O que aprendemos com os bebês?
Olga conheceu Luís Carlos Prestes, líder revolucionário brasileiro de extrema importância. Benario e Prestes apaixonaram-se e passaram a viver juntos. Benario e Prestes apaixonaram-se e passaram a viver juntos. Embora tenha vivido esse amor, Olga sempre priorizou a causa comunista.
Logo após prenderem os dois, Olga descobriu a gravidez. Certa vez afirmou que nunca havia pensado em ter um filho, mas que estava muito feliz, esperando ansiosa a chegada do bebê, fazendo casaquinhos e conversando com esse novo ser que havia dentro dela. Entretanto, devido à crueldade do governo brasileiro àquela época, foi deportada para a Alemanha nazista, sem receber os cuidados de pré-natal.
As condições na prisão eram péssimas. Viveu em condições precárias de higiene e de alimentação. Sua gravidez foi extremamente conturbada. Entretanto, sempre mostrou-se carinhosa em relação à essa nova vida que estava para chegar. Segundo Szejer & Stewart, citados por Piccininni, Gomes, Moreira & Lopes (2004), as expectativas da mãe sobre o filho se constituem através do bebê imaginário que cada uma constrói, e envolvem, principalmente, o sexo do bebê, o nome, a maneira como ele se movimenta no útero, e as características psicológicas que lhe são atribuídas. Seu parto foi realizado em uma prisão, nessas mesmas condições desumanas. Assim veio ao mundo a pequena Anita. Olga chorou de felicidade. A alegria de ser mãe e pegar nos braços seu bebê, após alguns segundos do nascimento era indescritível. Seu bebê em seus braços pela primeira vez, Olga sentia o calor da pele daquele ser tão esperado e amado.
Segundo Klaus, Kennel & Klaus (2000), o corpo dos bebês se molda às formas dos pais, as mãos tocam a sua pele e o bebê olha diretamente para eles, ocasião em que, para os pais, é extremamente divertido brincar com eles, visto que, podem até imitar os movimentos faciais da mãe. Nesses primeiros momentos de vida, os bebês podem responder às vozes que escutam.
A partir da observação de bebês recém-nascidos, esses autores descobriram que suas condutas normais estão organizadas em seis estágios diferentes de consciência, que variam entre sono e vigília. Segundo esses pesquisadores, os recém-nascidos têm capacidades sensoriais aguçadas. A visão, a audição, o tato, o paladar e o olfato já são bem desenvolvidos nos bebês. De acordo com as pesquisas, pelo sexto dia de vida, o bebê já é capaz de reconhecer o cheiro de sua própria mãe. "Eles nascem prontos para olhar em volta, aninhar-se junto a uma pessoa, escutar seus pais e alimentarem-se em suas mães" (Klaus, Kennel & Klaus 2000).
No momento em que Olga tomou a criança nos braços e lhe deu seu nome, em homenagem à Anita Garibaldi e a avó paterna, Leocádia, o bebê imediatamente parou de chorar. De acordo com Borsa, Feil & Paniágua (2007), os primeiros dias após o nascimento de um filho, as mães experimentam sentimentos intensos e variados. Ao lado da sensação de desconforto físico após o parto está a emoção pelo nascimento da criança. Olga teria direito a beber uma xícara de leite e uma tigela de mingau por dia, por ser lactante. As normas da prisão eram claras: as crianças nascidas nessa condição poderiam ficar com a mãe até os seis meses de idade; logo depois eram enviadas ao orfanato do partido. Entretanto, devido às campanhas contra o Estado Alemão feitas pela avó paterna da criança, esta poderia ficar com a mãe enquanto ela fosse capaz de amamentar.
Em uma das cartas enviadas à mãe de Prestes, enquanto estava na prisão, Olga revelou que sentia-se muito feliz por poder amamentar. Em suas palavras, era tão maravilhoso que aquele pequeno ser pudesse se alimentar dela. Ela sentia que assim podia passar um pouco de sua história e de todo o amor que sentia pelo pai da criança. Fazia roupinhas para sua menina, brincava com ela, a viu dar os primeiros passos. Olga passava boa parte do tempo ocioso conversando com a filha, olhando para seu delicado rosto. Mas poderíamos nos questionar sobre o que o bebê vê quando olha para o rosto da mãe. Segundo Winnicott (1971), o que ele vê é ele mesmo. Por exemplo, a mãe responde aos gestos e sorrisos do bebê e ele se vê ali, naquele gesto que recebe de volta. Entretanto, nem sempre essa reciprocidade existe. E então eles procuram obter essa resposta no ambiente. Assim, começa a construir sua própria percepção, descobrindo o significado das coisas que vê. A partir dessas respostas, há a criação do vínculo mãe-bebê. (Mahler, 1982)
De acordo com Winnicott (1987), Olga seria uma mãe dedicada, ou seja, uma mãe que tem a noção claro acerca do papel que necessita exercer, eximindo-se da culpa por não ser capaz, devido à complexidade humana, de livrar o filho de frustrações, as quais são necessárias à sua adaptação. O objetivo dessa mãe é proporcionar satisfação extrema ao bebê, livrando-o de qualquer mal. Segundo o autor, uma mãe não está livre de passar por situações problemáticas, que deixaram sintomas no bebê, mas que farão parte de sua identidade. Por exemplo, uma mãe que entrasse em depressão poderia culpar-se por privar o filho daquilo que ele necessita, entretanto, ela não pode ser considerada culpada dessas dificuldades causadas por ela.
No caso de Olga, sua luta pela causa comunista ? que durante ano foi um dos seus únicos objetivos de vida ? a privou de viver perto de sua filha. Entretanto, sua filha reconhece seus motivos e não a culpa pela sua falha, se é que se pode assim dizer do ocorrido. Nas palavras de Anita Leocádia: "tive o privilégio de ser filha de Luiz Carlos Prestes e Olga Benario Prestes, duas pessoas extraordinárias, que deram suas vidas por uma causa nobre. Dois combatentes revolucionários que se dedicaram inteiramente à luta por justiça social, por liberdade, pelo socialismo e por um futuro melhor para a humanidade".
A avó materna não quis ter o mínimo de contato com a neta. E negou-se a ajudar com a causa pela qual a mãe de Prestes lutava: resgatar a menina antes que ela fosse transferida a um orfanato, quando Olga não tivesse mais condições de amamentá-la.
Anita permaneceu ao lado de sua mãe durante 14 meses. No dia em que Olga não dispunha de mais leite, o bebê pôs-se a chorar, e sua mãe disse-lhe palavras doces. Palavras essas que eram escutadas com atenção pela pequena Anita. A criança sentia que algo ruim estava para acontecer. Sentia o nervosismo da mãe. Olga deveria entregar a menina às guardas da prisão. Alegou que isso era um crime. Que ela era apenas um bebê e deveria permanecer com a mãe. Entretanto, seu pedido foi ignorado. A criança foi arrancada de seus braços, aos prantos. Essa cena do filme que retrata a biografia da comunista nos remete a um dos mais tristes e emocionantes retratos do sofrimento alheio: uma filha, ainda bebê, sendo arrancada dos braços de uma mãe. Segundo Anita afirma, ela era muito pequena quando do ocorrido, logo não pôde, portanto guardar nenhuma lembrança da mãe. Foi criada pela avó, a quem provavelmente passou a ver como figura materna. Na ausência da mãe, alguém deveria tomar essa posição. Seu desenvolvimento prosseguiu sem sinais clínicos a serem considerados, em parte, pode-se dizer, devido a essa nova relação de dependência. (Winnicott, 1988)
A dor de Olga ao ver a filha sendo levada foi tão grande que desejou não mais viver. Olga foi levada a um campo de concentração, onde seu trabalho era explorado. Continuava sobrevivendo em condições desumanas de exploração. Recebeu, certa vez, uma foto da filha e a notícia de que a criança crescia a salvo nas mãos da mãe de Prestes e de sua irmã. Isso significava uma esperança. Acredito que o sonho de reencontrar a filha após a sua libertação também deve ter servido de pulsão para Olga continuar sobrevivendo em meio a tantas atrocidades.
Olga enviava cartas cheias de amor à sua filha, dizendo que todos os dias imaginava como seria bom pegar nas suas mãozinhas e beijar seu rosto. Assim, Anita nutria um grande amor pela mãe, que mesmo longe, a enchia de afeto e de esperança. O processo de independência do bebê foi extremamente forçado. Seus direitos humanos foram violados no momento em que fora brutalmente separada da mãe.
Em suma, podemos concluir que muitos bebês são exemplos de perseverança. Existem capacidades inerentes aos bebês. Eles nascem com os sentidos consideravelmente aguçados. São capazes de exercer domínio dobre o ambiente do qual fazem parte. Estão aptos a controlar seus movimentos e a dirigir respostas a seus pais e a seus pares, influenciando na resposta que irão obter. Segundo Winnicott (1988), podemos inferir que o ambiente torna possível esse processo de desenvolvimento e de busca de autonomia por parte da própria criança, possibilitando que ela concretize seu potencial. Aprendemos a responder aos estímulos provenientes do bebê de acordo com as suas reais necessidades ao invés de partimos das nossas próprias vivências. Assim, propiciamos um ambiente seguro e acolhedor para que o desenvolvimento possa ser seguro e com reduzido número de inadaptações.
Acredito que Olga Benário teria sido uma excelente mãe. De acordo com Winnicott (1987), poderia ser a mãe ideal. Seu bebê lhe trouxe esperança para continuar a viver. Mostrou-lhe o amor verdadeiro que existe num mundo, por vezes, muito cruel. Nas palavras de Anita Leocádia Prestes, ela aprendeu a maior das lições: "Desde cedo, aprendi com a vida de meus pais, com o exemplo de minha avó e, em especial com o martírio de Olga, que vale a pena lutar por um mundo melhor para toda a humanidade. Aprendi que não devemos compactuar a com a injustiça, que é necessário lutar contra ela, apesar de todas as dificuldades".
Referências Bibliográficas
Borsa, J. C., Feil, C. F., & Nunes, Paniágua, R. M. (2007). A relação mãe-bebê em casos de depressão pós-parto. Artigo retirado em: 09/09/10, de http://psicologia.com.pt.
Braga, C., Monjardim, J. (2005). Olga. [Filme-vídeo]. Produção de Cláudia Braga, direção de Jayme Monjardim. Manaus, Pólo Industrial de Manaus, 2005. DVD, 140min, color.
Klaus, M. H., Kennel, J. H., & Klaus, P. H. (2000). O que o bebê traz com ele. Vínculo: construindo as bases para um apego seguro e para a independência (M. R. Hofmeister, Trad.). Porto Alegre: Artmed.
Mahler, M. (1982). O processo de separação-individuação (H. M. Souza, Trad.). Porto Alegre: Artes Médicas.
Piccininni, C. A., Gomes, A. G., Moreira, L. E., Lopes, R. S. (2004). Psicologia: Teoria e Pesquisa, 20 (3), pp. 223-232.
Winnicott, D. W. (1971). O Brincar & a Realidade (J. O. A. Abreu & V. Nobre, Trad.). Rio de Janeiro: Imago.
Winnicott, D. W. (1987). Os bebês e suas mães (J. L. Camargo, Trad.). São Paulo: Martins Fontes.
Winnicott, D. W. (1988). Da dependência à independência no desenvolvimento do indivíduo. O ambiente e os processos de maturação (I. C. S. Ortiz, Trad.). Porto Alegre: Artes Médicas.
Autor: Daiane Silva De Souza
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