Coleta Seletiva



Um dia um aluno me perguntou a importância da escola. Sem muita convicção do que estava prestes a dizer, disparei:

– Pra ti não ter que varrer rua, João!

Depois me arrependi até o último fiapo de cabelo do que havia dito. O menino era uma peste em sala de aula, bom de matemática, raciocínio lógico, rápido, mas tinha um gênio do cão. Me tirava, com facilidade, do sério, embora eu tentasse me segurar, as vezes a paciência morria estrangulada num grito. João Carlos repetia pela terceira vez a segunda série, maior culpa a falta de incentivo dos pais do que seus maus modos. Fui para casa agastada por mais um dia de trabalho, ainda tinha que dar conta da louça do jantar transbordando na pia da cozinha e a pilha de redações por corrigir.

Nenhum recado na secretária eletrônica, Douglas havia sido terminante na noite anterior, aprontou as malas, a gente nem se despediu. Acho que o motivo maior das brigas foi o desemprego dele. Tantos anos na concessionária para ser despejado que nem lixo, na sarjeta. Mas alguém há de recolher o lixo, há cacareco que faz falta na cama, no corpo da gente. Pensei no episódio com João Carlos, há coisas que não se aprendem na escola.


Autor: Claudia Curcio


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