OS DESAFIOS DA PÓS-MODERNIDADE PARA O CAMPO DO CURRÍCULO



Ana Paula Bittencourt Santana

A análise da origem e desenvolvimento do campo conceitual do currículo nos leva a uma reflexão sobre a profundidade política, social e cultural que o mesmo apresenta dentro do processo educativo.
Trazendo uma visão crítica sobre o currículo, Berticelli (2001, p. 160), explicita que,

"Currículo é lugar de representação simbólica, transgressão, jogo de poder multicultural, lugar de escolhas, inclusões e exclusões, produto de uma lógica explícita muitas vezes e, outras, resultado de uma "lógica clandestina", que nem sempre é a expressão da vontade de um sujeito, mas imposição do próprio ato discursivo."

Neste sentido, o currículo configura-se como instrumento político e ideológico do processo educativo para a formação do homem ideal para o tipo de sociedade que se deseja conservar, transformar ou construir, dentro do qual são feitas inclusões e exclusões.

Esta perspectiva se difere em muito a concepção que permeou o Brasil até a década de 70, na qual o currículo aparentava neutralidade pois era concebido apenas relacionado à ideia de rol de disciplinas e listagem de conteúdos, como mera função instrumental dentro de um componente mais amplo, que é o contexto curricular. No final da mesma década, surgiu estudos sobre o currículo que enfatizava o papel social a ser desempenhado tanto pela escola quanto pela comunidade.

Porém, somente no final da década de 1980 é que é superada a primeira visão do currículo e a proposta curricular passa a contemplar o aspecto social e cultural, propiciando instrumentos políticos às camadas populares para que os estereótipos, as experiências e a pressão da ideologia dominante fossem debatidos, questionados e superados. Para tanto, algumas mudanças começaram a serem visualizadas, as quais atualmente ainda vêm sendo implantadas e efetivadas, dentre elas: a adequação dos conteúdos à vida dos alunos, a análise dos silenciamentos e métodos de provocá-los, a adoção de um currículo crítico, a adequação do currículo aos interesses das classes e grupos excluídos, a importância da regionalização na formação básica de todos os brasileiros, enfim, questões curriculares que hoje encontram-se intimamente ligadas aos problemas sociais, e mais recentemente, aos culturais.

Neste ínterim, é importante salientarmos que,

"O currículo é um dos "lugares" em que se "concede a palavra" ou "se toma a palavra", no jogo das forças políticas , sociais e econômicas". (BERTICELLI, 2001, p. 168)

Este se coloca como um dos principais desafios da pós-modernidade na proposta curricular: a concessão da palavra à todos, incluindo-se as diferenças culturais, de gênero, raça, cor, nível social, etc, conforme prioriza os Estudos Culturais, ou seja, um espaço no qual haja a igualização das oportunidades e não a supremacia de uma cultura em detrimento de outra para que se efetive a expressão multicultural e multireferencial. Neste sentido, dá-se a importância dos Estudos Culturais como "um campo onde se define não apenas a forma que o mundo deve ter, mas também como as pessoas e os grupos devem ser." (SILVA, 2007, p.134).

A partir daí, podemos perceber o conhecimento e o currículo como campos culturais, onde diferentes grupos tentam estabelecer sua hegemonia, passando a ser um artefato cultural, pois é uma invenção e construção social gerado a partir de visões e pessoas com interesses diferenciados.

Assim, urge a necessidade de uma nova concepção de educação que insira um currículo que compreenda as mais diversas especificidades para o êxito do processo educativo: o atendimento das necessidades de todos educandos, independente de suas diferenças de cor, gênero e cultura.
Só assim poderemos dizer que estamos construindo e fazendo uma educação para todos.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: Uma introdução às teorias do currículo. 2 ed.Belo Horizonte, Autêntica, 2007.
BERTICELLI, Ireno Antônio. Currículo: Tendências e Filosofia. In: COSTA, Marisa Vorraber (org.). O currículo nos limites contemporâneos. 3 ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.

Autor: Ana Paula Bittencourt Santana


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