SEM BICHOS, A FLORESTA MORRE...



NARRADOR

O desaparecimento de animais que dispersam sementes põe em risco a sobrevivência de remanescentes da mata atlântica
Pesquisadores comprovaram que a caça e a exploração intensiva das sementes de que os bichos se alimentam deixam as matas brasileiras cada vez mais perto do desaparecimento. Na amazônia, os castanhais envelhecem com chance reduzida de renovação porque a exploração intensiva da castanheira-do-pará (bertholletia excelsa) ameaça a sobrevivência da cutia (dasyprocta spp), principal dispersor das castanhas.
Numa perspectiva global biólogos avaliam que: "as florestas tropicais são hoje a última fronteira em termos de conhecimento, especialmente no que se refere à biodiversidade. Elas são consideradas as maiores fontes de produtos naturais e também são responsáveis pela manutenção de recursos essenciais ao homem, como a água, e pela manutenção da temperatura global. Entretanto, as altas taxas de desmatamento e a conversão de hábitats primitivos pelo homem têm causado o declínio acentuado de espécies animais e vegetais. A pior das extinções poucas pessoas notam: é a perda das interações entre os animais e as plantas, que são responsáveis pela manutenção das florestas".
Sem a dispersão pela cutia, vamos ter apenas fósseis vivos: por exemplo, quando um jatobá de 150 anos morrer, não haverá outros em volta para substituí-lo. Isso poderá modificar muito a dinâmica da floresta, num efeito dominó, ocasionando desequilíbrio em toda a cadeia alimentar.




... E nossa história aconteceu num lugar não muito distante, no meio da Floresta Amazônica.
Diálogo da Cutia com a Caçadora

Cutia ? Meu Deus! preciso fugir daqui, tem uma caçadora armada com um rifle querendo me matar.
A cutia tenta se esconder.
A caçadora vem devagar, olhando de um lado para outro em busca da cutia.
De repente dá de cara com o animal e os dois recuam assustados.
Caçadora ? aha! finalmente te encontrei e desta vez não vais me escapar.
Cutia ? Dona caçadora não me mate eu não faço mal a ninguém.
Caçadora ? Mas eu preciso levar comida para os meus filhinhos.
Cutia ? Olhe, se a senhora não me matar eu trago comida para os seus filhinhos.
Caçadora ? Mas, afinal, quem é você?
Cutia ? O meu nome verdadeiro é Dasyprocta Aguti, mas me chamam de cutia.
Caçadora ? E o que a senhora faz?
Cutia ? Eu sou um roedor muito esperto e habito as florestas brasileiras.
Caçadora ? Mas só isso?
Cutia ? Nãaao. Eu me alimento de sementes caídas das árvores, de raízes e frutos. Aí eu escondo algumas para poder eu comer mais tarde. Isso é o que a senhora tem que fazer, guardar sempre, pois tenho certeza que os seus filhinhos nunca vão passar fome.
Caçadora ? Pois é, por isso que tenho que lhe matar.
Cutia ? Mas a senhora tem que se lembrar que eu contribuo e muito com o meio ambiente, quando eu enterro a minha comida sou responsável pelo plantio de muitas árvores, pois as sementes germinam em todo o lugar já que eu não paro quieta e estou sempre correndo de um lado para o outro. Eu sou pequena, pois meço somente de 40 a 60cm de comprimento, mas sou muito importante para a floresta. Por isso, não me mate.
Caçadora ? hum! ao redor da minha casa tem tantas árvores que dão frutos e sombra. Quantas vezes alimentei meus filhos com eles.
Cutia ? Então! a senhora vê que eu posso contribuir tanto e olhe que só peso entre 3 e 6 kg. Eu só busco abrigos ideais para me refugiar e só saio à noite apesar de que minha espécie é muito comum e está espalhada por todo o lugar. E o mais importante, só me alimento de sementes, frutos e raízes.
Caçadora ? Mas a senhora não tem filhos?
Cutia ? Tenho, mas como sou muito velha, meus filhos estão espalhados por aí. Tive 10 filhos de 5 gestações, já que não posso ter mais que 1 ou 2 por vez. Eles são lindos. Agora mesmo, se a senhora me matar, meus dois filhinhos que estão refugiados num esconderijo não vão poder se alimentar, pois logo eles vão sair a minha procura. O que me deixa mais triste é que logo partirei, pois não vivo mais de 18 anos. Nós nos reproduzimos ao longo de todo o ano e nosso período de gestação é de 105 a 120 dias.
Caçadora ? Mas a senhora não tem parentes?
Cutia ? Tenho, mas minha família vive no Paraguai, no nordeste da Argentina e do Brasil, ainda nos estados de Rondônia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, sul de Tocantins, oeste da Bahia, Minas Gerais, São Paulo, no planalto paulista até a vertente oeste da Serra do Mar, no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, ou seja, é uma família grande.
Caçadora ? Nossa, eu já me sinto tão sozinha com meus filhos, pois além deles não tenho ninguém. Me diga, por que a senhora é tão esquisita?
Cutia - Esquisita como?
Caçadora ? Assim, com esse vestígio de cauda, essas patas da frente curtas e as de trás mais compridas, com pés compridos de cinco dedos, sendo três com unhas cortantes enormes. A sua pelagem aparenta ser dourada, com cada pelo de cores diferentes.
Cutia ? É que nós possuímos uma substância chamada eumelanina. Durante o crescimento do pelo é produzida de forma intermitente criando esse efeito que é chamado de aguti.
Caçadora ? Que legal! e eu que vivo permanentemente com esse rabo de cavalo, já que não tenho dinheiro para comprar um shampoo e lavar meus cabelos louros. A senhora já nasceu com esse pelo lindo.
Cutia ? Bom! eu sinto muito. A senhora ainda quer me matar?
Caçadora ? Sabe que eu não sei mais, acho até que ficamos amigas, não é? mas o que darei para os meus filhinhos comerem?
Cutia ? O meu companheiro, não sei se a senhora sabe, mas vivemos sempre em dupla, está caçando bacupari, que é o fruto que mais gostamos, para depois esconder suas sementes, conhece um rio próximo onde tem várias espécies de peixe. Ele pode lhe levar até lá. A senhora topa?
Caçadora ? Mas é claro! eu tenho que encontrar algo para eles comerem.
Cutia ? Que bom! é que o homem, sem necessidade, está sempre nos caçando e diz que é pra se alimentar, mas tenho certeza que se ele procurar melhor, encontrará outro tipo de alimento. Afinal, se sumirmos da face da terra, as matas brasileiras é que vão sofrer, ficarão cada vez mais perto do desaparecimento. Você sabia que na Amazônia, os castanhais envelhecem com chance reduzida de renovação porque a exploração intensiva da castanheira do Pará ameaça a sobrevivência de nossa espécie, já que somos o principal dispersor das castanhas?
Caçadora ? Pode ficar tranqüila dona cutia, que de agora em diante eu jamais matarei um animal sem que verifique se existe outro meio de subsistência. Afinal, quero ver meus filhos crescerem felizes por termos preservados o meio ambiente para eles.
Cutia ? Eu agradeço e espero que o homem tome consciência do que está fazendo e modifique seu modo de agir e pensar. Agora vou buscar meu companheiro para levá-la até o rio. Foi um prazer enorme conhecê-la e ainda nem sei seu nome.
Caçadora ? O prazer foi todo meu, dona cutia. A partir de hoje aprendi que sem bichos a floresta pode morrer, por isso precisamos cuidar e preservar os animais, que são também importantes seres vivos, em especial, a senhora dona cutia, a maior semeadora da floresta. Assim como a senhora, irei semear o amor pelos animais, nossos amigos que tem um papel relevante na preservação da vida de diversas árvores da floresta e conseqüentemente da vida humana e, o meu nome é ESPERANÇA.

Narrador

A interação entre homens e animais data de épocas pré-históricas. Eles, assim como nós, herdaram o planeta e coexistem conosco desde sempre.
Infelizmente, nesta relação os animais sempre saíram perdendo, os homens nunca deram muita atenção para a real importância desse relacionamento. Na realidade, o homem sempre achou que a única função dos animais no mundo é servi-lo, seja a que preço for. Eles são importantes peças de um quebra cabeças do qual nós também fazemos parte. Coabitamos e coexistimos em um mesmo planeta, juntos formamos o elenco de uma peça espetacular, em que não existem atores principais.
Cabe a nós humanos, na condição de seres pensantes, a responsabilidade de proteger e respeitar as outras formas de vida que convivem conosco. Devemos entender que cada elemento tem seu papel fundamental e que sem o qual haverá um grande desequilibro, que afetará todas as formas de vida.
A importância dos animais vai muito além do que podemos imaginar. Assim como ainda não descobrimos a quantidade de espécies de plantas existentes no mundo, não descobrimos também o potencial dos animais estamos mais preocupados em escravizá-los para servirem como fonte de lucro fácil
Observamos diariamente o desrespeitoso e antiético tratamento dispensado por nós aos animais. Baleias são cruelmente massacradas pelo interesse econômico de algumas nações, focas são cruelmente assassinadas em nome da supremacia humana, animais silvestres são retirados de seu habitat natural, onde cumprem um papel importante no ecossistema, para servirem de moedas vivas nas mãos de homens ávidos por dinheiro.
Onde estão a ética e respeito dos seres humanos? Por onde anda a gratidão e a compaixão, sentimentos ditos inerentes da espécie humana?
Toda ação provoca uma reação, não é assim? Pois bem, estamos colhendo os frutos amargos de uma semeadura irresponsável. Nossos atos geraram reações desagradáveis para nós mesmos. Plantamos desrespeito, indiferença, ingratidão e estamos recebendo doenças, guerras inoportunas, mudanças climáticas e expectativas futuras nada positivas.
O quadro só se transformará com mudanças na forma de pensar e agir de cada um de nós, um olhar mais direcionado e amoroso para as criaturas que juntamente conosco habitam o planeta, e que exercem um papel único no mundo.
Essa visão também deve ser passada para nossos filhos, afinal, as próximas gerações terão um árduo trabalho na reconstrução de um mundo mais justo, mais igualitário, um mundo mais fraterno.
Autor: Rosa Suzana Batista Farias


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