Perguntas sobre o conceito Barbosa de Resiliência no ambiente de trabalho



Introdução

Por vezes, listar os questionamentos de alunos é a melhor maneira de ensinar o teor de uma disciplina. Essa é a razão de pedir que fossem reunidas as perguntas a mim enviadas no decorrer do último curso que ministrei sobre meu trabalho com resiliência. Solicitei que a forma de perguntas fosse preservada para se tornar um texto didático e fácil de ser consultado.

Desenvolvimento

Professor George Barbosa, como é o seu percurso de pesquisador nesse tema de resiliência?
Desde 2006, quando defendi minha tese de doutorado validando um questionário de resiliência, até agora novas pesquisas possibilitaram ampliar os entendimentos sobre a resiliência. Lá em 2006 foi apresentada nos enquadres da teoria da Terapia Cognitiva, agora em 2010 estou aprofundando os conceitos e ampliando o entendimento dos modelos das crenças determinantes (MCDs) dos estilos comportamentais que expressam a resiliência. Esses MCDs são estruturados desde a primeira infância e são crenças que se aglutinam em esquemas mentais quando vamos conhecendo / aprendendo / experimentando os fatos da vida com aqueles que nos cercam. Esses MCDs quando organizados com uma base adequada, já desde cedo, capacitam a pessoa a se comportar de forma mais coerente com as situações com maior estresse e serem flexíveis em suas convicções face as decisões a serem tomadas.
De que forma podemos definir a resiliência? Ela vem da Física?
É verdade, inicialmente no anos 60 e 70 ela esteve associada à definição dada pela física. Michael Rutter ao buscar uma terminologia que melhor explicasse esse atributo nas pessoas recorreu ao conceito empregado pela física. Porém, já no final dos anos 80 vemos que já estava se descolando dessa ideia original, e passava a apresentar a capacidade de ser flexível diante das intempéries. Nessa trajetória os pesquisadores apresentaram a resiliência mais como invulnerabilidade, depois como maior capacidade adaptativa, depois como bom manejo do estresse. Nas duas últimas décadas, ela vem sendo apresentada como uma capacidade de ser flexível ao se atribuir significados aos fatos e que pode ser desenvolvida em todo ser humano.
Mas o que é exatamente resiliência? Alguns cientistas, para explicá-la, pendem mais para a teoria do estresse, ligando-a as habilidades de resolver traumas, recorrendo-se aos mecanismos de fuga e ataque que temos. Outra vertente dos cientistas costuma explicá-la utilizando-se das teorias da terapia cognitiva e psicologia positiva, e nesse caso, apresentam a resiliência como a capacidade de uma pessoa atribuir significados adequados às suas crenças. É nessa corrente de cientistas que estruturei o meu pensamento.
Há pessoas no trabalho que conseguem lidar com "problemas" de forma muito mais tranquila do que outras. A resiliência está nessas pessoas?
Essa questão já está na gênese da definição da resiliência. Como desde 2004 estou entre aqueles cientistas que defendem que ela se estrutura a partir do manejo das crenças pessoais, mesmo quando se fala em resiliência no ambiente corporativo, eu entendo haver pessoas que aprenderam, ao longo da vida, a atribuírem significados mais rígidos às suas crenças, desde cedo na vida. Essas pessoas podem desenvolver dois tipos de esquemas mentais. O esquema mental de negativismo em suas crenças e ter um estilo comportamental, no desempenho de suas funções, de maior passividade diante das dificuldades e intempéries. Ou um esquema mental de superestimação de suas crenças e ter um estilo comportamental no trabalho de maior intolerância diante dos eventos críticos. Em ambos os casos haverá maior sofrimento e aumento da vulnerabilidade.
Por outro lado, há pessoas que, desde cedo, aprenderam a atribuir um significado adequado às suas crenças, favorecendo transitarem por diversos ambientes e situações. Essas são aquelas que cultivam maior resiliência e, consequentemente, aprendem a lidar melhor com o fracasso, a dor, a frustração, o insucesso e os traumas que a vida trás consigo.
Em geral, quais características verificam em pessoas resilientes? Eu tenho escrito e ensinado que a resiliência pode ser resumida em uma palavra: sobrevivência. E, nesse sentido, quero dizer ser a sobrevivência no ambiente profissional, psicológico, social, emocional e espiritual. Dessa forma, a resiliência se apresenta de um modo psicossomático na vida de um resiliente. O fator mais evidente, a partir desse conceito, é a flexibilidade ao atribuir significados àquilo que se acredita. Os resilientes aprendem utilizar a flexibilidade para serem em mais controlados, atentos, confiantes, saudáveis, empáticos, otimistas, carismáticos e ligados à vida. E é por isso mesmo que são conhecidos como pessoas com maior maturidade emocional.
Parece que há pessoas que passam por situações difíceis, como um processo de desligamento involuntário da empresa, e costumam revivê-las sempre, fazendo disso um drama constante. Isso acontece muito? Trata-se do oposto da resiliência? Não é uma questão de reviver lembranças ou não, é bom lembrar que os estudos de resiliência começaram com as lembranças dos sobreviventes do nazismo. Trata-se do quanto uma pessoa atribui significados com maior ou menor rigidez a uma crença que organizou a partir de uma experiência de vida. Se houver alto índice de rigidez, com certeza, haverá uma recorrência da lembrança e maior o sofrimento, tanto no sentido de uma passividade para com a situação, ou de uma intolerância com o fato que gerou a memória. Sendo assim, você tem razão será uma baixa resiliência. No entanto não por lembrar-se dos fatos de modo recorrente, mas por atribuir sempre os mesmos significados a eles, independente do tempo que eles já aconteceram.
Pessoas resilientes chegam a sofrer preconceito por parte daqueles que não têm essa ?habilidade? muito desenvolvida? (Por exemplo: costumam escutar que não ligam para as coisas ou são extremamente racionais?) Olha, o meu conceito de resiliência trabalha com 8 áreas da vida, que costumo chamar de modelos de crenças determinantes, que estruturam o estilo de vida da pessoa. Esses modelos de crenças determinantes, que você poderia entender como um conjunto de crenças em uma mesma área, são: 1) o autocontrole em uma situação que é importante para aquela pessoa, 2) a análise do contexto que a pessoa está experimentando, 3) a autoconfiança em sua capacidade de realizar o que se propõe a fazer, 4) a capacidade de conquistar e manter pessoas junto de si para elevar as condições de proteção, 5) a habilidade de ser empática, 6) a capacidade de ser otimista e alimentar a esperança diante dos percalços, 7) a capacidade de amadurecer no modo como lidar com as reações somáticas que surgem quando a tensão ou o estresse se tornam elevados e assim ler o que se passa com o próprio corpo e das outras pessoas e 8) ter o exato senso de valorização da vida, inclusive com uma clara noção de desapego daquilo que parece ser tão desejado para a grande maioria das pessoas. Agora veja, se a pessoa for muito resiliente em todas as 8 áreas, com certeza, ela será tida como chata, metódica e, eu diria que, até desligadas. Muitos não iram gostar dela. Mas se ela tiver uma leve discrepância de uma área para outra, ela se tornará uma pessoa bastante interessante de se conviver com ela.
Aproveitando o gancho da pergunta anterior, quando falamos em resiliência, muitas vezes parece que não há sofrimento diante de uma infelicidade. Comente, por favor, essa questão. Como eu lhe disse acima, não é que não exista dor, sofrimento. O resiliente passa pelos mesmos percalços que uma outra pessoa. Aliás, nos anos 70 havia esse entendimento e chamaram aos resilientes de pessoas invulneráveis. Mas logo, isso foi corrigido. A imensa diferença está na capacidade de atribuir significado construtivo e maleável ao fato que desencadeia a dor ou o sofrimento. O evento está lá, é real. Mas a maneira de interpretá-lo é que faz a diferença.
Por superar adversidades com mais jogo de cintura na empresa, pessoas resilientes tendem a se destacar na área profissional também?
Com a mais absoluta certeza. Particularmente quando se trata de liderança e empreendedorismo.
É possível desenvolver a resiliência? Em caso positivo, como?
Essa é a pergunta chave! Como levar uma pessoa a deixar de atribuir significados RÍGIDOS às suas crenças, desde cedo na vida, SE NÓS VIVEMOS EM UMA SOCIEDADE de religiões extremadas, de fobias, de fortes preconceitos e diferenças sociais? Em minhas publicações e cursos eu levo as pessoas a desenvolverem os 08 modelos de crenças determinantes. Com esses anos de pesquisas já comprovei que uma ação pedagógica sobre eles, faz com que haja mudanças significativas em áreas essenciais do viver e a pessoa passa a ressignificar os eventos da vida de um modo mais resiliente. Eu sei que a Internet está repleta de texto que falam que para ser resiliente é preciso ser bom marido, ter bom humor, ser audacioso, gozar a vida. Mas isso são orientações baseadas em uma perspectiva do pensamento positivo e NÃO são científicas. A metodologia científica vem das pesquisas realizadas e não do senso comum.
Dê algumas dicas que podem ajudar as pessoas a ampliar a capacidade de superação (por exemplo: ser otimista, manter a calma diante dos problemas, etc.).
Trabalhar de forma disciplinada os 8 modelos de crenças determinantes, mesmo no ambiente corporativo. Cada um dos MCDs desenvolve resiliência em uma área da vida e o leque de todos eles juntos amadurecem a pessoa na tomada de decisões. Com o tempo a pessoa irá desenvolver novas rotas neuronais que irão possibilitar a pessoa ressignificar o fracasso, o trauma, o divórcio, o desemprego, o enfrentamento de competições, a morte, a doença, e assim, tornar a vida mais gostosa de ser vivida, interessante, segura e melhor aproveitada. Mesmo que haja dor ou grandes desafios!
Doutor, pode comentar mais sobre o comportamento de passividade e de intolerância nessa ótica da resiliência? A pessoa é intolerante?
Bem, esse é um conceito que tenho tido bastante empenho em explicar. Não desejo que as pessoas façam uma leitura psicológica dele e digam que um colaborador é passivo ou intolerante. Não é isso que tenho escrito. É um conceito com a abordagem comportamental. Portanto, uma pessoa, que em seu perfil psicológico pode ser introvertida ou extrovertida, está apresentando um comportamento de passividade ou de intolerância para com os eventos mais estressantes para ela. Esse comportamento de passividade ou de intolerância é estruturado pela intensidade que ela atribui às crenças que determinam o seu repertório comportamental nos dando a indicação de quanta rigidez ou flexibilidade há em suas crenças.
Poderia comentar os estilos de expressão da resiliência na rotina corporativa?
Não apenas no desempenho das atividades profissionais, mas também em outras áreas comportamentais verifica-se que o Estilo Comportamental de Passividade tem a característica do negativismo e do pessimismo. Tais comportamentos estruturam aquilo que identifico como Passividade diante das situações adversas e de alto estresse. Os psicólogos que efetuaram pesquisas identificaram essas características com a depressão. Já o Estilo Comportamental de Intolerância apresenta traços de medo e raiva. Tais comportamentos estruturam o que identificamos de intolerância face as fortes tensões e adversidades. Quando esses resultados são analisados por psicólogos há uma compreensão de que o perfil psicológico é de mania e ansiedade.
Qual deveria ser o foco ao se estruturar uma ação pedagógica da resiliência?
Tenho ensinado ns cursos e workshops que essa ação deve ser estruturada nos índices apresentados em cada um dos MCDs. Assim teremos uma ação para cada MCDs. Seja para diminuir a intensidade da rigidez quando acentuada ou para a preservação da crença, quando estiver em equilíbrio com o ambiente. Qualquer outro tipo de ação, eu penso que não é um projeto científico. Exceto quando estamos falando de um outro conceito de resiliência defendido por um outro pesquisador, como Cyrulnik, por exemplo. Aí podemos encontrar outras metodologias, mas também elas devem ser embasadas em pesquisas dos índices e não nos achados da internet ou nos livros de auto-ajuda.

Dr. Barbosa, em seu conceito de resiliência deve-se desenvolver resiliência a partir do mapeamento dos índices apresentados em cada um dos MCDs de uma pessoa ou uma equipe. Como gestor o que devo desenvolver?
Deve-se desenvolver as áreas onde há fraca resiliência e maior vulnerabilidade profissional. No entanto, podemos nos atentar para a vulnerabilidade social, física, conjugal ou mesmo espiritual. Os parâmetros são: a) - Quando ocorrer a categoria "Fraca no Estilo Comportamental de Intolerância" corresponde a um esquema de crenças de alta intolerância, representando uma área de vulnerabilidade no MCD.
Por outro lado, se ocorrer a categoria "Moderada resiliência no Estilo Comportamental de Intolerância", há um valor resultante de moderada intolerância, uma área intermediária entre os fatores de risco e os fatores de proteção no MCD. Já na categoria de "Forte resiliência no Estilo Comportamental de Intolerância", ocorre um padrão de leve intolerância, implica em uma área segura quanto ao MCD. Já a categoria de "Excelente resiliência" indica excelência no comportamento de resiliência no MCD.
Porém, quando resultar em "Forte resiliência no Estilo Comportamental de Passividade", resulta de um padrão de leve intolerância e uma área segura no MCD. Se indicar "Moderada resiliência no Estilo Comportamental de Passividade" é devido a moderada passividade e uma área intermediária entre os fatores de risco e os fatores de proteção no MCD. E, por fim, se ocorrer a categoria "Fraca resiliência no Estilo Comportamental de Passividade" há um esquema de crenças com alto pessimismo e uma Área de Vulnerabilidade quanto a esse MCD.
Desde 2006, eu tenho publicado que o mapeamento de um padrão de respostas com "Fraca resiliência" tanto no estilo de Passividade ou de Intolerância, corresponde a um valor extremado devido um esquema de crenças que reflete um padrão de alta intolerância, representando uma área de vulnerabilidade no que se refere a resiliência nesse MCD. E que carece de atenção.
Nota: Essas perguntas foram levantadas durante o Curso de Capacitação Comportamental, oferecido pela Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo, a professores e gestores de pessoas no segundo semestre de 2010. Outras perguntas ou dúvidas faça contato comigo: [email protected]

Autor: George Barbosa


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