral, nem contra o justo; ... Todavia, são contra a moral e depõem contra a própria organização social os juros excessivos.... Se a permissão de juros há de ser a regra, nem por isso há de o Estado permitir os juros extorsivos que levam a exploração do trabalho humano para ganância dos usuários".
O Código Civil de 1916 estabelecia uma limitação na taxa de juros moratórios e compensatórios, dizendo que se não fossem pactuados, seria cobrada uma taxa de 6% ao ano.
Posteriormente, a chamada Lei de Usura ( Decreto 22.626 de 1933), estabeleceu o mesmo índice para taxa de juros legais ( 6%) e determinou que os juros convencionais pudessem ser estabelecidos entre as partes até o limite de 12% ao ano.
A Constituição Federal de 1988, no parágrafo terceiro do art. 192, estabeleceu que as taxas de juros não poderiam ser superiores a 12% ao ano , remetendo a lei complementar para determinar qual seriam as punições em caso de cometimento de usura.
Em 2002, o Código Civil, na intenção de tutelar a questão, dispôs que a taxa de juros moratórios , não poderá exceder àquela que estiver em vigor para a mora do pagamento devidos aos impostos da Fazenda Pública. Já para os juros remuneratórios , estipulou a mesma taxa de juros acima referida, mas permitiu a capitalização anual.
Diante desse dispositivo, muito se discutiu se a taxa de juros que deveria ser aplicada era a SELIC . A interpretação mais acertada com relação a este dispositivo foi dada pelo Enunciado 20 do Centro de Estudos Judiciários , que remeteu a interpretação conjunta do artigo 406 do Código Civil de 2002, com o parágrafo primeiro do artigo 161 do Código Tributário Nacional, entendendo insegura a aplicação da taxa SELIC para estipular a cobrança de juros, permitindo que essa taxa fosse estipulada até 12% ao ano.
Em 2003, a Emenda Constitucional 40, revogou o parágrafo terceiro do art. 192 da Constituição Federal. Dessa forma, nas operações que envolvam cobrança de juros a taxa estabelecida pelo Código Civil deverá ser observada.
Porém, no que tange a cobrança de juros pelas instituições financeiras e bancárias, há que se ressaltar a existência de uma legislação específica que deverá ser aplicada para contratos onde estas forem mutuantes.
A lei 4.595/65 , que tem status de lei complementar e por isso suplanta o que dispõe a Constituição Federal no caput do art. 192, em seu art. 4, inciso IX estabelece que será o Conselho Monetário Nacional (CMN) quem limitará a taxa de juros dos serviços financeiros e bancários.
Dessa forma, as instituições financeiras e bancárias ficam submetidas à taxa de juros estipuladas pelo Banco Central do Brasil.
A súmula 596 do STF assim dispõe: "As disposições do Decreto 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional".
Essa liberdade em colocar no mercado taxas de juros aplicadas também aos contratos de mútuo bancário pelas instituições financeiras, contudo, vem sofrendo limitações no âmbito de nossos Tribunais.
O STJ, em recente julgado, tendo como relator o Ministro Sidney Benetti , sobre a abusividade de taxa de juros cobradas por instituição financeira assim decidiu:
Quanto aos juros, observa-se que o entendimento do Tribunal de origem está em consonância com a jurisprudência desta Corte, a qual decidiu na Segunda Seção, no julgamento do REsp 407.097/RS, Relator para o Acórdão Ministro ARI PARGENDLER, DJ 29.9.03, que o fato de as taxas pactuadas excederem o limite de 12% ao ano, por si, não implica abusividade; impõe-se sua redução, tão-somente, quando comprovado que discrepantes em relação à taxa de mercado após vencida a obrigação. A respeito, entre muitos, os seguintes julgados: REsp 537.113/RS, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ 20.9.04; AGREsp 565.262/RS, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJ 13.9.04. Incide a Súmula 83/STJ a inviabilizar o apelo (AgRg no Ag 135.461/RS, Rel. Min. ANTONIO DE PÁDUA RIBEIRO, DJU 18.8.97).
A vista destes julgados, fica evidente que o STJ liberou a cobrança de juros remuneratórios, tendo, porém a limitação subjetiva do patamar dos juros cobrados no mercado.
Fica, então, subtendido, que poderão as instituições bancárias praticar os juros remuneratórios que pactuarem com o consumidor no momento da formação do contrato de mútuo, sendo que é aberta a possibilidade ao mutuário que se sentir lesado discutir se essa taxa praticada é abusiva ou não.
O consumidor ficará submetido à subjetividade do julgador, que diante da análise do caso concreto declarará abusiva ou não a cobrança dos juros pactuados.
Importante ressaltar que se aplicando a regra da facilitação da defesa do consumidor em juízo, poderá o juiz determinar a inversão do ônus probatório, para que a instituição financeira prove que as taxas por ela cobradas não são abusivas, o que certa forma não é prova difícil de ser realizada, tendo em vista que a listagem das taxas de juros praticadas no mercado é documento facilmente obtido.
Dessa forma, verifica-se que a limitação legal da taxa de juros nos contratos de mútuo bancário inexiste em nosso sistema legal, sendo que ficará na subjetividade dos Tribunais a decisão, diante da análise do caso concreto, declarar se o consumidor está ou não sendo lesado.




3.4. Anatocismo

O anatocismo, ou como popularmente conhecido, a cobrança de "juros sobre juros" é vedada por nossa legislação. O art. 4º da Lei de Usura , afirma que é proibido contar juros sobre juros , sendo que esta previsão vem confirmada pela súmula 121 do STF que assim dispõe: " É vedada a capitalização de juros ainda que expressamente convencionada".
Dessa forma, as capitalizações de juros mensais e semestrais, quando não previstas em lei, são proibidas, inclusive para os contratos de mútuo bancário.
O Código Civil, no art. 591, prevê a possibilidade de capitalização de juros nos contratos de mútuo, quando feito anualmente, ao dispor que "Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual".
Importante salientar que sobre esta matéria pende discussão, tendo em vista a edição da Medida Provisória 2.170 de 23/08/2001, que prevê no art. 5 a possibilidade de capitalização dos juros para os contratos bancários, estabelecendo que " nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com peridiocidade inferior a um ano"
Ocorre que tal medida provisória atualmente está em discussão no STF, pois pende de julgamento uma ADIn que tem como relator o Min. Sydney Sanches, o que afasta atualmente a aplicação de tal dispositivo legal.







CONCLUSÃO

O consumidor, que nos contratos de mútuo bancário se submete à cobrança de juros, deve observar se o fornecedor do crédito está agindo de acordo com as práticas do mercado no momento de exigir o pagamento dos juros remuneratórios.
Primeiro importante passo é definir quem será considerado consumidor nos contratos de mútuo bancário, para que seja aplicada a legislação Consumeirista, garantindo ao mutuário os direitos básicos que lhe assistem.
Claro está na legislação que os juros de mora, aqueles que decorrem do inadimplemento, não podem ser superiores a 2% por definição legal claramente expressa do Código de Defesa do Consumidor.
Com relação aos juros remuneratórios, aqueles que advém do capital emprestado, a legislação que se aplica a estes contratos não é tão clara e remete a apreciação do Poder Judiciário que se coloca na tarefa de dizer se os juros cobrados no caso analisado são ou não superiores aos cobrados no mercado. Uma vez analisado o caso concreto, e verificada a abusividade na cobrança dos juros remuneratórios, possivelmente o consumidor terá seu contrato revisto.
Insta constar que as instituições financeiras não se submetem a Lei de Usura e caberá ao Conselho Monetário Nacional estabelecer as taxas que poderão ser cobradas a este título.
De outro lado, estão tais instituições proibidas de cobrar juros capitalizados em período inferior a um ano, sendo certo que só poderá haver esse tipo de cobrança caso seja editada lei que a autorize.
Dessa forma, o consumidor que se valha de um mútuo bancário, deverá estar atento às práticas de juros cobradas no mercado, para que possa discutir seu contrato caso esteja sendo lesado pelo mutuante.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.


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NUNES, Luiz Antônio Rizzato, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 4. Edição, Ed Saraiva: São Paulo. 2009.
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Autor: Fernanda Macedo


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