Direitos Reais Alheios - Da Superfície



DIREITOS REAIS SOBRE COISAS ALHEIAS: DA SUPERFÍCIE

INTRODUÇÃO
A pesquisa desenvolvida neste artigo tem por objeto o estudo doutrinário dos direitos reais sobre coisas alheias, cujas modalidades estão previstas no art. 674 e o disciplinamento legal nos seguintes, até o art. 862 do Código Civil.
A questão principal que se coloca no estudo das diversas espécies de direitos reais sobre coisas alheias é referente ao direito de superfície que será tratado ao decorrer do artigo.
O projeto do Código Civil de 2002, que se encontra vigente desde 11 de janeiro de 2003 em seus artigos 1369 a 1377, trata de um importante instituto denominado de "Direito de Superfície". Não se trata de um direito novo, pois é de nosso conhecimento que tal direito foi extinto do ordenamento jurídico brasileiro pela Lei nº 1257 de 29 de setembro de 1864, e não reinserido no Código Civil de 1916, embora houvesse a tentativa de reinseri-lo no anteprojeto de código civil de 1963. O retorno do Direito de Superfície em nossa legislação, na verdade ocorreu através da Lei Federal nº 10.257/2001 ? Estatuto da Cidade do Rio de Janeiro, em seus artigos 21 a 24, mas direcionados apenas a territoriedade urbana, não fazendo menção a zona rural.
O Instituto do Direito de Superfície ocupará uma importante posição no ordenamento jurídico brasileiro, pois concorrerá para a melhor utilização econômica e social dos imóveis urbanos e rurais
É de suma importância falarmos na função social da propriedade, pois com o Direito de Superfície o Poder Público terá mais um instrumento que o possibilite a consecução de seus fins em atender às necessidades públicas e promover o bem-estar social.
O assunto será abordado no que se refere ao seu conceito, aos requisitos, classificação e demais modalidades previstas em doutrinas e na legislação.

DESENVOLVIMENTO
I - CONCEITOS:
Direito das coisas: segundo a clássica definição de Clóvis Beviláqua, "é o complexo de normas reguladoras das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem. Tais coisas são, ordinariamente, do mundo físico, porque sobre elas é que é possível exercer o poder de domínio" (Direito das coisas, vol. I p. 11).
Afirma Silvio Rodrigues, que "só quando tais coisas são úteis e raras, isto é, quando passam a constituir bens, é que se tornam objeto de apropriação, estabelecendo-se entre elas e o homem um vínculo jurídico, que é o domínio".
Na opinião desse autor, a composição dos conflitos entre os homens em razão do domínio dos bens é o campo do Direito das Coisas, de maneira que o seu conceito pode ser ampliado, para dizer que "é o conjunto das normas que regulam as relações jurídicas entre os homens, em face às coisas corpóreas, capazes de satisfazer às suas necessidades e suscetíveis de apropriação" (Silvio Rodrigues, Direito civil, vol. 5, p. 3).

Direito Real de gozo: A propriedade em sua plenitude contém diversos componentes: usar, gozar, dispor e reaver a coisa sobre a qual incide; esses elementos que a integram podem ou não estar reunidos nas mãos do proprietário, porque o Direito os considera como suscetíveis de se constituírem em objeto próprio. Portanto, esse direito real outorga a seu titular o direito de usar e/ou frutificar um bem que não lhe pertence. É composto dos seguintes direitos: enfiteuse; servidão; superfície; usufruto; uso; habitação; promessa de compra e venda.



II ? CLASSIFICAÇÃO DE DIREITOS REAIS ALHEIOS DE GOZO

A) Enfiteuse ? É o direito real alheio que mais sacrifica a propriedade, tendo em vista que o proprietário perdia todos os elementos da propriedade. Esse direito era concebido na forma perpétua onde outorgava ao titular o direito de usar e gozar de forma ilimitada possuindo a disposição de forma restrita. Esse direito não é mais usado hoje em dia.

B) Servidão ? É o direito real firmado entre o proprietário de um imóvel com um terceiro que estabelece um serviço entre dois imóveis. O imóvel que suporta a servidão chama-se serviente. O outro, beneficiado, é dominante. Constituem restrições que um prédio suporta para uso e utilidade de outro prédio, pertencente a proprietário diferente. As servidões, como direitos reais, acompanham os prédios quando são alienados.


C) Usufruto - É o direito de desfrutar temporariamente de um bem alheio como se dele fosse proprietário, sem alterar-lhe a substância. Usufrutuário é aquele ao qual é conferido o usufruto. Nu-proprietário é aquele que confere o usufruto. Consiste na possibilidade de retirar da coisa as vantagens que ela oferece e produz, sendo um direito real que outorga ao seu titular o direito de usar e fruir propriedade alheia.

D) Uso ? O uso é considerado um usufruto restrito, segundo Carlos Roberto Gonçalves, "porque ostenta as mesmas características de direito real, temporário e resultante do desmembramento da propriedade, distinguindo-se, entretanto, pelo fato de o usufrutuário auferir o uso e a fruição da coisa, enquanto ao usuário não é concedida senão a utilização restrita aos limites das necessidades suas e de sua família" (Direito das coisas, vol. 5, p. 504). Portanto, em outras palavras, é o direito de servir-se da coisa na medida das necessidades próprias e da família, sem dela retirar as vantagens.


E) Habitação - É um uso limitado, porque referente apenas a um prédio de habitação. Consiste no direito de se servir da casa residencial com sua família. É a faculdade de residir ou abrigar-se em um determinado prédio. Tem por traço característico a gratuidade. Tem por característica própria: o uso da casa tem de ser limitado à moradia do titular e de sua família. Não pode este servir-se dela para o estabelecimento de um fundo de comércio, ou de sua indústria; não pode alugá-la, nem emprestá-la; ou serve-se dela para a sua própria residência e de sua família ou desaparece o direito real.

F) Do direito do promitente comprador ? Consiste a promessa irretratável de compra e venda no contrato pelo qual o promitente vendedor obriga-se a vender ao compromissário comprador determinado imóvel, pelo preço, condições e modos convencionados, outorgando-lhe a escritura definitiva quando houver o adimplemento da obrigação. (Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, vol. 4, p.528-529).

III- Da Superfície
Art. 1369 ao art. 1377

1) - DEFINIÇÃO:
Conforme Carlos Roberto Gonçalves "Trata-se de direito real de fruição ou gozo sobre coisa alheia, de origem romana. Surgiu da necessidade prática de se permitir edificação sobre bens públicos, permanecendo o solo em poder do Estado. No direito romano o Estado arrendava suas terras a particulares, que se obrigavam ao pagamento dos vectigali, com o objetivo precípuo de manter a posse das largas terras conquistadas".
Portanto, a superfície é o direito real que o proprietário transfere a terceiros o seu direito de construir ou plantar em sua propriedade. Ao contrário da enfiteuse, trata-se de um contrato temporário, ou seja, possui prazo determinado de validade de direito. É necessário a elaboração de contrato através de escritura pública, posteriormente registrada em cartório. À obra ou plantação que decorre do direito de superfície dá-se o nome de implante.

2) MODO DE CONTITUIÇÃO
O Código Civil exige que o direito de superfície se constitua por intermédio de escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis (CC art. 1.369). Em se tratando de negócio jurídico que envolve bem imóvel, não poderia ser dispensada a escritura pública, solenidade necessária a própria validade do ato. Embora a superfície seja direito diverso do de propriedade, o registro deverá ser feito, em qualquer hipótese, na própria matrícula do imóvel, não sendo caso de matrícula autônoma, uma vez que os direitos são exercidos sobre um só imóvel.
De modo que, enquanto o contrato que institui direito de superfície não estiver registrado no cartório, existirá entre as partes um vínculo obrigacional. O direito real, com todas as suas características, somente surgirá após aquele registro.
O direito de superfície, como foi dito, importa concessão temporária fixando o documento constitutivo o tempo de duração. A criação desse direito, por ser acordo, poderá ser onerosa ou gratuita, se estipulada a onerosidade poderá compreender pagamento único ou parcelado.
Surge, em consequência da superfície, uma propriedade resolúvel (art. 1.359, CC). No caso de efetuar o superficiário um negócio jurídico que tenha por objeto o direito de superfície, ou no de sucessão mortis causa, o adquirente recebe-o subordinado à condição resolutiva.

3) TRANSFERÊNCIA DO DIREITO DE SUPERFÍCIE
Dispõe o art. 1.372 do Código Civil:
"O direito de superfície pode transferir-se a terceiros e, por morte do superficiário, aos seus herdeiros".
Parágrafo único. Não poderá ser estipulado pelo concedente, a nenhum título, qualquer pagamento pela transferência.
O superficiário não é obrigado a pagar valores da transferência do seu direito, quer seja a título oneroso o não. É proibido ter cláusula contratual estabelecendo essa regra.
Tal orientação se amolda â tendência universal de se eliminar qualquer cobrança, por parte dos proprietários de imóveis, quando da transferência a terceiros de direitos constituídos sobre os mesmos.
O art. 1.373 do Código Civil confere o "direito de preferência, em igualdade de condições", no caso de alienação, seja do imóvel ou da superfície, ao superficiário ou ao proprietário, respectivamente. O aludido dispositivo estabelece, assim, o direito de preferência recíproco sobre direitos reais em benefício de ambos os titulares dos direitos objeto da avença.
Desse modo, se o proprietário concedente resolver alienar o imóvel, o superficiário terá preferência na aquisição. Se, por outro lado, este último optar por alienar o direito real de superfície, deverá respeitar a preferência instituída em favor do primeiro, sempre em igualdade de condições para ambas as partes.
Em se tratando de direito patrimonial de caráter privado, a preferência na aquisição pode ser objeto de transação ou renúncia, sendo licito consignar esta última no instrumento de constituição.

3) EXTINÇÃO DO DIREITO DE SUPERFÍCIE
a) Advento do termo final. No silêncio das partes o contrato prorroga-se por tempo indeterminado, assim como o direito real de superfície. Há, pois, a necessidade de notificação para a extinção do negócio, com prazo razoável. Enquanto não cancelado o registro imobiliário, o instituto prossegue gerando efeitos erga omnes.
b) Dispõe o art. 1.374 do Código Civil que, "antes do termo final, resolver-se-a a concessão se o superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida".
O dispositivo acima objetiva evitar burla aos termos estabelecidos na ofensa ao princípio de boa-fé objetiva, que deve ser observado e respeitado durante todo período de execução do contrato. É defesa, portanto, a alteração unilateral. Qualquer modificação posterior da destinação da utilização do solo deve ser realizada de comum acordo com o proprietário, denominado concedente. Observando-se as mesmas formalidades exigidas anteriormente; escritura pública devidamente registrada no cartório.
c) Abandono do imóvel pelo superficiário, permitindo a sua deterioração.
Com a extinção da concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário (art. 1375). A presença do superficiário ou de seus prepostos ou familiares, depois de extinta a concessão, caracteriza posse injusta, que autoriza a reintegração da posse.
d) O art. 1.376 do Código Civil prevê outro modo de extinção da concessão superficiária: a desapropriação. Neste caro "a indenização cabe ao proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um". O dono do terreno recebe o equivalente ao seu valor, enquanto o superficiário é indenizado pela construção ou plantação.

CONCLUSÃO
O direito de superfície foi reintroduzido em algumas legislações de forma expressa ou por construção doutrinária, moldando-se às necessidades de cada País de acordo com o momento histórico.
No nosso caso, esse instituto foi apresentado como direito real imobiliário no Código Civil, e reinserido em nosso ordenamento com o Estatuto da Cidade. Este direito veio para consagrar a função social da propriedade, trazendo novas perspectivas com mecanismos que permitem a utilização, por exemplo, do solo ou de prédios inacabados, a fim de promover o bem estar social, gerando com isso, um incentivo a construção civil, bem como a oportunidade de criação de novos empregos.
O direito de superfície tem características próprias, é limitado e autônomo, pois, pode construir ou manter construções, conservar ou assentar plantações, em solo alheio, em caráter temporário ou indeterminado.
Portanto, é necessário dizer que embora já existisse o direito de superfície, o mesmo voltou a ter relevante importância em nosso ordenamento jurídico, como instrumento útil a ser utilizado com bom senso e razoabilidade, atingindo, portanto, os negócios jurídicos e a vida de milhões de pessoas em nosso País, para que se possa conter a miséria, a violência e o abandono a que as pessoas estão sujeitas. Toda a sociedade deveria ser envolvida para que pudesse obter a conscientização dessa necessidade que a propriedade tem para todos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

? RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das coisas. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2003;

? SILVA, Caio Mario da. Instituições de direito civil. 19 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008;


? GOLÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Coisas. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010;

? http://www.coladaweb.com/direito/direito-das-coisas - acesso dia 05 de Novembro de 2010;


? http://www.guiadoconcursopublico.com.br/apostilas/05_194.pdf - acesso dia 07 de Novembro de 2010.


Autor: Bruna Katrine Dândalo


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