Prisão Temporária e sua Repercussão nos Dias Atuais.



A prisão temporária é sucessora da malfadada "prisões para averiguações".
Sobre a prisão temporária, Machado (2005) explica que é um tipo de prisão provisória, legalizando as chamadas prisões para averiguações, sendo introduzidas em nossa processualística pátria.
Com o enfraquecimento da polícia judiciária, após a promulgação da Constituição de 1988, por ter perdido alguns de seus poderes, entre eles o de prender para averiguação, nasce à prisão temporária, que está prevista na Lei nº 7.960 de 21 de dezembro de 1989.
No entendimento de Machado (2005, p.104): "É uma medida cautelar, devendo ser analisada tanto pela sua configuração teórica no âmbito da teoria geral do processo, tanto pelo seu aspecto dogmático".
Essa particularidade de prisão, por período determinado , tem o escopo de tão somente propiciar meios e condições necessários para a realização de algum ato investigatório, que não seria possível sem a detenção do indiciado, não podendo servir de instrumento para a punição de indiciados suspeitos, tal como as prisões cautelares em geral.
Lopes (2008) alerta que o imputado poderá ser posto em liberdade antes do término desses prazos, não necessitando a intervenção do poder judiciário podendo ser feita pela autoridade policial.
No mesmo diapasão Machado assevera (2005, p.103):

É a prisão por tempo determinado, com finalidade bem especifica, de tal maneira que o seu emprego não presta ao objetivo principal das medidas cautelares clássicas que é o de manter o indiciado no distrito da culpa com fim de assegurar a efetiva aplicação da lei penal.

Essa custódia apenas é justificada se for extremamente necessária e indispensável para prática de alguma diligência investigatória que ficaria prejudicada com o indiciado em liberdade.
Para Lopes (2008) trata-se de uma prisão cautelar que tem por escopo satisfazer o interesse da polícia permitindo que essa tenha em tempo integral total disposição do imputado, e ainda, como bem entender, sob o manto da "imprescindibilidade para as investigações do inquérito".
A prisão temporária somente será decretada nas seguintes hipóteses da Lei 7.960/89 (CÓDIGO PENAL, p. 500):

Art. 1º Caberá prisão temporária:
I - quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;
II - quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade;
III - quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:
a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2º);
b) seqüestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1º e 2º);
c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1º, 2º e 3º);
d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1º e 2º);
e) extorsão mediante seqüestro (art. 159, caput, e seus §§ 1º, 2º e 3º);
f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único);
g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único);
h) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo único);
i) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1º);
j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art. 285);
l) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal;
m) genocídio (arts. 1º, 2º e 3º da Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956), em qualquer de suas formas típicas;
n) tráfico de drogas (art. 12 da Lei nº 6.368, de 21 de outubro de 1976);
o) crimes contra o sistema financeiro (Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986).


Como todas as outras modalidades de prisões cautelares, a temporária somente deverá ser decretada em casos excepcionais, de extrema urgência e necessidade, e ainda quando a tal imprescindibilidade descrita no inciso I do artigo supramencionado estiver verdadeiramente demonstrada.
Para Martins (2007) o conceito de imprescindível comporta muitas interpretações, sendo um conceito extremamente aberto. Desta feita, deverá o juiz agir com prudência, ponderar e conduzir com certo rigor hermenêutico, aplicando tal medida quando a imprescindibilidade estiver demonstrada, sob pena de causar sérios riscos a liberdade individual.
"A circunstância fática definida na lei como "imprescindível para as investigações" convenhamos, é mesmo de difícil caracterização" (MACHADO, 2005, p.105).

O Risco da Decretação da Prisão Temporária

Lopes (2008) enfatiza para os ricos da decretação de tal medida, pois todo o cuidado é pouco até porque a cultura é inquisitória. A mentalidade da polícia é de obter uma confissão a todo custo, cabendo ao juiz suma prudência, pois a polícia brasileira ainda nos tempos atuais faz uso de métodos primitivos e medievais, permitindo que muita injustiça seja cometida.
Machado (2005) explica que nessa modalidade de prisão o preso fica integralmente a disposição da autoridade policial, o que lhes dá plena autonomia, inclusive para que o detido fique preso na própria delegacia de polícia, contrariamente da prisão preventiva, em que a rigor o preso encontra-se em estabelecimento prisional e, se a autoridade policial quiser interrogá-lo, terá que solicitar autorização para o juiz competente.
"Significa dizer que ele está 24h por dia à disposição de todo e qualquer tipo de pressão ou maus-tratos, especialmente das ardilosas promessas do estilo confessa ou faz uma delação premiada que isso acaba". (LOPES, 2008, p. 121):
Corroborando com o entendimento supramencionado Vargas (1992) explica que na prática, durante o período determinado em lei o poder judiciário, em especial o juiz que decretou a prisão temporária, permite que um mero suspeito fique sujeito a maus tratos que não deixam vestígios, não tendo nenhuma valia o exame médico para constatar as violências sofridas. O autor ainda enfatiza que a polícia apenas prende o cidadão para prática de maus tratos, pois se não houvesse necessidade deles não teria necessidade da decretação de tal medida.
"A tortura esta está aí, no dia-a-dia das delegacias e casas de detenção espalhadas pelo Brasil, mas sem dúvida mudou de cara: é muito mais psicológica do que física, mas não por isso menos cruel e eficiente". (LOPES, 2008, p.121).
"Eu não concordo com a tortura que se fez no regime militar e não concordo com a tortura que se faz hoje nas prisões". (Ministro do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, (GILMAR MENDES) .
Lopes ainda complementa (2008, p.121): "A prisão temporária cria todas as condições necessárias para se transformar em uma prisão para tortura psicológica, pois o preso fica a disposição do inquisidor".
Tourinho Filho (1998) considera prisão temporária como "medida odiosa e arbitrária". O doutrinador lembrou que durante o período autoritário do regime burocrático/militar, especificamente nos governos de Ernesto Geisel e Costa e Silva, houve diversas tentativas de se legalizar a chamada prisão para averiguações, hoje conhecida em nosso ordenamento jurídico como prisão temporária.
Para Lopes (2008, p.121): "A prisão temporária é um importantíssimo instrumento na cultura inquisitória que ainda norteia a atividade policial, onde a confissão e a "colaboração" são incessantemente buscadas".
Não se admite a manutenção da prisão temporária ao longo do processo exatamente porque isso fugiria à finalidade do instituto e significaria invasão indevida no campo específico da prisão preventiva, sendo a única medida cabível para a restrição de liberdade durante a fase do processo judicial.



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Autor: Sandro Roberto Vieira


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