Artigo: O presidente Ernesto Geisel e o estabelecimento do retorno à democracia ao Brasil pós Regime Militar de 1964



Artigo: O presidente Ernesto Geisel e o estabelecimento do retorno à democracia ao Brasil pós Regime Militar de 1964

Roberto Ramalho é Advogado, Jornalista, Relações Públicas e estudioso de assuntos políticos e jurídicos

I - A posse do presidente Geisel, sua política externa agressiva e a abertura lenta e gradual para o Regime Democrático

Empossado pelo Congresso Nacional após sua vitória em eleição indireta no Congresso Nacional contra o ex-presidente nacional do MDB e depois PMDB, Ulisses Guimarães, o general Ernesto Geisel já tinha em mente o restabelecimento do Regime Democrático no Brasil anos depois.
No dia 19 de março, o presidente se reuniu pela primeira vez com seu ministério, composto pelo general Golberi do Couto e Silva (Gabinete Civil), general Hugo Abreu (Gabinete Militar), general Vicente de Paulo Dale Coutinho (Exército), almirante Geraldo Henning (Marinha), brigadeiro Joelmir de Araripe Macedo (Aeronáutica), Mário Henrique Simonsen (Fazenda), Armando Falcão (Justiça), Antônio Francisco Azeredo da Silveira (Relações Exteriores), Arnaldo Prieto (Trabalho), Nei Braga (Educação e Cultura), Alisson Paulinelli (Agricultura), Dirceu Nogueira (Transportes), Euclides Quandt de Oliveira (Comunicações), Shigeaki Ueki (Minas e Energia), Severo Gomes (Indústria e Comércio), Paulo Machado (Saúde), João Paulo dos Reis Veloso (Planejamento) e Maurício Rangel Reis (Interior).

Nesse momento ainda não fazia parte do ministério o general João Batista Figueiredo, chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), e que seria um dos maiores responsáveis em ajudar Geisel na preparação ao retorno à democracia, avisando o momento certo de duas tentativas de golpe dentro do golpe e do retorno ao regime de linha dura, cujo cargo passaria a ser considerado equivalente ao de ministro somente a partir de 1º de maio seguinte.

Em discurso pronunciado no dia 29 de agosto e considerado pela imprensa na época como o mais importante desde o início de seu governo, Geisel definiu de forma mais clara seu projeto político como de "distensão lenta, gradual e segura". Traduzindo o tradicional binômio "desenvolvimento e segurança" formulado pela ESG, esse projeto defendia "o máximo de desenvolvimento possível com o mínimo de segurança indispensável". Ao aplicá-lo, Geisel iria continuar uma política de abertura com freqüentes reafirmações de sua autoridade e seu controle sobre o processo em curso.

Sendo o primeiro país a reconhecer o governo português de linha socialista formado em seguida à derrubada da ditadura salazarista no dia 25 de abril de 1974, viria e estabelecer relações diplomáticas com os Emirados Árabes e o Bahrein em junho e, em 18 de julho seguinte, apoiou o ingresso de Guiné Bissau na Organização das Nações Unidas (ONU), reconhecendo assim a independência dessa antiga colônia portuguesa.
Além de em julho, ter estabelecido relações diplomáticas com Omã e
percebendo a necessidade de "realinhamentos inevitáveis" na política externa, a Presidência da República e o Itamarati realizaram um trabalho de preparação junto ao Conselho de Segurança Nacional, à ESG e outras instituições formuladoras das estratégias nacionais para dar suporte político e, pragmático e ideológico a principal decisão do governo nesse período: o reatamento das relações diplomáticas com a República Popular da China, realizado em 15 de agosto de 1974 durante a visita de uma missão desse país ao Brasil.

Na mesma data, foi firmado um compromisso comercial entre os dois países, pouco tempo depois, como já era esperado, a China Nacionalista (Formosa ou Taiwan) romperia relações diplomáticas com o Brasil.
As atitudes de seu governo em relação a uma nova política externa começou a incomodar Os Estados Unidos que não via com bons olhos as atitudes do Brasil.

Tudo começou quando na segunda quinzena de outubro e nos primeiros dias de novembro de 1975, Geisel iniciou uma série de decisões aprofundando a linha pragmática de sua política externa, embora algumas delas tenham sido contestadas pelos setores mais conservadores do próprio governo.

Num ato inédito de seu governo em 17 de outubro, a Companhia Brasileira de Entrepostos e Comércio fecharia um contrato de exportação de trezentas mil toneladas de soja para a União Soviética.

Além disso, no dia seguinte a delegação brasileira na ONU votaria a favor de uma moção que condenava o sionismo ? política adotada pelo governo de Israel em relação aos países árabes do Oriente Médio - como uma forma de discriminação racial, provocando uma nota oficial de desaprovação enviada ao Itamarati pelo governo norte-americano.
Em razão desse ato, foi amplamente divulgado que a mudança da posição brasileira em relação ao Oriente Médio estava ligada diretamente à necessidade de aproximação com os países árabes exportadores de petróleo, inimigos de Israel.

De acordo com o Jornal do Brasil de 14 de março de 1976, o chanceler Azeredo da Silveira teria declarado ao chanceler americano Henry Kissinger, seu colega de diplomacia que "se vocês tivessem um milhão de barris de petróleo para nos fornecer diariamente, talvez essa mudança não fosse tão brusca".

Entretanto a política externa brasileira não parava por ai. No dia 5 de novembro de 1975, o Brasil tomaria uma decisão histórica ao votar a favor de um projeto de resolução da ONU que condenava o regime racista da África do Sul ao mesmo tempo em que recomendava a suspensão do fornecimento de matérias-primas estratégicas para esse país.
Porém a decisão mais controversa desse período, entretanto, foi o reconhecimento, em 10 de novembro, do governo angolano em fase de implantação pelo pró-comunista Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), cujas forças militares, em grande parte apoiadas por tropas cubanas, e financiadas por este governo estavam derrotando no campo de batalha os outros dois grupos rivais, a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) e a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), que lutavam ao lado de tropas do governo da África do Sul e recebiam apoio material e maciço dos Estados Unidos, de outras nações ocidentais e da China.

Através do parecer de seu representante em Luanda, ministro Ovídio de Andrade Melo, o governo brasileiro tornar-se-ia o primeiro a reconhecer a República Popular de Angola, proclamada pelo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) pouco depois de consolidar seu controle sobre a capital do país. Apesar de duramente criticada na ocasião, essa decisão foi fortalecida pela evolução da guerra civil, favorável ao MPLA, como da mesma forma viria posteriormente seu governo, mesmo de tendência- marxista-leninista ser reconhecido pela maioria dos países do mundo.

Também em 14 de novembro, o Itamarati anunciaria o estabelecimento de relações diplomáticas em nível de embaixada com Moçambique, outra antiga colônia portuguesa na África e também governada nessa época pelos líderes da guerrilha de tendência marxista-leninista.

Internamente, ainda em 1974, nas eleições para o parlamento, o governo do presidente Geisel também viria a aceitar a derrota para o MDB, partido de oposição ao seu governo, quando conseguiu eleger 16 senadores em Estados importantes da Federação, embora ainda tivesse a maioria no senado através der seu partido político, a ARENA.

A bancada de deputados federais do MDB também aumentaria consideravelmente chegando a ultrapassar 150 (cento e cinqüenta) membros e a ARENA tendo uma redução considerável com menos de 200 (duzentos) deputados, embora ainda mantivesse a maioria.

No dia 26 de outubro de 1975, o general Ednardo D?Ávila Melo, comandante do II Exército, havia distribuído nota oficial comunicando que o jornalista Vladimir Herzog fora encontrado morto por enforcamento em uma das celas do Centro de Operações para a Defesa Interna, ligado ao Departamento de Operações Internas e conhecido pela sigla DOI-CODI, organismo militar responsável pela coordenação dos diversos centros de polícia política em cada região.

O jornalista Vladimir Herzog era na época do fato o diretor-responsável do Departamento de Jornalismo da TV Cultura de São Paulo e editor de cultura da revista Visão. Sua morte causaria grande impacto e repercussão na opinião pública o que viria a causar forte suspeição à versão oficial.
Segundo as fontes citadas, o secretário de Imprensa da Presidência da República, Humberto Barreto, revelaria então pela primeira vez o clima de confrontação existente entre o presidente e os órgãos de repressão política, especialmente os de São Paulo, contestadores da distensão e ligados ao ministro do Exército, general Sílvio Frota.

Em decorrência desse fato o seu secretário de imprensa Humberto Barreto chegara a pedir demissão de seu cargo, mas fora convencido a permanecer pelo próprio Geisel, que revelara necessitar de pessoas fiéis para desarticular o esquema adversário.

Geisel já sabia que alguns militares de alta patente do Exército já articulavam um golpe militar para depô-lo, mas tinha um homem de extrema lealdade e confiança que já vinha há muito tempo monitorando todos os acontecimentos: esse homem era nada mais nada menos que seu ministro Chefe de Segurança de Nacional, general João Baptista de Oliveira Figueiredo que o sucederia na presidência da República levando o Brasil ao retorno ao regime democrático.

Com a aproximação da missa de sétimo dia pela alma do Jornalista Vladimir Herzog, o então ministro Golberi do Couto e Silva transmitiu recomendações aos Jornalistas paulistas para que não aceitassem e evitassem provocações capazes de radicalizar ainda mais a situação.
A missa seria rezada pelo cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, um dos maiores críticos do Regime Militar e reuniria milhares de pessoas na Catedral da Sé em um ambiente de grande tensão, acabando por tornar-se a primeira manifestação política de envergadura contra o governo do presidente Ernesto Geisel.

II ? O Milagre Econômico

O milagre econômico deveu-se a natureza concentradora do governo militar, principalmente em relação às empresas estatais que geraram divisas ao país através das exportações de seus produtos. Segundo Élio Gaspari foi um período paradoxal da História do Brasil. Afirma o autor em sua obra A Ditadura Escancarada[1]

"O Milagre Brasileiro e os Anos de Chumbo foram simultâneos. Ambos reais, co-existiam negando-se. Passados mais de trinta anos, continuam negando-se. Quem acha que houve um, não acredita (ou não gosta de admitir) que houve o outro".

Entre 1968 a 1973 o Produto Interno Bruto brasileiro cresceu a uma taxa média acima de 10% ao ano, enquanto a inflação oscilou entre 15% e 20% ao ano. Além disso, a construção civil cresceu, em média, 15% ao ano.
Durante essa fase de crescimento econômico do país, o grande arquiteto e executor das políticas econômicas no Brasil foi o economista e ministro da Fazenda Antônio Delfim Netto, que chegou a ser batizado de "super-ministro".

A partir de 1973 o crescimento da economia brasileira diminuiu consideravelmente ao ponto de ao mesmo tempo em 1974 ocorrer o primeiro choque do petróleo, quando o preço do barril foi elevado abruptamente de US$3,37 para US$11,25.

Dessa forma, a crise do petróleo acabou provocando uma aceleração da taxa de inflação no mundo todo e principalmente no Brasil, quando passou de 15,5% em 1973 para 34,5% em 1974.

Com isso, o crescimento diminuiu no período 1974-1979 passando a 6,5% em média, enquanto na época do "milagre" as taxas de crescimento se situavam, em média, a 10% anuais, tendo alcançado picos de até 13% anuais.

A partir daí a balança comercial brasileira, de 1974 em diante, apresentaria enormes difíceis causados principalmente pela importação de petróleo, que ultrapassaram os 4 bilhões de dólares ao ano. Isso tudo terminou gerando um grande desequilíbrio nas contas públicas internas e externas principalmente com o crescimento e endividamento do país no exterior. A capacidade de geração de divisas tornou-se insuficiente para sustentar o ritmo do crescimento. No final dessa década, a inflação acabaria chegando a 94,7% ao ano e em 1980 já era de aproximadamente 110 %, chegando a alcançar em 1983 o patamar de 200%.

III - A destituição do general Ednardo D?Ávila, Comandante do 2º Exército

Tentando acalmar os ânimos, em fins de 1975, o presidente Ernesto Geisel viria a ser homenageado com um almoço no quartel-general do Exército, tendo comparecido na oportunidade 117 oficiais-generais das três armas.

Mas o presidente Geisel já sabia de tudo já que tinha o suporte e contava com o apoio e a amizade de seus mais importantes aliados os generais Golberi do Couto e Silva e do general João Baptista de Oliveira Figueiredo que o mantinha informado de tudo e da movimentação dos militares contrários ao seu governo. Na ocasião, o ministro do exército Sílvio Frota para tentar agradar a Geisel discursou afirmando o apoio "franco e irrestrito" dos militares ao a ele e ao seu governo e a impossibilidade de que "intrigas ou pessimismos pudessem dividi-los ou abalar a lealdade ao chefe do governo.

Porém, já sabendo de tudo o que ocorria, essa harmonia foi quebrada logo no mês seguinte, em 19 de janeiro de 1976, com o anúncio da repetição do "caso Herzog" dessa vez com a morte do operário José Manuel Fiel Filho, também encontrado morto por enforcamento - "com suas próprias meias", segundo a versão oficial - nas dependências do DOI-CODI do II Exército.

O laudo pericial do Instituto Médico-Legal, mais uma vez atestaria como causa suicídio, tendo sido mais uma vez assinado pelo médico-legista Harry Chibata, que mais tarde viria a ser punido pelo Conselho de Medicina de São Paulo por falsidade ideológica.

Nesse momento Geisel não mais poderia tolerar atos de tortura e mortes cruéis na vigência de seu governo vindo a eclodir então o segundo confronto aberto entre Geisel e a chamada "linha dura" militar.
O presidente não titubeou em nenhum momento ? e hoje o Partido Dos Trabalhadores que conquistou pela 3ª vez a presidência da República através da sua candidata Dilma Rousseff deveria fazer uma grande homenagem enquanto ainda em vida, na pessoa da sua filha, Lucy Geisel, ao presidente Geisel com a maior condecoração que exista no país - viajou imediatamente para São Paulo e, de surpresa numa canetada só e com inusitada rapidez, exonerou o general Ednardo D?Ávila do comando do II Exército, nomeando em seu lugar o general Dilermando Gomes Monteiro para substituí-lo.

Por força disso, tendo informações seguras que estava em curso um golpe militar para depô-lo do governo O presidente Geisel faz uma profunda mudança nos escalões intermediários das Forças Armadas com a designação para comandos de regimentos, brigadas e divisões sediadas na área do II Exército de oficiais inteiramente ligados a ele, como o general José Fragomeni - que assumiria o comando da 2ª Divisão de Exército, o general Fernando Guimarães de Cerqueira Lima que seria designado para a 12ª Brigada de Infantaria, sediada em Caçapava no Rio Grande do Sul, e o general Gustavo de Morais Rego que passaria a chefiar a 11ª Brigada de Infantaria Blindada, com sede em Campinas, região da grande São Paulo.
Em decorrência desse ato o general Ednardo D?Ávila que havia sido remanejado para o Departamento de Ensino e Pesquisa, e havia se recusado a assumir suas novas funções, acabaria solicitando transferência para a reserva.

IV - O pacote de abril e o fechamento do Congresso Nacional

O Pacote de Abril foi um conjunto de leis outorgado em 13 de abril de 1977 pelo então Presidente da República do Brasil, Ernesto Geisel que teve como uma das suas principais medidas fechar temporariamente o Congresso Nacional objetivando fazer as reformas que ele achava necessárias.

Em verdade este pacote consistiu de uma emenda constitucional e de seis decretos-leis que outorgados alterariam as futuras eleições, o que afinal acabou ocorrendo.

Para as eleições de 1978 seriam renovados dois terços do Senado. No entanto, havendo o temor do governo sofrer uma nova derrota nas urnas como em 1974 quando perdeu na maioria dos estados, fez com que a nova regra implantada garantisse a maioria governista no Senado Federal: metade das vagas em disputa terminou sendo preenchida pelo voto indireto do Colégio Eleitoral cuja composição comportava os membros da Assembléia Legislativa e delegados das Câmaras Municipais.
Dessa forma um terço dos senadores não foi sufragado pelo voto direto e sim referendado após uma indicação do presidente da República. Eles seriam denominados de senadores biônicos.

Esta medida visou garantir aos militares uma maior bancada no Congresso Nacional. O "pacote" também estabelecia a extensão do mandato presidencial de cinco para seis anos, à manutenção de eleições indiretas para governador e o aumento da representação dos estados menos populosos no Congresso Nacional.

V - As destituições dos generais Silvio Frota, ministro do exército, de Hugo Abreu e a vitória do general Figueiredo em eleição indireta para a presidência da República pelo Congresso Nacional

Havia, contudo, um calo no pé do presidente Ernesto Geisel tendo em vista a candidatura do ministro do Exército à presidência da República que continuava sendo articulada durante o ano de 1977, chegando a obter o apoio de um grupo de parlamentares, inclusive alguns parlamentares do MDB.

Diversos os oficiais de alta patente das Forças Armadas favoráveis a Frota pretendiam tomar a dianteira no debate sucessório, inclusive articulando através da ameaça de quebra da unidade militar, criar um fato consumado ao presidente, que continuava a favor da escolha do general Figueiredo, mas proibira qualquer discussão sobre o assunto.

Assim como o general Ernesto Geisel já preparava o general João Baptista Figueiredo para sucedê-lo, a atuação de do general Silvio Frota à frente do Ministério do Exército tornava-se cada vez mais autônoma em relação às diretrizes emanadas por presidente, como ficou demonstrado em fins de setembro de 1977 no episódio da expulsão do ex-governador gaúcho Leonel Brizola do Uruguai, onde se encontrava ele se encontrava exilado desde 1964 junto com sua família.

Agindo com muita inteligência e perspicácia contatado por familiares de Brizola, Geisel chegou a admitir seu retorno ao Brasil, desde que ele aceitasse ficar confinado em algum lugar do território nacional.
Entretanto, como também tinha seus informantes dentro do governo sem consultar o presidente, Silvio Frota decidiu o contrário e determinou imediatamente que o III Exército deslocasse tropas que estavam subordinadas a ele e que eram de sua estrita confiança, para a fronteira com o Uruguai a fim de impedir a entrada de Brizola no país.

A sua desobediência e a profunda divergência de orientações causariam grande irritação no presidente Ernesto Geisel que inclusive já estava pensando em destituí-lo do cargo, porém, na reunião seguinte do Alto Comando do Exército o ministro Silvio Frota obteria o apoio da maioria dos generais de quatro estrelas deixando ele de mãos atadas naquele momento sem poder fazer nada.

Tudo levava a crer que no início de outubro, a candidatura do ministro do exército Silvio Frota ganharia força e deteria a iniciativa levando a ser preparada para o dia 16 do mesmo mês uma entrevista conjunta do marechal Odílio Denis, do almirante Augusto Rademaker e do brigadeiro Márcio de Sousa e Melo ex-ministros então na reserva, que viriam a manifestar publicamente seu apoio a sua candidatura à presidência da República.

Ao mesmo tempo em que a candidatura de Silvio Frota ganhava força, corriam rumores em Brasília de que o presidente Geisel receberia um ultimato no dia 14 para aderir a essa candidatura, tendo em vista ao apoio político que estava sendo intensamente trabalhada pelos parlamentares que o apoiavam.

O ministro Silvio Frota contava ainda com um relatório do Centro de Informações do Exército (Ciex) denunciando a presença de 97 pessoas consideradas subversivas em cargos de confiança da administração pública federal, que ele pretendia então divulgar como uma prova e comprovar seu ponto de vista sobre os perigos da distensão que estava já em curso.

Então por causa dessa insubordinação a sua autoridade de presidente da República e de posse destas informações, ele finalmente resolveu demitir o ministro do Exército sem medo e sem nenhuma demora.
O encontro dos dois ocorreria no dia 12 de outubro, ocasião em que os principais chefes militares do país também tinham sido chamados à capital da República e recebidos no aeroporto por oficiais da mais inteira confiança de Geisel. Com isso o presidente conseguiu frustrar dessa forma qualquer tentativa de Silvio Frota reunir o Alto Comando para resistir à demissão.

Depois de algumas horas de grande tensão resultado da demissão do ministro do exército Silvio Frota, a situação militar se definiu a favor do presidente Geisel, que nomeou para o ministério o general Fernando Bethlem, comandante do III Exército e considerado embora também fosse considerado também integrante da "linha dura". No mesmo dia, o Gabinete Militar da Presidência da República divulgou informações de que o novo ministro era o mais forte candidato à sucessão presidencial.

VI ? A negociação com setores da sociedade civil organizada como a CNBB, a OAB a ABI e entidades sindicais de empregados e empregadores, além do MDB

No entanto, sentindo firmeza em continuar com seu projeto de abertura lenta e gradual do Regime Militar para o Regime Democrático em discurso pronunciado para as principais lideranças da Arena no dia 1º de dezembro de 1977, e reafirmando a continuidade do seu projeto político admitiu na oportunidade a substituição dos mecanismos excepcionais do Ato Institucional nº 5 ? conhecido por AI-5 por "salvaguardas constitucionais" capazes de garantir a segurança do Estado.

Naquele momento outro personagem entraria em cena o senador Petrônio Portela que seria encarregado de negociar com setores representativos da sociedade a adoção de reformas político-institucionais no sentido da liberalização do regime. Com esse objetivo, o presidente do Senado, Petrônio Portela, estabeleceria inicialmente entendimentos com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e entidades sindicais de empregados e empregadores para, mais tarde, negociar com o MDB que fazia oposição política a seu governo já que era um partido político de oposição.

VII - A escolha da candidatura de seu sucessor a presidência da República general João Baptista de Oliveira Figueiredo

No dia 31 de dezembro de 1977, dia de natal, o presidente Ernesto Geisel comunicaria formalmente ao general João Baptista Figueiredo que o indicaria como seu sucessor. Porém, havia diversos problemas políticos tanto no meio civil quanto no meio militar a serem resolvidos para consolidar essa escolha.

Um dos políticos a favor da candidatura de Figueiredo o senador mineiro José de Magalhães Pinto trabalhava abertamente para obter maioria na convenção da Arena para sua própria indicação. No entanto, no início de janeiro de 1978, o general Hugo Abreu entregou ao presidente um documento criticando duramente o grupo que articulava a candidatura do chefe do SNI, que era a seu ver totalmente incapaz, de unir o Exército. A razão disso tudo era um documento em que constava uma lista de oito nomes apresentados onde o candidato escolhido por Geisel, João Figueiredo ocupava o último lugar, precedido dos generais Bethlem, Samuel Alves Correia, Dilermando Monteiro, Reinaldo Melo de Almeida e Euler Bentes Monteiro, além dos candidatos civis o ex-governador do Paraná Nei Braga e o governador de Minas Gerais, Aureliano Chaves.
No entanto, já decidido na sua escolha finalmente no dia 4 de janeiro, o presidente Ernesto Geisel critica o relatório e reafirma sua escolha perante o general Hugo Abreu. Mas este, por sua vez, amplia suas críticas ao grupo pró-Figueiredo, onde cita nominalmente o ministro Golberi do Couto e Silva e os secretários Heitor Ferreira e Humberto Barreto e pedia demissão do Gabinete Militar, sendo substituído pelo general Gustavo de Morais Rego. No dia seguinte, o presidente Geisel finalmente formaliza a indicação da chapa João Figueiredo-Aureliano Chaves, afirmando que buscara pessoas capazes de "levar adiante o processo de institucionalização e eliminar as leis de exceção vigentes no país" definindo "a trajetória de que a revolução seguiria daqui por diante".

Bastante preocupado em consolidar a indicação de seu escolhido, João Figueiredo, o presidente Ernesto Geisel teve que usar toda a sua autoridade para que o Alto Comando do Exército incluísse o nome dele em primeiro lugar na lista de generais-de-divisão que poderiam receber a quarta estrela em março de 1978, condição importante para aumentar o respaldo militar do candidato, que ocupava nessa época o quinto lugar na ordem normal de promoções ao posto máximo da hierarquia.
Saindo vitorioso por seis votos contra quatro, o presidente Geisel finalmente promoveu Figueiredo a general-de-exército em 31 de março, data do 14º aniversário do movimento político-militar de 1964, preterindo ao mesmo tempo o general Hugo Abreu, segundo na ordem normal prevista pelo Almanaque do Exército.

Ao mesmo tempo em que conseguia nomear Figueiredo general-de-exército, no campo político, o governo respondeu a esse conjunto de pressões com o envio ao Congresso Nacional, em junho, de um pacote de medidas que buscavam garantir a continuação da política de abertura dentro dos limites definidos pelo próprio regime militar.

A proposta incluía a revogação do Ato Institucional nº 5 (AI-5) e do Decreto-Lei nº 477 no qual previa a expulsão de estudantes por motivos políticos bem como a inserção de novas medidas de emergência na Constituição, a transferência para o STF da responsabilidade de cassar mandatos parlamentares, com base em denúncias enviadas pelo Poder Executivo, à permissão para o reinício das atividades políticas dos cidadãos cassados há mais de dez anos, o restabelecimento do habeas-corpus para crimes políticos, a abolição das penas de morte, prisão perpétua e banimento, o abrandamento das penas previstas na Lei de Segurança Nacional, a diminuição das exigências para a criação de novos partidos e a restauração do voto em separado do Senado e da Câmara na apreciação das emendas constitucionais.

Foi necessário que o presidente Ernesto Geisel usasse de grande prestígio para conseguir a aprovação desse conjunto de medidas, exigindo sua votação em bloco sem a apresentação de emendas.

De acordo com o Jornal do Brasil o presidente chegou a comunicar aos líderes da maioria no Congresso Nacional sua disposição de outorgar as reformas e realizar novas cassações de mandatos caso o Poder Legislativo rejeitasse o seu projeto político.

No dia 4 de agosto, seu governo finalmente sancionou o Decreto-Lei nº 1.632, transferindo da Lei de Segurança Nacional para a legislação trabalhista o julgamento de movimentos grevistas.

Posteriormente em 3 de setembro, como já era previsto e esperado, a Arena elegia por via indireta 20 governadores estaduais, cabendo ao MDB apenas o governo da Guanabara, onde a oposição era majoritária no Colégio Eleitoral. O único caso em que a Arena escolheu seu candidato contra os desejos do palácio do Planalto foi o de São Paulo, onde Lauro Natel acabou perdendo a eleição para o candidato Paulo Salim Maluf.
No dia 20 de setembro, o Congresso Nacional aprovaria por 241 votos a favor contra 145 contra as reformas políticas apresentadas em junho pelo governo. Apesar das pressões, o senador paranaense Acióli Filho, da Arena, apresentou uma emenda propondo a extinção da figura dos senadores eleitos por via indireta, os chamados "biônicos", mas ela seria derrotada por 178 a 131.

No dia 15 de outubro, a chapa oficial comandada pelo general João Baptista de Oliveira Figueiredo e pelo seu vice Engenheiro Aureliano Chaves foi eleita por 355 votos contra 226 dados à oposição representada pela chapa do general Euler Bentes e Paulo Brossad, garantindo assim mais um mandato presidencial para o grupo que, dentro do próprio regime, patrocinava a política de distensão gradual.

No desafio seguinte enfrentado por essa política foi conseguir maioria de deputados de seu partido político, a ARENA, nas eleições de 15 de novembro para a renovação das assembléias legislativas, da Câmara dos Deputados e de 1/3 do Senado já que outro 1/3 fora eleito indiretamente, garantindo assim a maioria governista. Geisel participou intensamente da campanha de seu partido político, a Arena, conseguindo eleger 15 senadores e 228 deputados federais contra 8 senadores e 196 deputados do MDB, embora a oposição tenha vencido na soma total de votos para o Senado recebendo 17 milhões e quatrocentos mil votos contra 13 milhões e cem mil dados à Arena, permanecendo majoritária nos principais estados do país, mas levando o vice-presidente eleito, Aureliano Chaves, a pedir para que o governo "não tapasse o sol com a peneira", e admitisse a nova correlação de forças no Congresso Nacional.

VIII - Conclusão

Concluindo, talvez esse artigo não agrade muitos políticos que ainda estão vivos e fizeram oposição ao Regime Militar, principalmente do atual PMDB (ex-MDB), torturados e perseguidos políticos, além de muitos militares das Forças Armadas, principalmente aqueles que ainda estão vivos e apoiaram à candidatura do ex-ministro Silvio Frota a presidência da República, mas considero o ex-presidente Geisel, embora fosse um militar de carreira, um verdadeiro expert em política, de um extraordinário poder de decisão e a de articulação nos momentos mais difíceis de seu governo, quando passou por momentos extremamente difíceis, principalmente sofrendo a ameaça real de golpe militar, o que seria um golpe dentro do golpe, quando não mais havia a necessidade de continuidade do Regime Militar que extendeu-se por muitos anos além da conta.

Para mim o ex-presidente Geisel foi um estadista, tomando posições firmes em todos os aspectos de seu governo, notadamente nos campos diplomáticos com a abertura de relações diplomáticas com os países comunistas, desagradando muito setores contrários a essas posições e aos Estados Unidos, assim como no âmbito político acertando em cheio na escolha de seu sucessor, general João Baptista de Figueiredo que comandaria a abertura política e o retorno de nosso país a democracia.

Essa é a minha homenagem que faço ao homem público general-de- exército Ernesto Geisel a quem as Forças Armadas devem sempre se referenciar e se lembrar de seus atos de bravura e coragem em nome de toda a nação brasileira e que a presidente eleita Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores, num gesto democrático e de reconhecimento, deveria condecorá-lo pós-mortem.

Referências Bibliográficas

GASPARI, Elio. A Ditadura Escancarada. São Paulo: Cia. da Letras, 2002.

Autor: Roberto Jorge Ramalho Cavalcanti


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