Dia do professor



Todo dia é dia de alguma coisa. E tem dia que é dia de alguma coisa e quando a gente vai ver tem outra coisa de que aquele dia é dia. Mas não para aí. Os meses também entram nessa onda. Só para se ter uma idéia, os católicos consideram agosto como mês das vocações; setembro como mês da bíblia, outubro mês das missões. E assim por diante. Perceba, portanto, que temos um não sei quê pelas datas comemorativas. E, talvez por isso, tem data que é data de mais de uma coisa.
Só para ilustrar isso vamos olhar para o mês de outubro. Olhe lá no seu calendário: dia 4 de outubro! Esse é o dia da Natureza; do Barman; do Cão; do Poeta; de São Francisco de Assis. Outro dia de outubro: o dia 12! Veja só, é dia de Nossa Senhora Aparecida, da Criança; do Atletismo; do Engenheiro Agrônomo; do Mar; do Descobrimento da América; do Corretor de Seguros. E assim por diante, cada dia é dia de alguma coisa. E, como estamos vendo às vezes, com mais de uma coisa por dia.
No meio de todas essas datas tem o dia do professor: 15 de outubro. Mas não é só do professor que o dia 15 é dia. Além do professor, dia 15 é dia do Casamento da princesa Isabel com o conde D'Eu (1864); da Criação do Observatório Nacional (1827); da Educação Nacional; da Normalista; do Educador Ambiental. E, evidentemente, dia do professor.
Onde vamos parar com isto?
No dia do professor.
É que, já que tem dia pra tudo, tem o dia do professor. Um dia para nos ajudar a refletir e procurar entender: quem é essa figura? Qual é sua função? Ainda existe espaço para ele?
Noutros tempos, professor era alguém respeitado e admirado. Simbolizava saber. Indicava caminhos. Emitia opiniões e dava conselhos... os estudantes o temiam não porque infundia medo, mas porque queriam, embora não tivessem certeza de conseguir chegar ao seu saber. Desejava-se estar aos seus pés. Não como quem chega aos pés de um santo, mas como quem venera uma pessoa capaz de ajudar na condução da vida, alguém especial sem o qual não se chega a lugar algum.
Mas o tempo passou. E aqueles tempos jamais hão de voltar. Por quê? Porque os tempos são outros e as coisas se resolvem não mais com o saber nem com a sabedoria, mas com as leis. Hoje, nas escolas, o que impera não é mais o bom senso nem a sensatez do professor ? que permanece tendo algo a ensinar ? mas as leis absurdas que tiram a autonomia do professor. Pra que serve a escola? Pra ser depósito de delinqüente. Para que as crianças ? filhos de pais e mães que se preocupam com o bem estar de seus filhos ? aprendam com os maus exemplos dos bandidos que as leis e legisladores e burocratas idiotas atiram para dentro das escolas.
Por incrível que pareça, o direito de aprender, o direito de estudar, o direito à segurança... e outros direitos, foram jogados no lixo. O direito da maioria é usado como papel higiênico enquanto um ou dois bandidos DESTROEM o ambiente escolar. E nesse ambiente, o professor passa a ser não mais a pessoa que pode ensinar, mas uma vítima a mais de um sistema que dá privilégios aos bandidos e tira direitos do cidadão. Pois, criam-se leis para proteger o bandido e não se criam leis para puni-lo ? e nem entra em discussão a necessidade de reeducação.
A esse respeito foi criado o engambelamento da "ressocialização". Mas essa é só mais uma forma de dizer que o sistema prisional não está cumprindo seu papel e, dessa forma, tenta se eximir da culpa jogando a responsabilidade para a escola. E quem paga o prejuízo? O professor e os alunos que desejam estudar, pois o professor acaba sendo obrigado a agir como carcereiro sem ter tempo para agir como professor. E, com isso o estudante que deseja estudar se torna refém de um sistema podre que inverteu os papéis: pune o inocente, o que cumpre as obrigações... e dá privilégios aos bandidos.
Neste ponto entram os utopistas. Dizem e fazem homenagens e enaltecendo o professor. Dizem que seu lugar jamais será ocupado. Mas não é verdade. O espaço do professor já se perdeu. Foi substituído pelas tecnologias de comunicação. Podemos dizer que hoje se redefiniram os papéis. É professor, além de receber um salário miserável, aviltante, passa a exercer um papel de carcereiro. Passa a exercer um papel de palhaço do sistema. Passa, ele próprio, a desacreditar daquilo que faz, pois vê que sua ação perdeu o sentido.
E assim o professor, mesmo amando o que faz, tem que confessar que exerce um papel anacrônico, pois seu saber foi dispensado. Sua autoridade foi descartada. Sua experiência é posta em cheque. Seu salário foi roubado. Seu espaço foi tomado. Mesmo se modernizando, se atualizando, estudando... permanece uma figura folclórica. Tanto frente aos alunos, como diante dos burocratas do sistema.
É verdade que o professor, permanece sendo uma autoridade na sala de aula. Mas uma autoridade sem poder, pois seu poder foi usurpado pela lei. E aqueles que mandam cumprir a lei, mandam o professor se calar, para que gritem aqueles que não querem estudar. Não é a toa que faltam tantos professores...
Mas, tudo tem seu dia. E tem dia do professor. Mas o que temos a comemorar?

Neri de Paula Carneiro ? Mestre em Educação, Filósofo, Teólogo, Historiador.
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Autor: Neri P. Carneiro


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