Judeus perseguição e intolerância ao longo da História



Alexandra Eliziario da Silva

Resumo
Gil Vicente retrata na sua obra o Auto da Barca do Inferno a intolerância praticada aos Judeus. E ao longo do século XV ate meados do século XVIII os Judeus eram obrigados a se converterem ao cristianismo recebendo o titulo de Cristãos- Novos. E a intolerância continua porque a mentalidade dos portugueses esta enraizada em muitas sociedades.

Palavra Chave: Judeus, Intolerância, Cristãos ? Novos

Desde o inicio do século VII os Judeus eram preponderantemente um povo de diáspora uma teia de comunidades espalhadas da Espanha a Pérsia e da Europa central ao Saara. O judaísmo era a religião de um povo e os Judeus um povo de uma religião, uma unidade sócio-religiosa.
Os Judeus que habitavam a Espanha eram conhecidos como Sefaradim¹. Eles eram comerciantes, proprietários de terras e agricultores.
Em meados do século XI, os Judeus Sefaradim saíram do seu isolamento cultural para produzir uma larga escala de homens que emularam com Samuel ebn Nagrela, que combinaram uma apreciação de cultura geral, ciência natural, literatura e fidelidade ao judaísmo rabínico.
Os Sefaradins tinham ampla gama de ocupações, eram lojistas, artesões, médicos, conselheiros do rei e peritos financeiros.
No final do século XIV a situação dos Judeus espanhóis se deteorizou notavelmente.
Só em meados do século XIV se desencadeia em Espanha a perseguição acaudilhada sobre tudo por membros do baixo clero, secundados pelo povo simples, que via nos Judeus a causa das suas penas. (Saraiva, 1985, p.22)


Dava-se inicio a perseguição não dos Judeus, mas daqueles que eram considerados judaizantes (pessoas que se convertiam ao cristianismo, mas continuavam a fazer os rituais judaicos).
Fernando e Isabel reis católicos estabeleceram a Inquisição² espanhola para investigar as acusações que circulavam contra os conversos. A Inquisição estava sob a jurisdição do Papa, mas era controlada pela monarquia.
Todos que eram descobertos pela Inquisição tinham suas terras confiscadas e condenados a diversas penas, e os que se recusavam a se arrepender eram entregues a autoridades seculares pra morrerem na fogueira.
Granada foi conquistada e com isso foi publicado um edito que tornava ilegal o judaísmo na Espanha.
Alguns se converteram e outros partiram para Portugal, aonde não eram obrigados a se converterem, nem eram molestados nos seus costumes e continuavam com seus comércios.
O rei D. Manuel que queria se casar com a herdeira do trono espanhol se comprometeu a expulsar os Judeus que viviam em Portugal, e concedeu um prazo para que os Judeus saíssem de seu pais. Mas algumas medidas foram tomadas para dificultar a saída dos Judeus.
Tudo foi feito para dificultar o embarque dos Judeus que insistiam em partir, apesar de o Rei se ter comprometido a fornecer-lhes meios de passagem... Mas um bando de frades acompanhados de sicários investiu os locais onde estavam concentrados, e, os violentado, lançou sobre eles águas do baptismo. (Saraiva, 1985, p.34)
A perseguição aos cristãos-novos era por causa da posição social que eles tinham sobre muitos cristãos ? velhos. E com a acusação de serem praticantes do judaísmo eram considerados hereges, levados a morte e seus bens confiscados.
O Tribunal do Santo Oficio que vivia sobre os bens confiscados dos réus e a que convinha demonstrar que o Judaísmo se multiplicava, era parte interessada nos processos. Sustentamos-nos não apenas que os inquisidores eram homens sujeitos aos enganos e a paixão, participantes nas lutas entre clãs, grupos de pessoas e classes sociais, mas ainda: que as regras do processo inquisitorial eram incompatíveis com uma verdadeira imparcialidade de juízo e levavam automaticamente a condenação de inocentes. (Saraiva, 1985, p.57)

Gil Vicente retratava os Judeus em seus Autos, principalmente no Auto da Barca do Inferno. Ele mostra o preconceito e a intolerância para com os Judeus e como eles eram satirizados.
Quem vai la ? Hou marinheiro!
Oh! Que ma-hora vieste?
De quem e esta barca que preste?
Esta barca e do barqueiro.
Passai-me por meu dinheiro.
E o bode há ca de vir?
Pois também o bode há-de-ir.
Que honrado passageiro! (Junior, 1996, p.59)

Havia dois bateis o do Paraíso e o do Inferno e nenhum queria levar o Judeu e o seu bode (animal usado como sacrifício para expiação dos pecados).
O Anjo nunca o levaria porque ele era considerado aquele que havia matado Jesus Cristo. E o Judeu somente estaria livre desse pecado se tivesse se convertido ao cristianismo. Mas o que torna essa historia interessante e que nem o Diabo queria levá-lo e todos que já estavam dentro do batel infernal se opuseram a entrada o Judeu mesmo sabendo que todos teriam o inferno como morada eterna.
Furtaste a cabra, cabrão?
Paraceis-me vos a mim
Gafanhoto de Almeirim
Chacinado em um seirão.
E comia carne da panela
No dia de nosso Senhor!
E aperta o salavanor,
e mija na caravela!
Vamos, vamos! Demos a vela!
Vos judeu, ireis à toa,
Que sois muito ruim pessoa.
Levai o cabrão na trela!

Nisso nos vemos como o preconceito já estava enraizado na mentalidade dos portugueses, e essa mentalidade de que os Judeus são assassinos e inferior vem se alastrando ao longo da Historia.
Diante disso ha fatos que nos causam grandes preocupações sobre a condição humana, os sentimentos, as idéias, as emoções, os afetos, os interesses que favorecem a idéia de hierarquia entre as pessoas, a invenção de grupos humanos "superiores e inferiores".
Sempre foi um grande desafio discutir questões ligadas às desigualdades nas sociedades. A questão da igualdade, de oportunidades, tratamento e direito toca num ponto fundamental da nossa condição humana, a tendência que o ser humano adquire em considerar natural auto-afirmação de um individuo,através da negação do outro.
Assim muitas vezes, a pessoa alcança o sucesso através da expropriação, da marginalização, e ate da destruição do outro.
Parto do princípio de que as sociedades reproduzem as desigualdades ao longo dos séculos com ampla participação da população quer intencionalmente, quer inconscientemente, seja através de ações discriminatórias ou da omissão frente às praticas.
Dessa forma quando fazemos uma reflexão sobre nossos próprios valores, crenças e condutas e fundamental para entendermos as desigualdades étnicas.
Os europeus criaram uma identidade narcisista exagerada, foram alem do fato de gostar de si mesmos e lutar para satisfazer seus desejos, expressar suas opiniões, sentimentos, sonhos e tentar realizá-los.
E esse narcisismo exarcebado criou um autoritarismo e um alto índice de violência. O maior exemplo dessa mentalidade narcisista foi à ascensão de Adolf Hitler, uma combinação perfeita entre o narcisismo e a violência.
Hitler tinha certeza que pertencia a uma raça superior e que os Judeus eram inferiores.
Como no Auto da Barca do Inferno as pessoas viviam escondidas atrás de uma mascara, escondendo seu verdadeiro eu, e com isso podiam apontar, excluir, julgar e ate matar aqueles que não se enquadravam no seu falso moralismo, hoje também encontramos inúmeras pessoas que se escondem atrás de suas mascaras e com isso exclui a todos que não se adaptam ao seu falso moralismo.
Quando vemos o "outro" através de uma mascara e como nosso espelho estivesse sujo ou rachado ao ponto de não conseguirmos nos enxergar no "outro", e como isso nosso semelhante se torna um ser monstruoso que necessita ser destruído. E assim vamos regredindo na nossa condição de ser humano.
"Uma infinidade de seres inferiores ao ser humano, prova uma infinidade de seres superiores a ele." (John Locke)


_______________________
¹. Sefaradim. Judeus espanhóis
². Inquisição. Era um tribunal religioso para erradicar a heresia.
BIBLIOGRAFIA
Fontes impressas:
Junior, Benjamim Abdala - São Paulo; Ed. SENAC São Paulo, 1996. Adaptação e Notas
Spina, Segismundo. O Velho da Horta/auto da Barca do Inferno/A Farsa de Inês Pereira: Gil Vicente ? 37º Ed ? São Paulo: Ed. Ateliê São Paulo, 2003.
Saraiva Antonio Jose ? Ed. Estampa, Lda., 1994. Historias de Portugal / Inquisição e Cristãos ? Novos ? 6ª Ed.
Seltzer, Robert M. O Povo Judeu/Pensamento Judaico ? 1º Ed ? Rio de Janeiro ? Ed. A. Koogam, 1990.

Fontes eletronicas:
http:// w.w.w.bnportugal. pt
http:// w.w.w.judiariadaguarda.web

Autor: Alexandra Eliziario


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