Clarissa



Em uma época que todos os jovens de dezesseis anos estavam se divertindo e vivendo a vida, Clarissa estava queimando suas belas pestanas. Clarissa nasceu lindíssima e foi a criança mais adorável de sua família. No colégio colecionava placas de louvor. Estava sempre estudando e nas férias se enfurnava na biblioteca de sua casa de praia ou da cidade. Mocinha linda e com ar de intelectual, fisicamente se parecia com sua mãe e o seu temperamento era de seu pai com quem se identificava. Sempre discreta, era avessa a badalações. Seu mundo era o mundo de negócios de seu pai. Era chic sem afetação. Passou em primeiro lugar no vestibular aos dezesseis anos e concluiu o curso com louvor aos vinte e um anos e foi trabalhar com seu pai enquanto fez sua pós graduação e doutorada. Sua competência era admirada por todos os acionistas da empresa. Sua meta, a diretoria da empresa, o que não escondia de ninguém. Passou por todos os departamentos, era obcecada. Não teve vida social, só trabalho sério. Competentíssima chegou muito cedo onde ambicionava e foi por competência e não porque era filha do presidente. Clarissa não saia de sua casa para ir trabalhar. Ela e seu pai usavam o helicóptero da firma, era mais rápido e seguro. Clarissa nasceu mulher de negócios, todos os acionistas respeitavam a sua competência e seu raciocínio rápido. Tanto que um dos diretores sugeriu o nome de Clarissa para ocupar nova pasta. O pai de Clarissa relutou porem ela declarou que sua nova pasta era o seu maior desafio. A preocupação do seu pai era a maneira como ela seria recebida para ocupar um cargo tão importante e o fato de ser tão jovem e mulher. Clarissa foi ocupar o apartamento de sua família no Central Park onde já existia toda a estrutura formada e assumiu o cargo e mostrou competência. Pessoa de hábito diurno não costumava sair a noite. O pessoal da empresa levava uma vida mais agitada e a maioria casada. Clarissa foi convidada para um jantar de negócios em renomado restaurante. Na realidade eram negócios com chineses. Ela falava mandarim, foi uma noite agradável e Clarissa impressionou os asiáticos. Após o jantar um dos donos do restaurante foi cumprimentar um dos americanos na mesa e foi apresentado para Clarissa que não ficou muito impressionada. Dois dias após o jantar Clarissa recebeu flores e os cumprimentos do jovem. Sua assessora tratou de agradecer. E os dias foram passando até o dia em que os asiáticos voltaram para mais uma reunião, no mesmo restaurante, que se prolongou até altas horas. Neste dia Clarissa notou o rapaz das flores, viu que era belo e muito agradável. Jovem de idade indefinida, olhos escuros lindos e de pela branquíssima. Foi reunião de negócios e o jovem entendeu pois não se aproximou da mesa para cumprimentar. No dia seguinte ao chegar na empresa ela encontrou flores e resolveu agradecer. Ele convidou Clarissa para jantar no seu restaurante, pois seria uma comemoração especial. Clarissa agradeceu e explicou que estava ocupadíssima. Duas semanas após o convite ele ligou novamente e ela aceitou. O convite foi para visitar famosa galeria de artes. Clarissa aproveitou e adquiriu uma obra de consagrado artista plástico e depois eles foram para uma casa noturna badalada, que também era dele. Ficaram horas juntos e Clarissa contou parte de sua vida, coisa rara, pois ela sempre foi introspectiva. Ele disse que seu nome era Nicola. Não falou sua origem, e não falou sobre seus familiares. Clarissa ficou muito curiosa. O pior foi ter que se levantar cedo no seguinte para ir para a empresa. Foi dormir tarde e não estava acostumada. Dois dias depois ele ligou, ela relutou e acabaram saindo, mais obras de arte, jantar e casa noturna, onde ela cansada voltava para casa, ele ficara para resolver negócios. Um era diurno e outro noturno. Clarissa foi convidada para ir no final de semana até Hampton para passar o final na casa de um dos diretores de sua empresa. Nicola não aceitou pois ele trabalhava a noite. Isso era sem dúvida um contratempo na vida deles. Ela ficou zangada e foi sozinha, porem não se divertiu e viu que estava se tornando dependente do telefone. No inicio da semana ela notou que estava ficando sem pique e nervosa. Ele ligou e saíram sempre o mesmo programa, galeria de artes, casa noturna. Ela sempre voltava sozinha. No final de semana ela perguntou porque ele não passavam o dia de domingo juntos em casa dela. Ele não aceitou mas aceitou ir a noite jantar em casa dela e foi justamente quando seus pais chegaram. Ela ficou apreensiva, mas manteve o convite. Ele até se entendeu com os pais dela. Nesta noite ele saiu cedo. O pai dela perguntou pelos familiares, a única coisa que ela sabia é que ele era do leste europeu e dono do mais famoso restaurante e da casa noturna mais badalada. O pai de Clarissa tentou obter mais informações porem o serviço de informações empacou. No final de semana Nicola a convidou para a casa ele após a noitada. Ela aceitou. Eles saíram mais cedo, ele morava em um apartamento muito bonito, sem decoração, a não ser uma mesa de vinte e quatro lugares no meio da sala, toda envidraçada e encortinada, cortinas de veludo verde escuro, mobiliado com uma mesa enorme, e um aparador e vinte e quatro cadeiras no chão encostadas na parede. Todas as obras de arte. Ele encomendou um jantar do restaurante dele, que estava delicioso. Depois do jantar deram uma passada na casa noturna, foi rápido e retornaram para casa. Ela acabou dormindo lá pela primeira vez e explicou a Nicolas que era sua primeira vez em tudo. No quarto com cortinas escuras e uma cama no meio do quarto e poucos móveis, sem adornos, apenas mais obras de arte no chão. Ela foi ao banheiro e não encontrou o espelho. Perguntou a ele onde poderia encontrar um espelho, ele explicou que estava a pouco tempo ali e ainda não terminou a decoração, portanto nada de espelho. Ela acordou sozinha no meio da noite e viu que ele não dormiu em casa, a deixou pegar no sono e voltou para o seu trabalho. Ela ficou muito preocupada. Nada aconteceu. Ela levantou para beber água e não encontrou a cozinha. Vestiu-se, se arrumou e apanhou um taxi. Foi terminar de dormir em sua casa e se sentindo rejeitada. Ele ligou no meio da semana, saíram e o programa já era rotineiro, galeria, restaurante,... Ele não levou Clarissa para o apartamento dele. Pediu para a primeira vez ser no dela. Ele sempre usava óculos escuros a noite para proteger sua retina, disse estar em tratamento. Ela encomendou ao seu Juvenal, copeiro de sua casa, que baixasse a intensidade da luz e que fechasse todas as cortinas. Nesta noite ele levou vinho tinto que ela não quis beber para poder se levantar cedo para ir trabalhar. Ele não jantou, só tomou o seu vinho, mas foi bom, ele estava muito carinhoso. Ela arrumou o quarto de forma que não lembrasse o quarto de uma jovem romântica, cheio de recordações dos seus porta retratos, etc. Ele gostou de conhecer o lugar onde ela dormia e, deve ser um fetiche, todo homem quer saber como é o ambiente onde sua amada dorme! Ela acordou, ele já estava longe. Ela ligou, ele pediu desculpas foi chamado para resolver negócios e ela tentou dormir mais um pouco. Estava agitada e com fortes dores no corpo e na garganta. Ela foi até o banheiro e se olhou no espelho. O pescoço estava inchado e com marcar indeléveis. Neste dia ela teve que usar gola alta para trabalhar e marcou uma consulta com o médico da família, porem Nicola ligou e ela foi ao seu encontro. Não sabia dizer não para ele. Eles jantaram no restaurante dele e acabaram dormindo lá onde ele tinha uma suíte para qualquer emergência. Ela foi até o banheiro e não encontrou espelho. No quarto nada. Não perguntou e se meteu entre os lençóis e ficou a espera dele. Ele demorou, ela caiu em um sono profundo. Quando acordou já era dia claro, ele dormia a seu lado e Clarissa notou que seu pescoço estava com um nódulo enorme. Assustada ela foi direto até o consultório, a enfermeira a examinou, o médico estava viajando. A enfermeira perguntou se ela tinha algum gato ou cachorro que dividisse a cama como ela. Horrorizada com tanto disparate respondeu que não. A moça porem viu dois pontos e chamou outra enfermeira que brincando disse que deve ter sido Drácula. E pensou, isso pode ter sido mordida de algum bicho estranho. O local foi desinfetado e fizeram discreto curativo. Ela enrolou uma echarpe no pescoço e foi para a empresa. Foi aí que ela notou o quanto sua produção diminui e o piar ela não conseguia mais pentear seus próprios cabelos, pois sentia fortes dores nos braços para segurar a escova e muita fraqueza em todo o corpo. Viu que o que estava provocando... Eram suas saídas noturnas. A fraqueza era tanta que ela foi para casa e passou dois dias sem forças. No terceiro dia ele ainda não tinha telefonado, ela resolveu se levantar e foi primeiro ao restaurante falar com o sócio que disse a ela que ele nunca apareceu por lá durante o dia pois era homem da noite. Foi na casa noturna ver se alguém dava qualquer informação. A resposta foi a mesma. Ela foi até o apartamento dele perguntar porem nem o porteiro sabia de quem se tratava mas se dispôs a abrir o apartamento que estava para ser vendido. Ela entrou, os quadros haviam sumidos e dele nem vestígios. O porteiro lembrou que realmente um homem apareceu interessado na compra e dormiu lá uma noite e desistiu do negócio, alegou que era claro demais. Clarissa desnorteada pediu para ir ao banheiro. O banheiro tinha um espelho do teto ao chão. Ela saiu de lá baratinada e a noite foi novamente a caça dele. A informação foi que foi chamado para voltar para Transilvânia e que o nome dele era Vlad Nicola e que não tem parentes. Ele realmente era sócio de tudo em nome de terceiros. Ela foi até a galeria, lá a galerista de quem ele dizia ser amigo não sabia sequer o nome dele, pois a noite em Clarissa esteve lá e comprou obras de arte, e ele também, foi a primeira vez que ele foi visto circulando por lá e como era muito amável e educado, foi tratado com deferência e que dias antes alguém levou todas as obras de arte dele para serem embaladas e despachadas para o leste europeu em nome de um amigo dele. Ela perguntou se a galerista freqüentava o restaurante e ela disse que sim. E a casa noturna também pois nunca viu ele por lá. Clarissa contratou o melhor investigador particular. Nada foi encontrado. Segundo o seu sócio, Nicola estava de viagem marcada para o leste europeu, porem a companhia aérea foi consultada e o nome de Nicola não constava da lista de passageiros, nem a companhia aérea soube dar qualquer informação. Clarissa se lembrou de uma corrente que ele deu a ela de presente e que a tal corrente de ouro com um pingente enorme que machucava o seu pescoço era de conhecida joalheria. Ela procurou dentro de sua bolsa, a corrente sumiu. Ela foi falar com o joalheiro e explicou que recebeu a corrente de presente e que como perdeu a dela queria repor para não magoar o seu namorado. Na lista de compradores não constava o nome dele. Clarissa voltou para casa e caiu em sono profundo e graças a alimentação recebida se reabilitou e voltou ao trabalho, porem sempre com lenços, echarpes ou golas altas. E de Vlad Nicolas não teve mais noticias. Ela foi até a Transilvania e visitou um castelo do conde Drácula e para sua surpresa lá existe a fotografia de um parente do conde que foi dado como desaparecido que é muito parecido com o Vlad ou Nicola, porem foi tirada do retrato pintado a óleo. A única lembrança de seu amado Nicola é a foto do retrato pintado a óleo de um vampiro. Será que ele descende do Vlad III o empalador que se estima tenha torturado quinze mil otomanos? O príncipe das trevas? Clarissa está em pânico teve seu sangue sugado e quer voltar para qualquer lugar menos a casa de seus pais. A preocupação da governanta é que ela abandonou tudo e vive trancada e muito fraca, se recusa consultar médico e que deu para sumir algumas noites de lua cheia. E que no prédio onde eles têm apartamento alguns moradores ouvem uns uivos terríveis e que todos se preocupam com a jovem promissora que deve andar sofrendo de depressão, excesso de responsabilidades. Nas imediações do Central Park uma jovem disse ter sido atacada ma que conseguiu gritar e assustar o agressor. O pai de Clarissa sente-se culpado do stress da filha que era para estar se divertindo, namorando, e não assumir tantas responsabilidades. Ele acredita que com um tratamento e acompanhamento médico Clarissa volta a ter vida normal. Clarissa não deseja vida normal, ela deseja reencontrar Nicolas Vlad III. Seja lá quem for, e fazer parte do mundo dele! Por enquanto ela sabe que se tornou um perigo para a sociedade.

Autor: Nadia Foes


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