Interrogatório On-line



FACULDADES JORGE AMADO CURSO DE DIREITO

Edson Braga Junior
Indira Shiva Reis
Luana Barbosa
Moises Ramos Junior

Interrogatório On-Line

Salvador 2007

 

FACULDADES JORGE AMADO CURSO DE DIREITO

Interrogatório On-Line

Trabalho realizado por alunos do oitavo semestre do Curso de Direito, na matéria de Prática Jurídica II, com orientação do Prof. Mauricio Freire.

Salvador

2007



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I –Introdução

O mundo nunca parou de se desenvolver, principalmente depois da Revolução Industrial. Dentre as invenções históricas, existem algumas que se destacaram devido a sua maior importância para a sociedade: a roda, a luz, o telefone, o carro, televisão, computador, etc.

No entanto, do mesmo modo que a máquina a vapor marcou o início de uma nova era na história da humanidade, nada se compara a criação da internet no mundo contemporâneo. Seria impossível imaginar o mundo hoje sem o auxilio da internet, seja para pessoas que desejam trabalhar, seja como forma de lazer, informação e expansão cultural.

Com ajuda da internet as informações atravessam o mundo com uma velocidade incrível, como num "piscar de olhos". A possibilidade de pessoas, localizadas em continentes diferentes, conversarem através de uma videoconferência em tempo real, sem precisar sair da sua sala de trabalho e algo incrível.

Devido aos seus benefícios, o Estado não poderia deixar de utilizar-se da internet para cumprir com suas obrigações constitucionais. Sua utilização foi crescendo de maneira gradual, sendo, portanto, necessário que os servidores sejam preparados, permitindo-se a otimização dos serviços prestados.

O poder judiciário, de uma forma geral, busca celeridade para dirimir a demanda da sociedade frente ao Estado, na sua busca pela realização do ideal justiça e pela perfeita concretização dos direitos e garantias Individuais e coletivas. Hoje, a maior critica dos aplicadores do direito, assim como de toda sociedade de uma forma geral, e a demora na prestação jurisdicional ao atendimento dos anseios da sociedade.

No intuito de auxiliar o Estado nessa tarefa, alguns aplicadores do direito aventaram a possibilidade da utilização do Interrogatório on-line, o que tem gerado grandes discussões e inúmeras críticas no âmbito do processo penal. Questionam-se se as vantagens de sua


 



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utilização seriam maiores do que as de.desvantagens, destacando-se tanto problemas de ordem tecnológico-financeiras, quanto jurídicas.

Em face da aprovação pelo Senado Federal, em 24 de outubro de 2007, do Projeto de Lei n. 7.227/06, de autoria do senador Tasso Jereissati, que altera o decreto-lei n. 3.689/41, faltando apenas o sancionamento do Presidente da República, para que entre em vigor a utilização do interrogatório on-line, foi escolhido tal tema, tendo em vista sua atualidade e necessidade de reflexão.

Para tanto, devido a ausência de literatura especifica sobre o assunto, fez-se uma pesquisa na internet com o intuito de um aprofundamento teórico nas discussões entremeadas entre os que defendem tal uso e entre aqueles que o abominam. Essa discussão encontra-se presente na primeira parte deste trabalho.

A segunda parte se refere a uma pesquisa de campo não tão abrangente, visto a dificuldade de aplicação dos questionários aos profissionais do Direito atuantes na esfera do foro criminal. Porém, buscou-se retratar quais as posições dominantes entre os atores deste processo, o Judiciário, o Ministério Publico e a Defesa. Estendeu-se também tal pesquisa aos servidores do Poder Judiciário, bacharéis em Direito encontrados nos Cartórios.

O presente trabalho não tem como escopo esgotar essa temática, mas apenas demonstrar como estão sendo travados esses questionamentos e sob quais perspectivas. E uma contribuição não só de interesse específico para os profissionais atuantes na esfera penal, mas também para toda a coletividade, uma vez que trata de um instituto integrante do aparato estatal no seu legítimo exercício da forca.

II - Sistema Inquisitorial e Sistema Acusatório

Quanto aos modos de proceder no dirigir do instrumento do processo penal, dois modelos podem ser utilizados, o sistema inquisitorial e o sistema acusatório. O sistema penal brasileiro ainda e caracterizado essencialmente por práticas inquisitoriais.


 



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Para o processo penal o interrogatório e a ouvida do réu, sendo, assim, um dos atos mais importantes do processo penal. Discute-se, ainda, hoje, qual seria a verdadeira Natureza deste ato, se seria meio de prova, ou meio de defesa. Tudo isso se relaciona com qual modelo e adotado na realização do processo penal.

Tomando por base o sistema inquisitorial, o interrogatório é, na verdade, neste viés, um meio de prova, sendo dirigido apenas a uma única finalidade, a confissão do réu. Desse modo, o réu era dado praticamente como culpado do delito de que estava sendo acusado, ferindo o principio da presunção de inocência, e sendo não sujeito de direito, mas sim objeto do processo ao qual estava sendo submetido.

Como se não bastasse, o réu era obrigado a produzir provas contra si mesmo, visto que não possuia o direito ao silêncio, sendo o direito de calar-se interpretado contra ele, como disposto no antigo artigo 186 do CPP: "Antes de iniciar o interrogatório, o juiz observará ao réu que, embora não esteja obrigado a responder as perguntas que Ihe forem formuladas, o seu silêncio poderá ser interpretado em prejuízo da própria defesa". Assim, justificava-se o emprego da tortura a fim de obter a confissão do réu, que ainda em processo de julgamento, já tinha sua sentença decretada desde o início, uma vez que era tratado como condenado. Nesse processo, como o juíz era o gestor das provas, somente a ele cabia o papel de interrogá-lo.

Já na perspectiva do sistema acusatório, o interrogatório é visto como meio de defesa, momento no qual o acusado pode ter um contato direto com um juiz imparcial, produzindo prova de sua inocência, não mais a serviço da confissão. Nesse processo, o acusado é sujeito de direito, já que deve ter todas as garantias processuais respeitadas, para que possa ser efetivamente realizada a ampla defesa e o contraditório, seguindo-se o devido processo legal.

Com o advento da lei 10.792/2003, buscou-se compatibilizar o ordenamento processual penal com a Constituição Federal de 1988, que consagra o modelo acusatório, como regente do processo penal, havendo mudanças significativas no interrogatório, no sentido de propiciar que este seja utilizado de modo a ser um efetivo meio de defesa para o acusado.


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Antes, o interrogatório poderia acontecer sem a presença do advogado ou defensor, mas, hoje com a lei 10.792/03 é nulo o interrogatório sem a presença do advogado ou defensor. Se o acusado não tiver tido a oportunidade de conversar com o seu defensor, o juíz deverá conceder um tempo suficiente para que o réu possa, reservadamente, comunicar-se com seu defensor. Somente o juíz poderia realizar perguntas para o acusado, agora, tanto a acusação, quanto a defesa podem fazer perguntas de modo a auxiliar o réu na sua defesa ou a acusação. O réu deixa de ser considerado objeto do processo para se tornar sujeito do processo.

Foi eliminado do código o dispositivo que dizia que o silêncio poderia ser utilizado, ou melhor, interpretado em prejuízo do acusado, pois esse artigo do código de processo penal afrontava de maneira expressa a constituição Federal de 1988 que garante o direito de permanecer calado.

Ademais, tenham sido feitas estas alterações na legislação, ainda há necessidade de uma mudança de mentalidade dos aplicadores do direito, que ainda continuam reticentes quanto a estas mudanças, conservando resquícios do sistema inquisitorial.

A localização do interrogat6rio hoje, no procedimento do processo penal, sofre muita critica dos doutrinadores e aplicadores do Direito Penal. Embora, assevere-se que a lei 10.792/2003 tenha lhe dado um caráter de meio de defesa processual, sua posição no escalonamento dos atos processuais ainda lhe confere feições inquisitoriais de meio de prova, servindo para a confissão do réu, porque 6 feito antes da produção de qualquer prova. Para que realmente pudesse realizar a ampla defesa, deveria ser localizado apos a produção de todas as outras provas.

Ill - INTERROGATORIO VIRTUAL IH.i. Conceito

Por se tratar de um tema atual, sem nenhuma lei sancionada que trate do assunto, a melhor forma de conceituar o interrogatório on-line e fazer uso do próprio texto do Projeto de Lei 7227/06, que vai determinar o comportamento do novo sistema.


O Interrogatório on-line será o instrumento Estatal, proporcionado pelo avanço tecnológico, que vai permitir ao Poder Judiciário praticar o ato processual (interrogatório) na forma de videoconferência em tempo real, usando como principais justificativas a economia processual e a celeridade.

Esse procedimento deve ser realizado com a presença de advogado na sala de audiências, junto ao juiz. Enquanto que na penitenciária o réu deve estar na presença de um outro advogado, que ficará junto a ele numa sala em separado e com uma rede direta de telefones reservados para comunicação entre advogados e acusado. Vale ressaltar que este procedimento deverá ser fiscalizado por um Oficial de Justiça, um membro do Ministério Publico e um advogado representante da Ordem.

O Projeto de Lei determina a alteração do art. 185 do CPP, que passará a vigorar da seguinte maneira:

§1 - Os intcrrogatórios e as audiências judiciais serão realizadas por meio de videoconferência, ou outro recurso tecnológico da presença virtual em tempo real, assegurados canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que permanecer no presídio e os advogados presentes nas salas de audiência dos Fóruns, e entre estes e o preso. Nos presídios, as salas reservadas para esses atos serão fiscalizadas por oficial de justiça, funcionários do Ministério Publico e advogado designado pela Ordem dos Advogados do Brasil.

§2° Não havendo condições de se efetuar nos moldes do §1° deste artigo, o InterrogatórIo do acusado preso será feito no estabelecimento prisional em que se encontrar, em sala própria, desde que estejam garantidas a segurança do juiz e auxiliares, a presença do defensor e a publicidade do ato.

§3° Antes da realização do Interrogatório, o juiz assegurara o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor.

§4° Será requisitada a apresentação do réu em juízo nas hipóteses em que não for possível a realização do InterrogatórIo nas formas previstas nos §§ 1° e 2° deste artigo.


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Ill.ii. O interrogatório On-line e o Princípio da Dignidade da Pessoa humana

Devido a sua importância os direitos fundamentais servem de guias para as normas constitucionais e infraconstitucionais e estão positivados na Constituição Federal, no seu artigo primeiro, entre eles, a dignidade humana, demonstrando assim sua enorme relevância no ordenamento jurídico, que tem por objetivo garantir a inviolabilidade física e mental do ser humano.

O Estado tem a prerrogativa de aplicar as medidas que são necessárias e estão previstas na lei para assim cumprir com sua função de investigar, acusar e punir aqueles que descumprirem a lei na busca da manutenção da ordem. Porém seus atos não devem ultrapassar os limites legais, por mais violento que seja o acusado, respeitando os princípios constitucionais.

Existe uma corrente que defende o interrogatório on-line como uma forma de proteção ao direito fundamental da dignidade da pessoa humana, pois vislumbra nesse procedimento uma forma de proteção ao réu. Proteção esta que abrange não apenas a integridade física da pessoa do acusado, tanto psicológica quanto mental.

Para os que assim pensam, o interrogatório on-line seria uma maneira de evitar o constrangimento do acusado, seja na sua condução sempre algemado em veículo gradeado e escuro, percorrendo grandes distâncias desta forma, desde o presídio até o fórum, seja na exposição de sua própria pessoa a um público muitas vezes hostil.

Por certo são muitas as justificativas para que o réu não seja obrigado a se deslocar, de forma a se respeitar a sua garantia fundamental de manter inviolada a sua integridade física e mental, sendo o interrogatório on-line utilizado em seu beneficio.

Neste sentido não existem maiores controvérsias na doutrina em aceitar que o tele-interogatório não fere o principio da dignidade da pessoa humana, mas pelo contrário, seria uma garantia a este princípio.


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III.iii. O interrogatório On-line e o Princípio da Ampla Defesa e do contraditório

Os princípios do contraditório e da ampla defesa são basilares do direito processual penal, derivando diretamente do consagrado principio do devido processo legal. O principio do contraditório constata-se na igualdade processual entre as partes, o direito de não apenas ter a informação sobre fatos do processo como também participar deles, tomando conhecimento de todos os atos praticados com a possibilidade de refutá-los.

Já o princípio da ampla defesa garante ao acusado o direito de participar de todo os atos processuais e ter uma defesa técnica com base no conhecimento prévio de todos estes atos já praticados no processo.

E importante salientar que após o advento da Lei 10.792/03 o interrogatório deixa de ter uma conotação probatória e passa a ser tratado como uma oportunidade para o acusado expor sua versão dos fatos, bem como utilizá-lo como um meio de defesa, se assim o desejar. Contudo, ainda existem inúmeras críticas quanto a sua localização no procedimento do processo penal.

Com a possibilidade iminente de ingresso do interrogatório on-line no ordenamento jurídico brasileiro, verificaram-se inúmeras manifestações por parte da doutrina processualista penal derredor do instituto em tela.

Ocorreu uma preocupação por parte desta doutrina em se dois dos mais importantes princípios que regem o processo penal não estariam sendo violados com o tele-interrogat6rio.

Os princípios de que trata este tópico são estritamente correlacionados e, apesar de diferentes, muitas vezes confundidos. Apesar de tudo, os doutrinadores, tanto os que criticam quanto os que defendem a utilização do instituto ora em estudo, apresentam mesmas razões para concordar ou rechaçar acerca da violação de ambos os princípios.


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Os processualistas penais que se manifestam contra a utilização de videoconferência nos interrogatórios assim se posicionaram por achar que está tecnologia aplicada ao interrogatório acarretaria em afronta a estes princípios.

Estar-se-ia afrontando o princípio da Ampla Defesa e do Contraditório na medida em que, prejudicado o contado direto do acusado com o juiz, encontraria impossibilitado que através desse contado direito e do contato visual o juiz possa fazer um melhor juízo de valor sobre o acusado.

Os que comungam desta opinião afirmam que artigo 9°, §3°, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o artigo 7°, §5°, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, estabelecem como direito do acusado em comparecer e ser interrogado perante a pessoa do juiz, acarretando verdadeira violação a estes dispositivos intencionais a possibilidade de interrogatório on-line.

Contudo, outras vozes se insurgem contra esta idéia, como e o caso de Vladimir Aras (2003), com o fundamento em que:

[...] as referidas normas falam apenas em levar o detido a "presença do juiz", e a presença virtual, ao vivo, por meio de videoconferência, confere ao acusado as mesmas garantias que o comparecimento in persona, diante do magistrado. (ARAS, 2002, p. 14)

De acordo com a análise do jurista supracitado, a significância (presente inclusive no CPP) da palavra "comparecer" não implica necessariamente o comparecimento físico da pessoa, mas estar ciente da realização de todos os atos processuais, deles tomando conhecimento. Mais uma vez fazendo uso das palavras do autor linhas acima:

Comparece aos autos ou atos do processo quem se da por ciente da intercorrência processual, ainda que por escrito, ou quem sefaz presente por meio de procurador, ate mesmo com a oferta de alegações escritas, a exemplo da defesa previa e das alegações finais. (ARAS, 2002, p. 14)

Desta forma, como exposto anteriormente, a corrente que se inclina favorável a utilização da videoconferência no interrogatório não vê como afronta aos princípios do


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contraditório c da ampla defesa a simples ausência física do acusado junto ao juiz e acusação, posto que a presença virtual suprisse de forma satisfatória esta ausência física, integrando o réu de tudo que se passa em seu interrogatório de modo a não cercear o seu direito a ampla defesa e contraditório.

Contudo, apesar de toda esta inovação tecnológica apresentar celeridade e corte de custos ao Estado, e preciso que se aplique, na prática, o interrogatório on-line com extrema cautela de modo a não ferir os direitos e garantias Fundamentais do acusado.

Ill.iv. O interrogatório On-line, a economia Financeira e a Celeridade Processual

Como se sabe, o direito esta sempre a procura de adequar-se ao mundo moderno, gozando das prerrogativas e facilidades que este lhe oferece, visando sempre a melhoria da prestação jurisdicional.

Adequando-se a tecnologia, o direito busca uma forma de acompanhar o seu progresso e incorporá-la aos seus atos. Assim começa a se verificar a tentativa de positivação do interrogatório on-line como regra no nosso ordenamento pátrio com o objetivo de se conferir celeridade ao procedimento processual penal e visando também a economia processual. O principio da celeridade processual, vale destacar, esta previsto no texto constitucional no inciso LXXVIII do art. 5.

A celeridade apresenta-se importante não somente para as partes envolvidas no processo (em principal o réu em ter este processo de pronto julgado sem ter que passar por mais constrangimentos), mas também para toda a sociedade, pois o Estado tem o dever constitucional de promover uma célere resposta jurisdicional.

No que se destaca pelo princípio da celeridade, o interrogatório on-line apresenta-se vantajoso, pois elimina contratempos que impedem a sua realização e conseqüente


 



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remarcação, como problemas no transporte dos presos, falta de combustível e atrasos no trânsito.

Tem ainda o tele-interogatório a faculdade de não mais se necessitar expedir cartas precatórias para oitiva do réu em outras comarcas, gerando delongas no processo devido a demora no cumprimento das mesmas.

Quanto ao principio da economia processual, esta e uma das justificativas principais na tentativa de implementação da tele-conferência no processo penal. São enormes os gastos que o Estado tem com o transporte de presos (viaturas, combustível, deslocamento de pessoal para a segurança, dentre outros), havendo ainda o risco de se arcar com prejuízos causados a sociedade por presos em fuga.

Ronaldo Batista Pinto (2006) manifesta a sua anuência a respeito da utilização do interrogatório on-line apresentando dados que comprovam o custo em se transportar presos ao fórum para oitiva de seus interrogatórias

Conforme dados trazidos por Leandro Nalini, em artigo publicado na Revista Consultor Jurídico de 16 de agosto de 2005 (Visão provinciana impede a evolução da videoconferência), colhidos pelo eminente desembargador Francisco Vicente Rossi, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no período de I a 15 de junho de 2003 foram realizadas 27.186 escoltas, 73.744policiais militares e 23.240 viaturas policiais foram mobilizados, gerando urn gasto de R$ 4.572.961,94. (PINTO, 2006, p.8)

Vale ainda ressaltar a questão da segurança (não somente da sociedade, mas também do próprio réu) como um dos fatores de preocupação ao se transportar os presos, pois fica-se sujeito a ação de quadrilhas organizadas com o objetivo de resgatá-los ou elimina-los. Tudo isto implica em despesas para o Estado ao se indenizar as vitimas dos danos e reparar estragos causados por estas operações.


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III.v. O interrogatório On-line c o Principio da Identidade Física do Juiz

A disposto das controvérsias e críticas acerca da localização do inquérito no procedimento processual penal sabe-se, que este e o momento em que o acusado apresentara ao juiz a sua versão dos fatos sob os quais esta sendo incriminado. E também a oportunidade que o juiz tem de dirigir perguntas ao acusado e ter de fato um contato direto com ele.

Não obstante se aceite que o princípio da identidade física do juiz não se aplica ao direito penal brasileiro, alguns doutrinadores afirmam ser isto um erro, pois deveria o juiz criminal ter um prévio conhecimento daquele que por ele será condenado ou absolvido. E o interrogatório apresenta-se como um momento próprio para este contato preliminar. Entre os que desta forma se posicionam esta Rômulo de Andrade Moreira (2007), que afirma:

Logo, conclui-se que o Juiz interrogante não precisa necessariamente ser o respectivo julgador, ainda que assim de preferência devesse ser, pois se nos afigura de suma importância para o ato de julgar este contato pessoal entre o julgador e o julgado, e o interrogatório injustamente o momento em que o Juiz conhecera o acusado, tomara conhecimento pessoal do homem a ser por ele condenado ou absolvido (e não somente através da leitura de um depoimento escrito). (MOREIRA, 2007,p.7)

O contato juiz-acusado, desta forma, seria de suma importância em especial no processo penal, que sempre implicara na imposição de uma norma sancionatória, na maioria das vezes de caráter restritivo de liberdade ou privativa de direitos. E o contato físico do juiz com o réu serviria como momento para o primeiro poder analisar as características do segundo, observando o seu comportamento e reações, não de forma a estabelecer um prejulgamento deste, mas para, nas palavras de Rene Ariel Dotti:

Tecnologia não poderá substituir o cérebro pelo computador muito menos o pensamento pela digitação. t. necessário usar a reflexão como contraponto da massificação. E preciso ler nos lábios as palavras que estão sendo ditas; ver a alma do acusado através de seus olhos; descobrir a face humana que se escondera por trás da mascara do delinqüente. E preciso, enfim, a aproximação física entre o Senhor da Justiça e o homem do crime, num gesto de alegoria que imita o toque dos dedos. o afresco pintado pelo gênio de Michelangelo na Capela Sistina e representativa da criação de Adão. (DOTTI, 2003. p.23)


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Contudo, diante do exposto, existem ainda opiniões favoráveis a utilização do interrogatório on-line e que não encontram problema algum em conciliá-lo com a necessidade de contato físico entre juiz e réu. Os que se inclinam favoravelmente a esta posição afirmam que a tecnologia em si permite que este contato virtual faça as vezes de um contato físico, pois tamanho e o avanço tecnológico que possibilita uma transmissão detalhada inclusive percepção de detalhes mínimos de modificações faciais e reações corporais bem como as alterações de voz por mecanismos de áudio. O interrogatório continua a ser oral. O contato visual permanece e ampliado pelas tecnologias de captação, amplificação e aproximação de som e imagem.

Há também uma vertente que segue no sentido de que não sendo o interrogatório um meio de prova, mas apenas uma oportunidade para a defesa do acusado, não haveria necessidade da presença física do juiz. O jurista Vladimir Aras (2002) com maestria fundamenta este pensamento:

A presença virtual do acusado, em videoconferência, e uma presença real. O juiz o ouve e o vê, e vice-versa. A inquirição e direta e a interação, recíproca. No vetor temporal, o acusado e o seu julgador estão juntos, presentes na mesma unidade de tempo. A diferença entre ambos e meramente espacial. Mas a tecnologia supera tal deslocamento, fazendo com que os efeitos e a finalidade das duos espécies de comparecimento judicial sejam plenamente equiparados. (ARAS, 2002, p. 16)

Para outros, o tele-interrogatório ainda põe em prática o principio da identidade física do juiz não presente no processo penal, na medida em que permite que o interrogatório fique gravado possibilitando o acesso aos seus dados por qualquer outro juiz que venha a posteriormente julgá-lo.

Ill.vi. O interrogatório On-line e a Publicidade

Entre os doutrinadores e operadores do direito processual penal há os que afirmam a quebra do principio da publicidade presente nos arts. 5, LX e 93 IX da CF e de previsão


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também infraconstitucional no art. 792 do CPP, pela aplicação do interrogatório on-line. A partir de análise dos dispositivos legais supracitados abstrai-se a idéia de que o principio da publicidade encerra a realização dos atos processuais de forma pública, aberta e ao alcance de qualquer cidadão que deseje presencia-los.

Os que deste pensamento não comungam, afirmam que o interrogatório praticado por meio eletrônico, pelo contrario, confere ao ato processual em tela maior publicidade, quando permite que qualquer do povo participe e tome conhecimento do seu conteúdo por meio mais amplo, inclusive através da internet, ampliando assim a possibilidade de acesso a informação.

Para operadores do processo penal como Vladimir Aras (2002) a alegação de que o tele-interrogatório fere o principio da publicidade não procede, pelo contrario, confere maior abrangência do ato processual.

Na verdade, o tele-interogatório amplia sobremaneira a publicidade do ato. O depoimento e tornado em sala especial do local de detenção, com a presença de um defensor (publico, dativo ou constituído) e de um oficial de Justiça. O acesso a este recinto deve ser livre para qualquer pessoa, inclusive da comunidade externa ao presídio. (ARAS, 2002, p. 10)

Este amplo acesso as atividade processuais, em especial o interrogatório, permite inclusive que pessoas residentes em qualquer lugar do pais tenham acesso ao seu conteúdo, posto que a tecnologia avançada assim o permite, o que se torna interessante nos casos aos quais a mídia confere maior notoriedade.

O Senador Tasso Jereissati, na justificativa da sua proposição do PL 7227/06 diz:

Em São Paulo, a media de gasto com a escolta de um preso ao tribunal 4 de RS 2.500,00. Com o sistema de videoconferência, estar-se-ia economizando algo em torno de RS 17.500.000,00 por semana, se considerarmos um preso por escolta. Só no Distrito Federal, um dos estados brasileiros pioneiros nessa idéia, conforme declaração do juízo de execução penal, a economia está em torno de RS 1 milhão por mês. (JEREISSATI, 2006)


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Acerca do principio em tela, mostra-se quase unânime o posicionamento doutrinário em aceitar o interrogatório on-line como meio que confere ampla publicidade a este ato processual. Disposto das opiniões contrarias, há concordância no sentido de que, ao contrario de cercar a publicidade, a tecnologia utilizada permite maior abrangência das informações dos atos processuais, abarcando um número mais amplo de pessoas que desejem acesso a estas informações.

IV - PESQUISA DE CAMPO

O interrogatório on-line, por se tratar de um tema recente e controverso, ainda não positivado no ordenamento vigente, tem levantado grandes discussões na seara jurídica. Nisso, justifica-se a necessidade de realizar uma pesquisa de campo com o fito de melhor vislumbrar as questões que permeiam o tema e as variações dos posicionamentos dos entrevistados conforme a função exercida.

IV.i. A Metodologia

A colheita dos dados foi realizada entre os dias 24 e 26 de outubro de 2007, no Fórum Criminal da Comarca de Salvador e alguns escritórios de advocacia criminalista. A pesquisa foi direcionada a juizes, promotores, advogados, servidores bacharéis em Direito dos Cartórios. Cabe frisar que todos os entrevistados atuam na esfera criminal, estando diretamente relacionados à matéria em foco, podendo, assim, visualizar na prática as implicações que trará o sancionamento do Projeto-Lei 7.227/06.

Deu-se a pesquisa através do questionário, contendo sete perguntas, as quais tratam dos pontos principais de controvérsia, envolvendo este tema. Foram feitas as sanguinities perguntas:

1.      Com o avanço da tecnologia, é possível a utilização do interrogatório on-line no processo penal?

2.      O interrogatório on-line fere o principio da ampla defesa e do contraditório?

3.      O interrogatório on-line afronta o principio da dignidade da pessoa humana?


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4.  Em havendo anuência do perco para realização de tal procedimento, estaria sua vontade
viciada pela prisão?

5.        O       Interrogatório       on-line       ofenderia       o       principio       da       publicidade?

6.      No caso das testemunhas, seria possível a oitiva on-line?

7.      A falta de contato visual direto com o acusado poderia afetar a valoração do Interrogatório feita pelo juiz?

A cada uma das perguntas elaboradas só se poderia dar resposta objetiva afirmativa ou negativa. Para tanto, foram inquiridas cinqüenta e oito (58) pessoas, das quais: dois (02) juizes, quatro (04) promotores, quarenta e dois (42) advogados, e nove (09) escrivãs/sub.

Não foi possível uma maior abrangência da pesquisa devido as dificuldades de acesso aos juizes e promotores, alem da exigüidade de tempo disposto pelos advogados e funcionários cartorários, bem como desconhecimento da matéria por parte de alguns. No entanto, o resultado da pesquisa permite uma breve consideração sobre o que pensam nossos operadores do Direito ao menos aqui na Bahia.

IV.ii. A Análise dos Dados

Ao final do levantamento da pesquisa, observou-se que o interrogatório on-line oferece vantagens e, ao mesmo tempo, desvantagens ao processo penal. Apesar de se ter buscado respostas objetivas a fim de se facilitar a apuração dos dados, muitas das pessoas submetidas ao questionário, que ficavam hesitantes em respondê-lo, alegando falta de tempo, empolgaram-se em discorrer sobre suas respostas, o que demonstra a extrema importância desse tema, alem do seu alto teor polemico.

Os dados obtidos estão colocados, tendo-se em vista as funções exercidas pelos entrevistados, de modo a observar até que ponto a variante do papel em que atuam na concretização do processo poderia interferir na sua visão sobre o tema em tela. Desse modo os dados apreendidos podem ser resumidos na tabela adiante exposta:


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                        OCUPAÇÃO QUESTOES

 

JUIZ (02)

PROMOTOR (04)

ADVOGADOS (42)

ESCRIVAO/SUB (09)

1. Possibilidade tecnológica do interrogatório on-line

Sim: Não:

100% 0%

75% 25%

52.4% 47,6%

77,8% 22,2%

2. Violação do principio da ampla defesa c do contraditório.

Sim: Não:

100% 0%

25% 75%

54,8% 45,2%

33,3% 66,7%

3. Afronta ao principio da dignidadc da pessoa humana

Sim: Não:

100% 0%

25% 75%

38,1% 61,9%

33,3% 66,7%

4. Vicio de vontade do preso que anui com o interrogatório on-line

Sim: Não

100% 0%

0% 100%

45,2% 54,8%

22,2% 77,8%

5. Violação do principio da publicidade

Sim: Não:

50%

25% 75%

40,5% 59,5%

11,1% 88,9%

6. Possibilidadc do tcle-dcpoimcnto

Sim: Não:

50% 50%

50% 50%

38,1% 61,9%

44,4% 55,6

7. Interferência na valoração feita pelo juiz

Sim: Não:

100% 0%

25% 75%

76,2% 23,8%

44,4% 55,6

Tendo em vista essas variações, a analise será feita separadamente em função da ocupação exercida. Cumpre dizer que apenas os aspectos responsáveis por essas diferenças serão aqui tratados, com o fito de que não seja repetido o que já foi aclarado em observações anteriores.

IV.iii. O Poder Judiciario

 

                        OCUPAÇÃO QUESTOES

 

JUIZ (02)

1. Possibilidade tecnológica do interrogatório on-line

Sim: Não:

100% 0%

2. Violação do principio da ampla defesa e do contraditório.

Sim: Não:

100% 0%

3. Afronta ao principio da dignidade da pessoa humana

Sim: Não:

100% 0%

4. Vicio de vontade do preso que anui com o InterrogatórIo on-line

Sim: Não

100% 0%

5. Violação do principio da publicidade

Sim: Não:

50%

6. Possibilidade do tele-depoimento

Sim: Não:

50% 50%

7. Interferência na valoração feita pelo juiz

Sim: Não:

100% 0%

Apesar da pequena amostra de juizes observados, nota-se que os magistrados, aparentemente, baseando-se apenas nas respostas que deram ao questionário, tendem a se posicionar contra a implantação do tele-interogatório no processo penal. A principal


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fundamentação dessa categoria e que. para a captação dos elementos decisivos para a valoração do interrogatório, e imprescindível o contato visual direto com o acusado, ficando, pois, prejudicado esse procedimento.

Como se pode perceber através da leitura da tabela supra, ambos acham que, sob o ponto de vista tecnológico, o interrogatório "on-line" e perfeitamente possível, todavia não seja a maneira mais adequada a finalidade a qual essa audiência se destina.

Segundo esse entendimento, tal procedimento é uma afronta ao princípio da ampla defesa e do contraditório, uma vez que este se revela um dos únicos momentos, no desenrolar dos atos processuais, em que o réu terá contato direto com a pessoa responsável por sentenciá-lo, decidindo por sua condenação ou absolvição. Assim, caracteriza-se esse instante pela possibilidade de apresentar a sua versão dos fatos, frente-a-frente com o julgador.

Embora um dos entrevistados tenha se pronunciado nesse sentido, percebeu-se que sua posição quanto a natureza do interrogatório e de que este seria, na verdade, meio de prova e não meio de defesa. Verifica-se, além disso, que sua argumentação oral não condiz com as respostas oferecidas no questionário, já que afirmou ser o interrogatório o único momento que o acusado teria contato com o mundo exterior e, no mais das vezes, utilizar-se-ia de tal recurso para se evadir. Assumiu, pois, que o Interrogatório on-line obstaria a fuga do preso, firmando uma presunção de fuga quanto àqueles que seriam interrogados.

Tal magistrado, cujo nome não convém citar, chegou a alegar que o processo penal e um meio inidôneo para se resolver um conflito, terminando por dizer que se algo acontecesse a seus filhos nunca recorreria ao Poder Judiciário, muito pelo contrário, pagaria a policia para matar o feitor, chegando a questionar a dignidade do sujeito passivo do processo penal.

Portanto, o que a pesquisa revela em suas entrelinhas e uma rachadura no âmbito do poder judiciário, separando de um lado aqueles denominados conservadores e, do outro, os intitulados de garantias. Os primeiros, permeados por ideais inquisitoriais, sustentam, para além da possibilidade, a necessidade de implementação dessa tecnologia, chegando a negar os direitos fundamental em prol de uma celeridade e economia equivocadas. Os últimos, impulsionados por fazer valer a Constituição Federal, primam pela defesa desses direitos, uma vez que a realização do valor justiça, do respeito a dignidade da pessoa humana, seja tão


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importante quanto a celeridade da prestação jurisdicional, abominando, pois, a utilização de qualquer meio que embora célere, desvirtue o papel do devido processo legal.

Há uma convergência no entendimento da importância da prisão como elemento viciador da vontade do réu no que tange a concordância com sua submissão ao procedimento virtual, com fundamento de que seu único interesse e se ver livre do jugo processual, já sabendo o quantum de pena seri-lhe-a aplicado, já que a prisão provisória termina por se tornar uma violência de maior gravidade do que a própria sanção penal. Nesse pensamento, o acusado, no intuito de tornar o processo mais célere, anui mesmo que para isso renuncie a direitos e garantias processuais, constitucionalmente irrenunciáveis.

No que se refere a afronta do principio da publicidade, apenas um dos juizes manifestou sua posição de forma afirmativa, já que entende que haveria, deveras, uma restrição ao acesso de terceiros a audiência. O outro magistrado não fez nenhuma observação quanto a este ponto, visto que sua entrevista foi feita oralmente, já que era um tema o qual lhe interessava muito, discorrendo mais sobre os outros pontos.

Quanto a colheita de prova testemunhal via videoconferência, as opiniões divergem. Um dos julgadores pensa ser o tele-depoimento ainda mais maléfico ao processo do que o tele-interogatório, visto que a testemunha presta compromisso de verdade. Dessa forma, não lhe assiste o direito de se calar ou de mentir, o que torna ainda mais imprescindível o contato visual direto entre ela e o togado, facilitando a averiguação da veracidade do depoimento. Já o outro julgador vê perfeitamente realizável a oitiva das testemunhas por esse procedimento, visto que a testemunha esta sob juramento, o que se revela uma posição ingênua.


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IV.iv. O Parquet

 

                            OCUPAÇÃO          QUESTOES

 

PROMOTOR

(04)

1. Possibilidade tecnológica do interrogatório on-line

Sim: Não:

75% 25%

2. Violação do principio da ampla defesa c do contraditório.

Sim: Não:

25% 75%

3. Afronta ao principio da dignidadc da pessoa humana

Sim: Não:

25% 75%

4. Vicio de vontade do preso que anui com o interrogatório on-line

Sim: Não

0% 100%

5. Violação do principio da publicidade

Sim: Não:

25% 75%

6. Possibilidade do tele-depoimento

Sim: Não:

50% 50%

7. Interferência na valoração feita pelo juiz

Sim: Não:

25% 75%

A tabela descritiva da pesquisa deixa claro, em linhas gerais, a grande anuência dos promotores na realização de interrogatórios on-line. A analise desses dados depende, em grande medida, da compreensão do papel ocupado por essa instituição no processo penal. De acordo com a Constituição Federal, o Ministério Público e o titular da ação penal pública, cabendo-lhe a Função de acusar. E, pois, parte artificial do processo penal, diante do que, resta explicado o seu posicionamento rente à temática da videoconferência.

Conforme pode ser notado, apenas 25% dos promotores da amostra não acham possível a utilização de tal sistema, tanto do ponto de vista jurídico, quanto do ponto de vista tecnológico. Os outros 75% entendem que o emprego dessa tecnologia nas audiências, além de ser tecnologicamente viável, em nenhuma medida fere as garantias do réu. Aliás, um dos entrevistados chegou até mesmo a negar que o acusado por um crime tenha alguma dignidade, o que retrata um posicionamento extremamente impregnado pelo ideal de conseguir a condenação do réu a qualquer preço.

Ora, esquece-se o Minist6rio Publico que a mesma Carta que lhe conferiu o poder de acusar, deu-lhe a responsabilidade de fiscalizar o cumprimento das leis. Essa é sua função primeira. Assim, sua analise da videoconferência deve ser muito mais minuciosa do que a analise de qualquer outra categoria, devendo observar com cautela se este procedimento não


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apresenta-se como um óbice a efetividade de garantias essenciais ao acusado, como a ampla defesa, o contraditório e tantos outros necessários ao devido processo legal.

Do mesmo modo, os mesmos 75% entendem que o interrogatório on-line não interfere na valoração feita pelo juiz sobre a defesa do acusado, não considerando tão importante esse contato visual direto entre julgador e réu. Esta postura termina por tornar o processo um meio impessoal e, portanto, sujeito de direito passa a ser objeto nessa relação jurídica, a partir de um instrumento que deveria trabalhar a serviço da defesa do réu, e não em busca da sua incriminação, por vezes infundada, manchada pela frieza e pelo distanciamento entre os atores processuais.

Diferentemente dos juizes, nenhum dos promotores inquiridos nessa pesquisa entendem ser a condição de preso um fator influenciador da anuência desses na realização do seu interrogatório via videoconferência. Já com relação à possibilidade do tele-depoimento, observa-se que há um equilíbrio entre os posicionamentos, havendo 50% de concordância e 50% de rejeição. Funda-se essa rejeição também na circunstância de que a testemunha, diferentemente do réu, presta compromisso de dizer a verdade sobre os fatos.

IV.v. Os advogados Criminalistas

 

                            OCUPAÇÃO          QUESTOES

 

ADVOGADOS (42)

1. Possibilidade tecnológica do InterrogatórIo on-line

Sim: Não:

52,4% 47,6%

2. Violação do principio da ampla defesa e do contradit6rio.

Sim: Não:

54,8% 45,2%

3. Afronta ao principio da dignidade da pessoa humana

Sim: N3o:

38,1% 61,9%

4. Vicio de vontade do preso que anui com o interrogat6rio on-line

Sim: Não

45,2% 54,8%

5. Violação do principio da publicidade

Sim: Não:

40,5% 59,5%

6. Possibilidade do tale-depoimento

Sim: Não:

38,1% 61,9%

7. Interferência na valoração feita pelo juiz

Sim: Não":

76,2% 23,8%

O posicionamento dos advogados, apurado através dessa pesquisa, é, no mínimo, surpreendente, senão contraditório, já que o discurso que se costuma ouvir desses é elaborado


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no sentido de se obter o devido processo legal, possível apenas a partir da tolal preservação dos direitos conferidos ao sujeito passivo pela CF/88, na perfeita realização da ampla defesa e do contraditório.

Com relação à utilização do procedimento referido, 52,4% entende ser possível a implantação desta tecnologia, enquanto 47,6% discordam de que seja viável a utilização desse procedimento. Um outro dado que se revela espantoso no questionário aplicado a essa classe e o fato de que, embora haja um equilíbrio entre aqueles que concordam c os que discordam de que a videoconferência e um obstáculo à realização das garantias, tal idéia se revela contraditória quando confrontada com outros dados da tabela.

Para observar, basta verificar que 76,2%, ou seja, a maioria afirma que a valoração do juiz em relação ao interrogatório fica prejudicada com esse novo procedimento. Como então com a interferência nessa valoração, poderiam ser respeitadas as garantias processuais? Disso depreende-se que alguns continuam a se manifestar favoravelmente a implementação da videoconferência, muito embora tenham consciência de que essa modifique aspectos subjetivos do processo penal. Cumpre dizer que 23,8% entendem não ser o fato de o juiz e o réu não se encontrarem no mesmo espaço físico algo que desvirtue a valoração realizada pelo magistrado, já que a tecnologia empregada no interrogatório virtual suprira a falta de contato visual direto.

IV.vi. Os Escrivães/sub

A leitura dos dados da pesquisa realizada com o escrivão/sub permite concluir que, para 77,8% desses entrevistados, a videoconferência é algo possível tecnologicamente, enquanto uma minoria de 22,2% entende não ter o país desenvolvimento tecnológico suficiente para que esse procedimento seja implantado sem que haja algum prejuízo para o processo.

Concordam alguns (33,3%), que o interrogatório on-line não é meio inidôneo a preservação no processo dos direitos a dignidade da pessoa humana, ampla defesa e ao contraditório. Todavia, a opinião que, no momento, mostra-se mais interessante é a dos 66,7%


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que entendem não apresentar a vídeo-conferência um obstáculo a implementação desses direitos.

Para entender essa tomada de posição por parte da maioria dos Escrivães/sub da amostra, manifestando-se a favor do novo procedimento, basta verificar quais são as principais preocupações dessa classe de acordo com o exercício de sua função. Observou-se que, na qualidade de funcionário cartorário, fundamentaram a aceitação do novo sistema na falta de estrutura física do Fórum Criminal que, por exemplo, não possui câmeras de monitoramento, o que acaba por não proporcionar a segurança necessária aos que ali se encontram, tendo em vista a movimentação intensa de entrada e saída de presos. Com a inserção do tele-interogatório no sistema jurídico nacional, restava acabada essa circulação dos presos pelos corredores do Fórum, já que a proposta e a oitiva do réu sem que este necessite sair do estabelecimento prisional.

Resta claro, que suas preocupações são de ordem outra que não as questões de direito processual atinentes ao tema . Assim a análise feita por eles e, com poucas exceções, bastante superficial, já que feita a partir de uma única perspectiva, qual seja, o da segurança. Ademais, notou-se que, por parte de muitos, o que faltava, realmente, era conhecimentos sobre o assunto proposto pelo questionário.

Nesse mesmo viés, 77,8% entendem a prisão como um fator não relevante na determinação do consentimento do réu em ser submetido á oitiva on-line, em detrimento de ter um contato direto, sem intermédio de qualquer aparelhagem, com seu julgador. Os 22,2% restantes, acreditam que e sim a prisão um elemento que vicia a vontade do preso.

Os percentuais mudam um pouco quando questionados sobre a viabilidade do tele-depoimento. 55,6% da amostra entendem, pelo mesmo argumento do juramento feito pela testemunha em dizer apenas a verdade, ser a colheita da prova testemunhal algo mais delicado e, portanto, não sendo a videoconferência meio apta a captar as variações nesses depoimentos, muito embora, ainda haja 44,4% que não consigam vislumbrar qualquer déficit para o processo em colhê-los virtualmente.


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Igual porcentagem se revela quando indagados sobre as conseqüências da aplicação dessa ideologia na valoração feita pelo magistrado da versão dos fatos apresentada pelo acusador. Foram apurados 55,6% de Escrivães/sub, descrentes de que haja qualquer interferência entre esses elementos. Todavia. tendo em vista que há 44% de concordantes com a influência do novo método na valoração do juiz, depreende-se que algum dos que disseram anteriormente ser a favor da videoconferência, tem consciência do prejuízo causado em elementos subjetivos do processo, aplicando-se nessa constatação as mesmas críticas apresentadas aos advogados no tópico acima.

V. CONCLUSÃO

E bem verdade que o Poder Judiciário não pode ficar alheio ao grande avanço tecnológico assistido ao redor do mundo. A tendência e que os papeis, as canetas, os autos impressos e tantas outras coisas saiam de cena, dando lugar ao que há de mais moderno no mundo virtual. Essas transições sempre existiram historicamente e sua necessidade e relevante a modernização dos modelos vigentes. Conceitos superados, costumam ceder frente a novos conceitos e essa dinâmica e essencial à vida.

Não obstante, há de se ter bastante cautela na Introdução de novos procedimentos no processo penal, já que o que se discute aqui não e meramente com que tecnologia será fabricada uma máquina, mas como será produzida uma fase delicada do processo penal, que funcionará como um dos pilares de sustentação da sentença que, se condenatória, por vezes, ira tolher a liberdade de ir e vir, frise-se, direito constitucional fundamental, de um ser humano.

E certo de que o tele-interrogatório representa aos cofres públicos uma economia de milhões. Deixa de gastar-se com escolta de presos, com combustível para o seu translado e com o resgate desse mesmo preso que, por vezes, aproveitaram à ida as Varas Penais para evadir-se. Todavia, o interrogatório virtual não garante a efetivação de princípios basilares do


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processo penal como a ampla defesa e o contraditório. tornando o procedimento bastante impessoal. Ademais:

"A despesa pelo deslocamento do réu deve a ele ser atribuída? O réu, no momento em que teve sua liberdade restringida, fica ao sabor do Estado. O processo demora? Culpa do Estado. O réu está longe? Culpa do Estado que o coloca longe. O réu precisa se deslocar toda hora? Culpa do Estado que não o julga deforma célere.” (CERQUEIRA.2007)

0 que não se pode admitir é que a videoconferência, a pretexto dos argumentos da economia e da celeridade processual, seja introduzida no processo penal brasileiro aos arrepios das garantias processuais do acusado que, cumpre frisar, até uma sentença penal condenatória e inocente.

Por fim, tendo em vista a relevância da temática proposta por esse artigo e seu frescor nas rodas de discussões jurídicas, os debates sobre a videoconferência apenas começaram. Muito ainda há para se refletir sobre as implicações da Lei 7.227/07 no processo penal. Por esses motivos, o presente trabalho presta-se a apenas direcionar umas primeiras reflexões sobre o tema, deixando claro que a matéria e por demais complexas para ser vista apenas sob o aspecto da celeridade e da economia.

V. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

ARAS, Vladimir. Videoconferência no processo penal . Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 585, 12 fev. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6311>. Acesso em: 29 out. 2007.

ARAS, Vladimir. O tele-interrogat6rio no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 61, jan. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3632>. Acesso em: 29 out. 2007.

CERQUEIRA, Josemar Dias. A videoconferência, o boi e a borboleta . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1527, 6 set. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10374>. Acesso em: 29.out.2007.

DOTTI, Rene" Ariel. "O interrogat6rio a distancia", Brasília: Revista Consulex, n°. 29, p. 23; 2003.


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MORIiIRA, Romulo de Andrade. O Supremo Tribunal Federal e o interrogatório por videoconferência . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1518, 28 ago. 2007. Disponível cm: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10334>. Acesso em: 29 out. 2007.

PINTO, Ronaldo Batista. Interrogatório on line ou virtual. Constitucionalidade do ato c vantagens em sua aplicação. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1231, 14 nov. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9163>. Acesso em: 29 out. 2007.

REINALDO FILHO, Democrito. A informatização do processo judicial. Da Lei do Fax a Lei n° 11.419/06: uma breve retrospectiva legislativa. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1295, 17 jan. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9399>. Acesso em: 29 out. 2007.


Autor: Edson Braga Junior | Indira Shiva Reis | Luana Barbosa | Moises Ramos Junior


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