DO DISCURSO REVELADO À PRÁTICA PEDAGÓGICA: UM ESTUDO DE CASO NUMA ESCOLA DE ENSINO MÉDIO EM MARACANAÚ-CE



DO DISCURSO REVELADO À PRÁTICA PEDAGÓGICA: UM ESTUDO DE CASO NUMA ESCOLA DE ENSINO MÉDIO EM MARACANAÚ-CE

José Alexandre Leite de Andrade


1 INTRODUÇÃO

O contexto educacional atual apresenta um quadro no qual a avaliação em suas diversas vertentes (aprendizagem, sistema curricular e institucional) torna-se uma temática de suma importância no campo das Ciências da Educação, principalmente a avaliação da aprendizagem, em vista do fato de ser uma ferramenta de uso constante do professor na sala de aula. A avaliação vem sendo tratada como um desafio pelos teóricos da contemporaneidade (ÁLVAREZ MÉNDEZ, 2002; MELCHIOR, 2003; PERRENOUD, 1999) por vários motivos, podendo ser destacado o contexto dinâmico e diverso em que se desenvolve, pela falta de planejamento, distanciamento e descaso da família pelo processo educativo, formação docente insuficiente ou inadequada, dentre outros. Fundamentalmente, tem-se observado que a falta de compreensão do seu real sentido ocasiona a operacionalização de práticas avaliativas inadequadas.
Nesse intento, buscamos responder à seguinte pergunta da pesquisa: Como vem sendo realizada a avaliação da aprendizagem e de que maneira a prova está contribuindo para que os alunos de uma escola de Ensino Médio, em Maracanaú, tenham uma aprendizagem satisfatória?
O presente trabalho foi conduzido com o objetivo de investigar e interpretar o sentido da avaliação e da prova como estratégias constitutivas do processo de ensino e aprendizagem a partir do discurso e da prática dos professores que lecionam na última etapa da Educação Básica no Colégio Estadual Liceu de Maracanaú, uma escola da rede pública estadual de ensino. Trata-se de uma pesquisa predominantemente qualitativa que utiliza como pressupostos teóricos os estudos da fenomenologia de Edmund Husserl .
No decorrer dos últimos anos, as críticas às práticas avaliativas mais tradicionais promoveram um distanciamento progressivo dos professores do uso de instrumentos vinculados ao exercício de uma avaliação com função apenas de constatar. A prova foi censurada e apontada como um instrumento insuficiente à maior e melhor compreensão dos processos cognitivos vivenciados pelo aluno para a apropriação da aprendizagem (ESTEBAN, 2003; HAYDT, 2004; LUCKESI, 1999).
Muitos professores, todavia, sentem sua falta, ressentem-se e envergonham-se quando a praticam. Outros, por sua vez, afirmam não conseguir acompanhar, efetivamente, as aprendizagens conquistadas pelo aluno sem o emprego dessa ferramenta avaliativa. Nessa perspectiva, o compromisso com a análise do processo e com o acompanhamento dos percursos de aprendizagem parece sinalizar sempre em direção contrária ao uso de provas.
Essa realidade contraditória instigou a proposição de algumas questões que nortearam o estudo:
1 Qual o papel da avaliação no processo de ensino e aprendizagem?
2 A prova pode ser utilizada como um instrumento confiável para fornecer as informações necessárias acerca do processo de ensino e aprendizagem?
3 Sabendo que avaliar implica julgamento, valoração e classificação, como acontece a avaliação da aprendizagem nesta etapa da Educação Básica?
4 Quais as lacunas ou pontos de estrangulamento mais relevantes na elaboração e utilização da prova?
Na escola, a avaliação da aprendizagem vem sendo praticada de diferentes formas e com funções distintas, no entanto observa-se que nem todos os professores que lecionam no Ensino Médio têm uma compreensão objetiva a respeito do significado da avaliação da aprendizagem. De modo geral, tratar acerca dessa prática e da sua importância no contexto educacional induz os docentes à defesa de uma avaliação não como uma atividade neutra, mas como atividade necessária na formação do educando.
As concepções de avaliação da aprendizagem defendidas e praticadas pelos professores do Liceu Estadual, como esta escola é conhecida em Maracanaú, ainda não haviam sido formalmente estudadas e interpretadas, apesar de que, desde 2005, virem sendo utilizadas no processo de ensino e aprendizagem. Tal situação despertou o interesse deste pesquisador, que durante os anos de 2003, 2004 e 2005 fez parte da equipe de ensino da 1ª Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação (1ª CREDE), responsável pelo acompanhamento pedagógico às escolas. Nas reuniões de cunho pedagógico promovidas pelo Liceu e pela 1ª CREDE, em que este pesquisador teve a oportunidade de participar, ficou constatado que os professores precisavam de uma melhor compreensão acerca dessa temática, para poderem empregá-la efetivamente como uma estratégia com o objetivo de auxiliar no processo de ensino e de aprendizagem.
A justificativa para este estudo, portanto, encontra respaldo na ideia de que é necessário, a priori, reconhecer as impressões acerca do significado de avaliar a aprendizagem a partir da visão dos docentes, para que se possa encontrar espaço para a discussão e disseminação de uma prática de avaliação de caráter formativo. Nesse sentido, a concepção de avaliação aqui defendida é a que visa identificar e acompanhar os avanços do aluno e suas competências, respeitando seu ritmo e tempo de aprendizagem, ou seja, uma avaliação que, além de ajudar o aluno a aprender, possa também auxiliar o professor a ajustar sua prática pedagógica. Outra justificativa para esta pesquisa é levantar informações que possam subsidiar futuros encaminhamentos para aperfeiçoar a prática da avaliação da aprendizagem na última etapa da Educação Básica, bem como respaldar futuras discussões acerca da formação dos professores que atuam neste nível de ensino.

2 CONCEITOS DE AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM

Quando discutimos avaliação, é necessário lembrar que mais importante do que a sua definição é a apreensão de seu significado. O significado da avaliação que mais interessa é aquele que surge da prática daqueles que se ocupam e se preocupam com a Educação no âmbito escolar. Percebe-se, assim, que não basta apenas definir e descrever determinadas práticas avaliativas; é necessária uma compreensão mais ampla, de modo a provocar uma reflexão mais aguda sobre o ato de avaliar. Não se pode esquecer que a avaliação é um processo intencional e sistemático de obtenção e análise de informações sobre um certo objeto de conhecimento, buscando, na compreensão desse objeto, elementos que possibilitem uma intervenção consciente, visando à concretização dos objetivos do ensino e aos fins da Educação.
Apresenta-se, a partir de agora, algumas das contribuições mais significativas acerca do conceito de avaliação presente na literatura. Desse modo:
O processo de avaliação consiste essencialmente em determinar em que medida os objetivos educacionais estão sendo realmente alcançados pelo programa do currículo e do ensino. No entanto, como os objetivos educacionais são essencialmente mudanças em seres humanos, a avaliação é o processo mediante o qual se determina o grau em que essas mudanças de comportamento estão realmente ocorrendo (TYLER, 1977, p. 98-99).
Nesse modelo de avaliação, percebe-se claramente uma relação entre os objetivos planejados e o desempenho, onde os comportamentos a serem avaliados devem ser os mesmos estabelecidos inicialmente. Tyler (1977) enfatiza o caráter funcional da avaliação, pois ela se processa em função dos objetivos previstos. Outro aspecto ressaltado por ele é que, como avaliar consiste em obter evidências sobre mudanças de comportamento ocorridas no aluno, em decorrência da aprendizagem, "[...] todos os recursos disponíveis de avaliação devem ser usados para conseguir esses dados" (HAYDT, 2004, p. 12).
O conceito de avaliação do processo de ensino e aprendizagem defendido por Haydt (2004) aproxima-se do modelo de Tyler (1977, p. 30), pois, para essa autora, "[...] avaliar consiste em verificar em que medida os objetivos instrucionais foram atingidos". Portanto, a avaliação é funcional, uma vez que se realiza em função dos objetivos estabelecidos.
Na opinião de Ristoff (1995, p. 5), a avaliação assume a função de afirmar ou confirmar valores. É uma concepção valorativa e acrescenta que:
[...] ao tratar da afirmação de valores é mostrar que há na avaliação uma função educativa que, em muito, sobrepuja no mérito a dualidade de crime e do castigo. É esta função educativa que nos conduzirá ao processo de instalação da cultura da avaliação ? um processo que é penoso e lento porque se inscreve não no vazio, ou numa página em branco, mas em uma história existente, em uma realidade, em um texto cultural que o antecede e o qual pretendemos reescrever.
Álvarez Méndez (2002, p. 17), por sua vez, concebe a avaliação como uma estratégia para evitar fracassos no processo de aprendizagem e justifica afirmando que:
Se fizermos da avaliação um exercício contínuo, não há razão para o fracasso, pois sempre chegaremos a tempo para agir e intervir inteligentemente no momento oportuno, quando o sujeito necessita de nossa orientação e de nossa ajuda para evitar que qualquer falha detectada torne-se definitiva.
Dessa forma, a avaliação torna-se parte de uma sistemática permanente e, integrada ao currículo, possibilita ao professor promover intervenções mais seguras para o êxito de todos aqueles que estão dispostos a alcançá-lo, atuando assim como ação reguladora da aprendizagem dos alunos. Para Perrenoud (1999), a função da avaliação é ajudar o aluno a aprender e o professor a ensinar. Defende assim a ideia de avaliação formativa, pois, ao ser praticada na escola, leva o professor a observar mais metodicamente o aluno.
Tratando-se especificamente da avaliação escolar, isto é, da verificação da aprendizagem de conteúdos curriculares, a concepção de avaliação mais empregada é a de avaliação como processo, na qual está implícito, segundo Brito (1991, p. 61), um modelo funcionalista-mecanicista de homem. Assim:
A idéia de avaliação como processo sugere sempre a existência de um paradigma formal construído a priori. Dele fazem parte as variáveis independentes, as variáveis dependentes e as variáveis de controle [...] A construção de paradigma sustenta-se numa concepção de homem, de mundo e de universo. Está definido no paradigma, o tipo de homem que se deseja construir, assim como [...] o instrumental mais adequado para formá-lo e apresentá-lo como pronto [...] Neste caso, a avaliação refere-se especificamente ao produto apresentado. Este produto pode ser abordado durante o processo em vários momentos, como pode ser abordado no final, isto é, no alcance do que foi definido.
Na opinião de Esteban (2003, p. 14), a ação de avaliar é definida como "[...] uma tarefa que dá identidade à professora, normaliza sua ação, define etapas e procedimentos escolares, media relações [...], orienta a prática pedagógica".
Nesse sentido, Vianna (2000, p. 19) concorda com as ideias de Esteban (2003), afirmando que a avaliação:
[...] não é uma atividade em abstrato, que se realize, como muitas vezes ocorre na prática, ignorando a diversidade dos currículos e a multiplicidade de metodologias de ensino empregadas por professores com diferentes formações (ou ausência de qualquer formação pedagógica), além de posicionamentos diversos quanto às suas áreas de atuação.
E acrescenta, a respeito do envolvimento dos sujeitos no ato avaliativo, que: "É importante que as avaliações sejam discutidas por diferentes segmentos sociais e os seus resultados examinados em função da diversidade das características sociais e em relação à proposta política que define as linhas mestras da educação" (Op. cit., p. 19).
Libâneo (1994, p. 196) define avaliação escolar como sendo: "[...] um componente do processo de ensino que visa, através da verificação e qualificação dos resultados obtidos, determinar a correspondência destes com os objetivos propostos e, aí, orientar a tomada de decisões em relação às atividades didáticas seguintes".
Demo (2002, p. 23), referindo-se à avaliação como um fenômeno complexo, leciona que: "Toda avaliação, ao mesmo tempo que revela alguma coisa, também esconde, pois representa recorte selecionado e parcial. Segue igualmente que toda avaliação acaba cometendo alguma injustiça, porque qualquer escalonamento é também reducionista".
Portanto, nenhuma avaliação é plenamente precisa no sentido de abranger todas as variáveis envolvidas no objeto avaliado. Seguindo a linha de raciocínio de Demo (2002) e a partir de seus estudos, Vianna (2000, p. 30) elucida que:
É forçoso reconhecer, contudo, que os procedimentos de avaliação, por mais bem planejados e refinados que sejam seus instrumentos, nunca oferecem um quadro completo da realidade do ensinar/aprender, pois nunca se conhece a realidade em toda a sua complexidade, assim como, também, por melhores que sejam os indicadores sociais os mesmos não conseguem refletir com precisão absoluta, a complexidade do mundo social.
A estreita relação entre Educação e Ensino faz com que a avaliação estabeleça valores entre os diversos elementos que deles fazem parte. Na verdade, é impossível, sem a promoção de uma ação avaliativa, formar percepções a respeito do processo de ensino e aprendizagem. A avaliação, portanto, não é apenas um conjunto de técnicas para o levantamento de informações sobre diferentes sujeitos, mas um momento necessário e permanente na reflexão acerca de problemas educacionais.

3 COMUNICAÇÃO DOS RESULTADOS DA AVALIAÇÃO: UMA REFLEXÃO PERTINENTE

A avaliação da aprendizagem é parte importante do processo educacional formal. Por meio dela é que se levantam informações e os resultados acerca da aquisição e retenção do conhecimento por parte dos alunos, e pode-se, assim, avaliar principalmente o processo de ensino no âmbito das diversas disciplinas curriculares.
A comunicação dos resultados da avaliação escolar é tratada, muitas vezes, como uma problemática que dificulta e confunde o processo avaliativo, pois "[...] alguns professores avaliam de forma tradicional e apresentam o resultado através de parecer descritivo, porque é uma exigência da escola. Outros avaliam seus alunos dentro de uma concepção transformadora e atribuem notas, pela mesma razão" (MELCHIOR, 2003, p. 138). Segundo a autora, as mudanças em relação à avaliação, contudo, devem ser muito mais profundas e significativas do que, simplesmente, mudar a forma de expressar os resultados. Não basta mudar a forma dos registros; é preciso ressignificar a prática avaliativa nas escolas (HOFFMANN, 2004).
A avaliação não deve ser utilizada somente com o intuito de cumprir uma formalidade educacional legal de aprovar e/ou reprovar, mas sim, conforme Veiga (1996, p. 161), deve ser "[...] vista como um meio investigativo da aprendizagem para redimensionar o processo tendo em vista garantir a qualidade de ensino para todos".
No âmbito escolar, quando o resultado da avaliação se limita apenas a caracterizar a retenção ou promoção, reforça seu sentido punitivo e de premiação. A utilização de modo exacerbado, principalmente, de provas e testes pelos professores na sala de aula fortalece a relação premiação/punição. Melchior (2003, p. 138) situa de forma contundente a necessidade de se promover uma profunda reflexão acerca da importância da avaliação e da finalidade que se atribui a ela, pois "[...] a avaliação deve ser realizada com o objetivo de auxiliar o professor a redimensionar sua ação pedagógica, o que implica no agir, imediatamente sobre os resultados obtidos".
As práticas avaliativas promovidas pela escola ainda trazem fortes características da época de sua inserção na Educação, cuja finalidade era classificar o aluno, tornando-o um sujeito excludente do processo de aprendizagem, além de confirmar a plena autoridade intelectual e o poder inquestionável do professor dentro da sala de aula.
É mister lembrar que tanto o trabalho docente quanto os modelos de ensino são oriundos das fortes influências deixadas pela pedagogia tradicional, de cunho religioso e normativo, trazida pelos jesuítas no século XVI. Não se pode esquecer que a ideia do professor ser o único detentor (e transmissor) do saber foi imposta por muitas décadas no contexto educacional. O saber era repassado para os alunos sem que estes tivessem oportunidade e espaço para contestar, assim como também não eram reconhecidas as experiências prévias dos alunos. Por essa razão, o professor era considerado um simples transmissor de conteúdos (LUCKESI, 1999).
No modelo tradicional de escola, a ação de ensinar e aprender partia da transferência de conteúdos já prontos e acabados, não havendo, dessa forma, espaço para a discordância. A avaliação, portanto, desempenha a função de verificar se o aluno aprendeu esse conteúdo, ainda que de forma mecânica e memorizada, utilizando-se de instrumentos tais como: testes, provas e arguições. É atribuída uma nota para indicar a aprovação ou reprovação do aluno e a avaliação assume a característica de ação punitiva. Por sua vez, o professor, nessa concepção de avaliação, torna-se um "controlador" e a nota, o objetivo maior do ensino. Nesse panorama, Luckesi (1999, p. 18) argumenta que "[...] o que predomina é a nota: não importa como elas foram obtidas nem por quais caminhos. São operadas e manipuladas como se nada tiveram a ver com o percurso ativo do processo de aprendizagem". Dessa forma, a avaliação deixa de cumprir sua real função, para atender à burocracia da nota.
A avaliação, quando praticada de forma a atender a exigências burocráticas e administrativas, não contribui em nada para transformar a Educação. Portanto, fazer provas e testes não é o bastante. Acreditamos que temos de ampliar o olhar sobre essas práticas. É preciso dedicar mais atenção aos processos e resultados, de modo a identificar formas de superação das dificuldades, avaliando o antes, o agora e o depois, refletindo na prática pedagógica da sala de aula.
Nesse sentido, os questionamentos devem partir da interpretação dos resultados. Em qualquer atividade avaliativa, o aluno tem o direito de ter acesso aos resultados, e não apenas receber de volta os instrumentos, de modo que os resultados sejam discutidos, explicados e justificados pelo professor. O que acontece frequentemente é o aluno simplesmente receber os resultados sem que estes sejam questionados ou discutidos, situação bastante comum ao se tratar de provas e testes.
Os resultados, por sua vez, segundo Kenski (1996, p. 142), não devem apenas ser comunicados por meio de notas, mas:
Os resultados dessas atividades precisam ser conhecidos não só pelo professor, mas, também, por todos os alunos. Devem ser discutidos, analisados em classe e servirem para que, periodicamente, sejam redefinidos ou não os objetivos, sejam reorientados ou não os caminhos da ação educativa.
Nota-se que, a partir dos resultados da avaliação, pode-se precisar o conhecimento do nível atual de aprendizagem, assim como o reconhecimento das dificuldades do aluno, possibilitando ao professor rever sua prática pedagógica, tomando medidas para superar as dificuldades com o intuito de promover avanços significativos.
As ações avaliativas desenvolvidas pelo professor na sala de aula devem estar plenamente inseridas em seu planejamento, assim como devem estar diretamente relacionadas aos objetivos de ensino e aprendizagem (BENFATTI, 2005). A determinação correta dos instrumentos que serão utilizados na avaliação, assim como os momentos de observação e registro, é necessária para que a avaliação cumpra efetivamente sua função formativa no cotidiano da sala de aula.

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa se realizou no âmbito de uma escola de Ensino Médio da rede estadual de Maracanaú. A pesquisa teve como eixo central nove professores que se dispuseram de maneira espontânea e que atuavam nas três diferentes áreas do currículo: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Ciências, Matemática e suas Tecnologias; Ciências Humanas e suas Tecnologias. Participaram três professores de cada uma dessas áreas. Também participou da pesquisa a coordenadora pedagógica da escola.
Neste trabalho, foi empregada a entrevista semiestruturada para coletar informações acerca do conhecimento e da prática dos professores sobre avaliação da aprendizagem. As entrevistas foram realizadas nos meses de abril e maio de 2009 e tinham basicamente os seguintes objetivos: a) identificar as concepções de avaliação e suas inter-relações com as concepções de prova; b) determinar a relação existente entre nota e avaliação da aprendizagem; c) identificar fatores que dificultam ou facilitam a implementação da prova como instrumento de avaliação da aprendizagem; d) conhecer o modelo de organização do ensino por blocos de disciplinas semestrais e sua sistemática de avaliação. A sala dos professores foi o local onde a maioria das entrevistas foi realizada. Um ambiente restrito, climatizado e bastante confortável. Noutros casos, foi utilizada a sala de leitura, ampla e climatizada, porém menos tranquila.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa revelou a existência de dificuldade dos docentes do Ensino Médio na compreensão das funções da avaliação, do estabelecimento de critérios, na definição de objetivos educacionais e na escolha de instrumentos e procedimentos para avaliar, fato este justificado por uma formação acadêmica deficitária nesse aspecto.
Avaliar a aprendizagem no âmbito escolar muitas vezes foi confundido pelos professores como apenas um ato de testar e verificar. Acreditamos que essa confusão tenha surgido pela falta de compreensão do significado dos termos, assim como da função que cada um deles exerce no contexto escolar. Tal prática direciona o ensino e a aprendizagem a um exercício repetitivo, classificatório e excludente.
Ficou evidenciado a partir desta pesquisa que, se o professor não tem convicção do que está fazendo, consequentemente, não terá condições de utilizar adequadamente a avaliação como uma ferramenta de auxílio de sua prática pedagógica, e esta, além de ficar comprometida, não se caracterizará em um procedimento seguro a serviço do processo de ensino e aprendizagem. É mister ainda salientar que não é suficiente apenas que o professor apreenda o significado do processo avaliativo; faz-se necessário que ele ponha-o em prática.
Assim, no tocante às concepções e práticas de avaliação dos professores investigados, concluímos que, em muitos momentos, eles retumbaram as influências do paradigma da modernidade, cujos problemas mais evidentes foram: a) a sua significação como mensuração, em virtude da prioridade com que os aspectos quantitativos eram tratados pelos docentes; b) a ênfase na avaliação de conteúdos objetivos, estáveis e memoráveis, revelados na elaboração das provas, uma influência do modelo positivista de ensino; e c) a utilização de provas escritas e testes como as principais modalidades de avaliação.
Com relação às práticas avaliativas, constatamos que, dentre as formas contemporâneas de avaliar a aprendizagem, apenas o seminário é a técnica utilizada pelos professores. A prova escrita (Provão) e o teste (Simulado) são instrumentos usados frequentemente ainda por esses professores. Entendemos com isso que estes tentam utilizar técnicas avaliativas inovadoras, mas não dispensam a prova como principal instrumento de avaliação. Também merece destacar o fato de que os professores pesquisados, mesmo revelando defenderem um pensamento contemporâneo de avaliação, permanecem utilizando um modelo tradicional de avaliar a aprendizagem, a "semana de provas".
Constatamos ainda que a prova não se configurava como um instrumento capaz de ajudar no processo de ensino e aprendizagem, ou seja, não estava sendo pensada, elaborada e utilizada pelos professores com uma intenção formativa. Isso ficou evidenciado e caracterizado pela falta de definição de objetivos de avaliação, visto que os professores passavam a usar a prova apenas para quantificar a aprendizagem e, dessa forma, gerar uma nota para ser colocada no diário de classe e, posteriormente, no boletim ao término de cada semestre. Como o objetivo da avaliação se restringia apenas em "dar" nota ao aluno, determinando com isso sua aprovação ou reprovação, a prova exercia tão-somente a função de julgar e assim sentenciar quem seria promovido à série seguinte e quem ficaria onde estava, ou seja, reforçava a classificação por méritos.
Os professores justificaram tal postura alegando que o sistema exige que seja assim, porque os pais querem ver os resultados e porque, dessa forma, iriam ajudar na definição da vida acadêmica dos alunos. Por isso, seguiam adiante sem questionar, refletir ou rever suas práticas avaliativas. Sem objetivos pré-estabelecidos para avaliar, os professores se prendiam a aspectos irrelevantes do processo e, em alguns casos, a aprendizagem e as tomadas de decisões ficaram em segundo plano.
Outro aspecto que mereceu destaque nesta pesquisa e que nos chamou a atenção foi quanto à forma como os professores elaboravam suas provas. Questões elaboradas com enunciados que se referiam de maneira direta e literal a conhecimentos de fatos e dados apareceram com bastante frequência durante a análise das provas. Esse tipo de questão remete o aluno a utilizar a habilidade da categoria de conhecimento de fatos específicos. Por conseguinte, provas apoiadas neste nível de operação mental se tornam "pobres", sem sentido para a qualidade da aprendizagem, sendo classificadas como questões de "decorar/memorizar" e conhecidas, no contexto escolar, como provas com questões de "decorebas".
Ainda acerca da elaboração das provas, encontramos questões que exigiam do aluno a habilidade referente à aprendizagem de procedimentos. Nesse estilo de questão, é solicitado mais do que a compreensão de métodos, teorias, princípios ou abstrações. Nesse sentido, os alunos deveriam aplicar as abstrações apropriadas sem que lhes tenham sido sugeridas quais são essas abstrações ou sem que lhes sejam ensinadas como usá-las em uma determinada situação. Denominadas de questões de aplicação ou questões complexas, tais questões induzem o aluno a fazer a operação mental de identificar as variáveis pertinentes a uma situação-problema especifica, de modo a dar-lhe significado. A capacidade de aplicação para a solução de problemas é um tipo de estratégia empregada por muitos professores do Ensino Médio, além de ser considerado um dos objetivos educacionais mais complexos.
Por fim, concluímos que, na escola pesquisada, os professores elaboram diversas questões de prova, sem conhecimento pleno de seu sentido. A elaboração e utilização de questões desprovidas de sentido pouco contribuem para o aperfeiçoamento do ensino e da aprendizagem, assim como não podem ser consideradas um indicador seguro de que os alunos realmente aprenderam o que a escola e os professores planejaram.
Além de sugerirmos que a escola promova momentos de capacitação para os professores, visto que estes apresentam pouco estudo, pouca leitura e baixa compreensão acerca da avaliação da aprendizagem, sugerimos ainda aos professores que: a) diminuam a ênfase na avaliação (prova e teste), coletando informações de forma contínua durante o processo de ensino, como forma de valorização do uso da avaliação formativa; b) estabeleçam objetivos educacionais de aprendizagem para os conteúdos, evitando o uso frequente da memorização; e c) elaborem provas cujos enunciados sejam reflexivos e que promovam operações cognitivas de compreensão, análise, síntese, interpretação e aplicação.





REFERÊNCIAS

ÁLVAREZ MÉNDEZ, Juan Manuel. Avaliar para conhecer, examinar para excluir. Tradução de Magda Schwartzhaupt Chaves. Porto Alegre: Artmed, 2002.
BENFATTI, Xênia Diógenes. A avaliação no cotidiano da sala de aula. In: CEARÁ, Secretaria da Educação Básica. A gestão pedagógica e o desempenho escolar. Fortaleza: Edições SEDUC, 2005, p. 47-55.
BRITO, Márcia R. F. Avaliação: projeto ou processo? Revista do Departamento de Psicologia (UFF), Campinas, v. 4, p. 60-64, 1991.
DEMO, Pedro. Mitologias da avaliação ? de como ignorar, em vez de enfrentar problemas. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 2002.
ESTEBAN, Maria Teresa. O que sabe quem erra? Reflexões sobre a avaliação e fracasso escolar. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
HAYDT, Regina Célia Cazanse. Avaliação do processo ensino-aprendizagem. 6. ed. São Paulo: Ática, 2004.
HOFFMANN, Jussara. Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola à universidade. Porto Alegre: Mediação, 2004.
HUSSERL, Edmund. A idéia da fenomenologia. Tradução de Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1990.
KENSKI, Vani Moreira. Avaliação da aprendizagem. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro (Org.). Repensando a didática. Campinas: Papirus, 1996, p. 131-144.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. São Paulo: Cortez, 1999.
MELCHIOR, Maria Celina. Da avaliação dos saberes à construção de competências. Porto Alegre: Premier, 2003.
PERRENOUD, Phillipe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens ? entre duas lógicas. Tradução de Patrícia C. Ramos. Porto Alegre: Artmed, 1999.
RISTOFF, Dilvo. Avaliação institucional: pensando princípios. In: BALZAH, Newton César; DIAS SOBRINHO, José (Orgs.). Avaliação institucional: teoria e experiências. São Paulo: Cortez, 1995, p. 37-52.
TYLER, Ralph Winfred. Princípios básicos de currículo e ensino. Tradução de Leonel Vallandro. Porto Alegre: Globo, 1977.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Ensino e avaliação: uma relação intrínseca à organização do trabalho pedagógico. In: VEIGA, Ilma passos Alencastro (Org.). Didática: o ensino e suas relações. Campinas: Papirus, 1996, p. 149-169.
VIANNA, Heraldo Marelim. Avaliação educacional e o avaliador. São Paulo: IBRASA, 2000.

Autor: Alexandre Leite De Andrade


Artigos Relacionados


Avaliação Diagnóstica, Formativa E Somativa.

Do Discurso Revelado À PrÁtica PedagÓgica: Um Estudo De Caso Numa Escola De Ensino MÉdio Em MaracanaÚ-ce

Modalidades E Funções Da Avaliação Na Educação Infantil.

Prova: Um Instrumento Eficaz Para AvaliaÇÃo?

AvaliaÇÃo

AvaliaÇÃo No Processo Ensino - Aprendizagem

Educação E Avaliação