CONSIDERAÇÕES ACERCA DO AGENTE PENITENCIÁRIO E SEU COTIDIANO NO AMBIENTE PRISIONAL: planejamento e formação continuada como ferramenta essencial de sua organização!



CONSIDERAÇÕES ACERCA DO AGENTE PENITENCIÁRIO E SEU COTIDIANO NO AMBIENTE PRISIONAL: planejamento e formação continuada como ferramenta essencial de sua organização!



Ana Sílvia R. de Sousa
Inspetora Penitenciário
Bibliotecária
Especialista
Direito
Mestranda

[email protected]





Resumo:

O texto trata do cotidiano do agente penitenciário marcado por experiências e eventos que levam, com freqüência a uma atuação desordenada, ansiosa, ás vezes frenética...por isso sujeitos às demandas imediatistas. Nesse contexto, suas intencionalidades e seus propósitos são frustrados e as circunstancias o fazem responder à situação de momento, ou seja "apagando incêndios". Faltando em sua ação planejamento.



Palavras-chave: agente penitenciário, cotidiano, planejamento e formação continuada.









Introdução


O cotidiano do agente penitenciário é marcado por eventos diferenciados. Chega cedo ao presídio para troca de plantão e já se depara com uma série de situações da mais diversas. No enfrentamento desta rotina está o subseqüente temor de tentativas de fugas, motins, rebeliões, brigas de presos dentro cela e fora, trafico de drogas etc.

Nesse contexto o agente penitenciário sofre de ansiedade, uma ansiedade frenética, que o leva muitas vezes a uma atuação desordenada e confusa. Refletir sobre esse "cotidiano", "questioná-lo", "equacioná-lo" não é uma tarefa fácil!
Neste texto particularmente, tenho o propósito de propor dois encaminhamentos:


? Primeiro : como trabalhar o planejamento no desenvolvimento de rotinas em Presídios;


? Segundo: como trabalhar as relações sociais/interpessoais de modo que o planejamento proposto possa ser implementado.




IMPLEMENTAÇÃO DO PLANEJAMENTO



Dado que o trabalho do(a) agente penitenciário visa principalmente a labuta com presos, não interessando, se é preso condenado ou não. Faz-se necessário que ele(a) "agente´seja capaz de analisar suas próprias ações, no dia-a-dia, identificando quais os aspectos ? e em que medida-podem e devem ser aperfeiçoados ou organizados. Para que? Para "re-construir e construir" esse cotidiano, com vistas a avançar sua ação, sua "intencionalidade" como resposta a uma atuação desordenada.

Seguem pequenos trechos de relatos de agente penitenciário sobre seu dia típico para evidenciar o assunto de que este texto trata:


Relato 01-"Meu dia de trabalho tem inicio às 8:00h da manhã. Inicialmente preocupo-me com a chegada de visitantes, ou seja , de familiares de presos, verifico se todos os agentes vieram trabalhar, se tem audiência, se tem preso para levar para hospital. Aqui os problemas são os mais diferenciados. Às vezes pode faltar uma chave de algema, pode faltar uma algema. É um revólver que não esta municiado, é uma carro que não chega..etc..."

Relato 02-"Chego ao presídio cedo às 8:00h. No decorrer do dia sou solicitado para inúmeras situações: escolta para hospital, escolta para audiência, condução interna de preso dentro do presídio para falar com diretor etc...Muitas vezes também um preso chama e pede uma ligação na permanência para falar com familiar, o preso também fala de sua "cadeia", diz que já era para estar solto e ainda está preso, e assim agente escuta um pouco. Apesar de não ter estudo nesta área jurídica agente entende um pouco."



Relato 03-"Meu dia como agente penitenciário no presídio, é sempre muito movimentado, por vezes turbulento. A rotina de um presídio é sempre agitado. Agente faz qualquer coisa, não segue uma agenda pré-ordenada. Às vezes tenho a sensação que a "turbulência é inerente ao sistema" . Chego a pensar ... será que vai dar pra fazer todo o serviço? No final do dia, fica sempre algo ainda a fazer. E olha que prioridades tem a todo instante".
Destacamos após essas falas a contribuição de Matus(1991) que, insistindo na necessidade da caracterização das atividades de trabalho, propõe quatro conceitos:

IMPORTANCIA-ROTINA-URGÊNCIA-PAUSA, os quais serão de utilidade para compreensão e transformação das ações cotidianas que achei interessante e adaptei para o profissional agente penitenciário. Essas categorias de análise foram reorganizadas em dois pares contrapostos: IMPORTANCIA-ROTINA e URGÊNCIA-PAUSA por Gonçalves(1995), em sua dissertação de mestrado, na qual fica patente a utilidade delas para organização e para o trabalho.

COMO SE CARACTERIZAM ESSES PARES DE CATEGORIAS????


As atividades de IMPORTÂNCIA são aquelas estabelecidas como prioritárias para o atendimento de Penitenciária na superação de dificuldades! As atividades de ROTINA "direcionam para o funcionamento do cotidiano, para normas reguladoras do processo de decisão-ação, para manutenção de procedimentos e de recursos de trabalho, cumprindo uma importante função, de manutenção do funcionamento do presídio. Enquanto as atividades do par IMPORTANCIA-ROTINA são planejáveis previamente, constituindo-se no arcabouço da organização do presídio, URGÊNCIA-PAUSA são atividades decorrentes da dinâmica diária do local. Assim, as atividades de URGÊNCIA "direcionam-se para atender aos problemas-situações que não são previstos pelo processo de decisão?ação e que exigem permanente atenção. As atividades de PAUSA "destinam-se ao atendimento das necessidades individuais do sujeito e incluem o descanso, os períodos de férias, as ações descomprometidas com resultado". São compromissos com a humanização no trabalho.


Comentando sobre atividades de Importância o agente penitenciário deverá prevê que será atropelado por obstáculos, deverá prevê que emergência é próprio daquele cotidiano. Deve ter consciência de suas funções ainda que mal compreendidas e mal delimitadas . O agente penitenciário tem clareza que os problemas estão ali ...bem na sua frente...é problema e "problemas são para serem solucionados", se não for, alguém acaba sendo prejudicado...Quem? Às vezes o próprio agente ...outras vezes, o preso. Por outro lado, aqui fica uma reflexão. Como pensar todos esses problemas? Falar sobre eles, entendê-los, ler um texto a respeito do assunto,? Refletir sobre a prática é trazer o assunto de volta e de uma forma coerente apresentá-lo novamente. A Rotina como bem diz o autor Matus, são normas, estão ali e você executa sem reclamar, as suas expectativas com a falta delas é bem pior, ou seja, normas para se fazer cumprir é tê-las. São um direcionamento já planejável E assim podemos até citar uma metáfora para melhor entendimento: Já se viu "um cego perdido no meio de um tiroteio" é assim que fica o individuo que não tem ações planejadas. Penitenciária é um território de lutas, de conflitos que geram incêndios e apagar incêndios requer uma ação imediata...alguém tem que apagar o incêndio! Esse alguém imediato é o agente penitenciário! Essa metáfora pode ser guia para ações futuras? Sim.... Considerando que: o cego saiba agora, de onde vem o tiro para poder se desvencilhar dele; Como? Planejamento!!!!

Gordon (1974) e Carkhuff(1977)apresenta duas atitudes facilitadoras para implementação de habilidades: "ouvir e mensagem" . Eu sem querer ser pretensiosa acrescento "ver". "Ouvir revela querer compreender" e ver "revela olhar com outros olhos"

RELAÇÕES SOCIAIS/INTERPESSOAIS E O PLANEJAMENTO


Enfatizar e valorizar as relações em seu aspectos éticos, é sempre muito importante para o comprometimento de ações que envolvam comunicação e integração. É tendo como ponto de partida que "responsabilidades" são compartilhadas. Nenhum processo de planejamento e desenvolvimento profissional, no presídio, tem resultados efetivos se a responsabilidade não é partilhada - cada qual com a função que lhe cabe, mas consciente das funções uns dos outros e colaborando mutuamente para que os objetivos sejam alcançados. É freqüente o agente penitenciário se arrogue de obrigações e tarefas de tal monta que se torna impossível cumpri-las. Sente-se exausto e frustrado, não se da conta de que compartilhar dessas responsabilidades não apenas aliviaria suas pressões, mas também envolveria os demais no compromisso com os objetivos propostos.

O planejamento é um caminho para ser seguido. Toda ação que envolve planejamento ela se torna uma construção de descobertas, de respostas, pois o "cuidado" de se prevê vai estar caminhando lado a lado das ações. Vai haver confronto, interlocução na mediação da complexidade. O agir humano vai sofrer uma reorganização. O confronto não é só com o outro é consigo mesmo. Se você agiu de forma inadequada, sem planejamento, esse é um comportamento que precisa essencialmente de uma formação, de mudanças de reflexão subjetiva. Esse re-pensar, esse re-posicionar sua consciência é de crescimento. Confrontar-se em sua prática é uma exigência da própria prática . O confronto com mudanças não é uma coisa tranqüila. No entanto, o chamamento ao compromisso é fundamental para que todos os envolvidos possam permanecer no processo de aperfeiçoamento.

Vejamos alguns conceitos de planejamento:


1. "processo permanente e metódico de abordagem racional e científica de problemas"(Batista, 1979,p.13);

2."processo de tomada de decisão, execução e teste de decisões"(Goldeberg,1973,p.64);

3."processo de antecipação e antevisão de condições, estados ou situações futruras, desejadas, e a previsão de todos os aspectos necessários para obtenção desses resultados".

Celso dos Santos Vasconcellos diz que:

''planejamento depende muito da dinâmica de grupo" e revela "três dimensões" básicas que precisam ser consideradas no planejamento: "a realidade, a finalidade e o plano de ação". "O plano de ação pode ser fruto da tensão entre a realidade e a finalidade ou o desejo da equipe. Não importando muito se você explicitou primeiro a realidade ou o desejo. Então por exemplo não há problema algum em começar o planejamento sonhando, desde que você tenha o momento da realidade, colocando os pés no chão. Em alguns casos você começa o ano fazendo uma avaliação do ano anterior, o grupo pode ficar até desanimado---afinal, a realidade infelizmente é muito complicada, cheia de contradições. Às vezes começar resgatando sonhos, as utopias, dependendo do grupo, pode ser mais proveitoso. O importante é que não se percam essas três dimensões e, portanto, em algum momento, a avaliação, que é o instrumento que aponta de fato qual é a realidade do trabalho, vai aparecer, começando o planejamento por ela".

Como já falei no parágrafo anterior, um exercício importante para o agente penitenciário é o olhar. Quando falo "olhar", é o olhar do cotidiano. Seu olhar precisa aprender identificar a mudança de tempo. Esse olhar também o ajudará a melhor organizar sua prática cotidiana. Olhar de constatação- o que é sua realidade, a realidade do presídio, dos presos. Olhar de investigação, análise e reflexão- o que o ocasiona aquele contexto, aquele resultado. Olhar de ação - indicando caminhos, analisando alternativas, prenunciando resultados e propondo superação de obstáculos.Re-olhar da avaliação - a cada momento, estabelecendo e revendo critérios, exercendo julgamentos, propondo valores e significados, tendo em vista o alcance dos objetivos definidos. Olhar de curiosidade, espanto ?permitir que o insólito exista e se mostre no cotidiano, com sua estranheza e aparentes impossibilidades, ao lado da criação do novo. Não perder de vista , nessa diversidade de olhares a necessidade e a funcionalidade do sua Formação permanente. Esse é um olhar intermediário-reflexivo de organizar idéias para numa experiência concreta compartilhar.


Observa-se que no conceito de planejamento há uma forma implícita e e explicita de colocar as situações. Passemos a comentar agora: A racionalidade do primeiro conceito que fala o autor. "Racionalizar significa tornar reflexivo, empregar o raciocínio para resolver problemas. Trata-se de uma operação mental complexa que consiste em estabelecer relações entre elementos dados. o autor ainda diz que racionalizar é "tornar mais eficiente uma ação mediante a adoção do método cientifico. Desse enfoque nasceu a racionalização do trabalho pelo qual se busca as implificação das tarefas". O autor refere a Taylor e Fayol(fica para outra oportunidade) mas o leitor poderá pesquisar. Tomada de decisão é do segundo conceito. Segundo o autor muitíssimas de nossas decisões , sejam elas pessoais ou profissionais, foram decisões tomadas por falência" ou seja as circunstancia nos levam a tomá-las. A tomada de decisão vai desde uma simples iniciativa de fazer um regime. E assim para Goldeberg "o estabelecimento de compromisso de ação. A tomada de decisão sai do plano das idéias e vem para a concretude.Vale dizer, que a tomada de decisão esta calcada, sobre modo, na competência de quem planeja"


FORMAÇÃO CONTINUADA E A VIABILIZAÇÃO DESSE PROCESSO FORMATIVO


Quando se fala em formação, é formação continuada para uma consciência critica fortalecedora, capaz de tomar boas decisões que é uma exigência para nós profissionais de segurança. E continuando, a formação continuada, ao lado de outras ferramentas, é instrumento essencial para aperfeiçoamento desse profissional. Cursos, oficinas representa para esse profissional atualização, aprofundamento das temáticas e apoiar-se numa reflexão sobre a prática, promovendo um processo constante de auto avaliação que oriente a construção continua de competências. A viabilização , nesta perspectiva , exige a consolidação de uma estrutura maior, como uma Escola Penitenciária que atenda aos anseios desta classe. Para tanto, faz-se necessário uma visão de futuro e recursos de toda ordem.




CONSIDERAÇÕES FINAIS


Ao assumir a tarefa de escrever este artigo, deparei-me com várias dificuldades. Primeiro por ser parte, e segundo, por uma conclusão muitas vezes muito subjetiva. Isto pode ocasionar equívocos, porém esta pesquisa possibilitou=me aprendizagem para fazer algumas sugestões. A tarefa não termina aqui, pois um artigo revive toda vez que é re-criado.

Dificuldades são inerentes a qualquer profissional e em qualquer área! Porém se percebe, que é nas dificuldades que se cresce e "ir além", além dos problemas, consciente de sua realidade ajuda a resolver os desafios. Proporcionar formação, proporcionar oficinas de formação é um objetivo que com certeza deverá ser buscado!




Referências


CARKHUFF, Robert ET all. The skillis of teaching:interpessonal skills. Massachusetts. 1977. GORDON, Thomas. Teacher effectiveness training. New York:Wyden Publescher, 1974.

LAKFF, George. Metáfora da vida cotidiana. São Paulo: EDUC/Mercado de Letras.2002.

LUCK, Heloisa. planejamento em orientação educacional. 19ª . ed., Petrópolis: Vozes. 2008.


MATUS, Carlos. Curso de planificação e governo-guia de análise teórica. São Paulo:ILDES Editor, 1991.


VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Planejar é antecipar ações para atingir objetivos. texto extraído da Revista Nova Escola. 2008.

Autor: Ana Silvia Rodrigues De Sousa


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