Moda também é ciência: sua aplicação na Indústria Têxtil.



Moda também é ciência: sua aplicação na Indústria Têxtil.


Fabiana Castoldi Rech
Nilo Alberto Scheidmandel

RESUMO
O presente artigo faz um passeio pela área têxtil, fazendo-nos refletir sobre os benefícios proporcionados pelas pesquisas e pelo desenvolvimento científico neste setor, levando em conta a busca pela sustentabilidade e o respeito ao meio ambiente. Apresenta razões para agradecer a ciência dos materiais pela sua aplicabilidade visando facilitar nossa vida.

PALAVRAS-CHAVE: têxtil, fibras, corantes.


1. INTRODUÇÃO

Primeiramente o homem sentiu necessidade de se proteger com peles de animais, depois passou a usá-las como forma de status e diferenciação entre povos, sexo, classe social. Neste tempo deu-se também a descoberta e o desenvolvimento dos tecidos naturais como a lã, a seda, o algodão e o linho.
A fibra do algodão já era utilizada pelos egípcios em 3400 a.C., porém só passou a ser usado em escala industrial a partir de 1793, quando surgiu o primeiro descascador deste material criado por Eli Whitney. No final do século XIX surgiram também os tecidos sintéticos oriundos de filamentos produzidos em laboratório. (Revista Textília, 2006, p. 187-188)
O grupo dos tecidos sintéticos divide-se entre fibras naturais modificadas, produzidas a partir de elementos vegetais, como a celulose, tendo como exemplo clássico a viscose; e as fibras sintéticas originárias de materiais petroquímicos, como o náilon, o acrílico e o poliéster.
Após vários anos dominando o mercado, as fibras naturais foram perdendo espaço pelas fibras sintéticas. Mas a grande sacada se deu na junção desses materiais, aliando o conforto das fibras naturais com a praticidade e durabilidade das fibras sintéticas, afinal gostamos do toque macio e do conforto proporcionado pelo algodão, mas adoramos poder vestir a roupa direto, sem precisar passar, e devemos isso a sua junção com o poliéster.
A partir de agora faremos uma passeio analisando as junções das fibras, desenvolvimento dos tecidos, suas composições, formas de tingimento, confecção. Todas essas informações visando sua relação com a ciência dos materiais.


2. CAMINHOS ATÉ SE CHEGAR AS PEÇAS PRONTAS

2.1 FIAÇÃO E TECELAGEM

A indústria têxtil transforma fibra em fios, fios em tecidos e tecidos em confecção.
As fibras podem ser definidas como materiais naturais ou sintéticos, formadas por cadeias poliméricas com grande resistência à tração mecânica, o que permite a fabricação dos fios.

Os fios têxteis, por sua própria natureza, têm de ter uma determinada quantidade de fibras em sua seção transversal, aspecto que irá determinar, entre outras coisas, a resistência, a uniformidade, o toque, a capacidade de isolamento, o índice de rupturas e o limite de fiabilidade da matéria-prima. (GARCIA, 1995, p. 39)

As fibras podem ser naturais, de origem animal (lã e seda), vegetal (linho e algodão) ou mineral (amianto); fibras artificiais, que tem origem vegetal, mas a elas são adicionados insumos químicos (viscose e acetado); e ainda as fibras sintéticas, produzidas exclusivamente pelo homem, a partir de derivados de petróleo (polímeros como náilon, poliamida, poliéster).
Na fiação, que é a transformação das fibras em fios, temos processos diferentes de acordo com as fibras a serem trabalhadas.
As fibras estão divididas em filamentos contínuos e descontínuos. Fibras contínuas são aqueles que não possuem tamanhos definidos por serem muito longas e, para transformá-las em fios, utiliza-se o processo de extrusão, que consiste em forçar o polímero através de um orifício, para formar o fio. Já a fibra descontínua é um segmento linear com comprimento definido, para estas o processo de fiação consiste em abrir as fibras, que normalmente apresentam-se em forma de fardos, separá-las e misturá-las, em seguida limpam-se as fibras e colocam-se paralelas umas as outras formando mechas. As mechas passam pela estiragem, etapa que se obtém uma maior uniformidade e afinamento das mechas, em seguida essa massa de fibras é torcida para se obter uma maior resistência.
As fibras naturais quando expostas a umidade, aumentam consideravelmente sua resistência, como é o caso do algodão e do linho, já nas fibras artificiais ocorre o inverso.

Tabela 1 ? Resistência de Alguns Materiais Têxteis
FIBRAS g/tex Comprimento de ruptura (km) Resistência específica (km/mm2) Alongamento de ruptura
(%) Resistência relativa a úmido (%)
Lã 0.1 ? 0.2 10 ? 18 13 ? 23 35 ? 50 80 ? 90
Algodão 0.2 ? 0.5 20 ? 45 13 ? 68 8 ? 10 110 ? 120
Cânhamo, Linho 0.5 ? 1.0 35 ? 80 53 ? 120 2 ? 4 130 ? 140
Juta 0.4 ? 0.6 30 ? 45 45 ? 68 2 ? 5 110 ? 130
Seda 0.4 ? 0.5 36 ? 40 47 ? 53 15 ? 25 75 ? 85
Viscose KS normal 0.2 ? 0.3 14 ? 22 20 ? 25 10 ? 30 45 ? 55
Viscose KS de grande resitência 0.3 ? 0.4 25 ? 29 38 ? 44 10 ? 20 60 ? 70
Acetato KS normal 0.1 ? 0.2 12 ? 16 15 ? 21 20 ? 30 60 ? 70
Acetato KS saponificado 0.5 ? 0.8 43 ? 63 65 ? 95 5 ? 10 70 ? 90
Cobre KS 0.1 ? 0.2 11 ? 18 16 ? 28 8 ? 16 50 ? 60
Nylon resistente 0.5 ? 0.6 40 ? 50 46 ? 56 20 ? 25 85 ? 90
Nylon de grande resitência 0.6 ? 0.7 54 ? 58 61 ? 67 15 ? 20 85 ? 90
Fibras de vidro 0.5 ? 1.2 401 ? 120 100 ? 200 2 ? 4 90 ? 100
Fonte: Fiação: Cálculos Fundamentais ? Suruapi Jorge Garcia ? 1995.

Além da resistência, a umidade também influencia no peso e no acabamento dos tecidos, daí a importância de várias provas e amostras para padronização das fibras. O manuseio do material requer conhecimento de suas características e da umidade no momento em que ele foi fiado, tecido ou acabado (ramagem). Geralmente sua comercialização ocorre por peso, e ninguém quer comprar "água".

A maior parte das fibras têxteis são higroscópicas, isto é, apresentam a capacidade de absorver ou liberar umidade. Quando há excesso ou carência de umidade no meio ambiente, as características da fibra, como o peso e a resistência são alterados. (ALBUQUERQUE, 1987, p. 43).

Para a comercialização de um tecido, as principais características levadas em consideração são o rendimento (quantos metros corridos em um quilograma de tecido), a largura e gramatura (quantos gramas por metro quadrado de tecido), como estes dados podem variar de acordo com a umidade relativa do ar, são retiradas várias amostras em horários diferentes para determinar as caracteristicas ideais, chamadas de medidas padrão, este padrão serve de base para futuras compras e/ou produções, respeitando variação percentual segundo a norma ABNT NBR ISO 139/2008.
Para se formar um tecido, entrelaçamos basicamente os fios longitudinais (urdume) e os transversais (trama). Urdume são os fios que formam a base do tecido, enquanto a trama passa pelos fios de urdume (cala), formando vários ligamentos. São os chamados de tecidos planos ou tramados, como a sarja, tricoline, oxford entre outros.

Os tecidos tramados são criados pelo cruzamento de fios verticais com fios horizontais em ângulos retos. A rigidez e o peso do tecido dependerão da quantidade de fios por centímetro e da espessura do fio. (SEIVEWRIGHT, 2009, p. 111)

Os movimentos básicos para o tecimento são a abertura da cala (urdume), a inserção da trama e a batida do pente, que afirma os fios. Para se conseguir a passagem da trama entre os fios de urdume, usa-se o porta tramas, o mais conhecido porta tramas é a lançadeira. Na figura 1 são demonstrados os três movimentos básicos.

Figura 1: Movimentos básicos para a produção do tecido plano:

Fonte: Tecnologia da Tecelagem ? Luís Henrique Rodrigues ? 1996.

Parece simples, mas é necessária uma preparação prévia do fio para poder ser tecido, essa preparação consiste na engomagem do fio para garantir a firmeza do entrelaçamento e o urdimento, que consiste no abastecimento da máquina, visto que os fios de urdume são os que dão suporte ao tecido.
Já na malha o processo dispensa a necessidade de tratamento prévio dos fios, já que se usa um conjunto único de fios entrelaçados. É exatamente por este detalhe que as malhas são flexíveis e elásticas.
Figura 2 ? Entrelaçamento da malha:

Fonte: ABNT ? NBR 12060/1991.

Para a confecção da malha os fios são trançados por várias agulhas, num processo semelhante ao tricô, só que com inúmeras agulhas (dependendo do diâmetro do tear). Isso permite uma combinação de fibras bem maior do que no tecido tramado, trazendo novas misturas de fibras e proporcionando inovações no desenvolvimento dos tecidos (chamados tecidos inteligentes).


2.2 BENEFICIAMENTO TÊXTIL

Esta fase, que vem logo após a tecelagem, basicamente divide-se em preparação para o tingimento, tingimento propriamente dito e acabamento.
Os artigos têxteis devem ser cuidadosamente preparados antes de iniciar o tingimento. A real necessidade desses processos tem como objetivo melhorar o aspecto, a capacidade tintórea, bem como condições para um posterior acabamento nobre ao tecido. Esta preparação ou pré-tratamento consiste em eliminar todas as impurezas do tecido, impurezas como as ceras, as pectinas naturais, os óleos lubrificantes, parafinas, gomas. Estas impurezas podem ser naturais ou artificiais. As impurezas artificiais são adicionadas aos fios durante o processo de tecelagem. Para auxiliar na retirada dessas impurezas podemos citar a purga, o alvejamento, escovagem, desengomagem, chamuscamento, mercerização conforme orientações e conceitos contidas no manual de tinturaria das indústrias Brinel S/A ? download em 12-09-2010.
Purga é a limpeza primária em molhado a qual é submetido o tecido visando eliminar as impurezas naturais, óleos de encimagem e goma presentes nos tecidos, o método empregado para limpeza da fibra exige a presença de pelo menos um agente tensoativo de eficiência comprovada capaz de umectar, exercer detergência e emulsificar. Utiliza-se também um álcali (Carbonato de Sódio) para saponificar as matérias graxas que são insolúveis. A formulação utilizada na purga depende da fibra que será trabalhada.
Alvejamento é feito geralmente por ação oxidativa utilizando Clorito de Sódio (NaClO2), Hipoclorito de Sódio (NaOCl), Peróxido de Hidrogênio (H2O2) ou por ação redutiva, usando-se Ditionito de Sódio (Hidrossulfito de Sódio ? Na2S2O4). O Clorito de Sódio apresenta boas propriedades alvejantes desde que adequadamente aplicados. Hoje é pouco utilizado devido a sua toxidade e reatividade corrosiva nos equipamentos, mesmo os de aço inoxidável. O Hipoclorito de Sódio também apresenta boas propriedades alvejantes, porém não é agressivo aos equipamentos de aço inox. É moderadamente empregado, devido aos efeitos negativos causados à ecologia. Atualmente o produto alvejante mais utilizado que proporciona um grau branco satisfatório é o peróxido de hidrogênio (água oxigenada) que apresenta boas propriedades de solidez. Os melhores resultados são obtidos fazendo-se a purga e depois o alvejamento em banhos separados.
O alvejamento com água oxigenada pode ser efetuado em um único banho, purga/alvejamento, resultando em um processo mais econômico e rápido, porém deve-se levar em conta a presença de ferro na fibra a ser processada, daí surge a necessidade de empregar um seqüestrante específico para o ferro para evitar que ele se oxide sobre o tecido.
O tingimento consiste na modificação da cor das fibras têxteis através de um processo químico que varia de artigo para artigo, através de uma solução ou dispersão durante a aplicação de matérias coradas. Para cada tipo de fibra têxtil existem corantes específicos. Corantes são produtos solúveis ou dispersáveis em água, que têm afinidade com as fibras, tendo a finalidade de promover a cor.
Durante o tingimento deve ser levado em conta a composição do artigo e a cor que se pretende chegar. Neste processo ocorre uma modificação físico-química do substrato de forma que a luz refletida provoque uma percepção de cor. As matérias corantes que provocam estas modificações são compostos orgânicos capazes de colorir substrato têxtil ou não têxtil de forma que a cor seja relativamente sólida a luz e a tratamentos úmidos.
O tingimento em fibra é mais usado para fibras longas (lã) e filamentos. Consegue artigos mesclados. No caso de artigos sintéticos pode-se conseguir as cores com a adição de pigmentos antes mesmo da fabricação do filamento.
No tingimento em fios o mais comum é o em bobinas, mas pode ser realizado também durante outros processo da fiação, é o mais indicado para a produção de tecidos listrados e xadrez. O tingimento em fios favorece a obtenção de cores mais igualizadas, porém tem o incoveniente de ter que verificar alguns processos que representam gastos de tempo e mão-de-obra. Outro tingimento de fio muito usado é o tingimento em urdume, que pode ser com o urdume aberto ou em corda. Ambos muito utilizados para o tingimento com corante índigo.
Segundo informações extraídas do site www.abiquim.org.br (acesso em 10-10-2010), o processo mais desenvolvido nos últimos anos com maior igualização em todo comprimento da peça é o tingimento em tecido, que resulta em menor desperdício de corante, menor quantidade de processos, pois pode ser realizado juntamente com as operações de beneficiamento de tecidos. Produz tecido de cor lisa. Pode ser usado com o tecido aberto assim não forma vincos e pode-se trabalhar em processo contínuo ou com o tecido em corda ocupando menos espaço e permitindo ao tecido ficar mais relaxado, fato este super importante principalmente para os tecidos que possuem elastano em sua composição.

Dentre o os processos de tingimento em tecidos podemos citar:
? Processo descontínuo ou por bateladas: indicado para lotes menores, ou com pouca produção. Na mesma máquina podem ser feitos todos os processos de preparação, alvejamento, tingimento e lavagem.
? Processo semi-contínuo: impregnação do tecido com banho de tingimento realizado por Foulard, após este processo o tecido fica em repouso por algumas horas para a reação do corante e posterior lavagem.
? Processo contínuo: indicado para grandes metragens ou lotes que requerem maiores produções. A reação do corante com a fibra é acelerada com a adição de vapor e temperatura. Com isso o tecido pronto para tingir entra na máquina e sai tingido e lavado.

Veja abaixo algumas classes de corantes mais utilizados na indústria têxtil de acordo com as fibras a serem tingidas:
? Celulose (algodão, viscose, linho, rami): corantes reativos, corantes diretos, à tina, enxofre, naphtol e índigo;
? Poliéster: corantes dispersos;
? Poliamida (Nylon): corantes ácidos e dispersos;
? Lã: corantes ácidos e reativos.
Tingimentos que se fixam por meios de interações iônicas são utilizados normalmente para seda, lã e poliamida. Mas a fixação também pode ocorrer por meio de interações Van der Waals, aquelas entre moléculas apolares: as moléculas do corante ficam presas às moléculas da fibra por questão de afinidade, sem formar uma ligação propriamente dita. Têm também as famosas pontes de hidrogênio: o hidrogênio do corante se liga a um par de elétrons livres de átomos doadores da molécula da fibra. Sem falar nas ligações covalentes: neste caso os grupos reativos dos corantes formam ligações covalentes com resíduos nucleofílicos da fibra.
A única semelhança entre os corantes é a presença do anel benzênico, fora isso é necessária uma classificação em grupos, pois eles são diferentes entre si. Anel benzênico ou aromático corresponde às estruturas que tem seis átomos de carbono e formam um hexágono regular com ligações simples e duplas alternadas.

Figura 3 ? Representação Anel Benzênico ou Aromático:

Fonte: Adaptado www.ecotece.org.br, acesso em 02-12-2010.

Tendo em vista que corantes, pigmentos e branqueadores são compostos complexos, muitas vezes é impossível traduzi-los por uma única fórmula química ? alguns são mistura de vários compostos e outros não possuem estrutura química definida. Por este motivo raramente utiliza-se sua nomenclatura química, preferindo-se usar os nomes comerciais. Para evitar transtornos utiliza-se uma lista organizada de nomes e números, trata-se do Colour Index (CI), publicação da American Association of Textile Chemists and Colorists e British Society of Dyers and Colorists.
Os corantes diretos são corantes que, por meio de interações Van der Waals, tingem fibras de celulose, utilizados principalmente para cores claras.
No grupo dos corantes azóicos o tingimento ocorre da seguinte forma: a fibra é impregnada com uma substância chamada agente de acoplamento, solúvel em água, essa substância deve apresentar alta afinidade por celulose, assim ao se acrescentar um sal de diazônio, ocorre uma reação com o agente de acoplamento, resultando na formação de uma substância colorida insolúvel em água, um precipitado sobre a fibra. A produção do corante diretamente sobre o substrato faz com que o tingimento seja altamente eficaz, com boa fixação, resistência à luz e também à umidade. A cor é produzida dentro da fibra, apresenta alta solidez, não necessita fixador, o brilho obtido é considerado excelente, mas é um processo longo, com alto custo e agride o meio ambiente.
Os corantes pré-metalizado utilizam-se de pigmentos a base de óxidos largamente utilizados no mercado por apresentar alto poder de cobertura, facilidade de uso, opacidade elevada, possibilidade de produtos micronizados e baixa absorção de óleo.
Já os corantes reativos contém um grupo eletrofílico (reativo) que forma ligações covalentes com as moléculas das fibras, por exemplo, com as hidroxilas das fibras celulósicas, ou com grupo amino, hidroxila e tióis das fibras protéicas ou ainda com grupos amino das poliamidas. São economicamente intermediários, não necessitam de fixador, apresentam alta solidez à luz e a úmido e alta reprodutividade. Tem como desvantagem a restrição no tratamento com cloro e agride o meio ambiente.
Diferentemente de corantes ou pigmentos os branqueadores ópticos ou agentes de branqueamento fluorescentes são compostos orgânicos incolores ou pouco coloridos que, em solução ou aplicados a um substrato absorvem a luz, na região próxima ao ultravioleta do espectro (340-380 nm), e reemitem a maior parte da energia absorvida como luz fluorescente violeta-azulada, na região visível entre 400 e 500nm. O resultado é que os materiais submetidos a este tratamento parecem, a olho humanos, menos amarelados, mais brilhantes e mais brancos. Realizando o sonho do homem, ou criando a ilusão óptica, de reproduzir o branco puro, das nuvens e da neve, esquecendo a aparência amarelada que os pigmentos e alvejantes químicos resultam nos processos convencionais de tingimento na cor branca.


2.3 ESTRUTURA DE ALGUNS MATERIAIS

As fibras naturais de origem vegetal são compostas basicamente de celulose, um polímero do carboidrato glicose. Algumas fibras naturais modificadas (semi-sintéticas) podem ser obtidas através da celulose, obtida através da polpa da madeira. Ao contrário do algodão e do linho, a celulose dos troncos das árvores não pode ser diretamente transformada em fios, devido a sua estrutura emaranhada. Para ser fiada é necessário que seja transformada em um forma solúvel, o que é possível através do tratamento com solução de soda cáustica (NaOH) e dissulfeto de carbono (CS2), resultando numa solução viscosa, a qual é passada através de pequenos bicos, formando fios finos, cuja neutralização com ácido resulta em celulose insolúvel em forma de fios, próprios para tear.

Figura 4: unidade monomérica presente na estrutura química da celulose.

Fonte: Adaptado de As 20 Redações selecionadas pela OQSP-2007 download em 09-10-2010.

As fibras animais, como a lã e a seda são constituídas de proteínas e seu processo de fiação resulta em fibras muito resistentes, devido às interações intermoleculares, do tipo ligação de hidrogênio, que ocorrem entre as macro moléculas de proteínas.

Figura 5: Representação de adição das moléculas de proteínas.

Fonte: Adaptado de As 20 Redações selecionadas pela OQSP-2007 download em 09-10-2010.

As proteínas são polímeros formados pela reação de condensação de aminoácidos: o grupo amino de um dos aminoácidos se liga ao carboxila do outro, havendo eliminação de uma molécula de água e a formação de uma ligação péptica (grupo amida).

Figura 6: Ligação péptica das moléculas de proteína.

Fonte: Adaptado de As 20 Redações selecionadas pela OQSP-2007 download em 09-10-2010.

A lã, composta por polímeros de queratina unidos por pontes de cistina (S-S), pode ter sua cor, qualidade e comprimento de fibras diferentes de acordo com a raça das ovelhas e com o processo de extração. Esta fibra costuma ter, em média, de 80 mm a 90 mm de comprimento. Para obtenção das fibras de lã as ovelhas são tosquiadas, em seguida, a lã bruta é lavada para que a lanolina, gordura natural dessa fibra, seja removida. A fibra então é secada e desembaraçada, tornando-se pronta para a fiação. Terminado este processo ela já pode ser tecida.
Uma categoria que vêm ganhando força nos últimos anos é a das fibras sintéticas, obtidas através de reações de polimerização. A poliacrilonitrila tida como a substituta da lã, uma vez que suas propriedades estéticas são semelhantes, além de ser um bom isolante térmico, é empregada principalmente em artigos de clima frio, como malhas e cobertores. Ela também é comercializada como Orlon, que é o resultado da polimerização da acrilonitrila em emulsão aquosa. O produto desta reação por adição é uma substância fibrilar, insolúvel em água que se precipita e se deposita no fundo do reator, sendo posteriormente filtrada e secada. Em seguida é dissolvida em solvente orgânico, sendo fiada através da passagem da solução pelas finadeiras, esses fios são secados em altas temperaturas para estarem prontos para o processo de tecelagem.

Figura 7: Estrutura atômica da Poliamida (nylon 66)

Fonte: Adaptado de As 20 Redações selecionadas pela OQSP-2007 download em 09-10-2010.

São misturadas a poliacrilamida pequenas quantidades de outros monômeros como o estireno, cloreto de vinila e cloreto de vinilideno pois é difícil o tingimento de poliacrilamida pura. Assim, consegue-se um copolímero com pontos de ancoragem para os corantes. Esses copolímeros são chamados de modacrílicos.
No que se refere a corantes temos uma gama muito grande estruturas e combinações visto que é desenvolvida uma fórmula específica para cada combinação de fibras, cores a que se quer chegar, etc; temos como exemplo a constituição química de alguns pigmentos a base de óxido conforme tabela abaixo:

Tabela 2 ? Demonstrativo dos produtos mais comuns à base de óxido:
COR COMPONENTE FÓRMULA VARIAÇÃO DE COR
Vermelho Óxido de ferro III ± ? Fe2O3 Amarelo ? Azul
Amarelo Hidróxido de ferro ± ? FeOOH Verde ? Vermelho
Preto Oxido de ferro II e III ± ? Fe3O4 Azul ? Vermelho
Verde Óxido de Cromo Cr2O3 Azul ? Amarelo
Azul Óxido de Cobalto Co(Al,CR)2O4 Vermelho ? Verde
Fonte: Abiquim (www.abiquim.org.br ? 10-10-2010)


2.4 CONFECÇÃO

Após todos os processos pelos quais passam as fibras, vem a sua última transformação e, provavelmente o processo que a coloca em contato direto com a população, que é a indústria de confecção. A confecção, como o nome já diz, é a transformação dos tecidos e malhas em peças do vestuário, cama, mesa e banho. É onde se percebe o benefício de todo o trabalho da ciência na criação e desenvolvimentos de produtos voltados ao mercado têxtil. Pergunta-se: onde entra a ciência agora?
A confecção tem uma característica especial, pois como uma indústria de transformação requer bastante mão de obra, cada peça, desde a sua concepção, obrigatoriamente passa por diversos processos até estar totalmente pronta. E em cada um desses processos a chave para o sucesso é o manuseio, que só pode ser feito por mãos humanas, embora bastante desenvolvidas as tecnologias de confecção, é necessária um toque individual em cada peça. Considerando-se a prática atual na confecção, os principais processos são os seguintes: criação e estilismo, modelagem, corte, estamparia e/ou bordado, costura e acabamento.
No departamento de criação e estilismo é feita pesquisa de tendência de moda, definindo os modelos que serão lançados. Na modelagem são definidos os artigos a serem utilizados bem como os modelos que serão fabricados, é ali que cada peça é testada e, após vários protótipos é aprovada para lançamento no mercado. Após a liberação pela modelagem as peças da coleção vão para o corte, entre o corte e a modelagem a principal tecnologia utilizada é a automação dos moldes através de programas específicos (CAD). Quando chegam no corte, com os mapas (desenhos dos moldes encaixados levando-se em conta largura dos tecidos e melhor aproveitamento de material), são montados os enfestos que podem ser manuais ou através de enfestadeira (automática e semi-automática), após o enfesto montado segue para o corte propriamente dito (pode ser manual, máquina de corte manual ou automática), antes da costura as partes que formarão a peça passam por uma preparação, dependendo do modelo são direcionadas a estampa, bordado, ou simplesmente pré-montadas para facilitar o processo de costura.
Na costura sim, cada peça é manuseada uma a uma, em termos de desenvolvimento tecnológico, embora já tenhamos inúmeros avanços nesta área, fica difícil a automatização completa, pois tecidos são bastante flexíveis e maleáveis o que impossibilita sua costura sem manuseio adequado. Com certeza este é um grande desafio para ciência e vem sendo pesquisado há muito tempo, mas nada substitui o trabalho humano, seja braçal, operacional, ou simplesmente para "apertar o botão" da máquina que fará o trabalho.


2.5 DESENVOLVIMENTO DE COLEÇÃO

A cada surgimento de novas coleções de moda, existe um trabalho intenso de pesquisa para se transformar em realidade as inspirações dos estilistas, que muitas vezes desconhecem o processo complexo que se desencadeia a partir de suas idéias. Processo este que vai desde o estudo e desenvolvimento de novas fibras para criação de novos tecidos ? os chamado tecidos tecnológicos; a pesquisa de novos corantes, principalmente com essa onda Eco, os corantes oriundos de matéria orgânica, principalmente de origem vegetal; o desenvolvimento de máquinas, equipamentos e processos produtivos visando atender um mercado consumidor cada vez mais exigente e ávido por novidades.
A moda muda a cada estação, mas as contribuições e descobertas que ela proporciona, nos servem de inspiração e trazem cada vez mais informações que nos ajudam a entender os processos de investigação e desenvolvimento da ciência de forma a nos aproximar dela e confirmar o que se ouve no meio acadêmico, de que não existe qualquer assunto que não esteja relacionado ou não seja beneficiado pelas descobertas científicas.
2.6 RESPONSABILIDADE AMBIENTAL

Junto com essa tecnologia, devemos lembrar a responsabilidade ambiental, pois de nada adianta os avanços científicos e tecnológicos sem meio ambiente, o único fornecedor de matéria-prima para todas as descobertas científicas é a natureza, sem ela não existe ciência, não existe humanidade, logo essa relação de proteção e conservação do meio ambiente deve ser cada vez mais intensa para que essa fonte de descobertas não se finde e permita a cada dia o surgimento de novas tecnologias.
Em se falando de indústria, é muito difícil uma indústria limpa, que não gere algum resíduo, mas se a indústria é um "mal necessário" temos a parceria da ciência também no tratamento dos resíduos oriundos dos processos de industrialização.
Falando em fiação, praticamente não existem resíduos visto que as fibras podem ser reprocessadas e reaproveitadas conforme informações institucionais contidas no site da Fiação São Bento S/A acesso em 03-12-2010.
Já na tinturaria é onde existe os resíduos com maior toxidade, estrategicamente o tratamento dos efluentes de uma tinturaria acaba virando seu principal diferencial competitivo pois quem demonstra compromisso com o meio ambiente e busca uma produção sustentável ganha muitos pontos na sua relação com o mercado consumidor.
Os corantes reativos, um dos mais utilizados no Brasil, reagem com a hidroxila presente nas fibras naturais, o que inclui os seres vivos, podendo, sem tratamento adequado provocar irritação na pele e/ou vias respiratórias. Já os azocorantes, que apresentam maior demanda mundial, são potencialmente cancerígenos, deixaram de ser produzidos em alguns países, porém o mesmo não ocorreu em países como o Brasil ,Índia e México.
Muitas indústrias se utilizam de processo físico-químicos (como a coagulação e a precipitação), que promovem a solidificação das substâncias poluentes a fim de reduzir estes problemas; seguidos por tratamentos biológicos, principalmente o sistema de lodos ativados, que consiste na adição dos efluentes em um tanque de aeração, no qual eles são agitados na presença de ar e microorganismos, promovendo a oxidação da matéria orgânica. Este processo requer um rigoroso controle de pH, nutrientes e temperatura, além de produzir um grande volume de lodo e não ser capaz de degradar todos os poluentes, o que neste caso significa um problema ambiental não solucionado, apenas transferido de um local para outro. Visando a superação destes limites, algumas indústrias tratam seus efluentes através dos processos oxidativos avançados (POA), caracterizados pela geração de espécies fortemente oxidantes, principalmente radicais hidroxila (OH.). Entre esses processos destacam-se, além dos tratamentos que empregam o ferro de valência zero e o ozônio, o Foto-Fenton, que consiste em uma reação entre Fe2+ e peróxido de hidrogênio (H2O2), uma molécula bastante instável, resultando no radical hidroxila. Este, por sua vez, reage com o corante, desencadeando a deterioração do último.
Tratamentos como absorção, floculação, degradação química, eletro e/ou fotoquímica e biodegradação, informações extraídas em visita técnica a empresa HJ Malhas ? Brusque ? SC dia 20-09-2010.
A absorção consiste basicamente na passagem dos efluentes em "barreiras" de diversos materiais, como sílica-gel, bauxita, carvão ativo, entre outros; não sendo muito utilizada devido ao seu alto custo.
A degradação química é baseada em reações com cloro ou ozônio, preferindo-se este último por não deixar resíduos, é um processo usado em grandes volumes de afluentes devido a sua rapidez e economia. Como a maioria das indústrias é de pequeno e médio porte este processo acaba ficando de lado.
A Floculação nem sempre é utilizada por ter resultados que variam muito dependendo do corante utilizado, da concentração dos rejeitos e da presença de catalisadores. Os catalisadores podem facilitar a retirada dos poluentes, mas estes por si só são fontes de poluição.
No método da biodegradação utiliza-se um agente biológico, normalmente bactérias ou enzimas, para degradar os compostos tóxicos nos efluentes. Mas, os corantes sintéticos não são naturalmente biodegradáveis, sendo necessária a criação de linhagens cruzadas de microorganismos para que se possa biodegradá-los, algo que, embora demande tempo e pesquisas, vem sendo conseguido com sucesso. Embora a obtenção das enzimas apresenta um custo um tanto quanto elevado, seu uso é de maior facilidade, são utilizadas no tratamento e efluentes a peroxidase, catalase, amilase, lacase e tirosinase conforme informações obtidas no download das 20 redações selecionadas OQSP 2007, em 09-10-2010.
As duas primeiras são utilizadas, isoladas ou em conjunto, para decompor o peróxido de hidrogênio (H2O2), não só nas águas de rejeito, como também após o alvejamento do tecido, pois o H2O2 residual pode comprometer o tingimento. A amilase, por sua vez, é utilizada na desengomagem, para a divisão do amido em glicose e também na limpeza de efluentes quando há amido residual. Apesar de não ter papel tão expressivo, ajuda indiretamente na limpeza de efluentes porque os "substitutos" químicos na tarefa que exerce (normalmente ácidos ou bases) são bem mais poluentes.
Já a lacase e a tirosinase são duas enzimas retiradas de fungos com grande utilidade no tratamento de efluentes, embora de modos diferentes. A lacase age como as bactérias acima citadas, degradando as moléculas de corante, e, o que é melhor, conseguindo degradar ou ao menos facilitar a biodegradação de grande parte dos corantes sintéticos. Enquanto isso, a tirosinase desencadeia algumas reações nos corantes transformando alguns grupos em quinonas. Como são instáveis em água, elas sofrem reações de polimerização, e o resultado é uma massa amorfa de coloração escura que, após algumas horas, precipita e pode ser recolhida.
Na tecelagem são poucos os resíduos, formados basicamente de óleos e lubrificantes utilizados nos teares, as felpas que se desprendem dos fios e as embalagens dos mesmos (cones, sacos plásticos e caixas).
Pela confecção são considerados resíduos os retalhos provenientes das sobras de tecido no encaixe (pedaços entre os moldes de peças e os refilos das máquinas de costura).
Tanto na confecção quanto na tecelagem a reciclagem desses resíduos é muito mais simples do que num processo de tinturaria, visto que os materiais podem ser reaproveitados sem a necessidade de tratamentos químicos, inclusive o óleo, que é reaproveitado por outras indústrias, como serrarias, fábricas de pré-moldados, etc.


3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Além da obrigação de pesquisar as estruturas químicas de vários materiais relacionando-as a prática da indústria têxtil, este artigo apresenta muitas surpresas boas, pois mostra o quanto a ciência contribui para nosso conforto e que, muito mais do que uma seqüência produtiva e uma coleção de moda, uma indústria de confecções é ciência pura, desde as análises e estudo dos materiais utilizados e suas estruturas, passando pelo desenvolvimento tecnológico e de vários processos até chegar ao consumidor que usufrui dessa ciência sem nem sequer imaginar todo esse caminho trilhado.
Percebe-se também que esse caminho de evolução é infinito. Entende-se que ainda há muito por fazer em termos de descobertas científicas e avanços tecnológicos principalmente relacionados a preservação do meio ambiente e a auto sustentabilidade. Os materiais estão a disposição, mas o uso consciente dessas riquezas e sua continuidade depende da consciência de cada um.
Fica a certeza de que a evolução humana, seja em termos tecnológicos ou sociais, deve basicamente a aplicabilidade da ciência em todas as áreas do conhecimento. Conhecimento este ainda tido como restrito, mas que está ao alcance de todos, bastam persistência, dedicação e empenho na sua disseminação e aplicação.
4. REFERÊNCIAS

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ALBUQUERQUE, Florival Ferreira. Controle de qualidade na indústria de fiação e tecelagem; Rio de Janeiro, SENAI/CETIQT, 1987.
RODRIGUES, Luís Henrique. Tecnologia da Tecelagem: tecnologia e qualidade na produção de tecidos planos; Rio de Janeiro, SENAI/DN, SENAI/CETIQT, CNPq, IBICT, PADCT, TIB, 1996.
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www.allchemy.iq.usp.br/as_20_redaçoes_selecionadas_OQSP-2007.txt; download em 09-10-2010.
www.brinel.com.br/manual_de_tinturaria_raiom_filamento_têxtil.pdf; download em 12-09-2010.
Visita técnica não estruturada empresa HJ Malhas Ltda, Brusque, 20-09-2010.
Documentação interna empresa MiraSul Têxtil Ltda, Sarandi, 2010.
Revista Textília, edição especial de aniversário, p. 197 a 189, mai, jun, jul, 2006, volume II.

Autor: Fabiana Castoldi Rech


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