DOR CRÔNICA: UMA EXPLANAÇÃO SOBRE SEUS ASPECTOS



Cibelle Marchi de Ângelo DOURADO 2
Ana Elisa Feracini PERUZZO 3
Suellen dos Santos SILVA 4
Vanessa Maques Gibran FACO 5

Faculdade da Fundação Educacional de Araçatuba

Segundo Pimenta Cam, a dor crônica é mais que um sintoma. Sua presença constante e duração prolongada, em geral, são muito perturbadoras. Acarretam alterações nas atividades físicas, no sono, na vida sexual, modificação do humor, baixa auto-estima, pensamentos negativos, apreciação desesperançada da vida, altera relações familiares, de trabalho e de lazer.
A dor é uma sensação que surge quando há ameaça de dano a um tecido e, por isso, sentir dor é fundamental para a sobrevivência de uma espécie. Uma dor aguda serve como esse sinal de alerta, porém a dor crônica já não tem mais esse sentido. A dor crônica acaba com a qualidade de vida, limita os movimentos, a agilidade e o bem estar de milhares de pessoas. Nos parágrafos a seguir serão apresentados de forma sucinta alguns conceitos de dor, os aspectos psicológicos da dor crônica e a contribuição do psicólogo para o tratamento, bem como a importância da atuação de uma equipe multiprofissional e interdisciplinar para o acompanhamento do paciente.

Palavras-Chave: psicologia; dor crônica; interdisciplinar.

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1 Trabalho realizado durante disciplina de Psicologia Hospitalar.
2 Autora responsável pelo trabalho
3 e 4 Co-autoras responsáveis pelo trabalho
5 Orientadora ? Professora Mestre do curso de graduação em psicologia da FAC/FEA.

INTRODUÇÃO
Segundo Cruz (2002, p. 99):

"A raiz latina da palavra dor é dolor, que significa sofrimento. No cotidiano, o termo dor está vinculado ao sofrimento físico e/ou mental. Outras definições referem-se a dor como um sofrimento moral, mágoa, pesar, desconforto, uma sensação desagradável. Apesar do desconforto existente, a função inicial da dor é informar sobre um perigo potencial ou real, bem como a quebra da homeostase organísmica". (AVALIAÇÃO E MEDIDAS PSICOLÓGICAS: PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO E DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL, 2002, 277p).

Quanto à temporalidade da dor existem dois tipos, a dor aguda e a dor crônica. A dor aguda é a dor de início recente e de duração provavelmente limitada. Straub (2005, p.467) define dor aguda como:

"[...] cruciante e pungente e normalmente se localiza em uma área ferida do corpo. Embora a dor aguda possa durar de alguns segundos a vários meses, geralmente diminui à medida que ocorre a cura. Exemplos incluem queimadura, fratura, fadiga muscular ou dor após a cirurgia. Outro tipo de dor aguda é a dor aguda recorrente, na qual episódios de desconforto são intercalados com peíodos nos quais o indivíduo está relativamente sem dor. As enxaquecas periódicas são esse tipo." (PSICOLOGIA DA SAÚDE, 2005, 676p).

Já a dor crônica é caracterizada por uma dor prolongada, normalmente com difícil identificação temporal e/ou causal, que causa sofrimento, podendo manifestar-se com várias características e gerar diversos estádios patológicos. "A dor crônica pode ser contínua ou intermitente, moderada ou grave em intensidade e sentida em quase todos os tecidos do corpo." (STRATUB, Richard, 2005, p.468)
Cerca de um terço da população apresentará algum tipo de dor crônica durante a vida. À medida que vivemos mais, cresce o número de pessoas com dores na coluna, articulações, doenças reumáticas, câncer, degenerações ou inflamações nos órgãos internos e outros problemas que podem provocar dores crônicas.

"Em um momento ou outro, raro as exceções, todos os seres humanos experimentaram, experimentam ou experimentarão sensações dolorosas. A dor crônica é expressa inicialmente através de numerosas afecções clínicas. A dor crônica, em algumas situações, proporciona sofrimento desnecessário, nocivo tanto ao estado físico quanto emocional do indivíduo". (CRUZ, Roberto, 2002, P.117)

Dor é uma sensação que surge quando há ameaça de dano aos tecidos, sejam eles quais forem. Sentir dor é fundamental para manter a integridade do organismo. Doenças que alteram a sensibilidade estão associadas ao aparecimento de traumatismos e ferimentos imperceptíveis. É o caso da hanseníase podem ocorrer lesões nas terminações nervosas, tais, que a dor deixa de ser percebida, por exemplo.
Dor Crônica:

"Dores crônicas, em geral, produzem alterações permanentes na vida de um indivíduo, modificando comportamentos, inserção familiar e social, enquadrando-o como um indivíduo sem habilidades para algumas atividades, sujeito à disposições sociais estabelecidas para esta categoria." (CRUZ, Roberto, 2002, p.117)

Dores crônicas podem estar vinculadas tanto a desordens do sistema responsável pela percepção quanto da inibição da dor. A fibromialgia, por exemplo, uma doença debilitante causadora de dores musculares crônicas, muitas vezes não diagnosticadas pelos médicos, é tida hoje como conseqüente a um desarranjo nos mecanismos de inibição da dor.

"A psicologia oferece, no campo da terapêutica humana, a possibilidade de confronto do paciente com sua angústia e sofrimento, na fase de sua doença, buscando superar o momento de crise". (CAMPOS, Terezinha, 1995, p.70)

ASPECTOS PSICOLOGICOS DA DOR: CONTRIBUIÇÃO DO PSICOLOGO PARA O TRATAMENTO
Segundo Simonetti (1959, p. 16)
"Aspecto psicológico é o nome que damos para as manifestações da subjetividade humana diante da doença, tais como sentimentos, desejos, a fala, os pensamentos e comportamentos, as fantasias e lembranças, as crenças, os sonhos, os conflitos, o estilo de vida e o estilo de adoecer. Estes aspectos estão por toda a parte , como uma atmosfera a envolver a doença, como desencadeador do processo patogênico, como agravante do quadro clínico, como fator de manutenção do adoecimento, ou ainda como conseqüência desse adoecimento[...]" (MANUAL DE PSICOLOGIA HOSPITALAR, 2004, 201p.)
Portanto, os médicos sempre tentam determinar as causas físicas e psicológicas da dor. Muitas doenças crônicas como câncer, artrite ou anemia falciforme e distúrbios agudos, como feridas, queimaduras, distensões musculares, fraturas ósseas, distensões ligamentares, apendicite, cálculos renais ou um infarto do miocárdio causam dor. "Quando alguém se apresenta ao médico queixando-se de dor, há, em princípio, 50% de probabilidade que essa dor seja psicogênica, isto é, um tipo de dor que não depende de uma lesão tecidual, atual ou pregressa." (FILHO, 1992, p.173). As doenças psicológicas como depressão e ansiedade também podem causar dor psicogênica, assim como fatores psicológicos também podem fazer com que a dor de uma lesão física pareça mais ou menos intensa. O médico deve levar essas questões em consideração. Como explicar, por exemplo, a "dor fantasma" relativamente comum em pacientes amputados? E a capacidade dos paraplégicos de sentirem seus corpos?

"As sensações nos membros fantasma são incrivelmente "reais" em suas vívidas qualidades sensoriais e em seu preciso local no espaço, tão reais que o amputado pode tentar sair da cama sobre o pé fantasma ou atender o telefone com a mão fantasma [...] Os mecanismos subjacentes da dor permanecem um mistério[...] Uma explicação propôs que a dor fantasma resultava da falta de adaptação emocional do amputado à perda do membro. Outra sugeria que as fibras nervosas danificadas no coto continuavam a enviar mensagens neurais para o sistema nervoso central, que eram interpretadas como estímulos dolorosos. Uma terceira explicação era que as memórias emocionais são armazenadas juntamente com as memórias sensoriais do membro amputado." ( STRAUB, Richard, 2005, p.478).

Devemos então entender a importância de se estudar os aspectos psicológicos em todas as áreas relacionadas à saúde do ser humano sendo que a Psicologia é uma ciência que contribui amplamente para a identificação e tratamento de transtornos que pode agravar o quadro de pacientes com dor e outras enfermidades sendo ela de origem orgânica ou não.

"Os aspectos psicológicos presentes nos quadros álgicos (tanto de dor aguda como crônica) envolvidos com a instalação e/ou manutenção de transtornos comportamentais e mentais merecem ser investigados e conhecidos para que intervenções possam ser programadas e executadas." (Oostdam & Duivenvoorden, 1987, Pincu & Williams, 1999, McGrath, 1994, e Ciccone & Grzesiak, 1984)

A avaliação psicológica pode ajudar no diagnóstico dos aspectos psicológicos associados com a dor, além de permitir ao profissional de saúde planejar intervenções que vão do diagnóstico até a prevenção, o manejo e o tratamento da dor.
Segundo Cruz e Sardá (2002,p.106-7) :

"No que se concerne ao método, a avaliação da dor divide-se em três grandes categorias: medida de respostas fisiológicas da dor, observações de comportamentos relacionados à dor e descrições verbais ou escritas da dor e variáveis associadas a esta.As medidas de respostas fisiológicas da dor geralmente são realizadas em laboratórios ou clínicas médicas e consistem em medir o limiar fisiológico, o limiar de tolerância e a resistência[...]. As observações de comportamentos relacionados à dor permitem a compreensão da manifestação da dor no que se refere à interpretação e resposta a estímulos dolorosos.[...]. As descrições verbais ou escritas da dor são com freqüência os métodos mais utilizados. As entrevistas, testes psicológicos, técnicas projetivas e diários de dor permitem a compreensão da subjetividade do paciente e de diversas outras variáveis não acessadas pelos outros dois métodos acima descritos. Através desses métodos podemos acessar componentes motivacional-afetivo, sensório discriminativo e cognitivo-avaliativo."(AVALIAÇÃO E MEDIDAS PSICOLÓGICAS: PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO E DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL, 2002, 277p.)

No contexto de características multidimensionais relacionadas com a dor, fica claro os aspectos psicológicos podem ter um papel de destaque no início, na gravidade, no exacerbamento ou mesmo na manutenção da dor por isso torna-se necessário e, em alguns casos, indispensável a avaliação psicológica da dor no processo de investigação dos aspectos psicológicos presentes em quadros álgicos.

TRATAMENTO DA DOR CRONICA: EQUIPE MULTIPROFISSIONAL E INTERDISCIPLINAR

O modelo integrado de assistência multidisciplinar deve moldar-se à natureza complexa e multidimensional da dor e implicar a formulação individualizada de planos diagnósticos e terapêuticos que freqüentemente exigem a adoção de várias modalidades de intervenções concomitantes ou seqüenciais, multiponto e multimodais.

"Os programas mais eficazes de controle da dor são programas multidisciplinares que combinam intervenções cognitivas, físicas, e emocionais da terapia cognitivo-comportamental com o uso racional de drogas analgésicas. Os objetivos de programas desse tipo estendem-se além do controle da dor, e buscam restaurar a qualidade de vida geral do paciente, diminuindo o enfoque na medicação, restaurando os níveis de atividade e aumentando o bem-estar psicológico e social".(STRAUB, Richard, 2005, p.492)

Portanto, o controle dos sintomas, a melhora do conforto, a modificação do simbolismo da dor, a normalização ou a restauração das funções físicas, psíquicas e sociais dos doentes, a maximização dos potenciais remanescentes, a prevenção da deterioração das condições físicas e comportamentais são algumas metas a serem atingidas no tratamento de doentes com dor crônica. O objetivo do tratamento é a melhora da qualidade de vida e a reintegração biopsicossocial dos doentes. Para isso é necessário que não entendamos a dor como um fato isolado, como um simples produto de uma disfunção orgânica, mas sim como um resultante de diversos fatores singulares interpretados de formas distintas por cada um de seus portadores.
Sobre esse assunto Campos (1995, p.96) diz:


"Há necessidade de uma inter relação entre os diferentes profissionais, que devem ver o paciente como um todo, tendo uma atitude humanizada. É de interesse que o psicólogo transmita seus conhecimentos e percepções do paciente aos membros da equipe, para que estes possam ter uma visão integral do paciente. (PSICOLOGIA HOSPITALAR: A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO EM HOSPITAIS.1995, 112p.)

O tratamento da dor deve priorizar a eliminação dos fatores causais e que perpetuam. Entretanto, nem sempre isso é possível de ser posto em prática. Deve-se priorizar o tratamento sintomático da dor. Medidas farmacológicas, de reabilitação, psicoterápicas, anestésicas, oncoterápicas, cirúrgicas e/ou neurocirúrgicas funcionais possibilitam minimizar a dor e resgatar ou melhorar os parâmetros funcionais na maioria dos indivíduos, o que é de grande valia para uma melhor qualidade de vida. O maior índice de alívio da dor crônica tem sido obtido com o uso dos antidepressivos tricíclicos, como Imipramina. Entretanto, não está definitivamente comprovado se a melhora da dor provocada por essas drogas é dependente ou não dos seus efeitos antidepressivos.
A dor crônica freqüentemente não pode ser eliminada completamente, mas o desempenho do paciente pode ser melhorado substancialmente, mesmo quando a dor persiste.
Para que o profissional possa contribuir com a melhora do paciente ele necessita:

"[...] ouvir o apelo e sentir a angústia, para então poder responder com a ação adequada. O ouvir e o sentir, assim como atender em profundidade o cliente é tarefa primordial de todo profissional da saúde, pois todo serviço referente à saúde é um encontro de pessoas, sendo necessário que o paciente aja, intervenha, se manifeste e contribua efetivamente no processo de sua plena reintegração física, psicológica e social. O paciente precisa querer a sua saúde, estendendo-a a seu ambiente familiar e social." (CAMPOS, Terezinha, 1995, p.60)


O tratamento deve também contemplar os aspectos cognitivos e comportamentais, não apenas dos pacientes, mas também de seus cuidadores, uma vez que estes freqüentemente apresentam convicções negativas e distorcidas em relação ao significado dos diagnósticos, exames complementares, farmacoterapia, reabilitação, atividades físicas, repercussões psicossociais, capacidades funcionais, atitudes e perspectivas futuras. "os psicólogos ajudam os pacientes a entenderem o funcionamento de seu corpo, a compreenderem as manifestações de sua doença, a acompanharem seu tratamento [...]" (CAMPOS, 1995, 101p.)
A eliminação dos elementos que ativam as vias nervosas, a adoção de atitudes de enfrentamento da dor, a eliminação de co-morbidades, pensamentos ou crenças desfavoráveis, entre outras medidas, são necessárias e fundamentais para assistir os pacientes com dor.
Os medicamentos também são imprescindíveis e aliados da reabilitação, pois além de possibilitar o controle da dor e de suas repercussões, facilitam a participação ativa dos doentes nos programas de reabilitação.
As atividades físicas são talvez uma das mais importantes recomendações para tratar e reverter sintomas e anormalidades físicas ou psicológicas em doentes com dor crônica, portanto o programa de manejo da dor deve orientar os doentes quanto aos efeitos nocivos da inatividade, esclarecer a importância e o benefício dos exercícios quanto ao aumento da flexibilidade e da força, e quanto à melhora da função do aparelho locomotor, do condicionamento cardiovascular e respiratório e do corpo como um todo, pois, freqüentemente, ao longo do tempo, muitos doentes com dor crônica reduzem as atividades físicas e evitam movimentos e exercícios, do que resulta comprometimento gradual do condicionamento físico. O terapeuta deve ser o responsável pelo ensinamento de técnicas de automanejo da dor e o doente pela aplicação de tais técnicas.
Conclui-se, portanto, que a dor crônica pode ser causada por uma disfunção orgânica devida as desordens do sistema responsável pela percepção e/ou da inibição da dor, e também pode ter em sua origem uma causa psicológica a esse processo dá-se o nome de dor psicogênica. Nesse sentido afirma-se a pertinência da atuação do psicólogo no acompanhamento do quadro de pacientes que sofrem de dor crônica, além do que vimos que as reações psicológicas do sujeito frente a essa situação podem contribuir para amenizar ou intensificar o processo de tratamento e reabilitação. Considera-se, contudo, que a forma de tratamento mais adequada a pacientes com dor crônica é a intervenção de uma equipe multidisciplinar que enxerguem o paciente como um todo, de uma forma humanizada. A dor crônica é um problema grave e merece a atenção de profissionais da área da saúde por esta causar grandes danos a vida do paciente, necessitando muitas vezes de readaptação no curso da vida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
CAM, Pimenta. Atitudes de doentes com dor crônica frente à dor [tese livre-docência]. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 1999.
CAMPOS, Terezinha. Psicologia Hospitalar: a atuação do psicólogo em hospitais. São Paulo:EPU, 1995. 112p.
CRUZ,Roberto; ALCHIERI, João e SARDÁ, Jamir. Avaliação e medidas psicológicas: produção do conhecimento e da intervenção profissional.São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002. 277p.
FILHO, Júlio. Psicossomática hoje. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1992. 385p.
SIMONETTI, Alfredo. Manual de Psicologia Hospitalar: o mapa da doença. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. 201p.
STRAUB, Richard. Psicologia da Saúde. Porto Alegre: Artmed, 2005. 676p.

Autor: Ana Feracini Peruzzo


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