CONTROVÉRSIAS ACERCA DA DISPENSA MOTIVADA NO BRASIL E NA ARGENTINA ANTE AO TRATADO DO MERCOSUL



RESUMO

O presente trabalho trata-se de pesquisa bibliográfica calcada em direito comparado, que teve como ponto nodal a questão da dispensa por justa causa do empregado pelo empregador, onde traçamos um panorama internacional do instituto, investigando acerca desta modalidade de resolução do contrato de trabalho em várias nações e traçando um contraponto entre a realidade destes países e sua influência na legislação laboral de Brasil e Argentina. Perquerimos acerca dos Critérios Norteadores da rescisão direta motivada no ordenamento jurídico brasileiro e argentino, aprofundando a discussão com a análise das similaridades e dicotomias entre os ordenamentos jurídicos destes países. Averiguamos o impacto do advento do Mercosul e suas consequências na contratação e rescisão do contrato de trabalho, finalizando nossa pesquisa com a análise crítica da harmonização da legislação entre os países membros do projeto integracionista sulamericano e sua efetiva aplicabilidade na resolução das lides de cunho trabalhista.
PALAVRAS CHAVE. Dispensa. Motivada. Mercosul


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO
2. DISPENSA MOTIVADA DO EMPREGADO ? PANORAMA INTERNACIONAL DA APLICABILIDADE DO INSTITUTO E INFLUÊNCIA DAS CONVENÇÕES DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO
2.1 ? Critérios Norteadores da Dispensa motivada do empregado pelo empregador no ordenamento jurídico brasileiro
2.2 - Critérios Norteadores da dispensa motivada do empregado pelo empregador no ordenamento jurídico argentino
2.3 ? Similaridades e dicotomias entre a legislação brasileira e argentina
3.0 ? O ADVENTO DO MERCOSUL E SUAS CONSEQUÊNCIAS NA CONTRATAÇÃO E RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
4.0 ? ANÁLISE CRÍTICA DA HARMONIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA ENTRE OS INTEGRANTES DO MERCOSUL E SUA EFETIVA APLICABILIDADE
5.0 - CONCLUSÃO



INTRODUÇÃO

Desde os primórdios da civilização, o trabalho apresenta-se como tarefa essencial do indivíduo, consistindo em uma ação humanizada inserida em contexto social específico, que procede da atividade recíproca entre o trabalhador e os meios de produção, significando ainda, uma fonte de realização pessoal correlacionada com as expectativas de progresso e desenvolvimento particular, dada sua primordial característica que remonta à subsistência.
Ante a importância do exercício laboral para o empregado e sua sujeição ao poder potestativo do empregador, inerente ao direito de comando, controle e fiscalização, é preocupação recorrente dos operadores do direito, em dotar os ordenamentos jurídicos de mecanismos eficazes no intuito de salvaguardar o direito das partes no que tange ao cometimento de faltas graves que induzam ou possibilitem a dispensa por justa causa pelo obreiro, visando manter a ordem e as garantias mínimas de limites éticos implementáveis `relação de trabalho.
Neste panorama, questões que versam sobre a legitimidade da dispensa por justa causa e critérios norteadores aptos a disciplinar a rescisão unilateral do contrato de trabalho pelo empregador mostram-se sempre relevantes, mormente quando se discutem as formas de desfazimento do liame contratual no âmbito internacional, posto que as normas norteadoras divergem de forma bastante acentuada entre os países, mesmo quando integrantes de mesmo bloco econômico, contorno que se torna ainda mais proeminente quando antevisto o impacto causado pelo fenômeno da globalização e do verdadeiro êxodo profissional proporcionado pela abertura das fronteiras laborais, tendo em vista que hoje se privilegia a competência em detrimento da nacionalidade.
Esta assertiva é corroborada pela criação de zonas de cooperação econômica, dentre as quais se enleva com destaque no presente estudo o Mercosul, que teve sua real gênese com o advento do Tratado de Assunção, que representa o instrumento jurídico fundamental do projeto integracionista, considerado como uma pseudo "carta constitucional", posto que fixa metas, prazos e instrumentos para integração dos países da Latino América.
Delimitando a questão laboral a ser averiguada, inserida em um parâmetro comparativo entre as normas vigentes no Brasil e Argentina, estabelecemos como ponto nodal da pesquisa ora procedida, a questão da dispensa motivada (por justa causa) no contexto brasileiro/argentino.
Diante do panorama ainda obscuro no que pertine as congruências entre a dispensa motivada nos contratos de emprego entre países coligados por Tratado Internacional, uma indagação se faz latente: quais os critérios norteadores comuns à dispensa motivada no âmbito da legislação trabalhista brasileira e argentina?
Tal pergunta motivou o estudo pelo qual iremos perquerir acerca das similaridades e dicotomias existentes entre as hodiernas legislações juslaboristas destes países, a fim de traçar um marco teórico relevante do ponto de vista científico, acadêmico, jurídico e social.
Visando responder a tal inquirição, modestamente pretendemos contribuir academicamente utilizando-nos de uma altercação mais aprofundada, para a obtenção de novas diretrizes cientificamente balizadas, de conclusões que poderão romper com dogmas processuais vigentes e dessa forma promover novos entendimentos e um avanço na interpretação do procedimento da dispensa motivada na seara trabalhista no panorama do Mercosul, cooperando com o estudo de novas alternativas para a pacificação das relações sociais advindas do contrato de trabalho.
Tencionando aproximar os extremos dessa discussão com o intuito de equacioná-los, realizaremos pesquisa bibliográfica, por meio do método dedutivo, utilizando como método auxiliar o comparativo, projetando a análise dos vetores dessa querela a fim de traçar um paralelo entre a legislação do Brasil e da Argentina, buscando as interseções e contestações entre ambas no que concerne a dispensa por justa causa.
A pesquisa é desenvolvida a partir de motivações empíricas e teóricas em razão da relevância da discussão que o tema aglutina, notadamente pela escassez de debates doutrinários pormenorizados sobre o assunto, visto que o acervo literário específico é restrito, lacuna que se estende ao compêndio jurisprudencial, que trata de forma subliminar o assunto, e, por conseguinte, implica em amplas restrições para a aplicação dos instrumentos aptos a salvaguardar os direitos das partes quando da resilição contratual, criando óbices a manutenção/rescisão do vínculo empregatício formal, o que enseja debates acerca da legalidade da rescisão unilateral do contrato laboral pelo empregador.
A coleta de dados será procedida mediante a consulta em livros, periódicos, artigos disponíveis na internet e jurisprudência atualizada, objetivando analisar o posicionamento doutrinário e jurisprudencial e sua efetiva aplicabilidade na seara laboral.
Como objetivo geral pretende-se investigar os critérios norteadores da dispensa motivada no Brasil e Argentina, subdividindo-se os objetivos específicos em averiguar as semelhanças e dicotomias entre as legislações doas países objetos do presente estudo, analisar a aplicabilidade das normas referentes à dispensa motivada no Brasil e na Argentina, e finalmente traçar uma análise pormenorizada sobre as vantagens e desvantagens das legislações pesquisadas sob o prisma dos direitos conferidos ao empregador e ao empregado.
De intróito, explanaremos de forma abrangente as motivações e problemática que nos coligiram a promover este estudo, seguindo, no segundo tópico com uma análise do panorama internacional no que concerne as hipóteses de dispensa motivada e a influência das Convenções da Organização Internacional do Trabalho, tratando das especificidades existentes nos critérios norteadores nos ordenamentos jurídicos de alguns países escolhidos ante suas peculiaridades e também do Brasil e da Argentina, investigando diferenças e congruências entre estas.
No terceiro tópico trataremos da aplicabilidade das normas referentes à dispensa imotivada no panorama do Mercosul, observando as peculiaridades ínsitas no tratado de integração geográfica e econômica considerando a soberania nacional de cada um dos entes envolvidos.
Como quarto e último tópico, realizaremos uma análise crítica sobre os pontos negativos e positivos de cada legislação estudada sob o prisma do empregador e do empregado, traçando parâmetro comparativo entre as normas trabalhistas de Brasil e Argentina.


2. DISPENSA MOTIVADA DO EMPREGADO ? PANORAMA INTERNACIONAL DA APLICABILIDADE DO INSTITUTO E INFLUÊNCIA DAS CONVENÇÕES DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO

Inobstante a indiscutível existência de prerrogativas universais de autonomia, que conferem às nações a supremacia e independência legislativa, bem como soberania nacional, a globalização vem intervindo de forma substancial nos modernos ordenamentos jurídicos dos países democráticos.
Tal interferência possui especial destaque no Direito do Trabalho, que também foi atingido por este fenômeno, implicando em substanciais mudanças de cunho legislativo e doutrinário, segundo lúcidos ensinamentos de Pedro Paulo Teixeira Manus, que transcrevemos:
... o fenômeno da globalização interfere no Direito do trabalho, trazendo como uma de suas conseqüências a tendência de modificações nas relações entre prestadores e tomadoras de serviços, como forma de aproximação entre os modelos jurídicos dos vários países.
A atuação da OIT ? Organização Internacional do Trabalho , bem exemplifica a interferência dos organismos internacionais nos ordenamentos jurídicos dos países membros, dada sua atuação legislativa internacional, que lhe confere diversas atribuições dentre as quais, a atuação econômica, visando garantir a concorrência mundial e a atuação humanitária, visando denunciar os abusos e irregularidades relativas às condições de trabalho, no intuito de diminuir as injustiças.
Dessa forma, considerando que a entidade conta com 192 países integrantes, não demanda exame complexo apurar sua direta intervenção na legislação laboral destas nações, que muito embora não sejam obrigadas a figurar como signatárias de todas as convenções propostas, quedam por adequá-las e respaldá-las em leis próprias, visando a manutenção da unidade buscada pela organização em um processo de internacionalização.
Neste norte, aponta Soares (2001), menções sobre a operacionalização deste processo, lecionando:
"O processo de internacionalização, que se apresenta como uma realidade palpitante e de crescente importância em nossos dias, compreende não apenas as relações políticas e econômicas, mas também as relações sociais no seu sentido mais amplo, dentre as quais as de natureza trabalhista e previdenciária. Daí, a internacionalização das normas protetivas do trabalho, instrumentalizada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), que se constitui foro competente e adequado para operacionalização dessa tutela, indispensável para se assegurar uma paz duradora, que tem como pressuposto a justiça."
Assim podemos encontrar pontos de interseção comuns às nações participantes da OIT, no que tange a questão da dispensa motivada, conquanto demonstra ser um dos tópicos que tem recebido maior atenção por parte das Convenções, visto que, historicamente, avulta, no rol das garantias fundamentais instituídas em favor do trabalhador, a estabilidade no emprego, que encontra-se atualmente comprometida e gravemente ameaçada, notadamente pelo fenômeno da globalização que criou uma crise nas relações laborais, atingindo de forma notória o contrato de trabalho ? ao menos no seu modelo tradicional.
A proteção do obreiro adquiriu contornos cogentes de estabilidade social ante as relações capitalistas de produção, fundadas no liberalismo econômico. Com o processo de globalização da economia, urge a revisão conceitual do caráter protecionista visando adequá-lo às novas contingências impostas, propiciando às empresas a rentabilidade necessária para se tornarem competitivas no mercado e, simultaneamente, preservando os direitos fundamentais do trabalhador, de maneira que o desenvolvimento ocorra com justiça social.
No contexto internacional, o empenho para alcançar esse objetivo expressou-se, acentuadamente, no âmbito da Organização Internacional do Trabalho - OIT, que aprovou importantes instrumentos normativos visando a conciliar os interesses do capital com os do trabalho, conferindo novo sentido à proteção do trabalhador.
No enfrentamento dessa situação, são promovidos esforços também por outros organismos internacionais responsáveis pela solução da questão social, entretanto, quanto a eficácia e êxito na ratificação de Convenções, confere-se especial destaque a OIT, que dentre medidas outras protetivas da relação de trabalho, insiste pela restrição da despedida arbitrária ou sem justa causa, através de sua atividade normativa, notadamente a Convenção 158, que coíbe a demissão imotivada.
A citada Convenção, na Parte I, referente às normas de aplicação geral, Seção A, concernente a justificação do término do contrato de trabalho traz menção expressa a vedação da dispensa imotivada no artigo 4°, sugerindo a continuidade da relação empregatícia a menos que exista causa justificada.
Enumera ainda, no artigo subseqüente, de forma taxativa e não meramente exemplificativa, hipóteses nas quais não será admitida a rescisão contratual pelo empregado por justa causa, dentre as quais a filiação a um sindicato ou a participação em atividades sindicais fora das horas de trabalho ou, com o consentimento de empregador, durante as horas de trabalho; a raça, a cor, o sexo, o estado civil, as responsabilidades familiares, a gravidez, a religião, as opiniões políticas, a ascendência nacional ou a origem social.
Pretensamente pelo violento bombardeio do patronato em oposição a tal convenção, bem como pelo teor taxativo das recomendações, a Convenção 158 fora mal recebida pela comunidade internacional, sendo que os signatários da citada Convenção se restringem, quase em totalidade, a nações de pequena relevância na economia global, como Camarões, República do Congo, Etiópia, Gabão, Iêmen, Lesoto, Maluí, Macedônia, Marrocos, Moldávia, Montenegro, Namíbia, Nigéria, Papua-Nova Guiné, República Centro-Africana, Santa Lúcia, Sérvia, Ucrânia, Uganda, Venezuela e Zâmbia, sendo rechaçado pelas grandes potenciais mundiais como Estados Unidos, Japão e Alemanha, bem como desprezada pelo Brasil e Argentina.
Mesmo em se considerando a baixa receptividade da Convenção 158, a mesma traz em seu arcabouço parâmetros objetivos traçados para coibir a dispensa imotivada, que servem de estrutura basilar para a aferição da gravidade de ato faltoso do empregado e sua implicação em falta grave punível com demissão por justa causa.
Para melhor compreensão das idiossincrasias que norteiam a vasta e eclética legislação laboral no que tange à matéria, colacionamos procedimentos diferenciados adotados pelos países de maior importância para o presente estudo.
Nos Estados Unidos, no que concerne à legislação do funcionalismo público, não há em seus estatutos a garantia estabilitária existente no Brasil, posto que o direito de manutenção no emprego, ou tenure , de fato existe, mas seu uso é flexível, permitindo ao Governo dispensar funcionários tanto por razões disciplinares quanto não-disciplinares, como cortes orçamentários e reestruturação de agências ou serviços. Entretanto, no direito norte americano, são utilizadas com freqüência as razões disciplinares para dispensa motivada, sobretudo quando o desempenho do obreiro for considerado fraco para os padrões do sistema, hipótese na qual o Governo tem o amparo da lei para dispensar indivíduos cuja demissão "promoverá a eficiência no serviço".
Em contraponto, a legislação de muitos países da Europa limita consideravelmente a faculdade de despedir sem justa causa, trazendo procedimentos minuciosos e custosos que muitas vezes inviabilizam a dispensa imotivada, à exemplo do que ocorre na França e Reino Unido, onde, ademais, a dispensa por justa causa exige procedimento especial e fundamentado, sob pena de reintegração ao emprego e pagamento dos salários retidos.
Por sua vez, a legislação do México assemelha-se à brasileira e traz menções específicas indicadas na seção 47 da Lei Federal do Trabalho , que constituem justificação suficiente para o empregador promover a dispensa por justa causa as seguintes hipóteses: dolo ou fraude por parte do trabalhador com seus colegas de trabalho; improbidade, ameaças ou lesões ao empregador; má conduta, indisciplina, mau comportamento inclusive fora do local de trabalho; danos intencionais ou prejuízo causado ao empregador por negligência não intencional, imprudência, atos imorais no local de trabalho, revelação de sigilo profissional, mais de três faltas injustificadas no prazo de 30 dias; desobediência; recusa do obreiro em adotar medidas preventivas de acidentes e/ou doenças; embriaguez ou consumo de bebidas alcoólicas no local de trabalho e prisão do empregado.
Finalmente, reportamo-nos a Alemanha, país no qual identificamos um diferencial bastante incomum: a seção 626 do Código Civil Alemão prevê a dispensa motivada "por uma razão convincente", deixando, como é a praxe legislativa hodierna, de enumerar as hipóteses taxativas de rescisão contratual por justa causa.
Entrementes, apesar de parecer medida temerária, porquanto atribui grande grau de subjetivismo à dispensa, convém reportar existem nas empresas um conselho, denominado de "Betriebsrat" que deve ser consultado pelo empregador antes de cada caso de despedimento com ou sem aviso prévio, sob pena de ineficácia da dispensa e sua conseqüente anulação judicial, ressalvando-se, por oportuno, que o parecer do conselho não é vinculativo para a decisão do empregador.
Neste diapasão, vemos que nas nações democráticas, independentemente do grau de protecionismo, custos sobre demissões e rotatividade laboral, possuem algumas condutas tidas como ensejadoras da dispensa por justa causa, pautados em critérios morais norteadores de uma conduta moralmente aceitável e socialmente recomendável do ponto de vista do inconsciente coletivo, dentre as quais: ato de improbidade, conduta indisciplinada, violação de segredo da empresa, agressões físicas e verbais, bem como procedimentos assediantes (assédio moral e sexual).



2.1 ? Critérios Norteadores da dispensa motivada pelo empregador no ordenamento jurídico brasileiro

A legislação juslaborista brasileira mostra-se além de conservadora, absolutamente protetiva no sentido de assegurar a manutenção do emprego e coibir a dissolução do contrato de trabalho, notadamente através de rescisão por justa causa, possuindo normas de caráter impositivo e taxativo que restringem, de forma cabal, esta modalidade de despedimento, seguindo o notório paternalismo que protege os empregados, em uma legislação que já assoberba o patronato com elevadas cargas tributárias e diversas obrigações de cunho previdenciário e de seguridade social.
Leciona a doutrina trabalhista brasileira, nos precisos ensinamentos de GIGLIO (2000):
...para a dispensa do empregado quando o ato faltoso por ele praticado constituir uma violação séria das principais obrigações resultantes do contrato de trabalho. Do ponto de vista subjetivo, somente existirá justa causa para o rompimento do vínculo se resultar irreversivelmente destruída a confiança votada no empregado, de tal forma que se torne virtualmente impossível a subsistência da relação de emprego.
Entretanto, indispensável frisar que não se considera qualquer ato faltoso, mesmo que grave, como ensejador da demissão motivada pela justa causa. Assim, a doutrina e jurisprudência são pacíficas acerca de determinados requisitos, a serem considerados quando da averiguação da possibilidade da dispensa motivada, segundo elencamos: a) gravidade do ato faltoso; b) atualidade do ato faltoso, isto é, tão logo conhecida a prática delituosa, deve o empregador providenciar a punição ao obreiro, sob pena de sua inércia ser interpretada como perdão tácito; c) nexo causal entre a falta grave e a rescisão; iv) proporcionalidade entre ato faltoso e punição, o que impede uma sanção acima de limites considerados razoáveis, como, por exemplo, uma dispensa por um atraso de 10 minutos nos trabalho, em vez de uma advertência; v) óbice legal à aplicação de dupla penalidade para uma mesma falta.
Para a configuração da justa causa, a Consolidação das Leis do Trabalho se vale do disposto no artigo 482, enumerando, taxativamente, e não de forma exemplificada, as hipóteses nas quais poderá valer-se o empregador da resolução do contrato de trabalho, aludindo os seguintes motivos, em estudo preparado por GIGLIO (2000):
1) Ato de Improbidade - Improbidade, regra geral, é toda ação ou omissão desonesta do empregado, que revelam desonestidade, abuso de confiança, fraude ou má-fé, visando a uma vantagem para si ou para outrem. Ex.: furto, adulteração de documentos pessoais ou pertencentes ao empregador, etc.
2) Incontinência de Conduta ou Mau Procedimento - A incontinência revela-se pelos excessos, a inconveniência de hábitos e costumes e/ou a imoderação de linguagem ou de gestos, ocorrendo quando o obreiro comete ofensa ao pudor, pornografia ou obscenidade, desrespeito aos colegas de trabalho e à empresa. Já o mau procedimento é tido como o comportamento irregular do empregado, com prática de atos que firam a discrição pessoal, o respeito, que ofendam a dignidade, tornando impossível ou sobremaneira onerosa a manutenção do vínculo empregatício e que não se enquadre na definição das demais justas causas.
3) Negociação Habitual ? quando, sem autorização expressa do empregador, por escrito ou verbalmente, o obreiro exerce, de forma habitual, atividade concorrente, explorando o mesmo ramo de negócio ou exercendo atividade outra que, embora não concorrente, prejudique o exercício de sua função na empresa.
4) Condenação Criminal ? há impossibilidade material de subsistência do vínculo empregatício, uma vez que, cumprindo pena criminal, o empregado não poderá comparecer para cumprir expediente. É obrigatório o trânsito em julgado da sentença condenatória.
5) Desídia ? Via de regra, consiste na repetição de pequenas faltas leves, que se vão acumulando até culminar na dispensa do empregado. Atrasos freqüentes e injustificados, baixa produtividade, produção imperfeita e outros fatos que denotem o desinteresse e falta de zelo do trabalhador.
6) Embriaguez Habitual ou em Serviço - Para a configuração da justa causa, é irrelevante o grau de embriaguez e tampouco a sua causa, sendo bastante que o indivíduo se apresente embriagado no serviço ou se embebede no decorrer dele.
7) Violação de Segredo da Empresa - A revelação só caracterizará violação se for feita a terceiro interessado, capaz de causar prejuízo à empresa, ou a possibilidade de causá-lo de maneira apreciável.
8) Ato de Indisciplina ou de Insubordinação - A desobediência a uma ordem específica, verbal ou escrita, constitui ato típico de insubordinação; a desobediência a uma norma genérica constitui ato típico de indisciplina. Ambas se constituem em atentado a deveres jurídicos assumidos pelo empregado pelo simples fato de sua condição de empregado subordinado.
9) Abandono de Emprego - A falta injustificada ao serviço por mais de trinta dias faz presumir o abandono de emprego, conforme entendimento jurisprudencial.
10) Ofensas Físicas - constituem falta grave quando têm relação com o vínculo empregatício, praticadas em serviço ou contra superiores hierárquicos, mesmo fora da empresa. A legítima defesa exclui a justa causa.
11) Lesões à Honra e à Boa Fama - São considerados lesivos à honra e à boa fama gestos ou palavras que importem em expor outrem ao desprezo de terceiros ou por qualquer meio magoá-lo em sua dignidade pessoal.
12) Jogos de Azar - Para que o jogo de azar constitua justa causa, é imprescindível que o jogador tenha intuito de lucro, de ganhar um bem economicamente apreciável.
13) Atos Atentatórios à Segurança Nacional - desde que apurados pelas autoridades administrativas, é motivo justificado para a rescisão contratual.
Além das hipóteses acima, há diferentes hipóteses dependentes da categoria profissional do obreiro, que constituem, também, justa causa específica para resolução contratual:
a) Bancários - Falta Contumaz no Pagamento de Dívidas Legalmente Exigidas
b) Aprendiz - Faltas Reiteradas - A falta reiterada do menor aprendiz sem motivo justificado constitui justa causa para a rescisão contratual.
c) Ferroviário - Constitui falta grave quando o ferroviário se negar realizar trabalho extraordinário, nos casos de urgência ou de acidentes, capazes de afetar a segurança ou regularidade do serviço.
Atente-se, ainda, que "há necessidade de dolo do empregado, da vontade de praticar o ato e não a mera culpa, como por negligência, imprudência ou imperícia do obreiro.
Quando da dispensa motivada, o empregado perderá muitos dos benefícios financeiros e assistenciais atinentes a rescisão sem justa causa, dentre os quais aviso prévio, férias proporcionais, 13° salário proporcional, seguro desemprego e multa de 40% do FGTS, fazendo jus tão somente ao saldo de saldo de salário, férias acrescidas de terço constitucional (se vencidas) horas extras, DSR, gratificações, prêmios e adicional noturno (se
existentes e pagos com habitualidade).
Por esta razão o cometimento da justa causa é apurado com peculiar atenção pela Justiça Especializada do Trabalho, que só reconhece a aplicação da medida extrema em casos de comprovado cometimento de falta grave, dolosamente provocado, havendo ainda que se excluir, o perdão tácito, assim considerado quando o empregador, ante ao cometimento de falta de mesma natureza mantém-se inerte possibilitando a repetição de conduta similar sem adotar tempestivamente as providências cabíveis (advertência, suspensão ou dispensa sumária).
Ante a exigência legal de comprovação sólida da ruptura contratual por ato faltoso do obreiro, com gravidade proporcional ao merecimento da punição, constitui-se como ônus do empregador segundo precisos termos do art. 818 da CLT combinado com o art. 333, II, do CPC, aplicado subsidiariamente, a prova da falta grave, para evitar-se, ou reduzir-se ao mínimo, a possibilidade de se praticar injustiça, imputando ao trabalhador a pena capital trabalhista sem lastro factual.
Assim, na seara processual é imposto ao empregador a prova inequívoca do cometimento da falta, devendo o mesmo desincumbir-se a contento de tal ônus sob pena de ter desconsiderada a justa causa, em muitos casos tendo de comprovar durante dilação probatória que incorreu o obreiro em ato de deliberada má fé ou dolo, posto que em algumas das hipóteses a mera culpa pode elidir a responsabilidade do trabalhador.
Frise-se, que na legislação brasileira, a dúvida razoável, é suficiente para descaracterizar a ocorrência da conduta típica do art. 482 da CLT. Deve o empregador agir conforme a proporcionalidade da falta, evitando-se chegar ao extremo do rompimento do contrato trabalhista, entendimento uníssono, adotado pelos Tribunais Regionais do Trabalho e também pela mais alta Corte, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho, conforme julgados cujas ementas transcrevemos:
JUSTA CAUSA. ATO DE IMPROBIDADE. A extinção do contrato de trabalho por justa causa constitui a mais grave penalidade na esfera trabalhista e somente pode ser reconhecida em juízo mediante prova clara e robusta do alegado, haja vista as conseqüências nefastas que podem causar na vida privada e profissional do trabalhador. Na hipótese, o acervo probatório produzido nos autos prova satisfatoriamente a prática do ato de improbidade que o empregador imputa ao empregado, impondo-se reconhecer a falta obreira. (TRT23. RO - 00837.2007.009.23.00-5. Publicado em: 30/04/2008. 1ª Turma. Relator: DESEMBARGADOR ROBERTO BENATAR)
"JUSTA CAUSA - ÔNUS PROBATÓRIO - A justa causa por autorizar a rescisão contratual sem ônus para o empregador deve ser por ele cabalmente provada. Não trazendo o empregador elementos robustos de prova da falta grave alegada, descumpriu o ônus probatório que lhe foi imposto por Lei, correta a reversão da justa causa aplicada. Recurso conhecido e não provido." (TRT 10ª R. - RO 00129-2006-021-10-00-8 -1ª T. - Relª Juíza Cilene Ferreira Amaro Santos - DJ. 02.08.2006).
Pelo aludido, queda indubitável que a legislação do Brasil já se mostra deveras protecionista, razão pela qual recebe com muita cautela proposta e convenções que versem sobre estabilidade e dispensa motivada.
Certamente por esta razão, a Convenção 158 da OIT fora um das poucas que o Congresso Nacional brasileiro não ratificou, sob o argumento de que o país já impõe um dos maiores custos sobre as demissões e baixa flexibilidade na contratação, o que seria agravado com a incorporação da Convenção 158, inibindo a abertura de novos postos de trabalho em razão das dificuldades impostas para a rescisão desses contratos.
No Brasil, essa proteção consistiu, basicamente, na estabilidade no emprego, cuja rigidez foi quebrada por sucessivas medidas flexibilizatórias do contrato de trabalho e, recentemente, pela Constituição de 1988, relativizada nos moldes preconizados pela OIT.


2.1 ? Critérios norteadores da dispensa motivada pelo empregador no ordenamento jurídico argentino

A "Ley de Contrato de Trabajo" traz em seu arcabouço garantias a manutenção do emprego, seguindo corrente dominante pela qual é elevado o princípio da continuidade da relação empregatícia, dispondo em seu art. 10: "Em caso de duda las situaciones deben resolverse a favor de la continuidad o subsistencia del contrato."
No mesmo diploma legal, no art. 62, concernente a "Obligación genérica de las partes" há a determinação de que as partes estão obrigadas, ativa e passivamente a cumprir tão somente as cláusulas pactuadas em contrato, estatutos profissionais ou convenções coletivas em concordância com demais dispositivos legais constantes da LCT e Código Civil
No artigo 242 da LCT encontramos menção expressão à dissolução do liame empregatício por justa causa:
"Una de las partes podrá hacer denuncia del contrato de trabajo em caso de inobservancia por parte de la outra de las obligaciones resultantes del mismo que configurem injuria y que, por su gravedad, com consientra la prosecusión de la relación.
La valoración deberá ser hecha prudencialmente por los jueces, teniendo em consideración el caráter de las relaciones que resulta de um contrato de trabajo, según lo dispuesto em la presente ley, y las modalidades y circunstancias personales em cada caso.
Seguindo um modelo similar ao adotado pela legislação alemã, a Argentina também não enumera as hipóteses taxativas para a dispensa motivada, restringindo-se a estabelecer que ambas as partes podem denunciar o contrato de trabalho por descumprimento das obrigações pactuadas pela outra parte, sempre que tal inadimplemento resulte em óbice intransponível a continuação da relação empregatícia, fundamento universal utilizado como sustentáculo de todas as legislações pesquisadas no presente estudo, entretanto passível de interpretações dissonantes.
Segundo MAZA (2008), em comentário aos artigos acima transcritos:
Los dos artículos precedentes se refieren, según examinamos, a la ruptura del contrato por la decisión unilateral del trabajador (renuncia) o por um acuerdo disolutorio de ambas as partes. El empleador en nuestro régimen legal no está facultado para romper por su sola voluntad el contrato, salvo que medie una causa justificada y, en tal caso, el régimen jurídico lo habilita a despedir.
Pelos ensinamentos do ilustre doutrinador supramencionado, consiste a justa causa na denúncia do contrato de trabalho feita pelo empregador quando considera que o empregado incorreu em inadimplemento de seus deveres, constituindo a "injuria grave", ressaltando que o posicionamento doutrinário e jurisprudencial confere ao termo "injuria" o mesmo conceito de descumprimento.
Encontramos, no art. 244 da LCT a única citação expressa quanto a caracterização comissiva de descumprimento de obrigação contratual pelo empregado, referente ao abandono de emprego, situação fática típica, que constitui premissa para a dispensa direta em todos os ordenamentos analisados na presente pesquisa. Ainda assim, exige-se a prévia intimação do obreiro, que deverá ser previamente constituído em mora.
No ordenamento laboral argentino, além do descumprimento por parte do obreiro, outros requisitos mostram imperativos para a caracterização de falta grave punível com dispensa por justa causa, os quais passaremos a conceituar e ilustrar.
O princípio da contemporaneidade disciplina que deve haver uma conexão temporal entre a data da falta grave imputada ao trabalhador (ou da cientificação do empregador do cometimento da mesma) e a data da dispensa, no dizer de BANGUESES (2008):
Para evaluar este recaudo hay que tomar como punto de partida el momento em que la parte agrviada tuvo conocimiento del incumpliemiento que se propone invocar y la fecha em la que finalmente dispone el distracto.
O princípio da proporcionalidade, como imposto na seara juslaborista, implica uma adequação axiológica e finalística pelo operador do direito do poder-dever de hierarquizar princípios e valores de maneira adequada nas relações de emprego e no controle delas, culminando com a obrigatoriedade das partes, em especial do patronato em punir a infração segundo sua real potencialidade ofensiva. É cediço que nem todo ato faltoso constitui motivo suficiente à dispensa motivada, muito embora reflita de forma negativa no perfil profissional do obreiro, devendo o empregador agir de forma a punir com correção e justiça a falta cometida, sem exorbitar em suas prerrogativas administrativas inerentes ao poder disciplinar.
Atualmente, no que concerne ao âmbito laboral, ao quesito proporcionalidade é conferido status elevado, de cunho universal, conforme bem afirma VIDAL (2006) :
No es posible concluir, sin embargo, que la doctrina laboral sea completamente ajena a los defectos estructurales Del principio de proporcionalidad aplicado en las relaciones horizontales, o sea, entre particulares, ya siendo posible detectar importantes intentos no sentido de cuestionar la aplicación universal del principio a medida que su inserción en el derecho laboral ha propiciado una eclosión de restricciones de todo tipo, muy superior a la de otros campos.
Como terceiro requisito exige-se a formalização do ato através de notificação por escrito, com indicação suficientemente clara, ou seja, em linguagem acessível e direta, sobre os motivos nos quais se funda a ruptura do pacto empregatício, conforme determinação expressa do art. 243 da LCT , determinando que sempre que houver a dissolução do contrato de trabalho, seja por rescisão indireta ou direta, deve ser procedida comunicação por escrito à parte pretensamente faltosa, que não poderá ser suprimida, ampliada ou modificada posteriormente.
De acordo com o averiguação procedida, observa-se que a dispensa por justa causa na Argentina, mostra-se atada a formalismos diversos, o que nos leva a constatação de que tenta-se preservar ao máximo o contrato laboral, evitando a flutuação e migração nos postos de trabalho.


2.3 ? Similaridades e dicotomias entre a legislação brasileira e argentina

Comprovamos que dentre as similaridades existentes entre a legislação brasileira e argentina está a manutenção da autonomia legislativa e jurídica, visto que, conforme visto alhures, as legislações laborais específicas disciplinam a dispensa motivada de forma livre, com sujeição controladas às convenções e tratados internacionais, resguardando-se tanto quanto possível de tornarem-se signatários de diplomas que possam atribular a normatização interna ou prejudicar as relações laborais já bem postas ante uma estrutura normativa aceita e bem utilizada pelos operadores do Direito.
Comprova-se esta assertiva pela posição adotada pelo governo brasileiro e pelo governo argentino ao descartarem a adesão a Convenção 158 da OIT, alegando de forma semelhante, que a inclusão de novos limites à rescisão imotivada traria prejuízo a empregabilidade.
No estudo mais acurado das normas disciplinadoras da rescisão motivada pelo empregador no Brasil e na Argentina, pudemos traçar um paralelo bem delimitado sobre as congruências e discrepâncias entre estas, confrontando diretamente os ditames preconizados na CLT e na LCT, embate no qual nos impressionamos com as peculiaridades de cada legislação e como ambas, aparentemente antagônicas, quedam por propiciar ao jurisdicionado a firme defesa de seus interesses difusos e coletivos.
Comecemos, pois, pelos pontos de interseção, dentre os quais destacamos a clara preocupação do legislador brasileiro e argentino com a continuidade da relação empregatícia, motivo pelo qual fora consagrada na CLT e na LCT a proibição à dispensa arbitrária, sujeitando o empregador ao pagamento de indenização quando da dispensa sem justificativa plausível.
Em ambas as legislações se exige o requisito da contemporaneidade para a ruptura do pacto empregatício por justa causa,isto é, que o ato faltoso tenha sido cometido em lapso temporal próximo ao da rescisão contratual, sob pena de ocorrer o que chamamos de perdão tácito, como bem ilustrado por Maza (2008):
"... la decisión de romper el contrato debe tener uma conexión temporal cercana com el hecho invocado, pues de lo contrario ES factible pensar que no tornaba imposible na prosecución del vínculo, es decir que no tenia la gravedad siuficiente o bien que la falta fue consentida por quien sufrió la injuria.
Prosseguindo com as similaridades, temos que ambos os ordenamentos se reportam à proporcionalidade na aferição do gravame da falta cometida pelo empregado para a aplicação da medida punitiva cabível, assentindo no entendimento de que não há que se cogitar de despedida por justa causa quando é flagrante a desproporcionalidade entre a falta cometida e a sanção aplicada, mormente quando constitui-se em ato inerente do poder potestativo do empregador que pode inquinar a vida profissional do obreiro, acarretando-lhe consequências indeléveis.
Finalmente identificamos ainda, a vedação expressa à cumulação de penalidades por um mesmo ato, imposta em razão da proibição do "bis in idem" preceito máximo consagrado pelo Direito em todas as suas esferas.
Após tantas paridades, destaquemos as divergências mais importantes a análise da aplicabilidade das normas referentes a resolução do contrato de trabalho.
A legislação brasileira ocupou-se em trazer em dispositivos legais apartados as hipóteses de rescisão unilateral do contrato de trabalho, disciplinando nos arts. 482 e 483 da CLT, respectivamente, as hipóteses categóricas para rescisão do contrato pelo empregador (rescisão direta/resolução) e pelo empregado (rescisão indireta). Observe-se que as hipóteses, à exceção de ofensas físicas ou morais, são artigos de conteúdo divergente, ou seja, as faltas de empregado e empregador são listadas seguindo preceitos diversos.
Já a legislação argentina, adotou o modelo alemão, apenas citando que qualquer caso considerado injúria poderia ser motivo de justa causa, eximindo-se de relacionar taxativamente as hipóteses de seu cabimento e deixando ao prudente arbítrio dos juízes a análise do caso concreto, conferindo, então, um caráter de maior abrangência e subjetividade.
Na contramão da legislação laboral do Brasil, que privilegia os princípios da informalidade e primazia da realidade, a legislação da Argentina exige o requisito formal da notificação por escrito do obreiro e citação específica e clara dos motivos que ensejaram a dispensa.
No Brasil, a lei não prevê uma forma específica para a comunicação da justa causa para o empregado, aliás, nos parece que norteia suas determinações em direção diametralmente oposta, visto que veda que o empregador conste o motivo ensejador da demissão por justa causa na Carteira de Trabalho do empregado, uma vez que este ato iria dificultar ou mesmo, inviabilizar que o trabalhador conseguisse um novo emprego.
No caso brasileiro, a falta de comunicação por escrito da alegada falta grave, só a faz presumir-se como inexistente, se houver cláusula expressa constante de acordo ou convenção coletiva da categoria profissional do obreiro que assim o determine.
Finalmente, enquanto o ordenamento jurídico laboral argentino impõe que, ante a conjectura de abandono de emprego, a empresa está obrigada a prévia constituição em mora do trabalhador, com intimação do mesmo para que retorne a suas atividades habituais, no Brasil, não é exigível a constituição em mora, bastando a prova que o empregado deixou espontânea e injustificadamente de comparecer para exercer sua função, o que pode ser provado inclusive por exibição de cartões de ponto e prova testemunhal.


3.0 ? O ADVENTO DO MERCOSUL E SUAS CONSEQUÊNCIAS NA CONTRATAÇÃO E RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

Ao longo de sua história, a América Latina sofreu uma infinidade de solavancos políticos que acarretaram atrasos econômicos e sociais, e, como principal prejuízo a clausura dos Estados latino americanos dentro de suas próprias fronteiras, notadamente quando dos golpes militares que a partir da década de 60 do último século, se fizeram presentes em todo o continente latino.
Na década de 80, com a reabertura política na região, chegam ao poder governos civis, e, paralelamente começa a reaproximação dos países vizinhos, tendo como ponto de partida a Declaração de Iguaçu assinada pelos então presidentes José Sarney, do Brasil e Raul Alfonsin, da Argentina, em 30 de novembro de 1985, pela qual, Brasil e Argentina, expressam sua firme vontade de acelerar o processo de integração bilateral com propósitos pacíficos. Cria-se então, a Comissão Mista de Alto Nível, presidida pelos Ministros das Relações exteriores dos dois países. Era o "início" do Mercosul.
A partir de então, segue uma série de encontros e tratados entre os Estados parte do Cone sul, dentre eles: Acordo de Integração e Cooperação Econômica Brasil-Argentina, em junho de 1986, Tratado de Cooperação Integração e Desenvolvimento, assinado em novembro de 1988, Estatuto das Empresas Binacionais (Brasil e Argentina), de julho de 1990.
O processo de globalização, acentuado na última década, havia finalmente se assentado em terras latinas, e, por reflexo, trouxe consigo como uma das conseqüências, a regionalização comercial na forma de blocos econômicos, fenômeno que enfim, repercutiu com mais fulgor na América do Sul, que, em prol do desenvolvimento criou o bloco econômico, denominado Mercosul, composto atualmente por Estados membros (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) e estados associados, Chile, Bolívia, entre outros.
O Mercosul, é um projeto integracionista que vem se desenvolvendo desde o início dos anos 90, como já dito, a partir das primeiras tentativas de cooperação econômica entre o Brasil e a Argentina.
Assumiu sua primeira conformação institucional em 1991, com o Tratado de Assunção. Buscou unificar inicialmente os mercados do Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, que são Estados partes do Mercosul, atualmente conta também com Estados associados como Chile e Bolívia, e com candidatos demonstrando interesse em a participar do Mercosul, como Peru, Venezuela e Equador.
Economicamente, o Mercosul pretende ser um mercado comum, estabelecendo o Tratado de Assunção em seu artigo 1º: "Os Estados decidem constituir um mercado comum que deverá entrar em vigência até 31 de dezembro de 1994, e que se denominará Mercado Comum do Sul, Mercosul".
Elucidativa a lição de Silva (2009): "O mercado comum objetiva a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre Estados membros através da eliminação dos direitos aduaneiros, das restrições de tarifas para a circulação de mercadorias, estabelecimento de tarifas externas comuns, adoção de uma política comercial comum frente a terceiros países, elaboração de um programa de liberação comercial, elaboração de políticas macroeconômicas entre os países partes. Almeja assegurar condições adequadas de competência entre os Estados membros com o compromisso de harmonizar suas legislações e de fortalecer o processo de integração."
Entretanto, inúmeros são os problemas do Mercosul, sendo um dos maiores a questão trabalhista, se antevendo que toda a América Latina, enfrenta problemas sócios/econômicos, desde a sua colonização pela Espanha e Portugal, fato gerador da exclusão que assola a Latino América, que conta com milhões de analfabetos sem qualificação profissional e camponeses sem terra, devido a grande concentração de latifúndios, concentração de renda em camadas privilegiadas da sociedade moderna, devido, precipuamente, a inexistência de uma política agrária eficaz, ao déficit tecnológico e ampla rotatividade de empregos, aliados ainda, a proliferação dos empregos informais e do dumping social, mácula maior dos países emergentes.
Saliente-se que em razão dos obstáculos existentes no percurso do desenvolvimento do Mercosul (crises econômicas, políticas, tentativa de imposição da ALCA, etc), o avanço obtido com a formação do grupo econômico tem se mostrado deveras tímido, quando não inexistente. É manifesto que há muitos anos o Mercosul está estagnado, restringindo-se a encontros de chefes de Estado, onde muito é debatido e pouco é efetivamente solucionado.
Na correta análise de SIMÕES (2001), o Mercosul está na atual fase de "União Aduaneira Imperfeita, por ainda existir lista de exceções às isenções tarifárias de importação e por haver indefinições temporais na aplicação da Tarifa Externa Comum", mas ainda assim é um bloco notável, com uma área de " 11,9 milhões de quilômetros quadrados, equivalentes a 9% da superfície ocupada por todos os países do mundo, o Mercosul tem 211,5 milhões de habitantes e um Produto Interno Bruto (PIB) da ordem de US$ 1,01 trilhões."
Dentre os países integrantes do Mercosul, o Brasil é o que apresenta o processo de urbanização mais acelerado, embora com uma concentração urbana menor do que a da Argentina. O fenômeno da urbanização é relevante para a integração porque as cidades tendem a representar um potencial de mercado maior do que as zonas rurais. Destarte, quanto mais urbanizado o parceiro comercial, maior tende a ser o seu mercado potencial.
Contraditoriamente, maior parte da população está a margem do processo econômico, o que resvala em uma situação desconexa: parte da população altamente abastada e profissionalizada convivendo lado a lado com população empobrecida, desqualificada cultural e tecnologicamente, sendo inconteste que nos grandes centros o problema se agrava ainda mais, com elevada taxa de desemprego e grande o número de pessoas sem profissão e até profissionalizados condenados à situação de indigência.
Agrava a situação dos trabalhadores mercosulistas, as políticas trabalhistas dos Estados partes do Mercosul que tendem a mecanização da força de trabalho, a precarização dos contratos e a flexibilização de fato e de direito das normas protetivas mínimas do trabalhador.
O Tratado de Assunção, a princípio silenciou sobre as relações de trabalho no bloco, urbanas e rurais, vindo, tão somente após uma década, através de pressão política e sindical, a criar o Subgrupo de Trabalho número 11, (atual Subgrupo 10), ocupado com as relações de trabalho, emprego e previdência social.
Através de estudos desenvolvido por este Subgrupo que se detectou a necessidade da adoção de uma carta de direitos fundamentais do Mercosul, a exemplo do ocorrido na União Européia.
Na tentativa de conferir maior efetividade as recomendações da carta, fora instituído, em 1997, um Observatório Sobre Mercado de Trabalho, que possui a função precípua de acompanhar os indicadores macroeconômicos e setoriais, constituindo-se num espaço de negociação de soluções e medidas para problemas emergenciais de desemprego e visando a geração de empregos.
Em 1998 foi aprovada a Declaração Sócia Laboral do Mercosul, também chamada de "Carta Social do Mercosul", que possui a finalidade de estabelecer direitos fundamentais a serem observados por todos os Estados Membros, dentre os quais a não discriminação e promoção da igualdade, a eliminação do trabalho forçado, garantias de liberdade de exercício de qualquer profissão ou ofício, abolição do trabalho infantil e aumento progressivo da idade mínima para ingresso no mercado de trabalho, liberdade sindical, negociação coletiva e direito de greve.
Todavia, ante a previsão do art. 20 da Carta Social , estes devem ser tomados apenas como diretrizes no tocante à legislação e atividade sócio-laboral dos países do Mercosul, o que leva ao adiamento perene de medidas mais drásticas e eficientes no que concerne a unificação das normas trabalhistas.
Além do silêncio no que atine a política social e relações de trabalho, a questão da livre circulação de trabalhadores é apontada como outro indício de imperfeição do Tratado de Assunção.
O Mercosul, diferentemente do Tratado de Roma, objetiva tão somente assegurar a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países, dispondo o artigo 1º do Tratado de Assunção que:
"Este Mercado Comum implica: A livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países, através, entre outros, da eliminação dos direitos alfandegários e restrições não tarifárias à circulação de mercadorias e de qualquer outra medida de efeito equivalente".
No entanto, existem interpretações dissonantes ao exato texto do tratado, entendendo que pessoas também são fatores produtivos e que a livre circulação está implicitamente assegurada, dubiedade de interpretação que causa dissensões de posicionamento entre os estudiosos do tema.
O artigo 1º do Tratado de Assunção em seu parágrafo último assegura o compromisso dos Estados-Partes de "harmonizar suas legislações nas áreas pertinentes para fortalecer o processo de integração." Denota-se inquietação do legislador da Carta Constitutiva do Mercosul com os desníveis de desenvolvimento existente em todas as suas áreas, notadamente porque, segundo o intuito do tratado, durante o processo em direção ao mercado comum, tais diversidades necessitarão ser expurgadas ou, no mínimo, arrefecidas para a obtenção da maior homogeneidade possível entre os Estados-Partes.


4.0 ? ANÁLISE CRÍTICA DA HARMONIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA ENTRE OS INTEGRANTES DO MERCOSUL E SUA EFETIVA APLICABILIDADE

O sistema adotado pelo Grupo Mercado Comum (1992), para determinar eventual harmonização na legislação trabalhista foi o de assimetrias, que conforme aprovação do grupo Mercado Comum tem o seguinte entendimento:
Deve-se entender por assimetria toda vantagem ou desvantagem que um país impostos ou outra intervenção do Estado que afete a competitividade de produtos ou de setores. Não se tenha em relação aos demais parceiros do Mercosul, proveniente de regulamentação, subsídios, consideram assimetrias as diferenças de competitividade decorrentes da dotação de recursos ou capacidade adquirida.
Estamos cientes de que a harmonização proposta não irá ser converter em uniformidade de condições de trabalho, quimera impraticável de alcançar ante a soberania interna de cada país integrante, motivo pelo qual o entendimento doutrinário majoritário converge na assertiva de que os preceitos que configurarem vantagem comparativa entre os países, decorrentes de uma interferência estatal no plano normativo, devem ser considerado assimetria passível de harmonização.
De outro norte, as vantagens competitivas, resultantes de condições naturais ou de qualificações existentes em um dos países, embora signifiquem, de fato, um benefício ou malefício entre os concorrentes, configuram uma desigualdade natural, que independem de regra estatal prévia, e, por conseguinte, não caracterizam uma assimetria a ser corrigida por providências administrativas ou legislativas de cada membro.
As supramecionadas assimetrias estão sendo alinhadas mediante o levantamento da legislação dos quatro países, valendo destacar que nem sempre a norma converte-se em prática efetiva dos ditames legais, seja pela revogação por leis posteriores, abundantes na legislação hodierna da Latino América ora pela sobreposição de jurisprudência dominante e reiterada. Deste modo, para aplicação da assimetria há que se sopesar não somente a lei escrita, mas a eficácia da norma, através da efetivação da prestação jurisdicional.
Dentre as incidentes formas recomendações para a adoção de regras coesivas para o Direito do Trabalho no âmbito do Mercosul, indubitavelmente a análise das convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificadas pelos diversos Estados Partes, instituem-se como princípios comuns aceitos pelos ordenamentos jurídicos nacionais e, em conseqüência a conjunto de normas comunitárias quanto á matéria.
As medidas adotadas até a presente data não se apresentam até o momento como barreira protetiva do Direito Laboral, sendo a legislação trabalhista mercosulista frágil e nem sempre é possível sua aplicação. Os sindicatos por sua vez, estão enfraquecidos ou servindo a interesses políticos, desprestigiados por estruturas e discursos arcaicos, não condizentes com a realidade do trabalho do mundo atual, servindo apenas de trampolim político.
Alude Barbosa (1991) que o "Cronograma de Las Lenãs", criado pela Decisão Mercosul/CMC/Dec. No. 1/92 dissecou de forma mais pormenorizada as relações coletivas e individuais de trabalho.
Adentrando à temática, ressalta-se que o mencionado Cronograma, bem como as diretrizes criadas para convalidação prática do Mercosul como um todo integracionista, deveriam ter por termo final a data de 31.12.94,quando então pretensamente estaria finalizada a fase de transição.
Obviamente, a necessária adequação estrutural dentro do próprio subgrupo, co-relacionada com a complexidade temática que envolve a questão, acarretou a morosidade dos trabalhos então propostos, o que implicou no descumprimento dos prazos pré-estabelecidos.
Em que pese nos adstrirmos às motes periféricos quanto à formatação estrutural do Mercosul no campo do Direito do Trabalho, notamos que estes tem ao seu final profunda confluência no Direito material em si, a começar pelo conceito de cada país integrante, diante de suas próprias e naturais peculiaridades, regulamenta de maneira distinta os direitos trabalhistas, assim como ocorre nas demais áreas do direito.
Cogente, então, a necessidade premente de se compilar teorias e princípios comuns à todos os co-participantes, visando a harmonização legislativa, a fim de que a norma dela imanente possa se tornar aplicável. Neste ínterim, criou-se a Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul que, por sua vez, gerou a Resolução Mercosul/CPC/Res. No. 1/94, seguida pela de No. 5/95.
Comungando com o entendimento de BELTRAN (1998) verifica-se, com clareza, que algumas questões que encontram-se em estudo pela Comissão retro-mencionada - emergem prioritariamente para final mobilização das regras laborais aos países membros, que se referem - dentre outras - aos encargos trabalhistas; migração de trabalhadores e normas de regularização.
Temos que, genericamente, buscar-se-á criar normas comuns de conduta afetas aos trabalhadores dos países integrantes, sem que implique em quebra de princípios tidos como fundamentais a cada um dos países signatários.
Sob este prisma, adotando entendimento similar ao de BRANCO (1997), no que tange ao cumprimento dos contratos firmados, o Brasil há de adotar o posicionamento da Lei de Introdução ao Código Civil, dispondo que a regência das obrigações competirá ao país de origem, observando-se a exceção prevista no parágrafo 1o., segunda parte, do referido artigo, que admite a existência de peculiaridades formais para revestir-se o ato de legalidade, ante a ordem jurídica local.
A Súmula 207, do Colendo Tribunal Superior do Trabalho brasileiro, jurisprudencia no sentido de que a lei a reger ditas relações é a do país onde se presta o serviço, e não o da contratação.
Este entendimento é a ratificação do que consta no Código de Direito Internacional Privado Latino-Americano (Código de Bustamante), em que pese nossos parceiros de Mercosul não serem dele signatários, posto que não o ratificaram, a despeito de adotarem o art. 198 do mencionado código, que trata da territorialidade da lei quanto à acidente e proteção social do trabalho, até dito procedimento está arraigado na praxe do Direito Internacional Privado.
Infere-se do arrazoado, que o Mercosul ainda nãoestá dotado de normatização particular que cuide das relações trabalhistas laborais de maneira uniformizada.
Convém não olvidar que se ambicionamos a efetivação de um processo integracionista retratado pela configuração do Mercado Comum, afigura-se de extraordinária urgência conferir celeridade a consolidação e concretização do consenso legislativo, para não nos perdemos em meio à globalização que assola o mercado mundial do trabalho, sob pena de, se assim não procedermos, permanecermos estagnados perante a realidade que ora limita a efetividade aplicabilidade de leis comuns trabalhistas aos países integrantes do Mercosul.


5.0 ? CONCLUSÃO

Ao término desta pesquisa muitas questões relevantes mostram-se exaustivamente debatidas dentro dos hodiernos conceitos laborais sujeitos as oscilações inerentes ao fenômeno da globalização e seus efeitos diretos, notadamente no que concerne a questão na continuidade da relação de emprego e coibição da dispensa imotivada, induzindo a normatização do instituto da dispensa por justa causa no cenário internacional.
Podemos observar que as nações mais desenvolvidas estão envoltas em um processo (certamente progressivo) de flexibilização dos direitos dos trabalhadores, o que compromete a segurança das relações laborais, notadamente no que tange a ausência de critérios objetivos para ensejar a dispensa motivada.
Vimos, com indisfarçável surpresa, que mesmo inseridos no contexto de um mesmo bloco econômico, países com panorama de desenvolvimento em muitos pontos similares, como Brasil e Argentina, divergem, de forma abissal, quando das garantias de manutenção de emprego e dispensa motivada.
No Brasil, onde o princípio tutela da proteção norteia todo o escopo normativo trabalhista, observamos uma base de sustentação mais firme no sentido de coibir a dispensa motivada, objetivando o legislador, de forma transversa, manter os postos de trabalho e impor, pela elevada carga tributária e significativo dispêndio financeiro, os trabalhadores em seus empregos.
Na Argentina, muito embora o conceito geral remeta à proteção do emprego frente à dispensa imotivada, vemos que os mecanismos legais possuem lacunas que podem ensejar entendimentos dúbios, cujo subjetivismo desafia as premissas basilares de continuidade da relação laboral.
Na legislação brasileira, o patronato encontra-se verdadeiramente atado por uma legislação paternalista, na qual predomina o "in dúbio pro operario", onde não raras vezes, o empregador, mesmo ciente de que pode dispensar o empregado por justa causa pelo cometimento de evidente falta grave, opta por seguir o caminho mais curto, e muitas vezes, menos dispendioso: rescindir o contrato de trabalho com o obreiro faltoso sem justa causa.
Isso ocorre porque a legislação do Brasil é taxativa, não só quanto as hipóteses de cometimento de falta grave, como também quanto a três outros requisitos de primordial enlevo: tem o empregador a obrigação de comprovar o ato faltoso, sua diligência no sentido de coibi-lo e ainda a comprovação do dolo (puro ou eventual) do empregado.
Na Argentina, cremos que inobstante o rigor formal do procedimento de despedimento por justa causa, que exige formalização do ato com comunicação por escrito ao trabalhador, inclusive narrando a conduta irregular que está sendo imputada ao mesmo, bem como prévia constituição em mora na hipótese de abandono de emprego, o fato de a legislação se referir a denúncia por descumprimento do pactuado em contrato laboral, sem fixar limites, amplia os horizontes da tese defensiva do empregador, possibilitando ao mesmo, caso pretenda, buscar a tutela jurisdicional para haver os seus direitos e exercer o seu poder de comando e disciplina com maior abrangência.
A intervenção da Organização Mundial do Trabalho, embora muitas vezes profícua, tem sido confinada aos interesses nacionais, representados, prioritariamente, pelos interesses patronais.
Acreditamos que a ausência de sanções e embargos financeiros, no que tange as convenções que versam sobre dispensa motivada e suas restrições, queda por aniquilar os bons propósitos da entidade, relegada a ter como signatários nas convenções mais significativas, nações sem relevante expressão econômica, enquanto as grandes potências e as nações emergentes, realizam triagem bastante seletiva das medidas protetivas que pretendem efetivamente adotar.
Podemos inferir também, que as diferenças entre a legislação brasileira e argentina, não foram, como deveriam, mitigadas com o advento do Mercosul, visto que as recomendações trazidas pelo tratado não possuem eficácia plena, esbarrando nos limites da soberania nacional, que aglutina interesses diversos dos estados membros e dificilmente serão harmonizados em favor do proletariado.
Concluímos com a pesquisa ora realizada, que as legislações do Brasil e da Argentina, no que concerne à dispensa motivada se equivalem na questão da eficácia do provimento jurisdicional, já que vantagens e desvantagens para empregado e empregador, existem em ambas.
No Brasil, o empregado encontra-se salvaguardado contra injustiças próprias de sua hipossuficiência financeira, lhe sendo conferidos direitos baseados em critérios de equidade que resvalam na facilitação da defesa de seus direitos perante o Judiciário.
Já o patronato encontra-se entrincheirado pelo excesso de direitos trabalhistas, compensações financeiras e encargos sociais devidos aos obreiros, estando restrito a demissão por justa causa nas exatas hipóteses previstas em Lei, onde, só após confirmada a procedência da denúncia de cometimento de falta grave ou aquiescência do antigo empregado, poderá ser liberado do pagamento das vultuosas verbas rescisórias.
Porém, o Brasil possui uma legislação que avança no sentido da flexibilização dos direitos dos empregados, ante a própria contingência laboral, que aponta para o mercado informal de trabalho ou para o desemprego, criando uma nova consciência nos trabalhadores, que mesmo considerando o programa assistencialista governamental (Bolsa Fimília, Bolsa Renda e congêneres), que premia com um salário mensal quem não trabalha, procura manter seu posto de emprego visando não só a aumento do orçamento familiar bem como uma aposentadoria futura.
No caso da Argentina, os encargos sociais mostram-se mais amenos e a legislação bem mais tolerante quanto a dispensa motivada, notadamente por conceder ao empregador amparo de ampla defesa calcada na existência de ato de descumprimento pelo empregado que não esbarra em hipóteses pré fixadas pela legislação, e por isso mesmo, adequa-se com mais flexibilidade a verdade real do liame empregatício.
Em contrapartida, pelo que observamos, o empregado encontra-se desabrigado em muitas situações limite, dentre as quais a dispensa motivada, visto que não falta de parâmetros objetivos e fixos, vê-se diante da desigual luta entre seus interesses e os de seu empregador e ainda sujeito as discrepâncias inerentes à subjetividade do Juízo sentenciante, que diante de legislação omissa permite entendimentos conflitantes do Judiciário acerca de temas de mesma origem e natureza.
Finalmente, concluímos que o Mercosul precisa evoluir em sua capacidade legislativa, editando convenções aptas a conectar os estados membros a uma normatização vanguardista, acomodando e conciliando interesses, com o fim precípuo não de coibir a dispensa motivada ou torná-la de tão difícil aplicação que as partes optem por acordos extrajudiciais com evidentes prejuízos para uma das partes, e muitas vezes para ambas, mas sim, para promover o desenvolvimento apto a desencadear um processo de humanização e valorização da mão de obra, pelo critério da meritocracia, que redundará seguramente na estabilidade no emprego advinda da competência.
















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Autor: Olinda Sammara De Lima Aguiar


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