Do instituto da Descoberta e o crime de apropriação de coisa achada.



Antes de adentrar no tema escolhido, importante ressaltar o conceito de propriedade. Propriedade é direito real por excelência que dá ao proprietário a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, além do direito de reavê-la de quem injustamente a possua ou detenha. É o conceito central dos direitos das coisas.
Assim, conforme o exposto acima, os direitos dos proprietários consistem em usar (utentdi), gozar (fruendi), dispor (abutendi) e reivindicar a coisa, sendo que os aludidos direitos encontram-se no artigo 1228 do Diploma Civil.
Segundo o Ministro Cesar Peluzo , em sua obra intitulada "Código Civil Comentado", a qual contou com diversos colaboradores, os proprietários podem (no sentido de faculdade) retirar toda a utilidade e proveito possível da coisa, desde que subordinados à função social (princípio constitucional de que a função da propriedade é social, superando-se a compreensão romana quiritária de propriedade em função do interesse exclusivo do indivíduo, do proprietário e do possuidor ).
Apesar do direito de propriedade não ser absoluto, ante a necessidade de cumprir-se à função social, caso seu proprietário ou possuidor perca coisa móvel, terá ele o direito de ser restituído. Para isso dá- se o nome de Descoberta.
O instituto está disposto no artigo 1.233 do Diploma Civil

Art. 1233. "Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí- la ao dono ou legitimo possuidor".

Segundo o Ministro supracitado, "descoberta nada mais é do que o achado de coisas perdidas. Ao contrário das coisas abandonadas (res derelicta) ou sem dono (res nullius), a coisa perdida tem dono, que apenas está privado de sua posse.
Mister salientar que, quando a isso, ninguém é obrigado a recolher coisa perdida, entretanto, caso assim o faça, a lei lhe atribuirá certos deveres, tais como restituir a coisa, esforçar-se para localizar o verdadeiro dono e por fim entregar a coisa perdida à autoridade competente para seguir o procedimento disposto nos artigos 1.235 e seguintes do diploma citado.
Ademais, aduz o artigo 1.234 do CC, que o responsável pela restituição terá direito a recompensa e à indenização pelas despeitas que houver arcado.
Em paralelo com a referida descoberta há o crime tipificado no Diploma Penal, no artigo 169, III, ou seja, o delito de apropriação de coisa achada.
Segundo o artigo do Código Penal:

" (...) II-quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de restituí-la ao dono ou ao legítimo possuidor ou de entregá-la à autoridade competente, dentro do prazo de 15 (quinze) dias.
Pena- detenção de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa".

Conforme se observa pelo tipo penal acima, qualquer pessoa pode cometer o delito, sendo o sujeito passivo o proprietário ou legítimo possuidor da coisa perdida.
Acertadamente, Guilherme de Sousa Nucci afirma em sua obra que "o apossamento, no caso tipificado acima, volta-se contra coisa pertencente a outrem, que está perdida. A obrigação imposta pela lei, portanto, é a pronta restituição do bem sumido a quem o está procurando. Essa devolução pode efetivar-se diretamente a quem de direito ou à autoridade competente", e ainda, afirma que "evidencia-se nesse tio penal a proteção estentida, nos crimes patrimoniais, não somente ao dono da coisa, mas também a quem possui legitimamente.
É cediço que ambos artigos tratam sobre o mesmo assunto, em esferas diferentes, sendo um tratado como instituto privado e outro de forma sancionadora.
Entretanto, há diferencias substanciais no que tange aos procedimentos. Isso porque o disposto no Código Civil foi omisso no que diz respeito ao prazo, enquanto que no Código Penal o prazo encontra-se expresso, entre outros exemplos.
Assim, é preciso zelo ao proferir o famoso ditado "achado não é roubado", visto que conhecendo o dono, deve o agente devolver a coisa achada imediatamente; se não o conhece ou se não puder devolvê-la a este a lei lhe concede um prazo para a entrega à autoridade, pois a obrigação civil existe .



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

PELUSO, César. Código Civil Comentado, Barueri,SP: Manole 2007.

Visão geral do projeto do Código Civil, cidadania e justiça. In Revista da Associação rasileira dos Magistrados do Rio de Janeiro, volume 10.

NUCCI, Guilherme de Sousa. Código Penal Comentado, RT: São Paulo, p. 573.

MIRABETE, Júlio Fabbrini, Manual de Direito Penal, 25 º, São Paulo, Atlas, p.285

PINTO, Antônio de Luis de Toledo, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. Vade Mecum. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

Autor: Renata Zanon


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