Um Dia Incomum



Acordei recordando-me de uma consulta marcada à semanas, era com uma médica especializada em nefrologia, aprontei-me mais que depressa e me dirigi ao ponto de ônibus.
Aguardei o transporte que me conduziria até outra cidade, onde ocorreria a consulta.
Fui observando a estrada e as formas se perdendo com o movimento do transporte que se deslocava velozmente, pensando em qual seria o nome dos que vi de relance e se certas construções ou mesmo a vegetação estariam ali quando retornasse.
Chegando à cidade de destino, desci e me dirigi ao centro, fui caminhando, ignorando os transeuntes até chegar ao consultório, onde fui surpreendido pela presença de um outro médico responsável pela manutenção de minha saúde, esse, especialista em asma, pneumologista.
Ele também estava ali se consultando, o que remeteu minha mente à imagem da mortalidade do médico, que assim como qualquer outro ser humano, está passivo de patologias.
Fui chamado para consultar e adentrei a sala da médica, que me fez as perguntas costumeiras e receitou uma série de exames para uma avaliação, que já se fazia tardia, devido a meu desleixo.
Após terminar minha curta e rotineira consulta, o médico ainda estava na sala de espera, aguardando resultados de seus exames e reparei que não estava utilizando seu habitual jaleco.
Pensei:
- Está a paisana! - O que me fez esboçar um sorriso mental.
O fato é que ele aguardava os resultados de alguns exames e devido a coinscidência de estarmos ali, ofertou-me uma carona até nossa cidade natal, o que aceitei pelo desconforto do transporte coletivo.
O que me surpreendeu foi ao sair do consultório, constatar que o meio de transporte que utilizava era uma motocicleta, que me desagradava, por não considerar confiável algo tão vulnerável e veloz.
Como já havia concordado, resolvi não hesitar, subi à garupa e partimos.
O médico corria como se desejasse transpor algum recorde de motociclismo. Em uma curva mal feita quase fomos abatidos por um veículo que vinha em sentido contrário, quando na próxima curva não escapamos.
Ao desviar de um outro veículo, após perder novamente o controle da motocicleta, o médico a arremessou em direção a um precipício.
Engraçado como nesse momento, a queda parece tão lenta e as imagens surgem como um grande rio recebendo seus afluentes, só consegui pensar em sobreviver, o que me fez apoiar no corpo do irresponsável condutor, para que conforme o impacto, servisse para amortizar o impacto do meu corpo, que já imaginava destroçado em meio aos rochedos e toda sorte de obstáculos que via surgir naquele precipício.
E ocorreu como eu previ, o corpo do médico amorteceu e a queda parecia não ter sido tão nefasta quanto eu imagivana, sofri apenas meras escoreações, que nem me fizeram perder a consciência.
Passado o episódio, com todo aquele transtorno de curiosos à margem da estrada, logo após o resgate e em seguida o transporte do cadavérico médico, que agora estava digno de uma análise daqueles estagiários recém-chegados à faculdade de Medicina.
De volta à cidade, me vinha tanto o alívio de ter conseguido sobreviver em meio ao perigo de morte eminente, quanto ao mesmo tempo, o remorso por naquele momento crítico, apenas ter pensado em meu bem estar, o que custou o destroçamento daquele corpo, um médico de outrora.
Agora me deparava diante de outro dilema, ir anunciar a tragédia aos familiares do médico e a dúvida se deveria dizer ou não que o utilizei como escudo.
Na dúvida, preferi omitir a parte do escudo.
O sofrimento foi grande, mesmo o médico sendo idoso, penso que para os familiares é sempre uma dor a perda, por causa daquela ausênca presente, um habitual que é arrancado subitamente.
Havia um primo do falecido que cuidava de seu carro, exibindo a condição de seu veículo em bom estado de conservação e eu ao mesmo tempo desejando conversar com o sobrinho do médico, ao qual eu tinha uma ligação maior, aguardei um momento mais oportuno para conversarmos sobre o ocorrido.
Foi justamente nesse momento de distração do primo, com seu veículo automotor, que me aproximei e relatei meus sinceros sentimentos em relação ao falecido, compartilhamos a dor.
Mas foi nesse momento que algo ocorreu.
Eu vi naquele sobrinho um rosto familiar, era meu primo e aproximando-me do caixão sendo velado, olhando dentro dele, deparei-me com o tio de meu pai ali deitado.
Mas como poderia tal coisa, e pensando bem, porque haviam mudado as pessoas envolvidas em tal fato ocorrido?
Me recordei do acidente.
Como poderia ter sobrevivido a algo desse tipo e o que faria em uma consulta numa cidade como aquela, sendo que meus médicos atendem em minha cidade, além de não ter nenhuma médica como aquela nefrologista, nem o médico de asma possui motocicleta, seria surreal estar naquele consultório.
Pensando ainda mais amiúde, comecei a perceber certos hiatos nos acontecimentos, como entre o momento do acidente e o velório, além de diversos outros fatores desconexos, foi quando me dei conta da evidência.
FUI ILUDIDO!!!
Um sonho, tudo não passava de um sonho, uma ilusão de minha mente que me remeteu a um estado psíquico caótico, onde até certo momento as coisas faziam sentido, aquele sentido da falta de sentido, onde estava entorpecido nessa atmosfera onírica.
Aaahh!!!
Agora despertei, a própria mente detectou o estado ilusório, ou será que agora estarei inserido em outro?
O que importa é que estou despertando e queria continuar adormecido para ignorar o acordar cedo e ter que me preparar para mais um dia fastidioso de trabalho.
Doce Ilusão!
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