Desenho Animado: Instrumento de Manutenção Social



UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PEDAGOGIA







BRUNO HERCÍLIO REZENDE DA SILVA







DESENHO ANIMADO:
INSTRUMENTO DE MANUTENÇÃO SOCIAL












JOÃO PESSOA ? PB
PERÍODO 2008.1
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PEDAGOGIA






BRUNO HERCÍLIO REZENDE DA SILVA






DESENHO ANIMADO:
INSTRUMENTO DE MANUTENÇÃO SOCIAL



Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Estágio Supervisionado da Área de Supervisão e Orientação Escolar, sob a orientação da Professora Margarida Sônia Marinho do Monte em cumprimento às exigências para a obtenção do título de licenciatura Plena em Pedagogia.








JOÃO PESSOA ? PB
PERÍODO 2008.1


UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PEDAGOGIA






BRUNO HERCÍLIO REZENDE DA SILVA




Banca Examinadora





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Professora de Estágio ? Efigênia Maria Dias Costa


_________________________________________________________
Professora examinadora ? Eliane Ferraz Alves



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Professora Orientadora ? Margarida Sônia Marinho do Monte
Dedicatória

Dedico este trabalho às professoras, Efigênia Maria Dias Costa, Eliane Ferraz Alves e Margarida Sônia Marinho do Monte; aos socialistas, Karl Marx, Friedrich Engels, Vladmir Lenin, Leon Trotsky, Antonio Gramsci, Paulo Freire, Che Guevara, Fidel Castro, Carlos Lamarca, Luís Carlos Prestes e Heloísa Helena; ao anarquista Mikhail Bakunin e a todos aqueles que contribuíram ou contribuem, na teoria ou na prática, para a construção de um mundo socialista.



















































"As idéias dominantes de uma época são sempre as idéias da classe dominante." (MARX; ENGELS, 2003).

Agradecimentos
Este trabalho não poderia ser realizado se não fosse a presença de todas as pessoas e animais que, em diferentes momentos, estiveram presentes com participações gigantescas e importantes, fazendo, assim, parte da construção da trajetória desse trabalho.

Agradeço à orientação e companhia da Doutora, sem muita questão de ser, Eliane Ferraz que caminhou, caminha e vai continuar caminhando comigo nesse processo inconcluso que é a educação, compartilhando momentos de alegria, de discussão, de troca, e de cansaço. Pessoa que eu fui conhecendo melhor e aprendendo muito com seu jeito atencioso de me orientar e de respeitar a minha produção e o meu percurso.

Agradeço a todos os professores e professoras das disciplinas, que estive ao longo do Curso de Pedagogia (UFPB), por me estimularem a seguir trabalhando não só nesse tema, mas também em outras atividades do cotidiano. Com eles também aprendi muito, não só no aspecto intelectual, mas também no aspecto humano - no jeito deles de ser e de lidar com os alunos - que muito me encantou, pelo menos na maioria dos casos.

Agradeço à professora Efigênia Maria Dias Costa, com quem tive o prazer de estar praticamente metade de todo longo Curso de Pedagogia na UFPB. Por ela ser do jeito que é: atenciosa, incentivadora, observadora de pontos incomuns e transformadores que poucos vêem. Enfim, é uma bela representante da classe. Agradeço por ela proporcionar os muitos momentos de exposição de pensamento nos inícios das suas aulas, não só para mim, mas também para todos os colegas da turma e por estimular a prática educativa num livre pensar. Valeu professora, ou melhor, está valendo estar com a senhora. Muito obrigado.

Agradeço à professora Betânia Zacarias, por me acompanhar em parte do meu estágio, nas atividades dos projetos que estivemos e estamos juntos.

Agradeço a todos educadores (as) que me auxiliaram na caminhada do estágio, já que por motivos diversos, não estive estagiando em uma só escola.

Agradeço à professora Margarida que possui uma atitude compatível com uma verdadeira estrategista guerrilheira. Está sempre, ali, dando atenção a "seus aliados" e "não aliados", para ter um panorama daquilo que é possível fazer para subverter determinada situação de forma eficaz. Claro que isso é reforçado com a orientação que ela fez do meu TCC (Trabalho de Conclusão de Curso), que fala do desenho animado enquanto instrumento de manutenção social, uma prova de que a conspiração existe. Neste caso, uma conspiração socialista.

Agradeço aos meus amigos de sala e da vida Monalisa, Priscila, Ricardo e Rosa, por estarem sempre ao meu lado nas proposições da academia e fora dela.

Agradeço à minha família, por ter me apoiado direta e indiretamente nesta caminhada de quase seis anos na UFPB.

Agradeço às crianças das escolas, que tiveram um grande papel neste trabalho, participando das exibições das animações. Suas ações e falas estarão guardadas para sempre comigo.

Agradeço a Ana Carla, Priscila Kelly, Valdeniza, Jucilene, Betânia, Nadja, Maria José, Ivana e Elaine, por terem me auxiliado na pesquisa.

Agradeço a todos (as) colegas de turma, parte importante desse processo, sem os quais esse trabalho não teria o mesmo sentido.

Agradeço a Junior, Thiago Lins, Sandra Melo, Marcos Anderson, Cris Pereira, Neto, Paulo Paulada e a todos os outros atores sociais que colaboram, fazendo parte comigo do movimento impresso comunitário (O Passional) na capital paraibana, reforçando, assim, todas as idéias ligadas de alguma forma a esse trabalho, já que ele trata também de comunicação.

Resumo

Este trabalho tem como objetivo discutir o desenho animado enquanto instrumento de manutenção social. Para realizá-lo, fez-se necessário, inicialmente, a construção de uma linha do tempo enfocando a TV aberta do Brasil. Em seguida é mostrado de que tipo de televisão está se falando e a que interesses ela atende. Assim, considerando-se a estrutura da TV aberta brasileira, enquanto indústria cultural bem como a ligação da indústria de animação dos desenhos animados, faz-se necessário um paralelo não só da aparente exibição dos desenhos animados, como também da aparente inocência na exibição do desenho animado (DVD?s e vídeos, TV aberta), no espaço formal educacional. As práticas docentes, vinculadas a este processo de exibição e a ideologia que os desenhos, podem veicular, de forma muitas vezes subliminar, partindo da magia e encanto que os "bichinhos" exercem sobre as crianças.




Palavras chave: televisão ? desenho animado ? indústria cultural ? ideologia ? prática docente.

Sumário

Página
Introdução........................................................................................................................10
Problematização...............................................................................................................12
Capítulo 1 ? Linha histórica da televisão no Brasil ........................................................16
Capítulo 2 ? De que televisão está se falando? ..............................................................18
2.1 ? Meio século e muita história ......................................................................20
2.2 ? Subjetividades e a TV.................................................................................23
2.3 ? A TV e as crianças......................................................................................25
Capítulo 3 ? O Papel da TV aberta brasileira na Indústria Cultural................................28
Capítulo 4 ? O desenho animado vendendo idéias e formando valores..........................30
4.1 ? O desenho animado a serviço da ideologia capitalista...............................32
4.2 ? O desenho animado a serviço da ideologia comunista...............................34
4.3 ? "Bichinhos" em desenhos animados como instrumentos de manutenção social....................................................................................................................36
Capítulo 5 ? Simbolismo e a ideologia nos desenhos animados ....................................39
5.1 ? O imaginário infantil e o desenho animado................................................41
Capítulo 6 ? Procedimentos metodológicos e uma breve análise sobre a prática docente e o desenho animado no espaço escolar..............................................................44
Capítulo 7 ? Considerações finais...................................................................................52
Referências
Anexos


Introdução
Este estudo pretende percorrer uma trajetória da TV aberta1 no Brasil, seguindo uma linha do tempo de 1950 a 1990 e entendendo que, pós isso, a TV aberta não está muito distante do que é hoje. Partindo do ponto de vista da programação existente nessa trajetória a TV demonstra ter atingido, com sua criatividade, o ápice no âmbito do controle social, considerando que esta atende aos interesses de mercado, em detrimento das transformações sociais do ponto de vista das massas. Isso afeta diretamente o cotidiano, a ponto de movimentar as estruturas sociais e conservar ou modificar a sociedade ao gosto das classes dominantes. Daí surgem várias questões, entre elas: como preparar os jovens e as crianças para estarem nesse espaço manipulador? Como fazer para que eles analisem criticamente a televisão?
Entre os principais objetivos dessa pesquisa está a tentativa de compreensão e análise dos recortes da realidade, identificada na presença cotidiana da TV em nossa cultura e na não utilização crítica do desenho animado2 no âmbito formal da educação; a integração da TV à escola, já que parte dos desenhos exibidos na TV passam na escola; e os interesses ou funções de produtores e proprietários de TV na educação. Essas questões serão discutidas neste estudo, por meio de analogias, construídas a partir da programação infantil (desenhos animados principalmente). O interesse comercial e a proximidade suspeita da TV aberta a objetivos consumistas, sem dúvida, estarão também sendo tratados neste trabalho, sem esquecer ainda, da utilização da programação infantil, mais precisamente do desenho animado como instrumento de manutenção social, reproduzindo as idéias dominantes. Essa visão capitalista desses desenhos é provocada pela transformação da TV aberta em uma indústria cultural, situação que respinga no espaço escolar.
Partindo desses pontos que envolvem a TV aberta no Brasil, a indústria e a escola, é interessante que haja uma tentativa de compreensão, por parte de quem geralmente está no meio de tudo isso, servindo como mediador, que são os pais e os educadores, e os acometidos pela proposição da exibição. Isso pode acontecer por meio de várias indagações, entre elas: qual o sentido da vida? Qual a sociedade ideal? Quem

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1 - São chamados os canais de TV gratuitos. Receberam essa denominação depois da chegada da Televisão por assinatura.
2 - Animação refere-se ao processo segundo o qual cada fotograma de um filme é produzido individualmente, podendo ser gerado quer por computação gráfica quer fotografando uma imagem desenhada repetidamente fazendo-se pequenas mudanças a um modelo (ver claymation e stop motion), fotografando o resultado. (Wikipédia)
está sugerindo proposições? O que pretendem os homens, disfarçados de "bichinhos", todos os dias para as crianças de hoje, na programação infantil?
Portanto, a proposta deste estudo é fazer uma breve análise do desenho animado enquanto instrumento de manutenção social, ou seja, dos "inocentes" animaizinhos a serviço da classe dominante, não importando o sistema social vigente.

Problematização

A trajetória educacional do Brasil, nas últimas décadas, vem apresentando em termos metodológicos um crescimento significativo e extremamente importante para a sociedade. Esse crescimento se deu, devido, principalmente, ao avanço das informações cientificas acerca do desenvolvimento da criança e do seu conhecimento.
Paradoxalmente, estudos que mostram que a insuficiência e a inadequação de espaços físicos, equipamentos e materiais pedagógicos, a desvalorização e a ineficácia da formação específica dos profissionais que atuam na área docente não vem acompanhando o ritmo desse crescimento. Esse descompasso entre as informações cientificas e a aplicabilidade dessas informações vem acarretando muitos prejuízos aos educandos, principalmente às crianças. É comum os alunos terem, em suas casas, uma televisão, por ser muito difundida na sociedade, resultado de seu baixo custo e de fácil acesso. Os telespectadores em meio às informações (imagens) que se apresentam no conteúdo dos programas, propagandas, notícias, anúncios são, em sua grande maioria, passivos. Tais informações são vinculadas em qualquer conteúdo televisivo, como por exemplo, desenhos animados e programas infantis.
A presença constante dos meios eletrônicos e de comunicação em nossas vidas deve chamar a atenção dos educadores, devido a importância na transmissão/construção de conhecimentos, valores, conceitos e culturas. Nesse sentido usar a televisão no ensino aprendizagem pode ser um meio para o educador alcançar seus objetivos ao trabalhar determinados conteúdos, algo que os grandes grupos capitalistas, de diversas formas, já fazem: reproduzir a idéia de consumo, por exemplo.
No contexto atual, os telespectadores são influenciados pelas imagens da televisão. Segundo Rezende (1989), isso se dá porque esta domina elementos como som, foco de luz, imagens móveis que despertam a atenção de adultos e crianças, destacando os desenhos animados e programas infantis. Essa leitura das imagens acontece de modo automático e contínuo, não permitindo ao espectador fazer grandes reflexões sobre os conteúdos das imagens. Por isso, também o público infanto-juvenil tem sido alvo, também, das programações de modo geral. Não é difícil observar a atenção e o interesse da criança, desde muito pequena pela televisão. A TV está, de fato, em evidência na vida infanto-juvenil, representada através do comportamento das crianças, seja em linguagens ou atitudes, imitações dos personagens de desenhos animados, programas, filmes, entre outros. Geralmente, essas imagens são veiculadas no período matutino da TV aberta do país. E acompanham uma boa parte do tempo das crianças. Sobre essa questão, Bastos (1998) explica que:
O tempo dedicado a TV é maior do que as atividades de lazer. A criança que assiste muita a programação da televisão fica limitada as suas próprias possibilidades, iniciativas e criatividades, uma vez que, são poucos os meios de comunicação que estimulam o lúdico da criança, e além do mais as mesmas tendem a serem telespectadoras fiéis, quando adultas.

A presença da TV na vida da criança ocorre quando esta ainda nada conhece do mundo. Os programas infantis informam ou formam sua personalidade, ou seja, participam do processo de desenvolvimento mental da criança. Sobre isso Rezende (1989) enfatiza "(...) que o consumo infantil, geralmente acrítico e passivo sem dúvida terá decisiva interferência na representação que a criança formará da realidade".
Sendo assim, compreende-se que a criança que assimila que se apropria passivamente das mensagens dos programas infantis não terá autonomia para formar seus próprios valores, porque as informações que lhes são transmitidas se encarregam de exercer esse papel. Claro que não se pode negar que a TV faz parte da vida das pessoas, principalmente do telespectador infanto-juvenil e nem, na maior parte do tempo, pode-se impedir que assistam aos programas para adultos. No entanto, é possível formar o telespectador crítico, ativo, frente às mensagens que recebe, refletindo, produzindo e formando seus próprios conceitos, através das atividades programadas pelo professor em sala de aula. Tal formação pode obedecer a dois pontos de partida: a necessidade e o interesse do aluno. Considerando esses dois pontos, o professor poderá explorar a produção de textos orais e escritos, usando a TV. Agindo assim, o professor terá a possibilidade de conseguir melhores resultados em suas aulas, pois a prática tradicional de ensino, na maioria esmagadora dos casos, não desperta o interesse dos alunos (PCN, 1998).
A programação infanto-juvenil, mais precisamente os desenhos animados, é fixada de alguma forma em um campo atemporal. Passam-se anos e lá está o Pica-pau, o Homem Aranha, entre outros, desenhos animados com efeitos dinâmicos. E mesmo a neutralidade não existindo na ação desses espaços programados, que são os desenhos animados e outros programas para crianças e adolescentes, não se deve afirmar que todas as crianças são totalmente passivas diante da TV. Havendo orientações dos pais e da escola, através do educador, será grande e presente a possibilidade da capacidade de discernir o teor das mensagens sublimadas por parte das crianças. Mas, muitas vezes isso não acontece e a TV termina por conduzir a um comportamento impulsivo e pouco reflexivo.
Ultrapassando a TV em si (o aparelho), pode-se encontrar um bom reforço na utilização da TV aberta comercial do Brasil (enquanto estrutura) como recurso que reforça essa situação de tentativa de implantação da passividade em massa. Nesse tipo de TV, que já ultrapassa os 50 anos de história, não será muito difícil observar o comprometimento desse veículo, com grandes corporações capitalistas. Basta analisar o discurso dessas TVs nas suas programações diárias.
Para entender um pouco essa situação, basta observar a relação de mercado entre programação infantil e produtos vinculados, direta ou indiretamente, a alguns personagens, por exemplo, os diversos tipos de material escolar ligados aos desenhos animados. Os desenhos, geralmente, promovem uma marca que queira vender seus produtos, entre eles, as bonecas, as sandálias que acompanham pulseiras com as fotos e nomes fixados ou gravados dos personagens de televisão, anunciados dentro dos programas que veiculam esses desenhos.
São muitas as atividades que podem ser geradas visando ao questionamento dos valores que a televisão ensina tanto para adultos, no seu cotidiano como telespectador, quanto para crianças pequenas em sala de aula. Através de produções de textos, na exibição de um desenho ou programa, pondo em discussão os seus valores e objetivos, e socializando as opiniões que podem ser orais ou escritas; na construção de textos escritos, observando a seqüência lógica desses textos e para superar as dificuldades de aprendizagem. Nessa aparente inocência dos desenhos animados, os interesses de classes, neste caso da classe dominante impõem, de forma complexa, através da economia, a sociedade "ideal", seus valores, seus discursos, enfim, a manutenção do sistema social capitalista. Por isso é importante analisar qual a formação dos programas que aparecem com a idéia de alegrar e ensinar com novos conhecimentos e de promover a imaginação e a criatividade das crianças, uma vez que a programação é ideológica e promove a venda de produtos e idéias, transformando a programação infantil da TV aberta e a programação geral dessas TVs em uma relação comercial. Dessa forma, tal programação degrada "agora" as mentes das crianças e no "futuro" poderá gerar "cidadãos" com características, como: consumidores, doutrinados, passivos, etc.
Com essas reflexões iniciais, apresentamos, neste estudo, a idéia de que a televisão pode ser um recurso pedagógico interessante para o educador, pois este deve ser explorado e utilizado nas atividades pedagógicas, no âmbito escolar. Ao realizar essas atividades, os objetivos devem estar estruturados na interpretação das ações dos personagens e de suas simbologias. Rever condutas para transformar suas ações, isto é, se auto-avaliar e modificar o seu espaço em prol da maioria (excluídos), se subverter, parece fazer parte da necessidade humana. Nessa perspectiva, é muito pertinente levar o grupo de trabalho responsável pela ação direta com crianças na sala de aula, a experimentar comportamentos diferentes do cotidiano, que possam gerar mudanças tanto em nível cognitivo, quanto em níveis emocional e comportamental.
Portanto, as reflexões e discussões que estão sendo apresentadas, neste estudo, podem contribuir para a construção de novos conhecimentos, novos saberes. Quanto mais integrado e socializado for o trabalho desenvolvido no espaço educativo (formal ou não), melhor será para o educando atendido. É nele que o resultado será mais aparente. Assim, seria ideal que toda criança pudesse ter um tempo de brincar e interagir com seu semelhante. Assistir a programações televisivas pode privar a criança de brincar e de aprender a viver. Por outro lado estar em frente de uma televisão, assistindo aos programas infantis com moderação e analisando criticamente seu conteúdo é de grande importância para uma formação reflexiva da vida.

1 - Linha histórica da televisão no Brasil

Para se entender um pouco melhor a programação da televisão no Brasil, hoje, é importante se buscar e traçar, mesmo de forma sucinta, como a história da televisão foi se dando ao longo do tempo. Nessa primeira parte do estudo será percorrida uma trajetória de 1950 a 1990, porque, posteriormente a isso, a análise da TV, na maioria dos casos, não se distancia do que se tem hoje, partindo do ponto de vista da programação existente. E para isso esse estudo faz uma viagem até 1950, quando em setembro foi inaugurada a TV - Tupi Difusora de São Paulo, "dita" a primeira emissora do Brasil. Segundo pesquisadores, tal inauguração aconteceu em 18 de setembro, mas só um dia depois, dia 19, o primeiro telejornal brasileiro iria ao ar: "Imagens do Dia". Ainda na década de 50, outras situações foram dando suporte ao desenvolvimento, pelo menos no sentido numérico, da televisão no Brasil. Outras inaugurações de canais de televisão em outras cidades aconteceram, já com o dedo de estrangeiros, para não dizer as mãos, nesse capítulo da história da TV. Os americanos, por meio de uma agência de publicidade, intervindo na grade televisiva do Brasil, já davam início a um plano futurista e bem arquitetado, no sentido de reforçar o que até hoje é claro, a "imposição cultural" imperialista por meio da "grande" economia em detrimento de outras culturas, de "menor" economia ou para muitos sub-culturas.
Na década de 1960, alguns acontecimentos formaram a construção da televisão no Brasil, como: a criação do Conselho Nacional de Telecomunicações (CONTEL), através de Decreto e a obrigatoriedade da exibição de todos os filmes transmitidos pela TV serem dublados, também através de Decreto. E, em meio a essas curiosidades, começa a surgir o que hoje é fundamental para os capitalistas de plantão, os parasitas da TV (qualquer ator comunicacional apenas interessado em lucrar financeiramente). Começava, naquela década, a se formar uma estrutura putrefata da TV, uma ótica leitora de que a TV poderia e deveria ser mais um pilar do sistema social capitalista, quando esse meio de comunicação já absorvia 24% dos investimentos publicitários do País.
Ainda nos anos 60, foram realizadas as primeiras experiências de televisão educativa no país (Rio de Janeiro), quando a TV Continental transmitiu aulas básicas de um curso profissionalizante, simultaneamente com a TV - Tupi Difusora de São Paulo. Nessa década foram regulamentados, por meio de Decreto (uma prática comum na época), os serviços de radiodifusão, determinando os objetivos do rádio e da televisão, "considerados de interesse nacional". Mas o que não vai ficar esquecido é o ano de 1964, quando aconteceu o Golpe Militar e, "estranhamente" ou "coincidentemente", a imediata concessão de um canal de televisão às Organizações Globo, de propriedade do empresário Roberto Marinho3.
Na década seguinte, 1970, o censo demográfico nacional registrou que 27% das residências brasileiras já estavam equipadas com televisores. Isso reforçava, para alguns interesseiros o plano de alguns interesseiros de que a TV deveria ser um veículo de comunicação a serviço do mercado, em sua maioria. Como exemplo disso, havia a publicidade indireta de algum produto inserido no conteúdo do programa transmitido ? foi introduzido na TV através da novela "Cavalo de Aço", da Rede Globo, o merchandising4, que também é definido como a publicidade que é feita fora dos intervalos comerciais. A partir daí foram se exibindo ao vivo os grandes eventos do planeta, como a Copa do Mundo de 1970.
O que chama a atenção na década seguinte (1980) é o surgimento de novas emissoras televisivas, entre elas, o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT) e a TV Manchete. Já no final dessa década, mais de 64% das quase 35 milhões de residências do país já estavam equipadas com aparelhos de televisão. Outro acontecimento da década foi a promulgação da nova Constituição Brasileira, modificando o sistema de concessões de canais de rádio e de televisão. Partindo para o ano de 1990, há o registro da data de aniversário dos 40 anos da televisão brasileira. Demonstrando ter atingido, com sua criatividade, uma maturidade no exterior, principalmente no meio capitalista, a TV brasileira amplia as exportações de seus programas, atendendo, assim, aos interesses de mercado, em detrimento das transformações sociais do ponto de vista das massas.










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3 - Criou uma Fundação que leva o seu nome e dirigiu a Rede Globo de Comunicação, durante muitos anos (www.biblio.com.br).
4 - Conjunto de ações de Marketing realizadas com produtos ou serviços que têm, como objetivo final, a venda de outro produto (www.revistameioemidia.com.br).

2 - De que televisão está se falando?

Depois da exposição sucinta de uma linha histórica da televisão no Brasil de 1950 a 1990 sem um grande aprofundamento analítico de como ocorreram essas transformações, busca-se, agora, tratar do que estamos tentando de fato discutir, a TV aberta e as relações que podem ser estabelecidas com as atividades pedagógicas. A Televisão aberta comercial consiste, no âmbito contextual do século XXI, no mais importante meio técnico de comunicação em funcionamento no Brasil. Isto deve estar se repetindo, possivelmente, por toda parte do planeta. A TV é o principal mecanismo de comunicação dos tempos atuais. Dificilmente existe um outro caso de um país continental, onde este meio exerça tão grande influência no conjunto da vida das pessoas e das entidades que as organizam. Aqui, predomina o baixo nível de letramento5 e o alto grau de analfabetismo funcional6, de certa forma compensado, geralmente, por uma boa oralidade7. Neste caso, tudo se propõe e se resolve.
A exclusão social de milhões, nos mais diversificados níveis e situações, implica em meios técnicos de comunicação que auxiliem no processo de estruturação e da manutenção, através de um dominante discurso, o da ordem. Nas últimas décadas, aconteceu o barateamento relativo e a facilidade de se adquirir o que é necessário e fundamental para se ter acesso doméstico à TV. E nisso as grandes empresas e os governos sempre apontaram interesse em ter como se dirigir à população, da mesma maneira e ao mesmo tempo. Estes são fatores significativos, para que se compreenda o problema da influência da TV aberta na educação de jovens e crianças brasileiras.
Desde sua origem, há cinqüenta anos, a TV é dirigida, comandada, por empresas privadas, ou seja, capitalistas, que viram, neste veículo, uma fonte de lucratividade, tendo como base principal os anúncios publicitários privados e públicos. Mais tarde, descobriram que os produtos televisivos eram mercadorias simbólicas que poderiam ganhar o mercado internacional, proporcionando elevados lucros.
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5 ? É o resultado da ação de ensinar a ler e escrever. É o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como conseqüência de ter-se apropriado da escrita.
6 ? É a denominação dada à pessoa que, mesmo com a capacidade de decodificar minimamente as letras, geralmente frases, sentenças e textos curtos e os números, não desenvolve a habilidade de interpretação de textos e de fazer as operações matemáticas. Também é definido como analfabeto funcional o individuo maior de quinze anos, que possui escolaridade inferior a quatro anos, embora essa definição não seja muito precisa, já que existem analfabetos funcionais com nível superior de escolaridade (Wikipédia).
7 - Derivado de oral (que em sentido lato-sensu, é exprimir toda manifestação de pensamento que não se faz por escrito), a oralidade, significa o procedimento verbal, ou seja, tudo o que se faz verbalmente. Tecnicamente a oralidade não implica na inexistência de qualquer escrito. A oralidade exprime o modo originário por que se procede em certos atos: oralmente, para que se distinga do que se faz por escrito, originariamente (ARAÚJO CINTRA, Antônio Carlos; GRINOVER, Ada Pelegrini; e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 15ª ed., São Paulo: Mallheiros, 1999).
No Brasil, diferentemente dos casos da França, Canadá e Inglaterra, a TV pública não conseguiu ter maior importância econômica, política e cultural, tendo sua implantação ocorrida depois da existência dos canais privados. A disputa ocorreu e continua ocorrendo entre as empresas privadas de televisão. O que acontece, na contemporaneidade, é que as emissoras de natureza pública operam em posição terciária, não oferecendo nenhum grande ?perigo? aos donos do negócio televisivo. Estes se preocupam em produzir ?sucessos? temporais ou esporádicos e localizados, chegando a alguns setores sociais. Porém, em suas essências, não conseguem deixar seus lugares de complementaridade e de execução do, no mínimo, discutível projeto educativo-cultural (estruturação de uma sociedade desigual). Alguns de seus programas se enquadram e merecem essa categorização de produto educativo ou cultural, apresentando-se como algo voltado para as artes eruditas e populares.
Em meio a isso, nos arquivos destes canais de TV, contêm boa parte da memória das artes do país (Brasil), das referentes à música popular até às referentes à música erudita8. Possuem guardadas, igualmente, imagens e sons de entrevistas com personalidades e registros de eventos de rara significação para a cultura do país.
Isso causa inúmeros prejuízos, impedindo que se compreenda a unidade deste meio de comunicação. A mesma situação se multiplica, quando se isola alguma característica da programação, o estético, por exemplo, dos fenômenos sócio-históricos que envolvem a produção televisiva. O que a TV faz, relaciona-se ao momento contextual em que ela e seu público vivem, aos seus sujeitos, objetos e interesses disputados em cada programa. Prega-se a compreensão do fenômeno televisivo, reconstruindo-se um conjunto vinculado à vida social, ao fator econômico, às injunções políticas e culturais do país.






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8 - Assim como em outras culturas, no ocidente distingue-se a música popular, de bases coletivas, da música erudita, cujo código nem sempre é acessível a todos. Essas duas vertentes ora se tocam, ora se afastam, a ponto de uma criar transformações na outra. A história da música erudita ocidental está associada à Igreja, às cortes, aos salões da burguesia, às salas de concerto e às universidades (http://pzaine.sites.uol.com.br).

2.1 - Meio século e muita história

Para entender um pouco mais esse contexto da TV brasileira, será dividida uma história de meio século em três fases: a instalação ou implantação, ainda precária e experimental, na década de 1950; a maturação, na década seguinte, quando as tendências atuais são esboçadas, causando o aumento da tele-audiência, a profissionalização do fazer televisivo e de inúmeras melhorias técnicas; a situação de hoje, esboçada no fim da década de 1960 e desenvolvida nas décadas seguintes, que foram marcadas pela imensa importância econômica, política e cultural deste meio de comunicação na realidade do país. Talvez só se esteja entrando em uma quarta fase, onde a TV aberta se integra aos demais meios de comunicação "antigos", como rádio, e "novos", como Internet, e evolui na direção da tão proclamada convergência digital, sem perder suas características mais essenciais.
As causas e efeitos da programação da TV aberta sobre o grande público não são problemas menores, por mais que os setores tradicionalistas da elite dominante não achem importante pesquisar e analisar criticamente o fenômeno. Este tipo de reação já foi mais freqüente no passado e, em parte, justificável pelo papel negativo que a TV desempenhou na vida política e cultural do Brasil. Provavelmente já não se diz que a TV "é uma máquina de fazer doido" e nem que ver TV aumenta o grau de "burrice", "destrói o hábito de ler livros", "de ir ao cinema e ao teatro". Claro que jamais deixaram de dizer que esse meio de comunicação não interessa aos extratos sociais mais ricos porque é coisa consumida pelos pobres, pelas massas. A TV está na casa de todos e suas emissões são, para o "bem" e para o "mal", provavelmente, a principal fonte atual de formação e de veiculação da cultura brasileira. Não é a única fonte desta natureza e nem consiste em algo fatalmente insubstituível. Desenvolver outras atividades, além de ver TV ou ?viajar? na Internet, depende de fatores econômicos, políticos e culturais que vão muito além da presença dessas mídias.
O aparente, mas factual desinteresse relativo e massivo pelo objeto livro, pelo cinema e pelo teatro não podem ser explicados como um efeito só da televisão. Em primeiro lugar, muito antes de sua instalação no país, números provam que havia poucos leitores. Em grande parte o cinema não era visto como arte, pela maioria dos seus consumidores, e nem o teatro de boa qualidade conseguia alcançar públicos extraordinários. A chegada da era da TV, certamente, reforçou e continua reforçando a baixa dos hábitos culturais mais "refinados", bem como, é um dos fatores responsáveis por modificações das atividades comunitárias, dentre estas as manifestações que organizam as comunidades populares. Não é muito simplismo crer em um poder exagerado desse meio de comunicação de massas. Ainda hoje, as referências a estas artes e outras manifestações sociais, quando exibidas na TV, provocam a corrida do público para o seu consumo. O mesmo ocorre com as festas públicas de maior relevo que agora incluem, quase obrigatoriamente, a midiatização9 televisiva. Portanto, seu poder publicitário influi e poderia influenciar muito mais no consumo destes outros meios de comunicação, se houver condições e interesse para tal.
Não aconteceu a substituição desses meios de comunicação mais "antigos", e sim as possibilidades efetivas de acesso que são limitadas e isto inclui condições políticas, econômicas e culturais. Entre elas é a de se conseguir abalar a tal lógica do entretenimento, ou seja, de determinado tipo de diversão passiva e contemplativa vendida para o mundo pela indústria cultural dos EUA (imposição cultural via economia). Isso pode ser tão prejudicial quanto o hábito de ver TV. Aí está um dos componentes do niilismo10 de nossa época. Aliás, se pode se ler livros, ir ao teatro, ao cinema e participar das festas populares do mesmo jeito que se assiste aos programas mais medíocres da TV. Depende do que se vê, lê, assiste e vive como espetáculo, bem como, não se pode esquecer quais atitudes são tomadas, a partir do consumo destes artefatos.
Na sociedade contemporânea existe uma cultura audiovisual eletrônica que proporciona aos jovens informações, valores, saberes e outros modos de ler e perceber o mundo. Entre essas formas de cultura eletrônica está a TV, lugar onde a maioria esmagadora das residências encontra uma ocupação, um entretenimento. Para Martin-Barbero (1995), os diversos e complexos processos de comunicação da sociedade difundem linguagens e conhecimentos diversos que descentram a relação escola-livro, âmago do sistema escolar vigente.
Considerando esse contexto, a TV será encontrada como o meio de comunicação predominante, instrumental de socialização, entretenimento, informação, publicidade, formado por funções de interesses dos mercados. Por ela gerações consomem e aprendem a se conhecerem. Reuniões públicas, antes nas ruas, associações, praças, etc. agora têm como cenário e como mediador a TV, ou pelo menos deveriam ter.
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9 - Termo coletivo usado para se referir às indústrias de comunicação e aos profissionais envolvidos. (pt.wiktionary.org/wiki/mídia).
10 - Doutrina filosófica e política que nega, dentre outras coisas, toda subordinação ao Estado, à igreja e à família. Palavra derivada do latim (nihil, ou seja, nada). O niilismo baseia-se na negação, seja da ordem social estabelecida, seja de todas as formas de esteticismo, assim como na defesa do racionalismo científico e do utilitarismo (Wiki.Ateus.Network).

Campanhas políticas e pronunciamentos oficiais substituem interações coletivas, os diálogos ficção-realidade transcendem fronteiras e mostram a telenovela ? um dos programas mais visto por crianças e adultos - superar o entretenimento meramente alienatório e discutir temas sérios, oportunos, que antes eram ignorados ou não admitidos. Tudo isso devido, principalmente, a uma cultura implantada, a um discurso construído em detrimento da maioria, um discurso dominante. Baseado no levantamento dessas questões, pergunta-se: como preparar o jovem para analisar a televisão, fazer uma leitura de mundo recortado por ela, compreender-lhe os recortes (essa edição da realidade)? Como analisar a presença cotidiana da TV em nossa cultura? Como utilizá-la criticamente a serviço da educação? Como integrar TV à escola, já que parte dos desenhos exibidos na TV passam na escola? Educa-se pela televisão? Quais os papéis ou funções de produtores e proprietários de TV na educação?
São perguntas retomadas neste estudo, deixando de lado a análise através de vários setores "reais" da sociedade para se buscar analogias num lugar de base, a programação infantil (desenho animados principalmente), atrelada mesmo que de forma implícita a tudo que foi exposto até agora sobre a TV. E, nesse foco, a proposta surge através do desenho animado, aparentemente inocente na maioria dos casos.

2.2 - Subjetividades e a TV

O mundo vive rápidas transformações em função das revoluções tecnológicas, nas quais a televisão tem um papel preponderante. Antes do advento da mídia, mais precisamente da televisão, as pessoas se reuniam em praças, esquinas, bares, calçadas, para participarem das conversas que ali surgiam. As crianças foram deixando as peladas11, as brincadeiras de rua e foram se rendendo aos "encantos" da televisão. Entre outros fatores, pode-se dizer que esses encantos fazem com que as crianças passem boa parte do tempo diante da TV. Com toda a influência desse meio de comunicação, conseqüentemente, mudaram-se os costumes e o cotidiano dos lares.
A presença da televisão na infância é reconhecida como uma atividade de lazer, chegando a disputar espaço com as brincadeiras infantis e, para muitos, tornando-se a única fonte de entretenimento. Num estudo realizado em 04 escolas de Florianópolis, mais de 70% dos educandos relataram que ver televisão é a principal atividade extra-sala de aula. Já cerca de 40% dos entrevistados afirmaram deixar a televisão ligada enquanto brincam ou fazem refeição.
Mesmo usando uma pesquisa que aconteceu em um contexto específico do país, não se deve desconsiderar que a TV se transformou em um eletro-doméstico do qual a população já não abre mão. É um objeto técnico, eletrônico, que está presente em lares, escolas, bares, restaurantes e outros ambientes sociais. (FISCHER, 2005).
Nesse percurso, percebe-se a influência e importância que se dá a esse instrumento eletrônico na vida das pessoas. Diante disso não é interessante esquecer de mencionar que as relações e compromissos dos pais também mudaram com o tempo. Para observar a relação entre pais, filhos e programação infantil da TV aberta será considerada, em termos de observação, que já há algum tempo atrás a mulher cuidava (tomava conta) dos filhos, em casa, enquanto o marido era o responsável pelo sustento da família. Essa estruturação de papéis mudou. E cada vez mais, a mulher se insere nos inúmeros ramos de trabalhos na sociedade. Com isso, os filhos terminam ficando mais tempo sem a presença dos pais e diante da televisão. À TV pode-se dizer, é atribuído





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11 ? É a expressão utilizada no Brasil para a prática do futebol amador, não competitivo, pelo simples prazer (www.revistas.ufg.br)

o papel de "babá-eletrônica". Pacheco (2005) ressalta que a "TV condiciona a rotina das crianças e de seus familiares, funcionando ora como babá-eletrônica, ora como pano de fundo para as conversas entre amigos, ora como convidada assídua das refeições, ora como convite ao silêncio familiar, mas sempre ligada".
Percebe-se que a televisão exerce grande influência em nossas vidas, quer seja como forma de lazer, quer seja pela atualização dos fatos ocorridos no mundo. O que não se pode negar é que, mesmo a TV exercendo grande influência nas vidas das pessoas, mais especificamente, das crianças, que são o foco desse estudo, de alguma forma, nem sempre são passivas diante da televisão. A criança relaciona-se com a TV do mesmo modo que se relaciona com o que está à sua volta. Para ela, a TV constitui um jogo simbólico, como são as brincadeiras infantis. A criança é receptiva às mensagens veiculadas na TV; ela recria situações de acordo com suas experiências, em um processo de troca de conhecimentos. Ela assimila o que vê e ouve, retirando o que lhe interessa no momento da exibição (FISCHER, 2003).
Por isso, de alguma forma, a mídia constrói as subjetividades, na medida em que produz imagens, significações, enfim, saberes que, de alguma maneira, encaminham a "educação" das pessoas, ensinando-lhes modos de ser e estar na sociedade em que vivem. É necessário, assim, ressaltar que não se pode negar que a mídia exerce grande influência na formação desse sujeito ao lado da escola, família, instituições religiosas etc. As etapas ou processos de subjetivação sempre são históricas e, portanto, cada época possui construções particulares do contexto onde se está inserindo a TV, na condição de meio de comunicação social, ou de uma linguagem audiovisual específica ou ainda na condição de simples eletrodoméstico manuseado por nós, cujas imagens cotidianamente consumimos; têm uma participação decisiva na formação das pessoas, ou seja, de forma mais enfática, na própria constituição do sujeito contemporâneo. Então, entende-se, assim, que a televisão é parte integrante e fundamental de complexos processos de veiculação e de produção de significações, de sentidos, os quais, por sua vez, estão relacionados a modos de ser, a modos de pensar, a modos de conhecer o mundo, de se relacionar com a vida (FISCHER, 2005).


2.3 - A TV e as crianças

As crianças, em geral, possuem a capacidade de decodificar a televisão de forma ativa, ou seja, elas são capazes de construir saberes a partir desse referencial que é a televisão, visto que existem programas que são ricos em valores culturais e significados. Mas nem todos os programas e modos de assisti-los proporcionam o mesmo benefício para todas as crianças. Não se vê todas as crianças de maneira ativa e nem como "leitoras" adequadas em quaisquer situações; nem todos os programas possuem e transmitem conteúdo cultural e significativo. Desse modo, faz-se necessário compreender que cada criança é única e sua forma de decodificar o que a TV apresenta vai depender de diversos fatores, tais como: sociais, cognitivos, políticos, ideológicos, culturais, biopsicosocial, entre outros. Fischer (2003) apresenta um olhar diferenciado, em seu "estudo da TV como dispositivo pedagógico", feito a partir de dois importantes enfoques: na TV, considerando um como uma espécie de estatuto de métodos pedagógico da mídia e outro como "Subjetividade feminina e diferença no dispositivo pedagógico da mídia" que apresenta afirmações de como a TV é um lugar especial de educar, de fazer justiça, de promover a "verdadeira" investigação dos fatos (relativos a violências, transgressões, crimes de todos os tipos) e também "ensinar como fazer" determinadas atividades cotidianas, como lidar com o corpo, determinadas mudanças no cotidiano familiar entre outros "ensinamentos".
Com isso fica cada vez mais evidente a interferência da mídia, especialmente da televisão, na formação do sujeito ocidental contemporâneo. Importamos um modelo principalmente de sociedade americana competitiva, consumista e altamente televisiva. Diante também de uma sociedade que percebe a caracterização de alguns desenhos animados cuja compreensão do conteúdo e da influência destes desenhos são ilimitadas. Tudo vai depender do ponto de vista do autor que o estuda e do espectador que o vê. Nesse momento, não se quer rotular nenhum desenho, mas despertar o interesse para estudos posteriores sobre os desenhos animados e, principalmente, apontar para a possibilidade de usá-los como recurso midíático no âmbito escolar.
A explanação do que alguns desenhos expressam, veiculam segundo determinados autores (PACHECO, 2005; FISCHER, 2005), é o início de um caminho que pode ser questionado, (re) elaborado e estudado mais profundamente.
Uma das pretensões desse estudo é partir de uma revisão da literatura sobre a influência e outras situações estruturais de conteúdo dos desenhos animados, é poder compreender como esses desenhos possuem influência no desenvolvimento cognitivo, social, afetivo, biológico e psicológico da criança. Partindo dessas questões, faz-se necessária a reflexão acerca da importância que a televisão exerce sobre a vida da criança e, portanto, da ausência dessa reflexão no âmbito da educação. (SALGADO, 2005)
Na vida infantil há a necessidade da fantasia, facilmente encontrada nos desenhos animados. A opção, o gosto das crianças pequenas por esses desenhos, pode ser considerado um fenômeno saudável e natural do desenvolvimento infantil. Por isso as manifestações de afetividade das crianças não acaba quando terminam os programas de TV, mas continuam ao longo de muitos outros atos de produção de sentido. Por isso a influência social dos meios de comunicação vem aumentando de forma que há uma penetração e difusão. A televisão somou alguns atributos midiáticos, como o alcance geográfico do rádio, os potentes mecanismos visuais do cinema e se transformou numa "mágica domiciliar". Utilizando a manipulação da linguagem, a televisão possui a maior margem de reconstrução da realidade, levando o público a perceber os fatos da maneira que os grupos dominantes desejam, padronizando, assim, os comportamentos.
Dessa forma, pesquisas apontam que a televisão, em geral, e as telenovelas, principalmente, praticam uma série de influências sobre os telespectadores, claro que algumas "positivas" e outras "negativas". Nessas investigações é veiculada a idéia de que os meios de comunicação desempenham certas funções importantes na vida das pessoas. Comprovando-se, ainda, através da análise da programação, que, por falta de conteúdo e pela pragmática estratégica será conquistada audiência através de cenas de violência e de sexo explicito. Assim, a programação é algo desregrado, em que as imagens e situações deixaram de se relacionar diretamente com o que está sendo dito reflexo de sua indigência conceitual (PACHECO, 1985; FUSARI, 1985).
É necessário, diante desses argumentos, conhecer e compreender os mecanismos televisivos para poder utilizá-los na produção particular de subjetivação, de ensino e de aprendizagem de formas de sentir, agir, ser na sociedade em que vivemos. Pois é notória a intenção de grandes corporações capitalistas12, mesmo que de forma implícita na programação da TV aberta e, principalmente, no foco desse trabalho, o desenho animado. Portanto, é nesse percurso que se propõe para a escola atrelar o estudo às

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12 - Do latim corporis e actio, corpo e ação, é um grupo de pessoas que agem como se fossem um só corpo, uma só pessoa, buscando a consecução de objetivos em comum. Num sentido amplo, é um grupo de pessoas submetidas às mesmas regras ou estatutos. Capitalista é o individuo ou grupo acometidos pelo sistema social capitalista, que tem como principio básico acumular bens com cada vez mais voracidade (Wikipédia).

exibições de desenho animado. Educação e desenhos animados devem estabelecer ligações com as crianças a partir desse universo televisivo, no qual a criança tanto se apropria. Assim, acredita-se que a televisão poderá deixar de ser uma simples transmissão de mensagens diretas a seus telespectadores, para ser um mecanismo instrumental de questionamentos, esclarecimentos, conhecimentos, a partir de uma consciência crítica perante o que se vê e a que se ouve.

3 - O papel da TV aberta brasileira na indústria cultural

É necessário tratar a TV aberta no Brasil como um negócio, pois o que vale não é a contribuição cultural transformadora de espaços conservadores e sim o lucro. Isso será facilmente notado se observado que cinco empresas controlam redes nacionais da TV privada brasileira, com associados locais ou, como muitos falam, regionais. Quatro se apresentam como empresas familiares e uma é de propriedade de uma Igreja. Durante a trajetória da TV no Brasil, várias empresas faliram, foram vendidas ou simplesmente pararam de funcionar. A atual estrutural configuracional dessas empresas começou a se delinear na década de 1970, resultando na situação atual.
A Rede Globo está à frente, quando o assunto é audiência. Mais da metade da publicidade contratada, o maior número de pessoas empregada - cerca de 8.000 - e a mais, por enquanto, poderosa e sofisticada capacidade técnica instalada. Isso lhe permite estar presente em todas as regiões brasileiras e praticamente em todos 6.000 municípios do país. Esta empresa está associada a "diversificadas" outras espalhadas pelo país, que reproduzem os seus sinais. A partir da TV aberta, seus negócios se expandiram para várias direções, incluindo a TV por assinatura, a indústria fonográfica e até, em tese, a revolucionária internet, entre outras.
Esta Rede (Globo de Televisão) é considerada uma das maiores do país e a maior empresa privada da cidade do Rio de Janeiro. Os números, tão objetivos, na perspectiva desse tipo de meio de comunicação, comercial, produzem a famosa audiência que faz parte de um jogo que poucos sabem e poucos vão saber até o fim da vida, como se desenrola de perto. Boa parte deles é produzida pela mesma empresa, que hegemoniza o mercado publicitário televisivo, por meio de: telejornais, telenovelas, programas de auditório etc. Segundo alguns publicitários, anunciar na Rede Globo significa alcançar milhões de potenciais consumidores. Estes são, igualmente, compradores, influenciados pela publicidade e crentes nas ?verdades? televisivas que este tipo de espaço comunicacional oferece.
Vale lembrar que o sucesso dessa empresa só não é maior, por uma razão logo vista: a grande maioria dos que a assistem tem um poder de compra limitado e em processo de crise. Então, se os anunciantes vendem menos, consequentemente barganham para baixo os preços da publicidade. Diversas fontes indicam que, na última década, ocorreu a baixa geral das rendas dos assalariados do país. Nisso pode-se incluir as várias classes médias, o aumento do desemprego, o crescimento do emprego informal com rendas, na maioria das vezes, pequenas e irregulares e a concentração urbana de pobres e miseráveis. Entre as situações difíceis geradas por este quadro social, bem típico do sistema social capitalista, está o fato de se ver produtos anunciados na "tela mágica", sem que se possa consumi-los.
As outras redes, que fazem parte da TV aberta do Brasil, ficam em segundo plano, superando, eventualmente, a preponderância da rede hegemônica. Infelizmente elas quase sempre, ou sempre, funcionam a partir de um referencial - Rede Globo - no qual buscam de forma pequena, sob o ponto de partido transformador, espelhar-se e, ao mesmo tempo, fazer a "diferencia". Tal força nesta empresa que inclusive alardeia o seu parâmetro de qualidade é fomentada pelo conjunto das empresas capitalistas que ora concorrem com a líder de audiência ou buscam nichos que não lhe interessam, para venderem seus produtos televisivos e para multiplicarem a idéia de consumo. Nos casos em que a concorrência ameaça a líder, seus diretores buscam a cooptação, a pressão e outros mecanismos, para evitar a perda de sua supremacia.
Os grupos ou empresas deste segmento industrial e comercial ditam aos seus públicos as imagens e sons que devem entrar em suas residências. Para tornar isso possível, a TV aberta necessita de uma relação com seus telespectadores que oscile entre os extremos sociais brasileiros, no que se refere aos gostos e às preferências. Parte da programação das redes é universal, sendo construída para atender, em tese, e metaforicamente, a todos. A Globo é especializada, profissional e de certa forma já veterana em fazer este tipo de programa. Assim funcionam os seus telejornais, as telenovelas do chamado horário nobre e os programas de auditório. Tudo isso, de alguma forma, está ligado à programação infantil. Esse interesse comercial, o atendimento suspeito a esses objetivos consumistas não deixam dúvidas quanto a isso. E não só a Globo como "carro chefe", mas também as outras redes que formam a TV aberta comercial do Brasil vem reforçando a idéia de que o que interessa são números e não contribuição transformadora subversiva de espaços, ou seja, para essas redes televisivas, utilizar também a programação infantil é o que interessa. Mais precisamente o desenho animado como mecanismo de manutenção social reproduzindo as idéias dominantes. Nesse sentido, a visão capitalista das coisas se transforma numa gigante indústria cultural.


4 - O desenho animado vendendo idéias e formando valores

Pode-se observar que, em toda sociedade, onde existe classe social que é dona dos meios de produção, também essa mesma classe consegue ser possuidora do modo de produzir as idéias, o que se sente, o que se intui, em poucas palavras, o sentido que o mundo deve ter. (DORFMAN; MATTELART, 1980, p. 127). Por isso é interessante que haja uma tentativa de compreensão, por parte de quem intermedeia a exibição do desenho no âmbito educacional e os acometidos pela proposta da exibição, com uma pergunta: quais são estes meios capazes de produzir a vida e de apropriar-se do sentido do mundo?
Quando se pesquisar quais são os meios que levam os indivíduos a se modificarem, que influenciam nas suas maneiras de pensar e agir, chega-se à resposta de que um dos principais instrumentos dotados de todo esse poderio é a linguagem que é utilizada pelos meios de comunicação.
O incrível é que são palavras, modos gestuais e imagens que provavelmente levam os indivíduos a se modificarem, expressando os sentimentos mais profundos e pensamentos mais complexos que muitas vezes não são deles, ou melhor, a partir de algum momento começam a "ser deles". E isso vem e faz parte de um "plano maior" advindo de alguns grupos sociais, de formas complexas na maioria dos casos, que formam o que alguns estudiosos chamam de grandes corporações (capitalistas). Por isso, é importante ressaltar que, dificilmente, vai haver ação neutra, se é que a neutralidade existe, no campo audiovisual, neste caso, no campo do desenho animado. Todo esse sortilégio da linguagem está muito ligado com o seu próprio uso, mas também dos meios que são utilizados para transmiti-las.
Pode-se constatar que, durante a história da humanidade, ocorreram diversas transformações no comportamento do homem e, conseqüentemente, na forma de se expressar. Há tempos passados, essas mudanças eram motivadas, principalmente, pelas obras literárias. Na sociedade contemporânea, tais transformações continuam a acontecer. Agora, porém, surge a televisão como um dos principais instrumentos que vem influenciando o comportamento dos seres humanos, porque, além do fato dela ser facilmente encontrada em todas as classes da sociedade, o poder do discurso da programação televisiva é agressivo. No meio de tantas informações veiculadas pela televisão, muitas delas têm como prioridade a persuasão dos telespectadores. E nisso a linguagem tem uma função comunicativa, isto é, por meio das palavras as pessoas dialogam, argumentam, interagem, discutem, ensinam, aprendem etc.
Geralmente, quem toma a palavra não quer apenas comunicar algo. Quer persuadir o outro. Quer convencê-lo de que está certo ou de que suas razões são melhores (ou no mínimo boas) e interferir na ação do outro. Isso surge, inevitavelmente, com a pretensão de vender uma idéia, uma imagem, um estilo de vida. Para tanto, basta uma boa fórmula de "venda", que quase sempre se resume na utilização de uma argumentação convincente e de uma linguagem clara, competente e adequada ao interlocutor. Assim, uma palavra pode ser considerada "chave" quando ela excita o consumidor à compra, desperta sua curiosidade. Uma informação ou conhecimento pode ser transmitido de diferentes maneiras, ou melhor, será aquela que vender mais. A palavra torna-se, além de transmissora de idéias, uma mercadoria.

4.1 - O Desenho animado a serviço da ideologia capitalista

Numa sociedade onde o ter domina, em muitos aspectos, o ser será encontrado de tudo, partindo do ponto de vista degradador humano, ou seja, do "quem pagar mais leva". Neste espaço social encontram-se indivíduos capazes de se submeterem a qualquer negócio, isso para possuir um determinado bem. Nesta linha, não de pensamento, mas de ignorância e alienação, o indivíduo procura se transformar em dinheiro, como um legado popular que diz: "o dinheiro é a mola do mundo", acreditando, de maneira já dominado por uma estrutura, que ele, o individuo está acometido, será alguém melhor se somar dinheiro, acumular capital. Isso provavelmente é um plano dominante e articuladamente planejado. Para isso as elites, na contemporaneidade, farão de tudo para manter essa sociedade, que para eles seria a sociedade "ideal", a sociedade capitalista. Produzindo e transformando mecanismos que venham causar essa manutenção social. Aqui será posto uma das armas desses grupos dominantes, um desenho animado. Esse desenho é intitulado "Bob Esponja". Ele é um personagem criado por Stephen Hillenburg13. Vive no fundo do oceano pacífico, numa cidade chamada Fenda do Bikini. Ele veste calça Quadrada e é, aparentemente, inofensivo. Mora em um abacaxi com seu animal de estimação Gary (um caracol). Bob ama seu trabalho de cozinheiro na lanchonete do Sr. Sirigueijo, até aí nada demais. Patrick, Lula, Molusco e Sandy Bochecha são personagens encontrados dentro da lógica da animação. Até aí também nada demais. Porém esse desenho animado surge com uma reapresentação da forma de vida, do modo de produção capitalista, ou seja, reproduz, na sociedade contemporânea, o desejo da classe burguesa e tenta doutrinar tanto as crianças das classes dominantes, quanto as crianças das classes dominadas, mostrando a ideologia do sistema social capitalista.
Para divulgar ainda mais sua ideologia, a classe dominante utiliza-se de instrumentos como a TV. Isso acontece em muitos dos desenhos animados, mas nesse desenho animado (Bob Esponja), por exemplo, há o uso de animais e do fascínio natural que estes exercem sobre as crianças como maneira de influenciá-las e doutriná-las. Esses animais, na verdade, são seres humanos disfarçados para enganá-las, influenciá-las a aceitarem a ideologia14 capitalista, que os "fabricantes" do desenho injetam

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13 - Cartunista estadunidense, criador do desenho animado Bob Esponja Calça Quadrada (Wikipédia).
14 - conjunto de idéias, valores, hábitos e costumes que vem do passado, baseado na tradição e que norteia, geralmente, o comportamento das pessoas (notassocialistas.vilabol.uol.com.br/diversos.html )

valores do capitalismo e reproduzem um mundo onde funcionários trabalham de graça e, de alguma forma, até pagam para trabalhar.
A distinção de classes é apenas um dos fatores do capitalismo presente no desenho animado. Nele também é "venerada" a produção de riquezas e reproduzida a exploração dos trabalhadores e seu reflexo em ganho de mais valia15 para o patrão. O desenho também mostra como o trabalho é uma mercadoria adquirida, comprada pelo patrão e como este pode consumi-la da maneira que melhor lhe convier, fazendo com que seus empregados trabalhem até 24 horas por dia. A amizade é confundida com interesses materiais. Não há família e nem parentes. Todos no desenho são algo próximo de amigos e a relação básica estrutural é a de produção e troca de valores materiais. Uma relação capitalista com trabalho e salário; com o detalhe de que o trabalho, não importando em que condições, é sempre o máximo e o valor do salário nunca é mencionado, portanto é o mínimo.










































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15 - Marx chamou de mais-valia a diferença entre o valor adicionado pelos trabalhadores (incorporado às mercadorias produzidas) e o salário que recebem. A mais-valia definida desta maneira é em tudo semelhante ao trabalho gratuito que escravos ou servos entregavam a seus senhores. É uma forma disfarçada de transferência de um excedente para a classe dominante (psol.org.br).

4. 2 - O Desenho animado a serviço da ideologia comunista

Uma das maiores provas de que o desenho animado também serve como mecanismo de manutenção social, ou de tentativa de proposição para tal foi a existência durante a Guerra Fria16 do desenho Smurfs (criado por Peyo17), exibido durante muitos anos na TV aberta do Brasil. Eles eram seres simbolicamente postos na cor azul e viviam em casas em forma de cogumelo. Cotidianamente, eram atormentados pelo malvado Gargamel.
Esse desenho animado possui muitas mensagens subliminares ligadas ao comunismo18 como um modo de vida, uma ordem social, um ponto de vista econômico. As "foices e martelos"19 surgiam através de outras ações dos personagens. Os Smurfs compartilhavam tudo. Eles plantavam e na época de safra colhiam, guardavam em armazéns toda a produção da aldeia, em uma espécie de galpão, e distribuíam igualmente entre todos ao longo do ano. Não se tem informação de que em algum episódio tenha existido algum fazendeiro Smurf vendendo sua colheita a um outro Smurf. Era compreendido que a colheita era para toda a população Smurf, não para a venda ou lucro de um único Smurf. O que surge nas imagens, nos símbolos do desenho é que cada um desempenhe um trabalho específico dentro da aldeia. Há o Smurf Pintor, o Smurf que tem como papel construir, etc. Cada Smurf tem seu trabalho e não permitido tentar outros campos. De fato, houve um episódio onde cada Smurf tenta fazer o trabalho de outro Smurf, e todos falham. Claro que esse episódio tenta mostrar



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16 ? Foi a designação atribuída ao conflito político-ideológico entre os Estados Unidos (EUA), defensores do capitalismo, e a União Soviética (URSS), defensora do socialismo, compreendendo o período entre o final da Segunda Guerra Mundial (1945) e a extinção da União Soviética (1991).É chamada "fria" porque não houve qualquer combate físico, embora o mundo todo temesse a vinda de um novo conflito mundial, por se tratar de duas superpotências com grande arsenal de armas nucleares (Wikipédia).
17 ? Criador dos Smurfs, o ilustrador belga Pierre Culliford (Wikipédia).
18 - É uma ideologia que prega a abolição da propriedade privada e o fim da luta de classes, além da construção de um regime político e econômico que possibilite o estabelecimento da igualdade e justiça social entre os homens (educacao.uol.com.br).
19 ? É um símbolo usado para representar o comunismo e os partidos políticos comunistas. O desenho apresenta uma foice sobreposta a um martelo, de forma que pareçam cruzados ou entrelaçados. As duas ferramentas simbolizam, respectivamente, o proletariado industrial e o campesinato ? as duas classes cuja aliança é considerada fundamental pelos marxistas-leninistas para o triunfo da revolução socialista (Wikipédia).

que o ideal é que cada Smurf "Desempenhe a atividade que lhe melhor cabe" ou em outra visão, a que a sociedade Smurf escolheu para ele. Existe um determinado personagem que sempre está construindo, outro que sempre está pintando. Todo o mundo aceitou o que eles são e não fazem perguntas. Então lá vem as extensões um pouco óbvias. Papai Smurf (uma espécie de líder) usa um boné vermelho. Cor muito ligada ao comunismo e adotada por partidos políticos de "oposição". Peyo, o criador do desenho, pensou em mostrar que o comunismo era o sistema mais justo de todos. Todos os Smurfs são da mesma cor e cantam a mesma canção em todos os lugares que eles forem. Isto pretende mostrar, muitas vezes de forma implícita, o quanto igualitária vive uma sociedade comunista. E, ainda mais, introduzir na cabeça das crianças que todos deviam viver em uma comunidade igual e justa. Qual a criança que, ao assistir os episódios desse desenho não, cantava a canção dos bichinhos azuis? O maior argumento de que os Smurfs eram os comunistas vem das ações do seu maior rival Gargamel. Há uma espécie de suspeita de que, na história desse desenho, o Gargamel representa os Estados Unidos, enquanto figura capitalista, porque a única coisa que Gargamel queria dos Smurfs era usá-los para o seu próprio lucro. Nas primeiras quatro ou cinco estações, o plano de mestre de Gargamel era pegar os Smurfs, fervê-los e transformá-los em ouro. Aí está uma das máximas do capitalismo: transformar as pessoas em dinheiro. Por alguma razão, nos mais recentes anos, quando a animação era de grande audiência, algumas fontes midiáticas, ligadas às produções animadas, começaram a dizer que ele queria comer as pobres criaturas azuis, mas a maior parte diz mesmo é que ele queria transformá-los em ouro. Outra alusão que pode ser feita do personagem Gargamel aos Estados Unidos é ele não se preocupar com os Smurfs ou com a cultura deles, prática comum nas políticas externas dos EUA (Estados Unidos da América). Tudo com o que ele se preocupava era adquirir ouro. Ele estava só interessado em como ficar rico e nada mais. Gargamel era um "capitalista". É como se o desejo dessa animação fosse mostrar, neste caso, que o último representante do "mau", Gargamel o "capitalista", seria a única ameaça a aterrorizar a calma e pequena comunidade comunista dos Smurfs.



4.3 ? "Bichinhos" em desenhos animados como instrumentos de manutenção social

Já foi visto antes que os personagens do desenho animado Bob Esponja, na verdade, são seres humanos que apenas se encontram camuflados de animais para, claro, mais facilmente, conseguirem transmitir às crianças toda a ideologia a que se propõe a animação. Isso se configura nos personagens de Disney, como colocam Dorfman e Mattelart (1980): "Os personagens são tipos humanos cotidianos, que se encontram em todas as classes, países e épocas." Assim os desenhos animados surgem como fábulas, que humanizam os animais para, de alguma forma, impor uma lição às crianças, dado o fascínio e admiração que estas possuem pelos inocentes animaizinhos. Os profissionais desta área (desenhistas e roteiristas) tentam, então, através dos animais, mostrar sua ótica de mundo, ou de quem está pagando, para os pequeninos.
Percebe-se, no cotidiano, que muitas são as festas infantis em que adultos usam fantasias de animais para motivar as crianças, como também são as crianças que, geralmente, mais procuram animais de estimação. Está óbvio, ou no mínimo claro, o fascínio que têm as crianças pelos animais, sejam eles de brinquedos, reais ou em filmes, revistas e desenhos animados. Assim, os desenhos animados têm outra função, além de simplesmente divertir, isto é, servir como ponte comercial. Poder-se-ia representar o mundo de Bob Esponja por homens, como muitos outros desenhos animados o fazem, mas assim ele não provocaria o mesmo efeito. Então, por que não usar os animais, "humanizando-os", e assim, usar o encanto que estes animais exercem, aliado à malícia dos homens para transmitir suas mensagens?

Os desenhos animados eram outrora expoentes da fantasia contra o racionalismo. Faziam justiça aos animais e às coisas eletrizadas pela sua técnica, pois, embora os mutilando, lhes conferiam uma segunda vida. Agora não fazem mais que confirmar a vitória da razão tecnológica sobre a verdade. (ADORNO 2002).

Não restam dúvidas de que os personagens são homens em corpos de animais, são aqueles tipos que encontramos no dia-a-dia, no cotidiano, consumindo, fazendo compras em supermercados, em parques de diversão, na escola; são crianças, jovens e adultos; homens e mulheres, com o dia-a-dia igual ao que se vê aqui fora, com uma diferença fundamental: é um mundo de fantasia, não existe de fato, mas feito com um objetivo: mostrar às crianças como o mundo deve ser.
Existem vários motivos para se acreditar que os animaizinhos que aparecem, não só no desenho Bob Esponja, mas em muitos outros, são homens disfarçados de animais. Pode-se buscar alguma explicação mais racional em Aristóteles (2004): "Somente o homem, entre todos os animais, possui o dom da palavra.". Esse "dom" de que fala Aristóteles que parece ser um processo complexo entre os homens, também pertence aos animais dos desenhos animados e das fábulas. Mas é exatamente por isso que Aristóteles chama de dom: aquilo que pode ser identificado neles, mais que simples e inocentes animais. Eles também são homens, que sentem e que falam, e pela palavra, exprimem seu pensamento, não exatamente o seu (assim como a maioria da população), mas nesse caso dos desenhistas e roteiristas que lhes dão a vida, e a palavra. Marx e Engels (2003) são outros a falarem da diferença entre homens e animais pela linguagem. Segundo eles, a linguagem é resultado "da necessidade dos intercâmbios com os outros homens", e é essa necessidade da relação entre os homens que possibilita a criação dos diversos tipos de mecanismos para se atingir objetivos. Entende-se que a palavra tem a finalidade, de alguma forma, de compreender o que é justo ou injusto. Através dela o homem expõe e impõe seu pensamento e faz-se entender. Como diz Aristóteles (2004), definir por meio dela, o que é "justo ou injusto".
Nesse sentido vale a pena colocar o que nos diz Aguiar (2004, p. 15), quando afirma que o conceito de justiça é variante de acordo com a classe dominante: "... Daí podemos afirmar que a justiça não é neutra, mas comprometida, não é mediana, mas de extremos. E uma vez que uma determinada classe assume o poder é necessário que uma idéia de justiça respalde o exercício do poder e mais especificamente legitime a dominação.". Nota-se que essa dominação é legitimada pela propaganda, pois a classe dominante tende a procurar a aceitação de suas idéias através da propaganda imposta à classe dominada. Por essa propaganda ideológica, a classe burguesa dominante consegue fazer com que suas idéias sejam legitimadas e aceitas pelo proletariado. Os desenhos animados, na maioria dos casos, são mais um meio de interlocução entre a classe dominante e a classe dominada, sendo assim, um meio de implantar na mente das crianças a ideologia da elite comandante, para que, desde cedo, aceitem todo o modo de vida capitalista, aceitem o estado atual das coisas com o mínimo de questionamento. As "idéias dominantes de uma época são sempre as idéias da classe dominante." (MARX; ENGELS, 2003). Entre as várias formas de comprovação dessas idéias, existe a utilização dos animaizinhos do desenho Bob Esponja, seres humanos em toda sua acepção. Esses animaizinhos comem, vestem, gastam dinheiro, vivem em casas, trabalham e têm quase todas as situações e relações típicas humanas, quase todas é verdade, porque a que importa é a que seja excluída a face ruim das relações capitalistas. No mundo de Bob Esponja não há mendigos, desempregados, descamisados, sem-terra, sem-teto, racismo explícito, analfabetos e apenas de longe se mencionam os salários, sem jamais fazer qualquer alusão ao seu valor.
O comportamento dos personagens de Bob Esponja, mesmo estando lá no fundo do mar, é muito parecido, para não dizer idêntico, ao comportamento dos seres humanos em terra firme. Os personagens comemoram os mesmos feriados capitalistas comemorados aqui em cima, como o dia dos namorados ou o natal; aniversários e festas particulares. O seu animal de estimação, chamado Gary, é um caracol que mia como um gato. Em Vídeo de treinamento do Siri Cascudo, Sirigueijo aparece com uma minhoca que, além de estar quase sempre com uma coleira, também late como se fosse um cachorro. Os animais do desenho vivem em uma cidade com regras específicas. Há a força repressiva do Estado, a polícia; carros, ruas, avenidas, semáforos e restaurantes; os animais trabalham, freqüentam escolas, vivem em sociedade. "O homem é um animal político, por natureza, que deve viver em sociedade." (ARISTÓTELES, 2004), E "Uma sociedade" como nos lembra Marx (2003) "não pode parar de consumir nem de produzir." Principalmente sendo ela uma sociedade capitalista, como a que é apresentada na proposta do desenho de reprodução do meio social. Além de todos esses fatos, no lugar em que vivem Bob Esponja e seus amigos, é comum bolos de aniversário com velas acesas, mesmo estando eles submersos no fundo do mar. Por tudo isso, é factível definir que os personagens desse desenho têm corpos e articulações de animais, mas mente e comportamento de seres humanos. E, como têm mente e comportamento de homens, podem transmitir aos espectadores, idéias de homens. No entanto, por incrível que pareça, ainda há mais nisso tudo: as relações dos personagens se confundem, pois o melhor amigo de Bob Esponja é uma estrela do mar. Aliás, não há outra esponja no desenho, não há mesmo dois animais da mesma espécie. Há apenas uma esponja, uma estrela do mar, um polvo, uma baleia e até mesmo um esquilo vivendo no fundo do mar; e por mais absurdo que possa parecer, há um personagem chamado Sirigueijo, um siri, cuja filha é uma baleia. Em Bob Esponja, o filme (2004), é encontrado algumas passagens em que o personagem central e seu melhor amigo Patrick (uma estrela do mar) tentam convencer outros e a si mesmos que não são apenas "garotos", mas "homens", e a palavra homem é utilizada tanto na versão dublada em português, quanto no original em inglês, da seguinte forma: "Man". Isso permite acreditar que os próprios personagens, vez ou outra, definem a si mesmos como seres humanos. Porém, para que esse estado de coisas não fique muito evidente, eles também se definem como os animais que são para continuarem reforçando o encanto que os bichinhos transmitem para as crianças.
5 - Simbolismo e ideologia nos desenhos animados

Nesta parte do estudo pretende-se analisar o que, Elza Dias Pacheco, (no livro O Pica-Pau: herói ou vilão? Representação social da criança e reprodução da ideologia dominante), desenvolveu num trabalho aparentemente preocupado com a reprodução da ideologia dominante através de mitos encontrados nos desenhos (PACHECO, 1985). Esta autora apresentou, como problemática de seu, estudo uma questão que estrutura preocupações das pesquisas de comunicação, enfatizando que um dos: problemas que demanda o interesse dos especialistas nas ciências do comportamento é a possível relação do conteúdo veiculado pelos meios de comunicação de massa com os comportamentos, atitudes, experiências e valores das crianças e adolescentes expostos a tais meios". Na contemporaneidade, não é interessante ignorar as ações dos meios de comunicação de massa, pois são novas tecnologias de comunicação e apresentam uma necessidade de estudo sobre eles, criticamente, com o objetivo de buscar, um aproveitamento distinto do que vem tendo até então. Como lembrou Pacheco (1985), "a comunicação de massa será um bem ou mal conforme quem a use, como a use e para que a use" O problema apresentado está na localização da forma como a comunicação de massa apresenta seus conteúdos, ou seja, seus objetivos.
Ainda dentro do espaço comunicacional, considerando-se a importância das situações lúdicas e da comunicação no processo social e educativo, os desenhos animados são, na maioria esmagadora dos casos, colocados como entretenimento, como passatempo, diversão infantil. Mas vale lembrar que esse divertimento não é seco, vazio de conteúdos simbólicos. O objeto lúdico, nos produtos culturais, é sempre cercado e envolvido por outros conteúdos: político, cultural, social, religioso, econômico. Sobre esta situação informa Vasconcelos (1986), "do ponto de vista sociológico, pode-se afirmar que a ação de brincar, como o comportamento que é, permite a percepção social e sua estrutura, levando o indivíduo a perceber noções tais como: estratificação social, papéis sociais, poder/autoridade, enfim, as normas sociais". Também, em relação ao brincar com produtos da indústria cultural, outra face se explicita: a ideológica. O desenho animado é mais um produto da indústria cultural e a cultura de massas mistura as ideologias, as superestruturas. Ela induz ao consumo classes que não possuem meios econômicos para consumir produtos de que, muito freqüentemente, elas consomem só as imagens (ADORNO 2002). Porém, do ponto de vista do criador adulto do desenho, é grande a chance de produção que o desenho animado permite. Neste caso seu limite é a criatividade e intenção do desenhista e do roteirista. Esses profissionais constroem, e é essa construção que acompanha o espectador infantil durante vários anos. Isso perpassa também para o produto da cultura de massa, visto que o desenho reflete a sociedade (a sociedade de quem o produz) e reflete sua construção na sociedade por intermédio das crianças. Desse jeito, o desenho animado pode de forma eficaz refletir e reproduzir ideologias, voltadas para a violência, as relações de poder e transmitir valores.


5.1 - O imaginário infantil e o desenho animado

No exercício de reflexão de imagens, signos, mitos, ritos e símbolos, a programação de TV, mais precisamente o desenho animado, vem apresentando uma faceta cada vez mais presente: o expressado por meio da violência. Isso se torna claro, a começar, pela presença fatal de alguns personagens, ou seja, da "morte" nas produções mais recentes. Enquanto nos desenhos mais antigos a morte era um tabu, pelo menos na maioria dos casos ? portanto, sempre reversível ?, em várias produções mais recentes a morte é dramatizada e ocorre como conseqüência de violência física.
Então, se a morte é o fim, a violência, por vezes, a torna até generosa. A crueldade e o sadismo são as atitudes realmente violentas. O destaque no elemento trágico, violento, é uma característica muito presente em determinados desenhos, como US Manga e X-Men. O áudio ou a música da vinheta de entrada de US Manga, uma versão do original, expõe e imprime a temática que aqui se analisa: "Sonho ou Realidade ? US Manga / É uma imagem irreal/ que pode até matar / é uma entidade do além que quer robotizar, doutrinar (algo a meu ver bem parecido, medidas as proporções com as religiões) / E só a força da ciência pode salvar / US Manga". A canção em ritmo pop, fácil de memorizar, mescla violência e ciência em um contexto de ficção, retomando o ideário que coloca a ciência como redentora. A partir, daí pode-se expressar a preocupação que Pacheco (1985) colocou sobre a possível influência dos desenhos animados na formação das crianças. Segundo a autora, o passo acelerado da maioria dos programas de televisão pode ter influência negativa sobre os hábitos de aprendizagem e expectativas das crianças. Desenhos animados, programas de ação e de detetives e até mesmo acelerados programas de caráter mais educativo, como o antigo Vila Sésamo20, abastecem os curtos instantes de atenção das crianças. Ainda sobre essa situação Pacheco (1985) diz que crianças que regularmente assistem a esses programas podem ter dificuldades para aprender com a relativa calma e o suave desenvolvimento da maioria das escolas públicas, nas quais é requerido que se concentrem por períodos de tempo comparativamente longos. É importante, também, ressaltar um outro aspecto ? que não é uma das principais linhas de preocupação desta parte do estudo, mas que não


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20 - Série de televisão, uma versão brasileira baseada no programa infantil norte-americano Sesame Street criado pela Children?s Television Workshop de Nova York, baseado em opiniões e conceitos emitidos por técnicos de educação e agência de publicidade (Wikipédia).


pode ser ignorado ?, o marketing. Na era da informação, além do fortalecimento das estruturas comunicacionais e da concentração de seu comando em poucas mãos, observa-se a universalização da prática do marketing Pacheco (1985) escreveu, na década de 80, que o marketing de brinquedos e outros produtos associados com os temas e características de programas populares de televisão é um novo fenômeno. Objetos como: relógios e bonés de Mickey Mouse, orgulhosamente portados por crianças de gerações passadas, são agora substituídos por bonecos de He-Man e de robôs Transformers. Mas o princípio continua o mesmo: produtos associados com os programas televisivos favoritos de crianças quase sempre geram boas vendas.
O que Pacheco (1985) colocava, leva a pensar que, em algumas situações, não é possível perceber o que vem antes: o programa ou o produto, vendido em lojas (bonecos, bonés, lençóis) Mostra que, por trás desse destaque comercial, surge uma outra característica: grande parte dos programas da TV aberta comercial treina, essencialmente, as crianças para assistir, mais do que pensar ou fazer. É claro, a maioria dos programas televisivos é tão rapidamente transmitida que não proporciona tempo suficiente para assimilar a informação, considerar a mensagem ou usar a imaginação. Isso suscita diversos questionamentos acerca da comunicação, da educação e da cultura, como o desenvolvimento e a produção do imaginário, por meio da programação.
Voltando para o público infantil, no crítico e político livro: Para ler o Pato Donald: comunicação de massa e colonialismo, Armand Mattelart e Ariel Dorfman (1980) trabalham em uma espécie de pesquisa e interpretação que pode ser feita a partir das aparentemente inocentes historinhas produzidas para crianças. O que os autores tentam mostrar é que, por intermédio desse produto cultural, pode-se enviar mensagens ideológicas que estimulam a dependência cultural e reproduzem e reforçam valores típicos da economia capitalista.
Segundo Dorfman Mattelart (1980), os autores, as imagens transmitidas são estereotipadas e isolam os leitores de outros, que sofrem o mesmo tipo de exploração: "estamos separados pela representação que fazemos dos demais e que é a nossa própria imagem refletida no espelho". No olhar, deles o imaginário infantil é a utopia política de uma classe. Nas histórias em quadrinhos de Disney, jamais se poderá encontrar um trabalhador ou um proletário; jamais alguém produz industrialmente algo. Mas isto não significa que esteja ausente a classe proletária. Ao contrário:

Está presente sob as máscaras, como selvagem-bonzinho e como lumpen-criminoso. Ambos os personagens destroem o proletariado como classe, mas resgatam dessa classe certos mitos que a burguesia tem construído desde o princípio de sua aparição e até seu acesso ao poder, para ocultar e domesticar seu inimigo, para evitar sua solidariedade e fazê-lo funcionar fluidamente dentro do sistema, participando de sua própria escravidão ideológica (DORFMAN, MATTELART, 1980).


Adiante, os estudiosos sintetizam suas idéias, escrevendo que, nas histórias infantis, estão implícitos toda imagem e conceito da cultura de massa contemporânea, isto é, o tipo de sociedade "ideal". O entretenimento, nesse sentido, promove a liberação de angústias e de muitas contradições sociais:

A diversão, tal como a entende a cultura de massa, trata de conciliar o trabalho com o ócio, o cotidiano com o imaginário, o social com o extra-social, o corpo com a alma, a produção com o consumo, a cidade com o campo, esquecendo as contradições que subsistem dentro dos primeiros termos. Cada um desses antagonismos, pontos nevrálgicos da sociedade burguesa, fica absorvido no mundo do entretenimento sempre que passa antes pela purificação da fantasia (DORFMAN, MATTELART, 1980)


6 ? Procedimentos metodológicos e uma breve análise sobre a prática docente e o desenho animado no espaço escolar

O homem, na sua trajetória, traz consigo transformações que o acompanham durante séculos. A globalização21 e o avanço do neoliberalismo22 são transformações marcantes do século XXI que interferem no comportamento das pessoas e nisso está incluída, claro, a escola. Com o avanço das novas tecnologias, será encontrado o desenvolvimento de novas formas de comunicação embutidas no cotidiano de cada individuo. A TV, por exemplo, possui uma posição diferenciada no meio familiar, se comparada a décadas atrás. Talvez essas transformações, de certa forma, radicais tenham surgido com a comunicação por satélite, e principalmente por internet, modificando o homem e o conceito sobre tempo e espaço. Atualmente é possível saber o que ocorre do outro lado do mundo em tempo real. A distância entre os países fica cada vez menor e a informação está à disposição de todos (claro que ainda com certa limitação por questões ideológicas dominantes), a ponto de se ter acervos de bibliotecas, de artes, revistas, jornais, na forma de um click. A facilidade de se obter informação é inegável, mas como o sujeito lida com inúmeras mensagens que somam valores e que interferem no modo dele perceber o mundo? Como o poder da mídia influencia na subjetivação do sujeito no contexto contemporâneo da sociedade da informação e do conhecimento? Aliás, informação23 e conhecimento24 são palavras interligadas, mas diferentes em seus conceitos. O que se tem, atualmente, é a facilidade da obtenção informacional que pode ou não gerar o conhecimento. E este sempre esteve entre os papeis da escola. Mas como se pode querer gerar conhecimento considerando o professor, apenas um transmissor de informações, como antigamente? O mundo mudou

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21 - Globalização ou mundialização é a interdependência de todos os povos e países do nosso planeta, também denominado "aldeia global". As notícias do mundo são divulgadas pelos jornais, radio, TV, internet e outros meios de comunicação (sociedadedigital.com.br).
22 - Em sentido amplo, é a retomada dos valores e ideais do liberalismo político e econômico que nasceu do pensamento iluminista e dos avanços da economia decorrentes da revolução industrial do final do século XVIII, com a adequação necessária à realidade política, social e econômica de cada nação em que se manifesta. Em sentido mais estrito designa, nas democracias capitalistas contemporâneas, as posições pragmáticas e ideologicamente pouco definidas dos defensores da política do "estado mínimo", que deve interferir o menos possível na liberdade individual e nas atividades econômicas da iniciativa privada e, ao mesmo tempo, manter, ampliar e tornar mais racional e eficiente o estado de bem-estar social (www.coladaweb.com/hisgeral/neoliberalismo.htm).
23 - Significa fatos: é o tipo de coisa presente em livros, que pode ser expressa em palavras ou imagens. A informação pode, portanto vir em várias formas: verbal, visual, por ondas etc. (www.ime.usp.br).
24 - Apropriação intelectual de determinado campo empírico ou ideal de dados, tendo em vista dominá-los e utilizá-los (aprender.unb.br).

já que está totalmente ligado às novas tecnologias, novas formas de comunicação que se utilizam ao mesmo tempo de sons, imagens e movimentos. Então como a escola está lidando e utilizando essas novas linguagens no meio educacional, para promover o conhecimento? Afinal, qual é o posicionamento da escola diante deste novo contexto social, econômico e tecnológico? A realidade é que, na maioria esmagadora dos casos, a escola não acompanhou os passos da sociedade e ainda insiste em trabalhar com um sistema educacional calcado nas práticas de séculos passados. O resultado que temos é o discurso da maioria dos professores sobre a falta de interesse e indisciplina por parte dos educandos. Isso deixa claro que uma mudança precisa ocorrer, é necessário construir uma nova visão da educação calcada no contexto da sociedade atual. O conhecimento deve ser construído sobre a base do aprender a pensar, do aprender a aprender e do aprender a fazer, se for possível de quebra que isso se desenrole de forma subversiva procurando sempre a transformação do espaço ocupado, ou seja, a formação de eternos rebelados sociais, como pretende Trotisk25. Para isso é necessário que exista uma ressignificação dos espaços de aprendizagem, seja formal ou não esse espaço, de tal forma que eles se voltem para a formação de sujeitos ativos, reflexivos, atuantes e participantes. Com esse objetivo o tema da aula não basta ser "do gosto" dos alunos. É preciso que desperte a curiosidade por novos conhecimentos. Neste raciocínio, é necessário pensar em algo que una o gosto, a curiosidade e o conhecimento. E porque não através do cinema de animação (desenho animado)?
Em meio a isso procurou-se neste estudo analisar algumas dessas possibilidades na educação por meio de cinco educadoras que exercem atividades em um dos espaços formais da educação de diferentes cidades, a escola. Essas educadoras procuram incluir em seus planos de aula: projetos nas suas escolas ou outras atividades cotidianas no espaço escolar, a exibição de filmes, documentários e, claro, desenhos animados. Isso é desenrolado no Ensino Fundamental dos respectivos espaços formais de educação: Escola Municipal Maria das Graças Rezende (Cabedelo / PB), Escola Estadual Edgar Guedes da Silva (Pedras de Fogo / PE), Escola Municipal Apolônio Sales de Miranda (João Pessoa / PB), Escola Municipal de Ensino Fundamental Cícero Leite (João Pessoa / PB) e Escola Municipal de Ensino Fundamental Zumbi dos Palmares (João Pessoa / PB). Essa última escola, a Zumbi dos Palmares, foi onde estive presente colhendo
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25 ? O Russo Lev Davidovich Bronstein, que mais tarde assumiria o nome de guerra de Leon Trotsky, foi preso pela primeira vez aos 18 anos, por seu envolvimento com grupos revolucionários. Passou dois anos em diversas cadeias czaristas (Wikipédia).

alguns dados e conversando com alunos sobre desenhos. A ZP, como é conhecida pelos estudantes, possui um razoável espaço físico, com sete salas de aula, uma biblioteca com vídeo, secretaria entre outros espaços, incluindo pátio coberto e espaço em terra para atividades recreativas. Entre seus profissionais estão: psicóloga, assistente social, supervisora escolar, diretoras adjuntas e uma geral, além de um quadro de professores que, pelo menos em números, atende à demanda da escola. Sobre as outras quatro escolas colhemos dados através de seus educadores com respostas advindas de questionários (anexo), não indo até essas unidades de ensino.
Neste trabalho buscam-se, como alvo, as práticas docentes no espaço formal educacional. Existe em meio a isso a tentativa de analisar o educador. Será que ele está dando continuidade ao discurso dominante através da exibição dos desenhos na escola? Essa tentativa de identificar algumas situações envolvendo a prática docente no espaço escolar, a exibição dos desenhos animados e a reação no espaço escolar do educando foi desenvolvida com o preenchimento de questionários com cinco pontos diferentes sobre a utilização do vídeo como auxiliar pedagógico, mas ligadas umas as outras. Todas as educadoras que participaram do estudo e observação das práticas docentes utilizam desenhos animados ou outro tipo de áudio visual direcionado ao público infantil nos seus planejamentos pedagógicos. Tais educadoras desempenham atribuições nas escolas denominadas por elas mesmas de: Educadora polivalente, Professora, Monitora de Informática e professora de Português em dois casos.
É importante a descrição das funções dessas profissionais para se identificar que tipo de perspectiva, pelo menos de forma superficial, está presente na prática docente. Pois a sociedade e o mundo estão em movimento e o aluno, mais do que nunca, possui seu cotidiano preenchido de imagens em movimento, que por vezes substituem relações familiares e outras. O desenho animado já é objeto e um tema próximo do aluno, basta, agora construir trabalhos em torno dos desenhos que isso, provavelmente, vai desenvolver conhecimentos que surgirão em conseqüência desta arte. Desde a aparente admiração direcionada, até a produção de pequenos filmes.
É muito provável que, para o sujeito se tornar um apreciador e fruidor da beleza do mundo que o cerca, seja preciso dotá-lo da linguagem fundamental à compreensão e desvelamento do universo da arte. Para isso é necessário desenvolver no indivíduo a sensibilidade para ver e para apreciar. O Brasil possui muitos exemplos de estudos que já descobriram formas de como desenvolver trabalhos na educação com o cinema de animação, isto é, tanto no sentido da apreciação crítica, quanto na produção de animações. Basta, agora, retirar o que estas experiências trouxeram de positivo para o educando no âmbito educacional e cotidiano e adequá-las às realidades de cada contexto, para que o possível trabalho docente através do desenho animado esteja sendo aplicado.
Partindo dessas factíveis experiências que trabalham com a educação do olhar, voltado para a formação de um espectador consciente acerca de tudo que o educando tem contato, principalmente os filmes de animação e a linguagem cinematográfica, é possível utilizar os desenhos animados como ponte de construção de conhecimento. Se o objetivo é que isso ocorra de forma eficaz, será necessária a presença de uma boa formação do profissional educador no momento destas atividades. Visto que outras técnicas de animação, como recorte, sombra chinesa, massinha de modelar, argila, areia e confecção de aparelhos primitivos de animação; como o traumatrópio26 e o zootroscópio27, surgirão como instrumentos educacionais, sejam no espaço formal ou no informal. E se os educadores não possuírem habilidades para tal, essas atividades surgirão no âmbito educacional como apenas passatempo.
A questão dos desenhos animados pode ser considerada como uma forma de expressão artística, onde o educando pode expressar seus sentimentos e reafirmar sua identidade. E, neste espaço, entre desenho, educador (a), educando e escola, é importante a valorização do próprio traço e a construção de um argumento significativo para que o educando possa expressar libertação. Algo que a ideologia dominante não vem permitindo por meio das produções "animadas". Visto que utiliza os desenhos animados como instrumentos de manutenção social. Aí entra o (a) educador (a) com alguns papéis, entre eles: desenvolver habilidades pessoais no educando, para tentar reforçar um momento de reflexão sobre a exibição dos desenhos animados na escola, forçando uma reflexão sobre determinados comportamentos sociais que, aparentemente, são naturais, mas que no fundo fazem parte de um plano maior dominante. A exibição de desenho animado na escola pode unir a valorização da criticidade individual e a força






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26 - É um brinquedo do séc. XVIII que preconizou todo pensamento de movimento e imagem dando ponta pé no que se transformaria em cinema e animação. A proposta é fazer o TRAUMATROPÓPIO, contendo cenas que podem remeter a situações que podem ser encaradas ou não como traumáticas (alinecastella.multiply.com).
27 - É uma caixa cilíndrica apoiada num eixo e com orifícios retangulares com uma tira de desenhos colocada internamente (www.mikosz.com.br)

do trabalho com questionamento grupal. Com o objetivo de socializar tudo isso e com tema de cunho educativo visando à formação do cidadão inquieto, insatisfeito, crítico, rebelado. De alguma forma, todos os objetivos acabam culminando em ações para frisar a importância do elo entre cinema e educação, e suas conseqüências para a formação do educando reflexivo, apreciador, produtor e crítico.
Neste estudo procurou-se analisar as práticas docentes no espaço formal, a escola, no que diz respeito à exibição de desenhos animados e à identificação de algumas situações comportamentais dos educandos a partir da exibição dos desenhos animados. Com isso outras situações ligadas à exibição e prática docente surgem, como por exemplo, a imposição cultural dos ditos países desenvolvidos sobre os ditos em desenvolvimento, no momento em que se detecta a nacionalidade da produção do desenho, algo que gera muitas razões para estudo, entre elas: os costumes e as imagens que a produção procura "pregar" às crianças. Outra informação identificada na pesquisa é se as educadoras incluem a exibição de desenho animado em seus planejamentos didáticos. As temáticas que geralmente são utilizadas por essas educadoras também fazem parte do campo de estudo deste trabalho. Em meio a isso, está interligado outro fator importante para tentar se entender quais prováveis tipos de intenções estão sendo postas "na mesa", nesse caso, por parte da educadora ou estrutura que ela faz parte. Isso acontece, a priori, no instante em que se procura identificar a existência de uma seqüência didática utilizada pelas educadoras pesquisadas na proposição de exibição do desenho animado. Esse trabalho segue com o registro de algumas observações feitas pelas educadoras no momento do preenchimento do questionário, na conversa que tive com algumas crianças na Escola Zumbi dos Palmares no antes e depois das exibições de desenhos propostos pelas educadoras. Além disso, as atribuições de cada educadora também vão fazer parte desse esquema de informações.
Quanto às questões que envolvem parte do estudo localizado no questionário aplicado entre as educadoras, será encontrado na sua parte inicial um ponto interessante que diz respeito à inclusão ou não da exibição de desenho animado no planejamento didático. Nos números dessa pesquisa obteve-se um percentual de 100% das entrevistadas apontando a exibição do desenho animado como parte planejadora em suas atividades didáticas. Já sobre as temáticas, são variadas as propostas entre as educadoras. Pontos como: religião, mesmo o Estado brasileiro sendo Laico28 e os
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28 ? Estado laico significa uma atitude crítica e separadora da interferência da religião organizada na vida pública das sociedades contemporâneas (Amigosdolivro.com.br).

espaços pesquisados sendo públicos; interpretação de texto; lingüística; relações entre as pessoas na sociedade; ciências; meio ambiente; diversidade racial ou simplesmente tentar fazer a ligação entre o conteúdo proposto e o desenho animado ou outro tipo de áudio visual29 produzido para o público infanto-juvenil. Vendo isso, vale lembrar que Zabala30 (2004) aponta a formação do educador como tendo início nos seus primeiros dias no âmbito educacional ainda quando criança. Nisso estão incluídas suas atividades no espaço educacional, resultantes das ações passadas tanto por meio da família, quanto da escola. Daí começa-se a entender, pelo menos de forma superficial, as sugestões propostas pelas educadoras e por meio de uma das respostas, vinda da Escola Municipal Maria das Dores Rezende (Cabedelo / PB): "As temáticas variam desde questões ambientais tais como: poluição, mudanças climáticas, sobre as relações humanas e a diversidade racial".
E o comportamento dos educandos como foi observado? Pelas educadoras alguns tipos foram detectados durante o início, meio e fim das exibições, como: comentários em grupos e de forma individual; perguntas sobre o que muitas vezes a educadora nem apontava como os principais pontos do desenho, imitação de falas e gestos que marcaram determinado personagem; perplexidade diante das imagens, muitos risos, suspense, estímulo e aparente prazer em desenvolver atividades ligadas às exibições. Isso se deu no momento da exibição de desenhos animados e outros tipos de produção áudio visual. Alguns poucos tipos de comportamentos detectados nos educados na proposta de exibição de desenhos animados como auxílio pedagógico, reforçam a idéia do quanto esse tipo de arte pode envolver a criança naquilo que for proposto, por exemplo, de cunho ideológico.
Nessa sociedade de consumo avançada que se vive, o ato de consumir não envolve necessariamente uma troca econômica. Consome-se com os olhos, absorvendo


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29 ? É uma linguagem caracterizada pela mistura do som, da palavra e da imagem por meio de recursos eletrônicos (www.senhorbomjesus.org.br)
30 ? Espanhol formado em filosofia e ciências da educação pela Universidade de Barcelona, na Espanha, Antoni Zabala Responsável pela maior mudança da história da educação espanhola pós-ditadura Franco, prestou consultoria a inúmeras escolas e ministérios da educação em países da América Latina, inclusive no Brasil. Atualmente preside o Instituto de Recursos e Investigação para a Formação (Irif ), especializado no aperfeiçoamento de professores. (www.terra.com.br)

produtos com o olhar cada vez que se empurra um carrinho pelos corredores de um supermercado, assistindo à televisão ou dirigindo ao longo de uma estrada pontuada por propagandas ou emblemas comerciais. Esse consumo visual é de tal forma parte do panorama cotidiano que não é dado conta dos significados, das simbologias que eles carregam consigo (WILLIS 1997).
Mesmo com o esforço das educadoras nessas atividades envolvendo a exibição dos desenhos, é visível a inevitabilidade dos ícones de consumo, que se infiltram massivamente nos mais prosaicos produtos cotidianos. São poucos, dentro do âmbito da educação, os debates que aprofundam a questão do predomínio das grandes corporações na formação da visualidade das últimas gerações. De duas décadas para cá, a tendência de alguns educadores engajados nas discussões de sua área de conhecimento era fazer a crítica a tudo que viesse pronto, inclusive o desenho animado, mas ignorar radicalmente o poder de figuras como as da Disney; era trabalhar em sala de aula com propostas alheias a este imaginário que, quando surgia, era explicitamente ou sutilmente condenado. Manter, em tese, a distância aparente entre os diversificados meios em que a informação visual circula e o espaço escolar, é uma tentativa quase sempre ineficaz, falha, pois a escola, muitas vezes, procura conservar a integridade dos conteúdos disciplinares tradicionais sem adequá-los ao conhecimento corriqueiro, produzido, massivamente, pelos veículos midiáticos.
Frente a um grande número de ofertas visuais e espetaculares na sociedade, a escola encontra-se em grande desvantagem, pois os chamados mecanismos auxiliares de ensino audiovisual, a comunicação corporal do professor, sua retórica, geralmente não convencem. O espaço da escola é um mundo cinza, estagnado e passivo. As imagens na escola são distribuídas e manipuladas como se fossem neutras e inofensivas, além de, na maioria das vezes, serem mal aproveitadas em termos de possibilidade educativa. Não se habilita o professor para melhores resultados sobre desempenhos comunicacionais, expressivos ao nível do desafio do ensino e das crianças da contemporaneidade, não se prepara o professor, sobretudo, para uma situação dialogal com o mundo, através de um universo imaginário. (MEIRA 1999). Essa situação que a escola vem passando pode ser reforçado na resposta de uma educadora que participou desse estudo31, quando indagada


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31 ? Pesquisa para o Trabalho de Conclusão de Curso do Graduando Bruno Hercílio Rezende da Silva no Curso de Pedagogia da UFPB.

sobre as reações das crianças no momento das exibições dos desenhos animados na sala de aula: "a concentração e perplexidade diante das imagens, além de comentários, risos, espanto, suspense etc.". Vale lembrar que a escola não deve ser sempre um espaço estagnado e passivo, ela deve, através da promoção de outras habilidades para seus profissionais, promover uma reflexão sobre a sociedade que a mesma está inserida, buscando isso de forma estrutural: analisando o seu sistema social e seus interesses.
Em meio a isso, surge, ainda neste estudo, a seqüência didática. Nele as educadoras mostraram na pesquisa que alguns tipos de situações, pré-exibição, do desenho animado fazem parte de uma seqüência didática, tais como: explicar e resumir a produção a ser exibida, chamar a atenção durante a exibição de pontos importantes na ótica da educadora, promover produção de texto e resumo oral sobre o tema e a exibição propostos, solicitar dos educandos pesquisa sobre a proposta temática que insere a exibição do desenho animado, estimular o interesse através do desenho pintado pelo educando e, dependendo do ano da turma, provocar debate num momento posterior à exibição. Que, diga-se de passagem, envolve diversas outras situações que uma delas foi descrita na observação da análise docente através da exibição do desenho animado no espaço escolar, como: "é uma atividade que se trabalhada da maneira devida certamente alcançará bons resultados". (educadora da Escola Municipal Comendador Cícero Leite). Essa fala da educadora retrata de fato um ponto que os desenhos animados conseguem, através de um mundo aparentemente inocente cheio de "animaizinhos", servir como mecanismo de manutenção social em longo prazo, ou seja, é como se o desenho animado funcionasse como uma espécie de mudinha, plantada hoje para se colher amanhã. Aí não importa a ideologia proposta, um resultado eficaz tem grandes possibilidades de surgir, porque, mesmo de forma subliminar, o desenho com seus atrativos naturais ao público infantil possui mecanismos insuperáveis, se comparados com as práticas tradicionais da escola.



7 - Considerações finais

Fazendo uma análise da linha do tempo da TV aberta do Brasil, como foi criada e como se desenvolveu, não é muito difícil de imaginar a que interesses ela atendeu, e continua atendendo. Estamos falando de um dos mais importantes, senão o mais, meio técnico de comunicação em atividade no Brasil. Isto deve estar se repetindo, possivelmente, por todas as partes do planeta. A TV possui espaço destacado na contemporaneidade. Mas, dificilmente existe um outro caso de um país continental, onde este meio exerça tão gigantesca influência no conjunto da vida das pessoas e das entidades que as organizam. Em um país onde predomina o baixo nível de letramento e o alto grau de analfabetismo funcional, de certa forma compensado por uma agressiva oralidade. Neste caso, tudo se propõe e se resolve e isso é histórico.
Está clara a necessidade do tratamento da TV aberta no Brasil como um negócio, pois o que vale não é a contribuição cultural transformadora de espaços conservadores, que surgem na maioria dos casos em detrimento da diversidade, e sim o lucro. Algo facilmente identificado, se observado que cinco empresas controlam redes nacionais da TV privada no país, com associados locais ou como muitos falam regionais. Quatro se apresentam como empresas familiares e uma é de propriedade de uma Igreja. Nisso surgem as ideologias tanto de quem oferece este serviço, neste caso o espaço para quem pagar mais e dizer qual seria a sociedade ideal, que é a TV, e aquilo que muitos preferem esconder, que é a luta de classes. Nesse confronto de classes, fica claro que em uma sociedade, onde estão presentes várias classes sociais, haverá a possibilidade de um controlador dos meios de produção desenvolver e perpetuar sobre as outras classes o modo de produzir as idéias, o que se deve sentir, como se deve viver, em poucas palavras, o sentido que o mundo deve ter (DORFMAN; MATTELART, 1980). Partindo daí, pôde-se observar um pouco das intenções dos desenhos animados e de suas ideologias, ou melhor, daqueles que o produziram.
Para tentar penetrar nas mentes das crianças com suas propostas, os produtores de animação, a serviço do capital, utilizam, sem dúvidas, os bichinhos como personagens. Eles, na verdade, são homens em corpos de animais, são aqueles tipos que são encontrados no cotidiano consumindo, comprando, em parques de diversão, na escola, igual ao que é visto no dia-a-dia, com uma diferença preponderante: é um mundo de fantasia feito com um objetivo: mostrar, nesse caso, às crianças, como o mundo deve ser feito.
Para isso existem cada vez mais produtoras externas aos canais de televisão, muito especializadas, com um perfil bastante fundamentado, que se dedicam às crianças, e também a programas jornalísticos ou a outros gêneros de programação, e que estão tendo muito êxito. São empresas que trabalham produzindo e com fortes ligações com a BBC32, por exemplo. Em meio a isso, estão os educadores, que trabalham com desenhos animados no âmbito escolar. Tais desenhos são exibidos também na TV aberta do Brasil.
Como resultado das informações adquiridas nas escolas - Escola Municipal Maria das Graças Rezende (Cabedelo / PB), Escola Estadual Edgar Guedes da Silva (Pedras de Fogo / PE), Escola Municipal Apolônio Sales de Miranda (João Pessoa / PB), Escola Municipal de Ensino Fundamental Cícero Leite (João Pessoa / PB) - vivenciadas na Escola Municipal de Ensino Fundamental Zumbi dos Palmares (João Pessoa / PB), podemos afirmar que todo cuidado é pouco, ao propor um trabalho desse no espaço escolar, pois esse tipo de atividade exige muita pesquisa antes da proposição. A escola deve favorecer a exibição de desenhos de forma crítica. Saber que tipo de perspectiva a animação possui, onde foi produzida e para quê, quais os seus objetivos etc. E, se o profissional da educação não possuir uma boa habilitação, uma formação progressista33, sensibilidade e compromisso, ele será só mais um, juntamente com seus alunos a somar a enorme, gigantesca massa que será manobrada da forma que o capital achar melhor.
Considerando-se tudo o que foi apresentado, sugere-se que as crianças, de uma forma geral, devam ficar menos tempo em frente à televisão e ter mais tempo e oportunidades para brincar e desenvolver outras atividades. Os pais ou responsáveis devem acompanhar mais de perto a formação das crianças, que tanto precisam das referências familiares para alcançarem um desenvolvimento psíquico34 dito satisfatório.


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32 ? BBC - Abreviatura de British Broadcasting Corporation, rede estatal de rádio e televisão britânica (www.foco.tv/HtmlGlo/gloVid.htm).
33 ? É uma doutrina (muitas vezes política) ou corrente filosófica de pensamento progressista relacionada ao positivismo. O progressismo pode ser relacionado ao adiantamento, desenvolvimento, aperfeiçoamento, evolução, superação e oposta ao conservadorismo anacrônico, rígido, autoritário, repressivo e, no caso da escola, punitivo e liberticida (Wikipédia).
34 - Aparelho psíquico designa os modelos concebidos por Freud para explicar a organização e o funcionamento da mente (Wikipédia).

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Anexos

Escola: ______________________________________________________________
Cidade: ______________________________________________________________
Bairro: _______________________________________________________________

Atribuição do educador na escola: _________________________________________

1 ? Você inclui a exibição do desenho animado em seu planejamento didático?

( ) Sim ( ) Não

Se sim: Desenhos Produzidos no Brasil ( )
Desenhos Produzidos fora do Brasil ( )
Em ambas as situações ( )
2 ? Que temáticas geralmente são utilizadas como propostas na exibição do desenho animado?
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_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________

3 ? Que tipo de comportamento é mais freqüente nas reações dos educandos após a exibição dos desenhos animados?
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_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________

4 ? Que tipo de seqüência didática é adotada pelo educador (a) para a exibição dos desenhos (no seu início, meio e fim)?
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5 ? Outras observações sobre essas atividades:
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Autor: Bruno Hercilio Rezende Da Silva


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