CRIME DE PRECONCEITO DE RAÇA E DE COR



CRIME DE PRECONCEITO DE RAÇA E DE COR

FRANCISCO TORRES SARAIVA*

RESUMO
Foca-se na abordagem do crime de preconceito de raça e cor, se fazendo uma análise da temática à luz da legislação. Portanto o preconceito diz respeito uma atitude muito subjetiva do indivíduo. Um estudo voltado para compreensão e desdobramento do instituto no ordenamento jurídico brasileiro.
Palavras Chave: Preconceito - Raça - Cor.

1. INTRODUÇÃO

No estudo em tela será tratado um assunto relevante para discussão e debate no ordenamento jurídico pátrio. Abordar-se-á aspectos relacionados à Lei de nº 7.716/89, que de forma mais ampla enfoca os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

2. ENTENDENDO O INSTITUTO JURÍDICO

Para o direito penal brasileiro, a prática da discriminação e do preconceito por raça, etnia, cor, religião ou procedência nacional consiste em um delito previsto na lei 7.716/89, alterada pela lei 9.459/97. As referidas legislações foram promulgadas em consonância com o Art. 5º, inciso XLI, que estabeleceu, em foro Constitucional, a prática do racismo como crime inafiançável e im¬prescritível, sujeito à pena de reclusão.
A lei 9.459, de 13.05.1997, corrigiu a Lei 7.716, de 15.01.1989, modificando os arts. 1º e 20º, e revogando o art. 1º da Lei 8.081 e a Lei 8.882, de 03.06.1994. Além de punir, com penas de até cinco anos de reclusão, e multas, os cri¬mes resultantes de discriminação ou precon¬ceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência na¬cional, introduziu no Art.140 do Código Penal o parágrafo terceiro, tipificando a injúria com utilização de elementos relacionados à raça, cor, etnia, religião ou origem, com penas de reclusão de um a três anos, mais multas.
*Acadêmico de Direito do sexto período da Faculdade São Luís.


Sobre o preconceito cita-se:
O termo preconceito denota, desde logo, no radical pré, algo que precede, que é e que, portanto, significa um conhecimento sumário,superficial, sem profundidade. Assim, o preconceito racial, sentimento de aversão por indivíduos de raça diversa, sem justificação consciente. (MARCOS ACQUAVIVA, 2008, p.647).


2.1. RACISMO E DISCRIMINAÇÃO OU PRECONCEITO RACIAL ? A INTOLERÂNCIA RACIAL.

É muito comum se estabelecer confusão entre racismo e discriminação ou preconceito racial.
O termo racismo geralmente expressa o conjunto de teorias e crenças que estabelecem uma hierarquia entre as raças, entre as etnias, ou ainda uma atitude de hostilidade em relação a determinadas categorias de pessoas. Pode ser classificado como um fenômeno cultural, praticamente inseparável da história humana.
A discriminação racial, por seu turno, expressa a quebra do princípio da igualdade, como distinção, exclusão, restrição ou preferências, motivado por raça, cor, sexo, idade, trabalho, credo religioso ou convicções políticas.
Já o preconceito racial indica opinião ou sentimento, quer favorável quer desfavorável, concebido sem exame crítico, ou ainda a atitude, sentimento ou parecer insensato, assumido em conseqüência da generalização apressada de uma experiência pessoal ou imposta pelo meio, conduzindo geralmente à intolerância.
Portanto, em regra, o racismo ou o preconceito racial é que levam à discriminação e à intolerância racial.
E nesse aspecto, existe uma preocupação mundial no combate ao racismo e à intolerância racial, que se manifesta através da realização de múltiplos eventos, nacionais e internacionais, com a participação de entidades governamentais e não governamentais, buscando a união dos povos contra toda forma de racismo, intolerância e discriminação, não apenas como caminho de preservação e respeito aos direitos humanos mais básicos, mas também como medida de minimização e erradicação de revoltas, guerras e conflitos sociais.
A Organização das Nações Unidas realizou uma Conferência Mundial contra o racismo, na África do Sul, nos meses de julho e agosto de 2001, com a presença de líderes governamentais, organizações internacionais e intergovernamentais, organizações não-governamentais (ONGs), entre outras. Na oportunidade, Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda e Alta-comissária da ONU para Direitos Humanos, no dia primeiro de maio, ao conversar com membros da Comissão Preparatória, em Genebra, a respeito de suas metas e perspectivas para a Conferência Mundial, observou:

"Esta Conferência Mundial tem potencial para estar entre os mais significativos encontros do início deste século. Pode ser mais: A conferência pode dar forma e simbolizar o espírito do novo século, baseada na mútua convicção de que nós todos somos membros de uma família humana. O desafio está em fazer desta Conferência um marco na guerra para erradicar todas as formas de racismo. As persistentes desigualdades, no que diz respeito aos direitos humanos mais básicos, não são apenas erradas em si, é também a principal causa de revoltas e conflitos sociais. Pesquisas de opinião em vários países mostram que tema ligado à discriminação racial, xenofobia e outras formas de intolerância predominam entre as preocupações públicas hoje. Há uma grande responsabilidade moral de todos os participantes em fazer com que esta Conferência tenha êxito. Depende apenas de todos nós assegurarmos que tiraremos proveito desta oportunidade e que produziremos um resultado prático, com uma ação orientada, que responda a estas preocupações. Nós devemos isto especialmente às gerações mais jovens, que correm o risco de crescer num mundo cuja população aumenta num ritmo sem precedentes."

Observou, ainda, Mary Robinson, que "o nome desta Conferência Mundial abarca outras formas de racismo e preconceito em nosso mundo moderno, como a xenofobia em todas as suas manifestações; como o anti-semitismo; a negrophobia; a discriminação contra povos indígenas, migrantes, refugiados, outros povos deslocados de suas localidades de origem e as comunidades minoritárias, tais como Roma e Sinti. Há ainda numerosos exemplos de discriminação com base na religião ou status social."

Observa-se, que a questão da discriminação e intolerância racial é tão antiga, quanto à própria vida do homem em sociedade. Constata-se, portanto, que o racismo, a discriminação, o preconceito e a intolerância racial são fenômenos antigos e mundiais, não restritos apenas a países ou regiões do globo, apresentando implicações transnacionais e intertemporais de acentuada importância, principalmente como agentes catalisadores de inúmeros conflitos e guerras, que tanto sofrimento e desespero têm propiciado à população mundial.



3. RAÇA, COR, ETNIA, RELIGIÃO E PROCEDÊNCIA NACIONAL ? A LEI Nº 7.716/89.

No Brasil, o primeiro diploma a cuidar especificamente do preconceito e da discriminação racial foi a Lei nº 1.390, de 3 de julho de 1951, denominada Lei Afonso Arinos, de autoria do então deputado federal pelo estado de Minas Gerais, Afonso Arinos de Melo Franco.
A ela se seguiu a Lei nº 7.716, de 15 de janeiro de 1989, até hoje em vigor, que foi modificada pela Lei nº 9.459, de 13 de maio de 1997, que alargou significativamente seu alcance, apontando expressamente a discriminação e acrescendo os crimes resultantes de preconceito ou discriminação de etnia, religião ou procedência nacional.
A referida Lei nº 7.716/89, no art. 1º, estabelece punição aos crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, sem, entretanto, esclarecer os precisos contornos de cada uma dessas expressões.
Raça pode ser definida como cada um dos grupos em que se subdividem algumas espécies animais (no caso específico da lei ? o homem), e cujos caracteres diferenciais se conservam através das gerações (Ex.: raça branca, amarela, negra).
Cor indica a coloração da pele em geral (branca, preta, vermelha, amarela, parda).
Etnia significa coletividade de indivíduos que se diferencia por sua especificidade sociocultural, refletida principalmente na língua, religião e maneiras de agir. Há quem inclua fatores de natureza política no conceito de etnia (Ex.: índios, árabes, judeus etc.).
Religião é a crença ou culto praticado por um grupo social, ou ainda a manifestação de crença por meio de doutrinas e rituais próprios (Ex.: católica, protestante, espírita, muçulmana, islamita etc.).
Procedência nacional significa o lugar de origem da pessoa; a nação da qual provém; o local do qual procede ao indivíduo (Ex. italiano, japonês, português, árabe, etc.), incluindo, a nosso ver, a procedência interna do país (Ex.: nordestino, baiano, cearense, carioca, gaúcho, mineiro, paulista etc.).



3. INJÚRIA POR PRECONCEITO.

A injúria por preconceito, também chamada de injúria racial, foi acrescentada ao Código Penal pela Lei nº 9.459, de 13 de maio de 1997, consistindo na utilização de elementos referentes à raça, cor etnia, religião ou origem, para ofender a honra subjetiva (auto-estima) da vítima. Vem prevista no art. 140, § 3º, do Código Penal, cominando pena de 1 a 3 anos de reclusão, e multa.
Portanto, não há que se confundir, como freqüentemente ocorre, o crime de racismo (previsto pela Lei nº 7.716/89), com o crime de injúria por preconceito. O primeiro resulta de discriminação, de preconceito racial, implicando em segregação, impedimento de acesso, recusa de atendimento etc., a alguém. O segundo é crime contra a honra, agindo o sujeito ativo com animus injuriandi vel diffamandi, elegendo como forma de execução do crime justamente a utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem da vítima. Cita-se jurisprudência:

"A utilização de palavras depreciativas referentes à raça, cor, religião ou origem, com o intuito de ofender a honra subjetiva da pessoa, caracteriza o crime previsto no § 3º do art. 140 do CP, ou seja, injúria qualificada, e não o crime previsto no art. 20 da Lei nº 7.716/89, que trata dos crimes de preconceito de raça ou de cor." (TJSP ? RT 752/594).

4. CONCLUSÃO

Percebe-se claramente que ainda convivemos com a problemática do preconceito e discriminação, não somente no que diz respeito o que está positivado no ordenamento jurídico pátrio.Essa questão em tela é bastante ampla e atinge muitos outros aspectos da vida. Faz necessário trabalhar no âmbito da educação de base e mudar essa realidade tão presente no nosso dia a dia.Precisamos mostrar e preparar novas gerações para conviver com as diversidades e inculcar em suas mentes que todos somos descendentes de uma só raça, e somos meros mortais. Nota-se perfeitamente que à lei contribui de maneira relevante, no entanto há necessidade de se trabalhar questões axiológicas e desmitificar muitos mitos e lendas impreguinadas na mente de um povo, que muitas das vezes se auto descriminam e não consegue se aceitar a si mesmo como grupo ou indivíduo. Estamos em um Estado Democrático de Direito, e, portanto é inadmissível verificar o comportamento de muitos indivíduos de forma preconceituosa e discriminadora.


REFERÊNCIAS

ACQUAVIVA, Marcos Cláudio. Dicionário Jurídico Acquaviva. São Paulo: Rideel.

ANDREUCCI, Ricardo Antônio. Breves considerações sobre o racismo e intolerância racial. Disponível em:.Acesso em 01.06.2010.

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Senado Federal, Brasília: 2007.


Autor: Francisco Torres Saraiva


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