O Primeiro passo



O Primeiro passo.


Autor: Eduardo Silveira



Olha amor! Vou colocar isso aqui no carro e já volto pra fechar tudo, tá?
Tudo bem!? Respondeu ela, voltando-se rapidamente para ele e esboçando um meio sorriso.
Assim que Daniel fechou a porta e saiu, ela voltou a fixar o olhar para algum ponto indefinido no horizonte. Sua mente, pensativa, vagava muito além da janela daquele apartamento.
Havia uma ansiedade grande em todo o seu interior, principalmente agora, que a mudança de cidade era uma coisa inevitável.
Mas, em seu íntimo, ela sabia que não era só, aquela mudança, que a estava incomodando.
Os seus pensamentos voavam aleatoriamente ao longe. E, como se um filme fosse, várias fases de sua vida foram cruzando a sua mente, rápidas como um bólido, mas ela conseguia reconhecer cada quadro, cada situação que se apresentava.
E, nesse devaneio, se viu menina, viu a mãe cuidando dela, colocando seu uniforme da escola, viu a mãe presenteando-a com coisas que ela havia desejado tanto, viu a mãe ralhando com ela por ter feito uma bobagem qualquer...Viu alguns amigos queridos, outros nem tanto, enfim, diversos quadros se apresentaram, e ela reconheceu a todos.
E, junto a esses quadros felizes, apresentaram-se também alguns, medos, preconceitos, anseios, dúvidas, e algumas frustrações.
Mas, e a alegria? E a felicidade, onde estavam? Onde haviam ficado? ? Perguntou a si mesma.
Era óbvio que em sua vida ela tivera momentos de alegria e de felicidade também, mas, porque não conseguia lembrar-se deles com clareza? - Continuou se perguntando.
Maria Lúcia reconheceu que era o medo que estava bloqueando suas emoções. E não deixava espaço para as lembranças dos momentos felizes. Uma onda de tristeza nublara seus olhos que se umedeceram. Chegou mais perto da janela e suas mãos seguraram firme no parapeito apoiando-se. Teve a impressão que ia desmaiar, mas nada aconteceu. Foi só um mal estar súbito. Uma agonia que a estava devorando por dentro.
E ali, de pé, sozinha, somente ela e a sua consciência, começaram a travar uma batalha interior.
Precisava descobrir qual era a causa real daquele medo, que a estava apavorando tanto.
Então, começou a se questionar.
Como seria a sua vida dali pra frente. Como ela iria administrar sua vida, sua casa nova, a vida em comum com o seu marido? Será que ela seria forte o suficiente para enfrentar esse desafio? E os outros que, com certeza também viriam, será que ela suportaria?
Meu Deus! ? assustou-se, com tantas perguntas e dúvidas que insistiam em martelar a sua mente.
Retrocedeu um pouco no tempo.
A sua vida inteira vivera ali. Sempre fora cuidada zelosamente pela mãe. O seu porto seguro era ali, aquele apartamento, o qual ela conhecia cada cantinho e onde cada cômodo tinha uma estória. Mais nova, fizera um intercâmbio e morara por uns meses em um outro país, mas aquela época, era um outro contexto. Agora era uma mudança real, não apenas um sonho.
E agora, o que aconteceria? - Perguntou a si mesma.
Se sentiria só? Triste?
Era óbvio que sim, mas teria muitas alegrias também, desde que se dispusesse a tê-las. ? Pensou.
A vida iria passar de qualquer modo. Com tristezas, alegrias, com sorrisos ou lágrimas, a vida não espera ninguém. Ela passa. E quem quiser viver, que procure embarcar nessa locomotiva e aproveitar a viagem, da melhor maneira possível.
E era isso exatamente o que ela queria. Viver bem. Estar bem. Ser feliz.
E ela percebeu que só havia uma maneira de sentir-se assim. E essa felicidade almejada não seria por causa dos carinhos de sua mãe, por causa do imenso amor que seu marido tinha por ela ou pelo afeto sincero dos seus amigos. Não. Nada disso.
Só uma pessoa no mundo poderia fazê-la, realmente, ser feliz.
E essa pessoa, era ela mesma.
Seu rosto se iluminou.
Toda mudança. Toda expectativa. Todos os sentimentos que afloravam e mexiam tanto com ela, eram na realidade, ranços do passado, que como raízes profundas a estavam amarrando, estagnando sua vontade de mudar, de se realizar, de pensar e voar alto, de ir sem medo, ao encontro da felicidade.
Seu olhar mudara. Respirou lenta e profundamente.
E, pela primeira vez, em muito tempo, ela constatou que tinha tudo pra ser feliz. Era amada pelos seus pais, pelos seus amigos, pelo seu marido, só faltava ela mesma, se amar de verdade.
E reconhecendo isso, seu coração se desanuviou, ficou mais leve. Sentiu-se bem.
E assim pensando, disse a si mesma: - Eu me amo e me amo muito.

-Vamos! ? falou Daniel.
Maria Lúcia voltou-se e disse: - Vamos sim.
Quando ela chegou perto da porta, Daniel lhe perguntou: - Aconteceu alguma coisa??
Ela respondeu: - Não,nada. Tudo bem.
Ele retrucou: - Ok. Então vamos?
Enquanto ele fechava a porta do apartamento, ela se aproximou dele e disse baixinho: - Sabe que eu te amo?
Daniel sentiu um frio percorrer-lhe a espinha.
Seus olhos se encontraram, e, pela primeira vez ele viu uma luz diferente cintilando nos olhos dela.
- Eu também te amo. ? Disse ele ternamente.
Ela não falou mais nada. Apenas sorriu discretamente.
Em seu íntimo, ela sabia que ao decidir ser feliz, havia dado o
primeiro passo em direção a uma nova vida, e que esta, seria vivida baseada na verdade, na fé e na esperança de sempre buscar a verdadeira felicidade.



Autor: Eduardo Silveira


Artigos Relacionados


O Convite

Um Brilho Especial.

Amigos Ou Algo Mais ? (i)

Não Deixe A Sua Felicidade Nas Mãos De Ninguém

O Anjo Que Descobriu O Amor

Don't Look Back In Anger...

PedaÇos De Gesso