CASAMENTO RELIGIOSO COM EFEITOS CIVIS



Unidade de Ensino Superior Dom Bosco ? UNDB
Disciplina: Direito Civil ? Famílias e Sucessões
Prof.: Carlos Couto
Aluno: José Caetano Cardoso de Sousa
Trabalho Extra Classe

CASAMENTO RELIGIOSO COM EFEITOS CIVIS

EFETIVIDADE DOS ARTIGOS 1.515 e 1516 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

DA POSSIBILIDADE JURÍDICA DO CASAMENTO RELIGIOSO COM EFEITOS CIVIS

O casamento, embora não sendo o único mecanismo de formação de família, continua tendo a sua máxima importância, podendo ser civil ou religioso. Silva (2010, p. 2) discorre que a Constituição Federal de 1824 estabeleceu a religião católica como a religião oficial do País, fato rompido com a ordem liberal do Constitucionalismo de 1891, concluindo que o Estado não tem religião oficial.
A Carta Magna de 1988, em seu constitucionalismo pátrio, defende a liberdade religiosa, direito fundamental, previsto em seu art. 5º, VI, permitindo o culto de qualquer religião e até o direito de ser ateu, agnóstico, ou não crer. Qualquer culto religioso deve ser respeitado, mostrando que o sincretismo religioso é máxima respeitada no pluralismo e multiculturalismo abarcado pela ordem constitucional. Entretanto, as religiões contemporâneas não perdem a sua importância, face aos novos tempos que imperam "[...] desesperança, incerteza, desordem, violência, e imprevisibilidade, marcas firmes da Pós Modernidade, bem como a solidão, a depressão, o medo, fazendo com que o homem volte-se cada vez mais para a fé". (SILVA, 2010, p. 2).
Considerando-se o casamento religioso na Igreja Católica, é possível observar a Lei nº 10.406/02, do novo Código Civil, e seus artigos 1.515 e 1.516. Anteriormente ao advento dessa lei, não era possível que o casamento religioso, em qualquer religião, tivesse validade plena, sem ser precedido pelo casamento civil. Não havia, portanto, autonomia do casamento religioso.
O novo Código Civil, ao entrar em vigor, prescreve a tudo se dedica ao estudo do Direito, a reflexão profunda sobre as inovações que ele introduz ao sistema jurídico do País. (VIEGAS, 2007, p. 348). Em sua doutrina, Carlos Roberto Gonçalves frisa que,
O Código Civil de 2002, suprindo omissão do código anterior, disciplina expressamente o casamento religioso, que pode ser de duas espécies: com prévia habilitação (art. 1516, §1º) e com habilitação posterior à celebração religiosa (art. 1516, §2º). Em ambas, portanto, exige-se o processo de habilitação. Somente a celebração é feita pela autoridade religiosa da religião professada pelos nubentes, reconhecida como tal oficialmente. (...) celebrado o casamento religioso, os nubentes requererão o registro, a qualquer tempo, instruindo o pedido com a certidão do ato religioso e com os documentos exigidos pelo art. 1525 do Código Civil. Processada e homologada a habilitação e certificada a inexistência de impedimento, o oficial fará o registro do casamento religioso, lavrando o assento e conservando em seu arquivo (GONÇALVES, 2003, p.119).


Além da grande inovação que diz respeito à unificação da idade núbil, ou seja, a permissão para o casamento a partir dos 16 anos, tanto para o homem quanto para a mulher, exigindo-se a autorização de ambos os pais, ou seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil, que passou a ser alcançada aos 18 anos, existe outra alteração, "[...] embora de pouca ou nenhuma repercussão de ordem prática, diz respeito ao casamento religioso de efeitos civis. Antes regulado em lei esparsa, agora pelo próprio Código Civil" (arts. 1515 e 1516) (VIEGAS, 2007, p. 348). Paulo Lobo corrobora essa afirmação, completando que

Porém, o Código Civil de 2002 ampliou o alcance do casamento religioso, admitindo, pela primeira vez no direito brasileiro republicano, efeitos à celebração religiosa do casamento, sem ter sido antecedida de habilitação civil, devidamente homologada. Nesta hipótese, o casal requer à autoridade competente que seu casamento religioso seja registrado, fazendo prova de sua celebração. Todavia, a habilitação não é dispensada: apenas deixa de ser prévia. (....) O modelo idealizado pelo atual Código Civil é apenas a substituição da autoridade civil pela religiosa, para fins de celebração. (LOBO, 2008, p. 80).

Silva (2010, p. 3) esclarece, portanto, que "[...] o casamento religioso pode preceder ao civil, servindo inclusive como documento para consolidar o casamento civil", devendo o celebrante da cerimônia comunicar o fato ao Cartório competente para registros civis de casamentos, não sendo certo que esta comunicação seja monopólio do celebrante religioso, mas que qualquer um dos nubentes também pode, da mesma forma, fazê-la.
Deve-se dar no prazo de até noventa dias à comunicação do casamento religioso para as instâncias registrais civis. Se não obedecer esse prazo, existe a pena de desconstituição dos efeitos do casamento religioso. Entretanto, essa desconstituição é relativa, não sendo o seu prazo decadencial. Feita a comunicação em prazo posterior, ainda assim o casamento religioso pode ser convalidado (SILVA, 2010, p. 3).
Na visão de Silva (2010, p. 4), pode parecer estranho que pela simples ausência de comunicação no prazo de 90 dias, exista a necessidade de nova celebração no religioso. Desta forma, ele considera imprescritível essa comunicação. O autor comenta ainda a dispensa feita à cerimônia de casamento religioso, no casamento civil, da realização de nova cerimônia, de maneira que o casamento civil limita-se às assinaturas e proclamas.
Surge uma indagação na explanação de Silva (2010, p. 4) sobre o mero casamento no religioso, sem intenção de casamento no civil: se isso não poderia ser uma forma de não efetivar o casamento no civil, fraudando para evitar o casamento no civil, a partilha de patrimônio inerente ao regime de bens e todos os consectários de Direito de Família do casamento. Questiona ainda se esse não seria um fato torpe de pessoas já casadas no civil se casarem, com dolo, no religioso, ludibriando o outro nubente e a sociedade.
O casamento religioso também tem editais, proclamas, procedimentos, tudo para averiguar se os candidatos ao casamento não possuem impedimentos para o matrimônio; não há como convalidar o casamento religioso em seus plenos efeitos sem o registro no civil. O casamento no religioso perde seus efeitos. O casamento religioso só terá plena validade com o registro no Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais;
O registro do casamento religioso em instância civil, conforme já dito, pode até extrapolar os 90 dias previstos inicialmente em lei; havendo demora no registro do casamento civil daqueles que celebraram o casamento religioso, o que resta, em verdade, é mero constrangimento, sem qualquer prejuízo à autoridade religiosa celebrante, que realizou cerimônia com guarida legal, até porque não cometeu qualquer equívoco, uma vez que não é mais legalmente compelido a fazer o casamento religioso com prévio casamento civil.
O nubente eventualmente prejudicado pode solicitar guarida legal, seja do Ministério Público, seja na esfera cível, com ações tanto na seara do Direito de Família, quanto na órbita de responsabilidade civil ou até mesmo, se necessário, dar início à persecução penal contra o nubente que cometeu eventual crime. Até mesmo a Igreja Católica pode buscar reparação por eventuais danos morais e materiais em se sentindo lesada por nubente que, de má-fé, se utilizou do sacramento religioso para perpetrar qualquer falsificação. A esse respeito, Lobo (2008, p. 81) leciona que,
O Código Civil de 2002 inovou em relação à legislação anterior sobre os efeitos do casamento religioso, admitindo que até mesmo a celebração com ausência de prévia habilitação possa ser convalidada. Essa é a hipótese do casamento exclusivamente religioso, que antes não produzia qualquer efeito civil e não podia ser submetido ao registro civil. A nova norma dobrou-se à realidade dos costumes em várias regiões do país, cujas comunidades atribuem muito mais força simbólica ao casamento religioso, considerando suficiente. Basta que os casados apenas perante a autoridade religiosa requeiram o registro civil a qualquer tempo, promovendo-se a habilitação perante o ofício competente, sem necessidade de nova celebração. (LOBO, 2008, p. 81).

Sendo assim Silva (2008, p. 4) considera evidente que o casamento religioso tem autonomia diante do civil e o registro do casamento religioso em civil pode se dar a qualquer tempo, estabelecendo-se mais uma vez que o casamento religioso pode ocorrer sem prévio casamento civil.
Paulo Restife Neto e Félix Ruiz Alonso reforçam a tese de que o casamento religioso pode ser convertido em casamento civil, prorrogando-se o tempo de noventa dias, admitindo o registro até anos depois, conforme se verifica na explanação abaixo:
O casamento religioso, é assim, no Código Civil de 2002, equiparado ao casamento civil. A equiparação é a maneira jurídica de acolher no direito pátrio os institutos que lhes são estranhos. Mediante a equiparação o casamento religioso, provenha do sistema jurídico-religioso que for, passa a ser aceito pelo ordenamento brasileiro. Obtido o registro, o casamento religioso goza da equiparação ex tunc (art. 1515). O efeito retroativo ao momento em que foi contraído, celebrado, indica a recepção total do casamento religioso. O casal pode também requerer o registro anos depois de haver contraído o matrimônio religioso; entretanto, uma vez registrado, a equiparação geradora de efeitos jurídicos retroage à data das núpcias (...) (RESTIFE NETO e ALONSO apud GONÇALVES, 2008, p.121).

Silva (2010, p. 5) observa que "[...] a despeito do ditame legal e de farta doutrina", existem certas Pastorais, na Igreja Católica, que mantém ainda como exigência a realização anterior de casamento civil, para o casamento religioso, considerando-a uma burocracia, ilegal, estéril, desnecessária, e que traz os seguintes dilemas: e aqueles que vivem em união estável e não desejam se casar no civil, querendo o casamento apenas no religioso? e os que, sabendo do permissivo legal de converter casamento religioso em civil, assim tentam proceder, chegam ao extremo de preparar festividades posteriores ao casamento religioso, fazem gastos consideráveis para tanto e só são avisados da estranha exigência da Pastoral Carcerária nos instantes derradeiros do casamento, com data já marcada, convites já distribuídos e todas expectativas de fazer um casamento religioso sem maiores entraves?
Em seu relato, Silva (2010, p. 4) comenta a impossibilidade de dialogar com aqueles que se valem de dogmas religiosos para tornar os equívocos duradouros, pois qualquer religião tem a prerrogativa de ter seus dogmas, embora sem ofender a lei, discriminando os seus seguidores. E acrescenta que,
Tanto do ponto de vista ético, quanto jurídico, isto é recriminável. Deve-se temer pessoas e instituições em um mundo desencantado que ainda possuem certezas. Por isso, a via da escrita acadêmica é um bom lócus para denunciar abusos e equívocos que tanto podem gerar transtornos a nubentes desavisados. (SILVA, 2010, p. 4).

O autor ressalta ainda que (SILVA, 2010, p. 5) sem exigência prévia de casamento no civil, a conversão do casamento religioso em civil é claramente autorizada em lei, iniciando-se uma argumentação pelo óbvio...; sendo a Igreja Católica uma Instituição respeitável, devidamente estruturada e com aparato para tomar diligências, imprimir editais e fixar ritos internos, não demanda exigir o casamento civil antes do casamento religioso; "a lógica religiosa não pode ofender o permitido no ordenamento jurídico". A Igreja não forma uma espécie de pluralismo jurídico tolerável.
O Direito Estatal só deve deixar de vingar quando deixa lacunas e comunidades abandonadas pelo manto estatal criam mecanismos de auto-regulação não violentos. Não é o caso em tela; a Igreja Católica, com tantas exigências, pode perder seus seguidores além de celebrar menos casamentos. Converter uma união estável, judicialmente, em casamento, pode ser muito menos burocrático que celebrar casamentos nas esferas civis e religiosas; não se pode burocratizar um momento único na vida de um casal - o casamento religioso - desvirtuando-o e provocando constrangimentos, com repercussões jurídicas e morais.
Silva (2010, p. 5) conclui que o casamento religioso pode ser realizado sem prévio casamento civil; o casamento religioso pode servir até como documentação para o casamento civil e a conversão do casamento religioso em civil pode se dar a qualquer tempo.
Pode-se concluir este trabalho reafirmando a importância e a facilidade do casamento religioso com efeitos civis ao mesmo tempo em que se responde que não é tão efetivo o casamento religioso com efeitos civis no Estado do Maranhão, conforme dados levantados em pesquisa.
Em conclusão deste trabalho, vem em relevo o Código Civil de 2002 e mais precisamente o conteúdo dos artigos 1.515 e 1516, com as novidades pertinentes à idade núbil que passa 16 anos tanto para o homem como para a mulher, necessitando entretanto, do consentimento dos pais ou responsáveis e a maioridade civil de 18 anos, quando até então era 21 anos.
Finalmente, é fato que o Código Civil de 2002 prevê expressamente o registro civil do casamento religioso, aumentando o prazo de registro para noventa dias de acordo com os artigos 1.515 e 1.516, conforme o que foi apresentado.
Desta forma, acompanhando os fatos históricos que culminaram com a separação completa entre a Igreja e o Estado, consumada pela Constituição de 1891) (evidenciou-se que quando o Estado reconhece os efeitos jurídicos do matrimônio religioso, não dá sanção pública a uma verdade religiosa nem reconhece oficialmente um determinado credo. Ao contrário, estaria estabelecendo efeitos jurídicos a um verdadeiro matrimônio, o que foi concretizado pela Constituição de 1988 e particularmente no Código Civil de 2002.


REFERÊNCIAS:


GONÇALVES, C. R. Direito civil brasileiro, volume VI: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2008.

LÔBO, P. Famílias. São Paulo: Saraiva, 2008.

RESTIFE NETO, P.; ALONSO, F. R. A recepção do casamento religioso e o novo Código Civil. RT, 817/35 apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VI: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2008.

SILVA, J. F.V. Noções sobre casamento religioso na Igreja Católica . Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2502, 8 maio 2010. Disponível em: . Acesso em: 30 set. 2010.

VIEGAS, J.F.M. Reflexões sobre o novo Código Civil. De jure - Rev Jur Min Pub Est Minas Gerais. Belo Horizonte, n. 8 jan./jun. 2007.




Autor: Jose Caetano Cardoso De Sousa


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