O GÊNERO CANÇÃO PARA A FORMAÇÃO DO LEITOR:



O GÊNERO CANÇÃO PARA A FORMAÇÃO DO LEITOR:
UMA ABORDAGEM TÓRICO- METODOLÓGICA COM PERSPECTIVAS DE MAPEAMENTO, DE ETAPAS E DE PROCESSOS

Anaclécia Maria Santos¹
RESUMO
O ensino na base dos gêneros visa desenvolver no sujeito a capacidade de atribuir significado aos conteúdos ensinados e estabelecer relações considerando diversos fatores: as características psicossociais, o grau de desenvolvimento intelectual, a aplicabilidade dos objetos de conhecimentos adquiridos e a capacidade de o aluno estabelecer relações entre o conteúdo ensinado às necessidades de seu cotidiano. A aplicação do gênero canção proporciona a esse sujeito a interiorização desses conteúdos. O sujeito é herdeiro de valores e práticas culturais que devem ser valorizadas em todo o processo de aprendizagem, pois contribui para o desenvolvimento de suas competências. Sabemos que a música é um gênero literário bastante rico e essa riqueza oportuniza ao professor utilizar-se de vertentes metodológicas que procuram especificar como os textos são dissecados, analisados. Podemos dizer que são realizações definidas por propriedades sociocomunicativas. Ou seja, um conjunto aberto e ilimitado de designações concretas, marcadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e função. São, na verdade, valiosas comunicações etnográficas.

INTRODUÇÃO

A educação de hoje tem se voltado para um novo foco: o desenvolvimento de competências por vários campos, podemos então dizer: capacidade de pensar, e as habilidades de observar, relacionar, estruturar, analisar, justificar, sintetizar, correlacionar, inferir, entre outras. O ensino por competências permeia esses campos do saber e tem o texto como objeto de ensino na base dos gêneros que nos leva a uma educação mais significativa.
A priori, nossa proposta é estimular, de forma clara e precisa, através da leitura de mundo, a possibilidade ao contato direto com os gêneros textuais, a saber: as fábulas - através dos personagens, de poesias, revistas, jornais, advinhas, literaturas de cordel, receitas, materiais recicláveis e da utilização de vários recursos práticos ao leitor para que ele mesmo possa construir outras possibilidades de leitura e uso desses gêneros durante o processo de sua formação.

¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¹Pedagoga, especialista em Teorias do Texto, especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica, Coordenadora e docente da pós-graduação em Psicopedagogia Clínica e Institucional na Faculdade Serigy, diretora e professora do Ensino Fundamental pela prefeitura de Itaporanga D?ajuda/SE.
Portanto, para facilitar a criação de linguagens alternativas na construção do saber dinâmico que privilegie a realidade do sujeito levando em conta o cotidiano de sua vida social, propomos o gênero canção numa abordagem teórica e metodológica com perspectiva de mapeamento, de etapas e de processos como alternativa e sugestão de novas abordagens de conteúdo e técnicas a serem empregados na prática docente.
É preciso lançar novos desafios que incentivem a aprendizagem com construção de sentido ? uma das razões deste trabalho. É no momento do lançamento desta proposta metodológica e, através das reflexões e do diagnóstico que esses desafios devem ser lançados, visando não somente a transmissão dos conteúdos, mas a construção do conhecimento numa interação com os textos empiricamente realizados.
Para estreitar esse processo entendemos que a tarefa do educador na formação do leitor não é apenas ensinar, mas facilitar a aprendizagem, gerar condições para que os alunos aprendam automaticamente, com situações cujo objeto funcione como ponte para a abertura do espírito crítico, e tirar proveito do que ele vê, observa e experiencia.
Existe um leque de atividades para se trabalhar esse gênero em sala de aula. Essas atividades oportunizam uma aprendizagem mais significativa uma vez que o sujeito se apropria de vários textos: poesias, sonetos, romances, história em quadrinhos e muitos outros. Essas propriedades discursivas oportunizam ao sujeito uma aprendizagem mais dinâmica, mais ativa e evidenciam os aspectos constitutivos da sociedade em que pertencem.

ENCONTRANDO SENTIDO NA LEITURA ATRAVÉS DO ENSINO NA BASE DOS GÊNEROS
No cotidiano, as pessoas normalmente fazem uso de uma infinidade de textos. No uso desses textos, fatos sociais são produzidos, é o que nos pontua Bazerman (2005, p. 21). Segundo ele "Os fatos sociais consistem em ações sociais significativas realizadas pela linguagem, ou atos de fala". E, todo enunciado reúne atos de fala.
A escola também utiliza esses atos de fala através de uma coleção de gêneros, sejam cartas, jornais, debate, entrevista, resumo, outdoor, quadro de avisos, revista científica e de informação, folder, canção, poema, soneto, romance, história em quadrinhos e muitos outros. No entanto, o professor deve catalogar todos os gêneros de que os alunos se utilizam em sala de aula e identificar as formas de escrita que eles devem enredar para assim definir as competências, desafios e formas de aprendizagem ofertadas por meio dos gêneros textuais. Mas, é necessário que compreendamos a forma e a circulação desses textos no sistema de gênero para que façamos o seu devido uso.
Um texto só pode ser interpretado se houver leitura. Adentrar no "universo dos gêneros discursivos" é necessário e indispensável, pois é parte primordial dos atos de fala, da perseverança em todo esse processo, da habilidade em aprender. O empenho do mestre nesse momento é preponderante. Ele precisa compreender os alunos com seus antecedentes sociais e culturais e, acima de tudo, mostrar interesse pela leitura de cada um, animando-os a continuar com seus próprios esforços.

A leitura é um ato solitário, depende da vontade de um eu e de sua capacidade de posicionar-se diante do discurso do outro. Mas, se ela ocorre na escola, o professor pode atuar como um mediador, comentando aspectos da organização do discurso e transmitindo informações que possam auxiliar o aluno a enveredar por esse intrincado mundo de letras. (MICHELETTI, 2001, p.17)


É a partir daí que se inicia a construção do real, pois à medida que o leitor lê a palavra escrita, ele conduz-se à interpretação de mundo. E essa interpretação é muito importante para ele como sujeito do processo ensino-aprendizagem. Partindo desse discurso, entendemos que a leitura é um ato interativo e de compreensão de mundo.
Também sabemos que a atividade de leitura é complexa e envolve diversos aspectos que se articulam e se relacionam de forma intrínseca.
Smith (1999, p.20), em seu livro Leitura significativa, nos apresenta outras informações que são necessárias à leitura:
? Compreensão da linguagem relevante;
? Conhecimento do assunto;
? Habilidade em relação à leitura.

Essas informações nos permitem afirmar que a constituição da proficiência leitora dos alunos envolve trabalhar com alguns aspectos: os comportamentos leitores, as habilidades de leitura e os procedimentos de leitura. Todos esses aspectos devem ser mobilizados de maneira articulada, pois estão presentes nas práticas de leitura das quais ele participa.

Para que essa proposta se realize da melhor forma possível, é preciso planejar as aulas garantindo os materiais necessários, possíveis intervenções e parcerias afinadas com os alunos através de:

Ø Discussões sobre textos trabalhados em sala de aula;
Ø Discussão e análise de letras de música;
Ø A apropriação dos mais variados gêneros como poesias, parlendas, músicas, histórias em quadrinhos, fábulas, textos publicitários e outros;
Ø Trabalhar as informações contidas nos textos, principalmente os jingles onde a música está presente.

Mas é necessário também apresentar instrumentos textuais que contemplem assuntos diversos e uma variedade de gêneros presentes nas situações do dia a dia, os quais gostaríamos de destacar: tirinha, receita, culinária, placa, letreiro, poema, quadrinha, depoimento, notícia, capas de livros e revistas, anúncios, classificados, bilhete, carta, carteira de identidade, gráfico, horóscopo, e, finalmente, letra de música.
Essas diretrizes possibilitam o pensamento autônomo e crítico do sujeito a que se destina, uma vez que trabalhar com essa diversidade de gêneros como qualquer ato de fala nos leva a "codificação de propriedades discursivas" (Todorov, 1980 p.51,); também propicia o desenvolvimento de sua capacidade de defender ou contrapor idéias, de expor e discutir assuntos de seu interesse e vivência. Portanto, pode-se dizer que esses atos de fala também propõem atividades que corroboram o desenvolvimento da oralidade.
Segundo Bakhtin (p. 283, 1999): "A língua penetra na vida dos enunciados concretos que a realizam, e é também através dos enunciados concretos que a vida penetra na língua."
Para dar mais ênfase a esse processo, entendemos que o estudo na base dos gêneros propicia uma aprendizagem com construção de sentido voltada à importância da memória para facilitar esse momento de aprendizagem de acordo com a especificidade de cada situação de leitura. É esse momento, que o leitor se apropria dos gêneros e amplia seu universo de discurso, além de multiplicar sua visão de mundo. A leitura poderá também conduzir o interlocutor a uma disciplina pessoal, levando-o a conhecer e a transformar esse mundo.
Todo interlocutor torna-se leitor quando é engajado em situações nas quais a linguagem escrita é usada de forma precisa. São muitas as informações contidas em um texto, portanto, cabe ao interlocutor inter-relacionar essas informações e produzir coerência. Tanto as práticas sociais de linguagem como a intuição linguística facilitam esse processo.
Aproximamo-nos da cultura letrada quando lemos. Também nos tornamos mais informados de tudo o que acontece ao nosso redor e no mundo, quando exercitamos essa atividade. É assim que nos aproximamos das tecnologias, numa esfera de comunicação e informação. E, os gêneros em sua diversidade nos possibilitam o desenvolvimento das competências e habilidades.

O GÊNERO CANÇÃO NA FORMAÇÃO DO LEITOR
Ao longo da história a música vem exercendo um valoroso papel no desenvolvimento do ser humano em seus diferentes aspectos, contribuindo, sobremaneira, para a aquisição de costumes e valores essenciais ao exercício da cidadania.
A música está presente em todo o contexto escolar. De há muito se tem observado nas práticas escolares o uso do gênero canção, só que não como um gênero ? quiçá não se conhecesse o uso desta nomenclatura e suas preciosas facetas, mas atuando de forma efetiva e educativa através do contato prazeroso com ele. Esse contexto levou-nos a refletir sobre essa prática e sua complexidade dentro do âmbito escolar.
Loureiro (apud Jaeder, 2003 p.35,) afirma que segundo o filósofo Pitágoras, "a música pode introduzir no espírito do ser humano o sentido de ritmo e harmonia". Já para Platão a educação musical é observada como pré-requisito ao conhecimento filosófico. Por essa razão, "ele reconhece a primazia da música sobre as outras artes, uma vez que, a seu ver, são o ritmo e a harmonia os que mais fundo penetram no íntimo da alma, e os que dela se apoderam com mais força.
No traçar das entrelinhas, foi possível construir uma ponte entre os textos ? letras de música e a canção. Seria um olhar sobre a oralidade e a canção segundo Dionísio (apud Tatti, 2002):
Uma canção é uma fala camuflada em maior e menor grau. Essa camuflagem consiste na transformação dos contornos entonacionais da fala [...] Pois se cada falante fala de modo diferente, imprimindo uma gestualidade singular ao texto falado, a canção estabelece uma determinação do modo de vocalização desse texto.
Portanto, propomos a redefinição da formação do leitor através da intervenção do gênero canção, considerando a expressão espontânea e verdadeira do sujeito. Intenciona-se alcançar de forma ampla os proponentes desse tipo de gênero com as múltiplas implicações das perspectivas teóricas e metodológicas as quais abordaremos mais adiante.
Importa enfocar aqui que não se trata de uma "educação musical", ou o estudo da música propriamente dita, com canto orfeônico, leitura de partituras, com feição conservatorial, vinculada a arte-educação, mas à junção da música com a literatura, não necessariamente o "fazer musical", mas como a diversidade de gênero literário, prioritariamente o gênero canção pode contribuir para a formação do leitor. Vale ressaltar quais as suas facetas e como este tipo de gênero se relaciona com os textos escritos.
A explanação se fará à luz do reconhecimento discursivo do gênero canção mediante uma abordagem significativa arrazoando a primazia interdiscursiva. Nesse contexto, surge uma "nova forma de formar leitores, que coloca como palavra de ordem, criar, experimentar e também o livre expressar. O estudo com esse gênero intenciona a facilitação da introspecção de si mesmo, contribuindo para uma inter-relação harmoniosa entre o sujeito e o conhecimento.
Mas por que tanta ênfase no ensino/estudo do gênero canção, especificamente? No primeiro momento podemos afirmar que os gêneros são o centro da própria linguagem do discurso e fazem parte das estruturas sociais. O gênero canção oportuniza ao sujeito uma aprendizagem mais significativa. Por isso, enfatizamos a utilização desse tipo de gênero na formação do leitor.
Segundo Meurer (2000 p. 149,):

A pesquisa e o estudo baseados em estudos de gêneros textuais poderão estimular o estudo da língua a se transformar em um contexto destinado ao levantamento das muitas maneiras de manifestações orais e escritas [...] Uma outra razão importante para abordagens calcadas em estudos de gêneros textuais é a potencialidade que esta área de estudos oferece para que a pesquisa e a prática pedagógica possam ir além das regularidades típicas dos gêneros, permitindo explorar também regularidades nas esferas sociais onde os gêneros são utilizados.

Ainda podemos adicionar que o respeito à liberdade de expressão do sujeito e a consciência de que a prática de ensino baseado nesses fenômenos discursivos é propícia, pois sendo um objeto de conhecimento deveremos considerar os caminhos pelos quais ele percorre na busca da ampliação de seu espaço, sob a ótica de sua tripla competência: a verbal, a musical e a litero-musical.
Por isso compreendemos que o estudo na base dos gêneros com ênfase na canção viabiliza essas relações de sentido, incita o sujeito a melhor explorar, experimentar, indagar, questionar e relacionar-se com o ambiente através dos diversos textos com os quais ele tem acesso. Também pressupõe uma reflexão sobre as instâncias que marcam a leitura de um texto a partir de sua forma e conteúdo. Não só por seu conteúdo e estilo, mas por toda a complexidade que envolve um repertório de gêneros do discurso.
Desta forma, em termos bakhtinianos, um gênero pode ser assim caracterizado segundo Koch (apud Bakhtin, 2002 p. 53,):

? São tipos relativamente estáveis de enunciados presentes em cada esfera de troca: os gêneros possuem uma forma de composição, um plano composicional;
? Além do plano composicional, distinguem-se pelo conteúdo temático e pelo estilo;
? Trata-se de entidades escolhidas tendo em vista as esferas de necessidade temática, o conjunto dos participantes e a vontade enunciativa ou intenção do locutor.

Em se tratando de necessidade temática, o foco aqui seria o gênero canção, elemento central de uma atividade humana: o sujeito, a ação, o instrumento. Analisemos então que o sujeito seria o enunciador, ou seja, o agente discursivo desta atividade humana, com o auxílio de um instrumento semiótico ? o gênero canção. Segundo Koch (2002 p. 53,), "a escolha do gênero se dá em função dos parâmetros da situação que guiam a ação e estabelecem a relação meio-fim que é a estrutura básica de uma atividade humana."
A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas e a língua escrita é marcada por eles. Trabalhá-los em sala de aula é uma forma dinâmica de formar leitores. Os novos referenciais nacionais (PCN de Língua Portuguesa) fazem indicação dos gêneros como objeto de grande importância dentro do domínio da linguagem oral.
Sempre que se ensina a ler e a escrever, automaticamente inserem-se os mais variados tipos de gênero discursivos. No dizer de Brandão (2003), o discurso se materializa e se manifesta linguisticamente sob a forma de texto. É por meio do texto que se pode entender o funcionamento do discurso.
Utilizar os gêneros do discurso é essencial para a aprendizagem, razão por que resolvemos explanar, através desta pesquisa, seu trabalho no processo de leitura, pois a necessidade de desenvolver a capacidade de compreender textos orais e escritos, de assumir a palavra e produzir textos é constante em nossos dias. Daí a necessidade de um estudo mais minucioso que possibilite uma melhor compreensão dos textos. Essa compreensão se dará através da utilização de diversos textos que deverão empiricamente permear toda a atividade em que o sujeito está envolvido.
Cumpre salientar que o gênero canção deve estar inserido em todo esse processo. A música, entretanto favorece a apropriação dos conteúdos propostos, levando o sujeito à exteriorização de tudo o que o ele tenha assimilado. Bakhtin (1992), também insiste na importância dos gêneros do discurso quando diz que se eles não existissem e se não tivéssemos o seu domínio, a troca verbal seria quase impossível.
O Gênero canção é farto de elementos que se pode trabalhar para que o sujeito tenha uma aprendizagem mais significativa e assimile melhor os conteúdos: o ritmo ? ao ouvirmos uma melodia, observamos sua composição pelo ritmo que lhe é dado pela alternância de sílabas acentuadas; a rima ? um recurso musical baseado na semelhança sonora de palavras no final de versos (rima externa) e, às vezes, no interior de versos (rima interna). A rima, no entanto é o que mais chama a atenção do leitor. Observe-se, então, a incidência de rimas que o compositor Chico Buarque, explora na canção "Quando o carnaval chegar".



Além dessa análise, explorar a ortografia: o emprego do m ou n, o emprego da vírgula, trabalhar os verbos sambar, chegar, falar, e como esses verbos estão inseridos na canção (ando, endo e indo ? gerúndio).
Além do ritmo e da rima pode-se explorar os recursos sonoros: a aliteração (repetição constante de um mesmo som consonantal); a assonância (repetição constante de um mesmo fonema vocálico); a paronomásia (o emprego de palavras semelhantes na forma ou no som, mas de sentidos diferentes, próximas umas das outras, vejamos um exemplo:


A repetição de palavras ou estruturas sintáticas maiores (frases, orações, etc.) que se correspondem quanto ao sentido chama-se paralelismo é o que iremos observar na canção "Sem fantasia", de Chico Buarque:


A canção nesse contexto não deve ser trabalhada de forma aleatória, sem sentido. É necessário uma dinâmica diferenciada, é preciso ir mais além, pois ela integra diversos procedimentos que possibilitam uma conexão entre a expressão dos sentimentos e a assimilação do conteúdo ensinado ? a exemplo disso, o uso da canção pelos professores de ciências exatas. Utilizar o gênero canção na troca de conhecimentos em sala de aula é uma das diversas formas de ensinar ao sujeito que tem muitas formas de aprender.

Existem diversas formas de explorar a canção em sala de aula, gostaríamos de destacar também as relações binárias, isto é, os pares de elementos que se aproximam ou se opõem e que podemos identificar na composição da canção "Dois Rios" que se encontra no CD Cosmotron, do grupo Skank:


Essa estrofe apresenta algumas relações binárias, elementos que estão em oposição ? "Céu está no chão, céu não Cai do alto; é o claro, é o escuro". Mas o que ou quem a expressão "Dois rios" representa? A relação existente entre os dois rios pode ser compreendida como céu e chão, claro e escuridão.
Por fim, ouvir música é uma experiência profundamente pessoal. O ouvido como meio receptor deve sempre estar conectado com a voz que é o único meio expressivo, pois este instrumento depende do ouvido, é o que nos afirma Loureiro (2003). Trabalhar esses dois elementos é de essencial importância, pois desenvolve o senso da entonação. É no cantar, no ouvir o som agradável aos ouvidos, na expressão do corpo e dos sentimentos que o indivíduo descobre que ele é único.
Segundo Loureiro (apud Kater 2003): "a musicalização visa, através da vivência e compreensão da linguagem musical, sua organicidade e articulações, abrir canais sensoriais, facilitando a expressão de emoções e consolidando a formação da personalidade."
Ao finalizar o trabalho, faz-se necessário enfatizar a premência de se construir uma ponte entre a escola e a realidade externa. Diante das profundas exigências do mundo contemporâneo, a demanda pela leitura e pelo domínio da língua escrita torna-se cada vez maior, o que exige uma reflexão acerca do papel da escola e dos professores e da ressignificação do uso dos gêneros do discurso em todas as esferas do âmbito escolar.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Formar leitores é colocar em funcionamento um comportamento atuante, diligente e vigilante, de construção inteligente de significado. Embora as estratégias cognitivas da leitura não possam ser modeladas, podemos, mediante o ensino por meio dos gêneros, promover situações de leitura que propiciem ao leitor desenvolver as suas potencialidades. A leitura exige habilidade com linguagem, habilidade em aprender.
É preciso lançar novos desafios que incentivem a aprendizagem como construção de sentido ? uma das razões deste trabalho. É no momento do lançamento dessa proposta metodológica e, através das reflexões e do diagnóstico que esses desafios devem ser lançados, visando não somente a transmissão dos conteúdos, mas a construção do conhecimento por meio do ensino na base dos gêneros.
Por essa razão, um professor que tem competência para ensinar, não utiliza apenas uma forma para verificar a aprendizagem de seus alunos. Compete a esse educador, fazer uso dos mais variados meios que incitem no discente a capacidade de construir conhecimentos, bem como o desenvolvimento de suas habilidades e competências. Entendemos que os gêneros textuais facilitam esse processo.
As exigências cada vez maiores do mercado de trabalho, as inovações tecnológicas e as crescentes influências da televisão e da imprensa levaram as formas de aprender e sentir a se modificarem, sinalizando uma revolução profunda nas concepções sobre as práticas pedagógicas. Cada vez mais a escola deve voltar-se para a sociedade, ser uma estimuladora da produção de conhecimento, promovendo a formação de leitores e produtores de textos competentes. Capazes de selecionar as informações e analisá-las na construção de uma sociedade mais justa.
Conclui-se, portanto, que o processo de formação do leitor, desenvolvido de forma dinâmica, interativa e reflexiva, baseado no ensino dos gêneros textuais com ênfase no gênero canção leva o sujeito ao prazer da busca do conhecimento, incentiva a organização de idéias e favorece a criatividade. Através do livre expressar, ele estabelece inferência, estratégias que são invocadas na prática da leitura por meio dos gêneros. Essa inferência advém da verificação da identidade discursiva do gênero canção a partir de uma abordagem que leva em consideração o primado do interdiscurso.

REFERÊNCIAS

BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso: problemática e definição. In: Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Gêneros do discurso e as formas de textualização. In: SANTANA NETO, João Antônio, MACÊDO, Joselice e ROCHA, Maria José. Discursos em análise. Salvador: UCSal, 2003. Pags 35-51.
BAZERMAN, Charles. Atos de fala, gêneros textuais e sistemas de atividades: como os textos organizam atividades e pessoas. In: DIONÍSIO, Ângela Paiva e HOFFNAGEL, Judith Chambliss (org). Gêneros textuais, tipificação e interação. São Paulo: Cortez, 2005. Pag.19-46.
BRASIL, Ministério da educação. Guia do PNLA 2010: Língua portuguesa e matemática ? Ministério da educação continuada, alfabetização e diversidade, 2010.
DIONÍSIO, Ângela Paiva et alii. Gêneros textuais e ensino. Rio: Lucerna, 2002.
KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Capítulo IV ? Os gêneros e tipos de discurso: considerações psicológicas e ontogênéticas. In: ROJO, Rxane e CORDEIRO, Gales. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas, São Paulo: Mercado de Letras, 2004. pags. 21-38.
MICHELETTI, Guaraciaba. Leitura e construção do real: o lugar da poesia e da ficção/ MICHELETTI, G., PERES, L. P. F., Gebara, A. E. L. ? 2. ed. São Paulo: Cortez. 2001. (Coleção aprender e ensinar com textos).
LOUREIRO, Alícia Maria Almeida. O ensino de música na escola fundamental. São Paulo: Papirus, 2003. ? (Coleção Papirus Educação)
MEURER, José Luiz. Uma dimensão crítica do estudo de gêneros. In: MEURER, José Luiz e MOTTA-ROTH, Desirée. Gêneros textuais e práticas discursivas: subsidies para o ensino da linguagem. Bauru, SP: EDUSC, 2002. PAGS. 17-29.
PCN?S - BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1997.
SMITH, Frank. Leitura significativa. 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.
TODOROV, Tzvetan. Os gêneros do discurso. São Paulo: Martins Fontes, 1980.


ANEXOS
Quando o Carnaval Chegar
Chico Buarque

Quem me vê sempre parado,
Distante garante que eu não sei sambar...
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu tô só vendo, sabendo,
Sentindo, escutando e não posso falar...
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu vejo as pernas de louça
Da moça que passa e não posso pegar...
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Há quanto tempo desejo seu beijo
Molhado de maracujá...
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
E quem me ofende, humilhando, pisando,
Pensando que eu vou aturar...
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
E quem me vê apanhando da vida,
Duvida que eu vá revidar...
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu vejo a barra do dia surgindo,
Pedindo pra gente cantar...
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu tenho tanta alegria, adiada,
Abafada, quem dera gritar...
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar...


Sem Fantasia
Chico Buarque
Composição: Chico Buarque

Vem, meu menino vadio
Vem, sem mentir pra você
Vem, mas vem sem fantasia
Que da noite pro dia
Você não vai crescer
Vem, por favor não evites
Meu amor, meus convites
Minha dor, meus apelos
Vou te envolver nos cabelos
Vem perde-te em meus braços
Pelo amor de Deus
Vem que eu te quero fraco
Vem que eu te quero tolo
Vem que eu te quero todo meu
Ah, eu quero te dizer
Que o instante de te ver
Custou tanto penar
Não vou me arrepender
Só vim te convencer
Que eu vim pra não morrer

Trocando em Miúdos
Chico Buarque
Composição: Chico Buarque & Francis Hime

Eu vou lhe deixar a medida do Bonfim
Não me valeu
Mas fico com o disco do Pixinguinha, sim!
O resto é seu
Trocando em miúdos, pode guardar
As sobras de tudo que chamam lar
As sombras de tudo que fomos nós
As marcas de amor nos nossos lençóis
As nossas melhores lembranças
Aquela esperança de tudo se ajeitar
Pode esquecer
Aquela aliança, você pode empenhar
Ou derreter
Mas devo dizer que não vou lhe dar
O enorme prazer de me ver chorar
Nem vou lhe cobrar pelo seu estrago
Meu peito tão dilacerado
Aliás
Aceite uma ajuda do seu futuro amor
Pro aluguel
Devolva o Neruda que você me tomou
E nunca leu
Eu bato o portão sem fazer alarde
Eu levo a carteira de identidade
Uma saideira, muita saudade
E a leve impressão de que já vou tarde.

De tanto te esperar
Eu quero te contar
Das chuvas que apanhei
Das noites que varei
No escuro a te buscar
Eu quero te mostrar
As marcas que ganhei
Nas lutas contra o rei
Nas discussões com Deus
E agora que cheguei
Eu quero a recompensa
Eu quero a prenda imensa
Dos carinhos teus


Dois Rios
Skank

Composição: (samuel Rosa - Lô Borges - Nando Reis)
O céu está no chão
O céu não cai do alto
É o claro, é a escuridão
O céu que toca o chão
E o céu que vai no alto
Dois lados deram as mãos
Como eu fiz também
Só pra poder conhecer
O que a voz da vida vem dizer
Que os braços sentem
E os olhos vêem
Que os lábios sejam
Dois rios inteiros
Sem direção
O sol é o pé e a mão
O sol é a mãe e o pai
Dissolve a escuridão
O sol se põe se vai
E após se pôr
O sol renasce no Japão
Eu vi também
Só pra poder entender
Na voz a vida ouvi dizer
Que os braços sentem
E os olhos vêem
E os lábios beijam
Dois rios inteiros
Sem direção
E o meu lugar é esse
Ao lado seu, meu corpo inteiro
Dou o meu lugar pois o seu lugar
É o meu amor primeiro
O dia e a noite as quatro estações
Que os braços sentem
E os olhos vêem
E os lábios Sejam
Dois rios inteiros
Sem direção
O céu está no chão
O céu não cai do alto
É o claro, é a escuridão
O céu que toca o chão
E o céu que vai no alto
Dois lados deram as mãos
Como eu fiz também
Só pra poder conhecer
O que a voz da vida vem dizer
Que os braços sentem
E os olhos vêem
E os lábios beijam
Dois rios inteiros
Sem direção
E o meu lugar é esse
Ao lado seu, no corpo inteiro
Dou o meu lugar pois o seu lugar
É o meu amor primeiro
O dia e a noite as quatro estações
Que os braços sentem
E os olhos vêem
Que os lábios sejam
Dois rios inteiros
Sem direção
Que os braços sentem
E os olhos vêem
E os lábios beijam
Dois rios inteiros
Sem direção


Autor: Anaclécia Maria Santos


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