Rejeição de filhos e direitos fundamentais



Rejeitar a paternidade, apesar de tendenciosamente camuflada, se tem tornado uma prática frequente nos dias que correm.
As razões deste indigno mal são inúmeras: Imaturidade, imoralidade, irresponsabilidade, inconveniências diversas e egoísticas - é um conjunto de justificações injustiçadas que rolam mas que em nada abonam e muito menos prestigiam a sociedade e a criança, em particular ? é um pecado à humanização.
Das diferentes narrações por nós captadas em distintos meios deste solo pátrio, condensamos, apenas as mais comuns.
Maioritariamente, pais recusam-se a reconhecer filhos porque imaturos, jovens que do emocional relacionamento desaguam numa situação em que tenham de assumir uma gravidez não planificada, eclodindo receios quanto à reacção dos pais ante a sua dependência material (normalmente estudantes ou desempregados), preferindo, em consequência, a fuga à responsabilidade. Noutros casos, os jovens rejeitam os filhos por coação dos pais em razão de discriminação social: Como foste capaz de engravidar aquela pobrezinha sem classe? Não me traga compadres desgraçados ? eis a conversa simbolizante da cruel interferência no amor dos filhos!
Numa outra vertente, a rejeição decorre da imoralidade azedada à irresponsabilidade, de homens casados que, em relação paralela, deparam com uma inesperada gravidez da parceira e a fuga à paternidade torna-se a conveniência para proteger o seu lar em detrimento do valor daquela mãe que se sujeita solteira e desprestigiada. Mais penosa fica a criança sem culpa, privada do direito fundamental de ter apelido de família.
Cabe sublinhar que a rejeição de filhos também ocorre do lado materno. As alegações são díspares. Deparam-se as já referidas atitudes comportamentais dos homens, que muitas das vezes ditam a revolta feminina mas não justificam situações friamente dramáticas de abandono de bebés e, às vezes, ao relento.
O buscando leis de hoje é motivado por alguns dos nossos estimados leitores que, para além de se mostrarem indignados com este mal social, questionam sobre os possíveis remendos jurídico-legais ou seja: Que fazer para garantir o estabelecimento tanto da maternidade como da paternidade nos casos em que os progenitores rejeitam os filhos?
Já discorremos nestas linhas que a Constituição da República proíbe a discriminação da criança em razão do seu nascimento, sendo a maternidade e a paternidade dignificadas e protegidas (confira-se: artigos 120 e seguintes). Em complemento a estas normas, a Lei da Família fixa no artigo 205, o imperativo de a criança dever ser enquadrada numa família através da sua filiação materna e paterna, pelo registo.
Os mecanismos previstos na lei para o estabelecimento da filiação (maternidade e paternidade) compreendem, grosso modo, a voluntariedade dos pais.
Os pais devem declarar o seu vínculo parental no acto do registo de nascimento ou após aquele.
Os casos em que a lei permite a menção automática são muito limitados: no acto do registo de uma criança com menos de um (1) ano de idade, é obrigatório indicar a pessoa da mãe, ficando a maternidade estabelecida mesmo que ela não esteja presente ou manifeste a vontade. Trata-se de proteger a criança até esta idade delicada, com a ressalva de a mencionada mãe impugnar, se for o caso. Para as crianças maiores de um ano de idade, a maternidade deve decorrer da própria vontade da mãe mas também pode se recorrer à via do Tribunal para a averiguação oficiosa até aos dois anos de idade, findos os quais deve se proceder à investigação judicial a pedido dos interessados.
Para o caso da paternidade, o vínculo pode ser automático se houver casamento: O filho que nascer de mulher casada presume-se que seja do marido não se necessitando a sua anuência (a ele assiste o direito de impugnar, fundamentando em Tribunal).
Existe também o mecanismo da união de facto: A união estável de pelo menos um ano entre um homem e uma mulher, quando alegada e demonstrada, pode gerar uma situação que permite o registo automático da paternidade.
Fora dos casos supra mencionados, o pai deve reconhecer voluntariamente o seu filho mas não se verificando, o recurso será ao tribunal para averiguar ou investigar por iniciativa da Conservatória (até dois anos) e dos interessados.
O reconhecimento da filiação por via do tribunal subentende um processo complexo durante o qual a vítima é unicamente a criança e por esta razão, o apelo à consciência de todos para que reflictam pensando numa criança sem vínculo dos pais, sem direitos, com protecção legal fragilizada e vulnerável a ilicitudes e abusos.
Em conclusão, urge anotar que rejeitar um filho consubstancia negar um direito fundamental e fragiliza a protecção e o bem-estar da criança. Significa um atentado descarado aos direitos fundamentais da criança.
Autor: Didier Malunga


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