"Tu mata mas não come"



Eu, Matinhense legitimo, de pai, mãe, avós e bisavós da terra, mais do que ninguém tem o dever de resgatar os contos causos e lendas do nosso povo. Onde alguém pode enxergar uma historia qualquer, um conto sem sentido talvez, eu enxergo meu passado, a certeza de que meu povo fez, e sempre fará historia.
Diz-se que por meados do ano de 1930, um caçador cujo nome se perdeu, talvez por essa historia ser daquelas contada de boca em boca sem nunca ter sido documentada, morava ali pras bandas do sertãozinho com sua esposa em seu rancho de taquara e ripa de palmito.
Da terra tiravam o alimento básico, arroz, feijão, mandioca, cará e o próprio palmito, dos rios tiravam os peixes como complemento. A atividade principal do homem da casa era a caça, caçava-se o ano todo, respeitando claro as épocas de reprodução de cada animal, no inverno caçavam mamíferos e aves, no verão, lagarto e alguma espécie de pássaro.
Num certo dia de inverno, o amanhecer ainda era distante, o homem já estava de pé, a mulher acendia o fogão de lenha para então preparar o café para o esposo, que sentado a mesa rústica, fazia os últimos ajustes na espingarda fogo central calibre 28, colocava cartuchos na cartucheira e limava o facão, fiel companheiro das caçadas.
Tomado o café o homem veste a bota sete léguas, põem a espingarda a tira colo e ia partir quando a mulher sai a porta e diz ao marido: - Deus que te ajude fazer uma boa caçada, o homem então se vira, cospe de lado e olhando a amasia fala: só se ele puxar o gatilho pra mim! E sorrindo parte sem dizer mais nada, deixando a esposa a porta com visível cara de tristeza.
Depois de quase um dia todo de caçada, o homem já esta no caminho de volta, quando ele avista num galho de arvore um macuco, espécie de pássaro de grande porte, mais que depressa o homem faz pontaria, nesse instante uma voz diz: - tu mata mas não come. Ele então vira o rosto a procura de quem havia dito aquilo, não encontrando nada e pensando se tratar da sua imaginação faz pontaria novamente, e a voz torna a repetir como que um aviso fúnebre, tu mata mas não come, ele novamente procura ao redor e faz pontaria ao mesmo tempo que a voz ameaça novamente, tu mata mas não come, então irritado o homem fazendo pontaria e não querendo perder a pose fala, então quero ver se não como, e puxando o gatilho mata a ave que vai tombar junto a terra úmida, sorrindo o caboclo coloca a ave no bornal e parte pra casa, sem dar a devida importância para o aviso que dizia, TU MATA MAS NÃO COME!
Chegando em casa, sem perder tempo o homem ordena a esposa para que limpe e prepare o pássaro, pois após banho iria comer o mesmo imediatamente, sem entender mas não querendo contrariar o esposo, a mulher faz o que fora pedido de forma que 30 minutos depois a ave já estava cozida e sobre a mesa a espera do marido.
Ele então senta-se a mesa, coloca em seu prato, junto a uma boa quantidade de farinha branca e molho, a mulher o observa, quando vai levar a colher a boca, de estalo arregala os olhos leva as mãos ao peito e cai ao chão como que fulminado por uma força estranha que lhe tira a vida dando validade a previsão da voz que dizia, tu mata mas não come.

Porque não acreditamos naquilo que não vemos, preferimos pagar pra ver?
O respeito é divino, quando o desconhecido se apresenta ele tem um motivo, não nos custa respeitar, o homem pagou com a vida o desrespeito ao desconhecido, se a voz dizia que tu mata mais não come, na certa tinha uma explicação, mas a arrogância humana nos impede de entender os desígnios divinos.

Autor: Leandro Silveira Tavares


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