A DEPRESSÃO PÓS-TRAUMÁTICA




JOSÉ MANOEL DE SOUZA RODRIGUES
Assistente Social/Psicanalista


RESUMO

O presente trabalho trata-se de uma dissertação psicanalítica inspirada em um caso de depressão pós-traumática apresentada em um refém de rebelião. Em face da inseparabilidade entre a teoria e a prática, foi necessário pesquisar a obra de diversos autores, entre eles Freud, Lacan e Klein, possibilitando dividir a pesquisa em sete capítulos, quais sejam: Depressão - Os discursos da psicanálise e da psiquiatria - Depressão, luto, melancolia e neurose obsessiva - A depressão: covardia moral e as relações existentes ? Melanie Klein e a posição depressiva ? A psicossomática e ? Apresentação do caso clínico. Ao final da leitura será possível a compreensão de que a psicanálise é completamente viável e perfeitamente indicada para o tratamento da depressão pós-traumática, sendo que a função fundamental do psicanalista é a instigação do desejo.
Palavras-chave: depressão ? depressão pós-traumática ? analista ? analisando ? psicanálise.


RESUMEN

Este trabajo es un ensayo psicoanalítico inspirado en un caso de depresión post-traumática presentado en un rehén de rebelión. Teniendo en cuenta la inseparabilidad de la teoría y la práctica, fue necesario investigar el trabajo de muchos autores, entre ellos Freud, Lacan y Klein, lo que permite dividir la búsqueda en siete capítulos, que son: Depresión - Los discursos del psicoanálisis y la psiquiatría ? Depresión, luto, melancolía y la neurosis obsesiva ? La depresión: cobardía moral y las relaciones existentes ? Melanie Klein y la posición depresiva - psicosomática y ? Presentación del caso clínico. Al final de la lectura será posible entender que la psicoanálisis es totalmente viable y perfectamente adecuada para el tratamiento de la depresión post-traumática, siendo que la función clave del psicoanalista es la instigación del deseo.

Palabras clave: depresión - depresión post-traumática - analista - analizando - psicoanálisis.


INTRODUÇÃO

A presente dissertação foi inspirada nas visitas que o autor passou a receber de um dos reféns da série de rebeliões de presos comandada pelo crime organizado, ocorrida nos presídios do estado de São Paulo, durante o mês maio de 2006. Importante notar, que essas visitas foram muito intensificadas de um ano para cá. Assim, doravante, neste trabalho, o visitante será chamado pelo nome fictício de ASP e estará na condição de analisando e o autor na condição de analista.
Ressalta-se que o analista em destaque, conhece os detalhes do fatídico acontecimento, estando em condições de não somente reconhecer e tratar psicanaliticamente os sintomas apresentados pela vítima, mas de saber o que realmente o analisando "sente". Isso, em decorrência de também ser servidor da Secretaria de Administração Penitenciária do estado de São Paulo e, na ocasião da série de acontecimentos que culminou com simultâneas rebeliões em várias unidades penitenciárias, também fora feito refém. Vale lembrar, que coincidentemente, ambos, analisando e analista, no tempo em que estiveram em poder dos sentenciados, sofreram intensa tortura psíquica e foram incontavelmente ameaçados de morte e, que os rebelados, eram mais de 1000 criminosos fortemente armados com submetralhadoras, revólveres, facas e barras de ferro.
Assim, de um ano para cá, paralelamente ao tratamento psiquiátrico, que já vem sendo realizado desde maio de 2006, o analisando passou a ser tratado psicanaliticamente.
No decorrer do percurso clínico, no entanto, começou-se a elaboração e questionamento da queixa inicial, a "depressão", dando espaço ao trabalho analítico e, mais especificamente, ao trabalho de luto.
Dessa forma, as visitas do analisando instigou a retomada e discussão de alguns conceitos psicanalíticos, afirmando o legado de Freud em sua ênfase na indicação de que, na psicanálise, a teoria e a prática são da ordem da inseparabilidade..
É importante lembrar, que no contexto psicanalítico, o "campo de pesquisa" é o inconsciente, mais propriamente o sujeito do inconsciente. Dessa forma, ao se acessar o sujeito do inconsciente, se está pesquisando.
O início da pesquisa teórica dar-se-á mediante o estudo da depressão, iniciando-se pela definição da doença através da leitura de várias obras e, dentre os vários autores, serão destacados Freud, Lacan e Klein.
Ao ser estudado o Transtorno de Estresse Pós-Traumático e sua comorbidade com a depressão, serão verificadas as diversas formas de tratamento, inclusive do ponto de vista da psiquiatria. Na seqüência, aprofundaremos os estudos no tocante ao trauma e psicanálise e teremos a oportunidade de verificar o quão difusa é a literatura freudiana, notadamente em relação às exposições traumáticas.
Merecerá destaque o diagnóstico da depressão, tanto do ponto de vista psicanalítico, quanto psiquiátrico.
Serão comentados os discursos da psicanálise e da psiquiatria, onde além dos quatro discursos de Lacan, aparecerá sua quinta proposição, o discurso capitalista.
Ficarão esclarecidas as considerações e comparações acerca da depressão, do luto, da melancolia e da neurose obsessiva, além de um importante estudo sobre a pulsão de morte.
De bastante relevância para o presente trabalho será o entendimento da depressão como covardia moral, conforme Lacan, o qual afirma que a depressão aparece justamente quando o sujeito abre mão de seu desejo, se acovardando, sendo, portanto, uma reação do eu, que estando inchado, recusa o que vem do inconsciente. Ainda no tocante a este assunto, estudaremos a intrínseca relação existente entre o desejo, a falta e a lei, demonstrando que para a psicanálise, o desejo tem uma significação única e particular, só podendo advir, a partir da falta.
Verificaremos que a castração é o ponto de partida da organização da estrutura, sendo esta, operada pelo complexo de Édipo. Entenderemos que a depressão se trata de uma forma que o sujeito encontra para não lidar com o desejo, não sendo simplesmente um produto da cultura.
Será Interessante também o estudo da correlação com a posição depressiva postulada por Melanie Klein, para quem existem duas posições fundamentais no desenvolvimento psíquico: a posição esquizo-paranóide e a posição depressiva, merecendo destaque a segunda.
Ao final, antes da apresentação do caso clínico, já mencionado inicialmente, será efetuada ainda, uma incursão pela psicossomática, com destaques para a origem, a ciência moderna e as contribuições freudianas. Veremos que existem muitas coincidências entre os aspectos característicos das neuroses atuais descritas por Freud e a medicina psicossomática.
Verificaremos que o marco da psicossomática é a obra do médico alemão Georg Groddeck, para quem, uma vez sendo psicossomática a essência humana, a psicanálise pode compreender e tratar as doenças orgânicas.
Ao aprofundarmos os estudos em torno do médico e psicanalista Pierre Marty, apreenderemos que a base da teoria sobre pacientes psicossomáticos - é o conceito de depressão essencial e, que na clínica desses pacientes, não se estabelece uma relação afetiva, de transferência com o outro, nem mesmo com o analista, supondo que este mediante a articulação de seus problemas com os fatos concretos, irá resolvê-los.


CAPÍTULO 1
A DEPRESSÃO

A depressão é inegavelmente a doença do momento, bastando o indivíduo estar se sentindo triste para logo o senso comum diagnosticá-lo como deprimido, o que não é verdade, haja vista ser normal da natureza humana, a presença de sentimentos de tristeza em determinados momentos da vida, tanto em pessoas onde a doença realmente esteja instalada ou não, sendo, portanto, um engano comparar as fases de tristeza comuns a todo ser humano com a doença "depressão".
Estar com depressão é algo bem diverso do que está apregoado na sociedade contemporânea e exige tratamento, sendo dispensáveis aquelas recomendações tradicionais que parentes e ou amigos fazem, acreditando que aconselhando o indivíduo a sair, a procurar diversão, ou seja, a reagir de modo contrário, irá tirá-lo de seu sofrimento, pois isso em nada ajuda, muito pelo contrário, essas pessoas poderão ser interpretadas pelo doente como sendo egoístas e incapazes de compreenderem suas dores.
O fato é que nem mesmo o médico, nem o psicanalista ou qualquer outra pessoa, podem entender quais os reais sentimentos do deprimido; tudo que podem é reconhecer e tratar os sintomas, mas o sofrimento somente o paciente conhece.
Até o momento a ciência ainda não consegue explicar a causa exata da depressão, encontrando-se, porém, relação entre acontecimentos na vida das pessoas e o início de um episódio depressivo, não descartando a possibilidade da existência da predisposição e vulnerabilidade.
Para que o sujeito seja diagnosticado como depressivo, é preciso que apresente um grupo de sintomas centrais, dentre eles a tristeza e, tais manifestações, devem estar presentes a maior parte do dia e em quase todos os dias. São vários os tipos de depressão, podendo ser a psicanálise e a psiquiatria indicadas para tratamento; nesta, a necessidade ou não da utilização de antidepressivos vai depender da experiência do profissional.


1.1 A depressão pós traumática

A grande maioria dos trabalhos acerca da depressão após evento traumático, mostra que antes de seu aparecimento, o indivíduo é acometido por TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático), existindo assim, uma relação entre a ordem cronológica e a causalidade, sugerindo que em havendo comorbidade, os sintomas depressivos apresentam-se de forma mais intensa.
Importante se faz esclarecer, que o trabalho intitulado "A depressão e o desejo na psicanálise", escrito por Érica de Sá Earp Siqueira (2006), foi extremamente relevante, servindo-nos de espelho e luz na busca por demais referências teóricas, notadamente no presente capítulo.
É grande a quantidade de sintomas comuns entre o TEPT e a depressão maior. Conforme Franklin & Zimmerman, citado por Berlim et al ( 2003), apud SIQUEIRA (2006):

"uma das razões para a ocorrência da comorbidade poderia ser a sobreposição de sintomas (sintomas "contaminados" ou comuns) entre os transtornos (como anedonia, problemas de concentração e de sono). A hipótese, contudo, não foi sustentada empiricamente, o que sugere que a comorbidade não é um artefato dos sintomas ?contaminados?".

Ainda conforme Berlin et al (2003), citado por Siqueira (2006), pesquisas de Blanchard et al, foram conclusivas na afirmação de que a depressão maior e o TEPT, embora correlacionados, apresentam respostas independentes ao trauma, sendo suficiente a presença de cinco sintomas para se diagnosticar comorbidade. Com a pré-existência da depressão maior aumentaria a suscetibilidade à ocorrência de TEPT após um trauma psíquico, bem como que o TEPT aumentaria o risco do primeiro episódio depressivo desenvolver-se, havendo ainda evidências de que a depressão maior aumentaria o risco para exposição ao evento traumático. Dessa forma, essas correlações possibilitam existir entre a depressão maior e o TEPT uma vulnerabilidade comum. De acordo com o autor, pesquisas de Breslau et al, independentemente do desenvolvimento do TEPT, a ocorrência de eventos traumáticos aumentaria o risco para a depressão maior. Foi relatado por esses autores que em indivíduos com depressão maior prévia, a exposição a trauma foi mais elevada, comparando-se a indivíduos sem depressão. Dessa forma, nas palavras de BERLIN et al (2003), apud SIQUEIRA (2006):

"Os indivíduos expostos com história pregressa de depressão maior apresentaram um maior risco para desenvolver TEPT do que os não-deprimidos. Indivíduos com TEPT que experimentaram um novo evento traumático durante os cinco anos subseqüentes tiveram, durante esse período, um aumento do risco para desenvolverem o primeiro episódio depressivo. Em contraste, pessoas que experimentaram trauma durante o período de cinco anos, mas não desenvolveram TEPT, tiveram um modesto e não significativo aumento do risco para desenvolver o primeiro episódio de depressão maior. Dessa forma, os autores concluíram que a depressão maior pré-existente aumentaria o risco para exposição a eventos traumáticos e para o desenvolvimento de TEPT em mais de três vezes".

Segundo o autor, compreender a depressão maior e o TEPT como entidades separadas e distintas nos casos comorbidos, pode ser um erro, uma vez que o achado acima descrito não sustenta a hipótese de que a depressão que resulta de eventos traumáticos é independente do TEPT. É de se supor a estreita relação existente entre a depressão maior e o TEPT, mas cada caso, em decorrência da complexidade dessa relação, deve ser analisado em separado.
Dessa forma, para uma abordagem da depressão na vida de alguém que passou por um trauma, no caso do estudo em destaque ? "um refém de rebelião", é interessante que se faça a partir de uma reflexão sobre esse momento particular na vida do sujeito, em que as perdas aparecem de forma mais efetiva, impondo um trabalho de luto. São perdas sucessivas e variadas, relacionadas às somatizações psicogênicas, sofrimento moral e vida financeira; esta última em decorrência dos descontos relativos às licenças médicas. Nesse contexto, nem sempre o sujeito consegue elaborar lutos, razão pela qual a depressão parece ser cada vez mais comum na vida de pessoas que passam por um evento traumático.
O interesse em refletir sobre a depressão pós-traumática abarca algumas questões, quais sejam: a existência de uma particularidade na clínica psicanalítica com os psicotraumatizados; a posição de Freud acerca do atendimento psicanalítico aos portadores de trauma psíquico e; a possibilidade da clínica psicanalítica em face de lidar com o sujeito.
Em se tratando de perdas, é interessante mostrar que em relação a Freud, suas perdas mais substanciais ocorreram principalmente em sua velhice, coincidindo com o surgimento de um câncer, de forma que as principais foram:
-perde sua filha Sophie de vinte e seis anos de idade, em 1919, aos sessenta e três anos;
-aos 65 anos de idade, quando afirma a Ferenczi ter entrado na velhice, detecta o surgimento de um tumor maligno em sua mandíbula;
-perde seu neto, filho de Sophie, de apenas quatro anos e meio de idade, em 1923 e;
-confissão em carta a Ferenczi, de estar sofrendo de depressão.
Houve um pedido de Freud ao médico e à sua filha Anna, no ano de 1939, no sentido de que sua vida fosse abreviada quando se tornasse insuportável tolerar a dor e o desespero, no que foi atendido, recebendo uma injeção de morfina, entrando em coma e morrendo em seguida. O autor, no período em que estava muito doente, realizou importantes contribuições à psicanálise.
Quanto ao objeto de estudo do presente trabalho, trata-se de uma pessoa com idade entre 40 e 50 anos de idade e, acerca desse marco ou acima, FREUD (1905 [1904]) apressadamente afirmou ser importante a consideração da idade dos pacientes quando da indicação para o tratamento psicanalítico, uma vez que em pessoas nessa faixa etária, a plasticidade dos processos anímicos de que depende este trabalho, não haveria mais, já que pessoas a partir de certa idade não se deixariam educar, além de que o material a ser elaborado prolongaria a duração do tratamento indefinidamente; afirma ainda neste texto, que nos casos de depressão profunda, estados confusionais e psicoses, a psicanálise seria contra-indicada, ressaltando não ser absoluta a impossibilidade, haja vista poder-se modificar o método, o que poderia superar a contra-indicação no caso das psicoses.
Freud, em alguns momentos, parece repensar quanto à posição da utilização da psicanálise em pessoas de mais idade, a exemplo de seu texto "Sobre a transitoriedade", onde observa que: "a limitação da possibilidade de uma fruição eleva o valor dessa fruição" FREUD (1916[1915]), fazendo referência a uma flor que, por durar apenas uma noite, não deixava de ser bela. Faz comentários que enquanto a transitoriedade diminui a beleza da flor para uns, seria ainda mais apreciada para outros. Assim, em forma de poesia, observa que é de se pensar, que o sujeito estando mais em contato com o próprio fim, facilitaria o suposto pouco tempo para trabalhar em uma análise. A partir da afirmação acima, Mucida (2004) deixa evidente, que para pessoas com mais idade, o limite do tempo para se definir algumas posições subjetivas abrevia o tempo de compreender e concluir, ou seja, o curto período de uma análise pode ser usufruído de forma melhor. Sendo assim, diminui a tendência às defesas e resistências ao tratamento analítico, em relação aos outros adultos. Portanto, uma vez que para a psicanálise existe o sujeito do inconsciente e do desejo, logo, independentemente da idade cronológica, é completamente viável o tratamento psicanalítico.
Em sua tese principal: O sujeito não envelhece, Mucida (2004) se apóia justamente no estatuto do sujeito para a psicanálise, haja vista, que tanto para Freud, como para Lacan - o sujeito, no que se refere ao inconsciente, não envelhece, assim como o desejo caracteriza-se por seu caráter indestrutível e independente da idade; o sujeito não envelhece mediante a atemporalidade do inconsciente.
É afirmado em Freud (1915), no texto "Nossa atitude para com a morte" que, cada um em seu inconsciente, está convencido de sua imortalidade; assim, o comportamento do sujeito é o de que não acredita na própria morte. É interessante que só se pode imaginar algo em relação à própria morte, na condição de expectador, pois nosso desejo habita no inconsciente, lócus onde inexiste uma representação simbólica da morte; daí a crença do sujeito, agindo como se fosse imortal.
Assim, de acordo com o postulado psicanalítico do inconsciente, são inexistentes a idade cronológica e a idade para o desejo, mesmo porque em havendo desejo, a psicanálise é viável, pois o sujeito é o desejo. Dessa forma, quando o sujeito desiste de desejar, surge o que chamamos de depressão, que na concepção de Lacan - trata-se de uma "covardia moral", estado possível a qualquer idade, podendo ocorrer até mesmo em sujeitos muito jovens.

1.2 Tratamento psiquiátrico da comorbidade "depressão maior-TEPT"

Em face da inexistência de trabalhos apontando diferentes formas de tratamento para a comorbidade entre o TEPT e a depressão maior, mediante consenso entre especialistas em TEPT, em 1999 o Journal of Clinical Psychiatry, citado por Siqueira (2006), publicou um informativo de tratamento da comorbidade, apresentando-se como melhor alternativa, embora se saiba da inferioridade científica dos consensos em relação aos estudos controlados e das metanálises. Assim, o tratamento da depressão maior comórbida com o TEPT, segue os princípios adotados no tratamento do TEPT puro.
Dessa forma, o tratamento inicia-se com um ISRS (Inibidor Seletivo da Recaptação de Serotonina), em doses relativamente baixas, sendo gradualmente incrementada ao longo de um período de 6 a 12 semanas. Não havendo melhora sintomatológica ao final de 4 a 8 semanas em dose plena, poderá ser indicado um outro antidepressivo (em geral nefazodona ou venlafaxina). Havendo em 8 a 12 semanas uma resposta parcial pode-se adicionar um segundo fármaco, a exemplo de um anticonvulsivante ou lítio. A medicação deve ser continuada por um período de manutenção por pelo menos 12 meses, caso houver uma resposta clínica ou remissão dos sintomas.
Abaixo duas tabelas extraídas de BERLIN et al (2003), apud SIQUEIRA (2006):

Do ponto de vista da psiquiatria, recomenda-se além do tratamento farmacológico, a psicanálise ou outra abordagem psicoterápica.


1.3 Trauma e psicanálise

A literatura freudiana é difusa no tocante às exposições traumáticas, estando reportadas à histeria e às neuroses de guerra, sendo possível depreender-se, que no geral, o trauma está relacionado à falta de preparo do sujeito em absorver ou integrar uma excitação psicossexual. Dessa forma, o efeito traumático é provocado após a introdução do agente causador.
O espaço entre o acidente e a manifestação inicial do sintoma é chamado por Freud de "período de incubação". Dessa forma, conforme exemplo encontrado em WEREBE et al (2003), apud SIQUEIRA (2006):

"uma menina de oito anos é bolinada pelo vendedor de balas ao passar, excitado, as mãos sobre a genitália dela. Somente aos 12 anos, ou seja, na entrada da adolescência, assistiremos nela uma reação: uma angústia ao se encontrar, na rua, nas proximidades de lojas. Isto se desenvolve, no decorrer da vida desta paciente, num quadro misto de depressão, fobia e ansiedade. Basta este caso, descrito por Freud em 1895, para entendermos que o efeito propriamente traumático surge quando o sujeito fica suscetível, sexualmente, à compreensão do sentido que o ataque abriga".

Podem ocorrer casos em que os sujeitos após serem vítimas em algum evento traumático, depois de um abalo físico inicial, que em seguida se apaga da memória, tornando-se desconexos afetivamente do impacto, de forma que o indivíduo passe a agir mecanicamente e de forma desorientada, não sentindo dor, pânico ou medo, podendo reaparecer as reações esperadas, não raramente, até mesmo após anos em forma de inibições e restrições funcionais acompanhadas de ansiedades, fobias e visões alucinatórias associadas aos acidentes. Postula Freud, que pela magnitude do efeito, o acidente estimula uma quota afetiva do instinto sexual que deveria acionar o sistema de alerta, de angústia-sinal, em forma de dor, etc. O autor refere-se, neste caso, nas palavras de WEREBE (2003), apud SIQUEIRA (2006):

"a uma espécie de insistência, de compulsão pela repetição, que operaria, então, de forma masoquista sobre o ego, por exemplo, no retorno coercitivo de imagens violentas dos acidentes, até tornarem-se pesadelos e provocarem angústias e inibições. Os últimos, pesadelo e angústias, são, então, bem-vindos já que assinalam a possibilidade de um trabalho mental para sua integração no universo psíquico".

Os conceitos de Freud podem ser transcritos para a atualidade. Conforme WEREBE (2003), apud SIQUEIRA (2006):

"A guerra de 1973, entre Israel, Egito e Síria, gerou, anos depois (15 a 25 anos), um problema grave, inclusive econômico, para as autoridades israelenses. O serviço israelense de psiquiatria teve de emitir licenças médicas de trabalho e indenizações para veteranos acometidos de TEPT, anos depois da guerra. Do ponto de vista psicanalítico estrutural, pode-se dizer que a neurose torna-se possível por um conflito: na neurose de guerra, o conflito seria entre o ego pacífico e um ego belicoso que o repudia. O ego antigo, pacífico, protege-se de um perigo mortal, defendendo-se de um novo ego bélico, protegendo-se em uma neurose traumática".

Do conflito gerado entre o ego e os instintos sexuais, aquele repudiando estes, geralmente pode ocorrer neurose, de maneira que o perigo estaria no próprio indivíduo, podendo haver também o real perigo externo, mas Freud afirma ser pouco provável a ocorrência de uma neurose sem a participação de estados inconscientes, ou seja, somente por um real perigo mortal.
Existem semelhanças entre as neuroses de guerra e de paz, ocorrendo em ambas, perturbações da vida emocional com conflitos mentais inconscientes. Assim, nas neuroses, o ego defende-se de uma ameaça, que tanto pode ser externa, quanto incorporada a uma forma assumida por ele próprio, seja em tempos de guerra ou de paz. Já o inimigo nos casos de neuroses de transferência em épocas de paz é a libido, cujas exigências parecem ameaçadoras. Ainda quanto a essas épocas de paz, observa-se, nos casos de neurose traumática, uma relação entre medo, ansiedade e libido narcísica.
Na formação do sintoma neurótico, há que se considerar ainda, o ganho secundário imediato, a exemplo do afastamento do ambiente e ou atividades propiciadoras ao aparecimento dos sintomas.
Segundo Freud, como os casos das neuroses de guerra eram apresentados por uma minoria, os motivos evidentes compensavam-se por outras motivações inconscientes, a exemplo da ambição, auto-estima, patriotismo, hábito de obediência, entre outros. Dessa forma, na consideração de que os neuróticos estavam simulando uma doença, procuravam inclinar a balança, visando somente recuperá-los para retornarem à guerra, não se importando com a doença. Assim, aplicavam-lhes tratamento elétrico doloroso, associando a doença à dor, podendo até haver recuperação, mas o efeito era muito curto, fazendo com que os pacientes, às vezes fossem a óbito, até mesmo suicidando-se. Ernst Simmel deu os primeiros passos para tratar os neuróticos de guerra através da psicanálise, utilizando-se da catarse.
Nos casos em que acidentes provocavam sintomas histéricos, a exemplo de alucinações visuais recorrentes, perdurando-se por muito tempo após a ocorrência do fato, Freud chamava de "histeria traumática", que pode ser comparada aos transtornos do estresse pós-traumático atual. Em ambos os casos a causa é proveniente da emoção e do susto sofrido, não decorrendo de danos físicos, já que estes operam contra o desenvolvimento de uma neurose.
De acordo com Freud, indivíduos ansiosos são protegidos do susto e da neurose traumática, devendo ser a ansiedade, o medo e o susto distinguidos na etiologia das neuroses traumáticas, tendo em vista ser a ansiedade um estado particular de espera do perigo ou preparar-se para ele, mesmo que desconhecido. Já o medo exige um objeto definido do qual se tenha temor, enquanto que o susto trata-se do estado de surpresa que alguém fica sem estar preparado, ao entrar em contato com o perigo.
Através do portador de neurose traumática, na situação de acordar em outro susto após um sonho, o que não é de se esperar - uma vez que se considera que a natureza dos sonhos seria uma realização dos desejos do paciente, Freud desenvolveu, numa tentativa de elaboração do ocorrido, a teoria da compulsão e a repetição, de forma que procurava repetidamente trazer o paciente ao momento do acidente.
O sujeito reage de forma complexa a seus sintomas, tendo em vista a angústia pela intrusão do que se reproduz de um lado e, por outro, a fascinação pela cena traumática inicial ? a fascinação pelo horror.
O trauma afeta o equilíbrio narcisista e sendo não representado ou insuficientemente representado, não pode ser ligado e integrado nos sistemas mnêmicos. O trauma não se representa, ele se apresenta; é como se uma parte da experiência vivida escapara de toda subjetivação, não encontrando palavras para descrevê-la, de forma que produz a ruptura da continuidade, podendo ir desde uma ferida até uma amputação. Assim, dependendo da susceptibilidade da pessoa afetada, um susto, uma vergonha, uma dor física, ou outra experiência que provoque emoções aflitivas - pode atuar como trauma. Dessa forma, de acordo com a estrutura de personalidade e a história de vida anterior ao trauma, uma vez que vulnerabilidades prévias como traumas precoces, vínculos afetivos instáveis e alterações da auto-estima, podem influenciar ou não o risco de desenvolvimento do TEPT.
Particularmente na histeria, as causas desencadeantes que compõem a história de sofrimento, podem ser por vários traumas parciais, havendo casos, em que uma circunstância pouco expressiva em combinação com o fato realmente atuante, ou mesmo ocorrendo quando o sujeito por algum motivo esteja susceptível ao estímulo, atinge a categoria de um trauma, que de outra forma não teria ocorrido. De acordo com Freud existe a possibilidade de estados hipnóides, nos quais o indivíduo fica mais susceptível a desenvolver a histeria.
Agindo muito tempo depois, o trauma psíquico ou sua lembrança, é como se fosse um conflito psicológico adormecido, mas não resolvido - que fosse reativado. No caso de um trauma de infância, revivê-lo resultaria em regressão e no uso de mecanismos de defesa: repressão, negação e anulação. Seria uma tentativa do ego em dominar e reduzir a ansiedade.
Acerca do tratamento, de acordo com a teoria freudiana, a ab-reação traduz-se num método eficaz contra os sintomas histéricos. No início, Freud se utilizava da hipnose, desenvolvendo posteriormente o método catártico - através do qual ocorria uma melhora dos sintomas traumáticos, quando experimentava novamente a vivência traumática com uma emoção intensa, ao passo que sem emoção - a recordação do trauma em nada resultava.
Foram descritas por Freud duas variedades básicas das neuroses traumáticas, ou seja, uma individual e outra mais abrangente, a exemplo das neuroses de guerra. Além destas, outros autores propuseram mais duas alternativas: as neuroses traumáticas familiares e as derivadas de herança orgânica.
A psicanálise clássica compreende o TEPT como uma neurose narcisista, observando-se, porém, a necessidade que a personalidade do indivíduo tem de uma inteira reabilitação.
Face ao exposto, ao receber uma vítima de um TEPT, o psicanalista deve considerar, além do conteúdo manifesto, as questões latentes do indivíduo, como sua infância, sua estrutura psíquica e questões afloradas pelo trauma que desestabilizou o equilíbrio anterior.


1.4 O diagnóstico da depressão

Freud parte do "fenômeno", apesar deste não estar no fundamento de sua teorização. Encontra-se na obra freudiana, que o início da atividade científica consiste na descrição dos fenômenos - que são reunidos, ordenados e inseridos em relações, bem como que não são os fenômenos que são confirmados pela clínica, mas as construções do analista.
Inicialmente Lacan foi considerado um psiquiatra fenomenológico jaspersiano, uma vez que dava seu sentido humano às condutas observadas nos doentes e aos fenômenos mentais que eles apresentavam. Em 1953 Lacan começa a refletir sobre a psicanálise a partir da função da fala e do campo da linguagem, deixando de ser jaspersiano, passando a elaborar a tese do inconsciente estruturado como uma linguagem, onde foi estabelecida a noção de estrutura que determina o sujeito.
Diante da afirmativa de que não cabe ao analista compreender o paciente, já que opera a partir de um mal entendido, torna-se incompatível a aplicação da psicanálise dentro do conceito fenomenológico. Dessa forma, segundo Quinet, Lacan afirma veementemente no Seminário sobre as psicoses, apud SIQUEIRA (2006): "comecem por não compreender, partam da idéia de que existe um mal entendido fundamental". Nesse sentido, Quinet reafirma, apud SIQUEIRA (2006) que, "só a partir dessa posição será possível fazer o paciente nos dar o sentido que ele atribui ao que está dizendo". Diante das afirmações compreende-se que no discurso do analista o analisando produz os próprios significantes instigado pelo analista, no lugar de objeto a. Entretanto, depreende-se na leitura de Quinet, que o fenômeno não deve ser descartado uma vez que está interligado à estrutura. O fenômeno, segundo o autor, apud SIQUEIRA (2006), "longe de ser uma questão que não interessa para a psicanálise, é uma questão fundamental na medida em que o fenômeno remete à própria estrutura". Daí pode-se perceber que é a partir do fenômeno que se pode pensar em uma estrutura.
A partir de uma tripartição estrutural RSI (Real - Simbólico - Imaginário), Lacan propõe um modelo de diagnóstico. Esses três registros são indissociáveis entre si e trazem um novo conceito - o "nó borromeano" ou "cadeia borromeana".
O real designa uma realidade fenomênica, imanente à representação e impossível de simbolizar; designa a realidade própria da psicose, que não possui representação possível, que está fora do simbólico e, assim não há palavras para dizê-lo. Portanto, remete ao excesso inassimilável, ao traumático e ao impossível; escapa à análise, constitui os limites da nossa experiência e retorna sempre no mesmo lugar.
O simbólico designa um sistema de representação que determina o sujeito à sua revelia, baseado em signos e significações, ou seja, na linguagem. Portanto, remete à própria psicanálise, uma vez que esta se fundamenta na eficácia de um tratamento apoiado na fala e no inconsciente como tesouro dos significantes.
O imaginário designa o que está relacionado à imaginação, ou seja, com a representação de coisas em pensamento ? real ou não. Este registro está diretamente vinculado ao simbólico, uma vez que permitindo o preenchimento das lacunas entre um significante e o outro, permite uma significação particular a cada sujeito; dessa forma, é responsável pela produção de sentido.
As categorias psiquiátricas são estruturalmente tratadas por Lacan, onde busca extrair a estrutura do sujeito dos tipos descritivos, extraindo das falas de cada paciente o que organiza o modo de cada sujeito lidar com a castração simbólica.
Quinet fundamentado em Freud, afirma que é a partir do simbólico que podemos fazer o diagnóstico diferencial estrutural. Assim, Lacan, partindo do legado de Freud, considera que a castração é o ponto pelo qual a estrutura se organiza. Dessa maneira, a castração passa a ser vista como uma lei e o falo como um significante da falta. O sujeito se organiza em torno da falta na estrutura, sendo a castração, uma função simbólica e real na constituição do sujeito, ou seja, é porque algo lhe falta que pode vir a desejar.
Neurose, psicose e perversão são as estruturas clínicas possíveis a partir da castração, em cujas, em termos psicanalíticos, mostram o modo de relação do sujeito com o seu desejo. Assim, na neurose, a castração é negada pelo sujeito através do recalque, havendo uma separação entre afeto e idéia. Dessa forma, por ser indesejável, a idéia é mantida afastada da consciência e o retorno do recalcado em forma simbólica seria o sintoma neurótico.
É importante esclarecer que no entender de Freud, o recalque é constitutivo do núcleo original do inconsciente. É, portanto, o processo que mantém no inconsciente as idéias e representações relacionadas às pulsões e que o desequilíbrio do funcionamento psíquico causado pela produção de prazer resulta no desprazer.
No que se refere à perversão, o sujeito desmente a castração, enquanto que no caso da psicose, nenhum traço é conservado, permanecendo a falta foracluída.
Após esses esclarecimentos, pode ser depreendido que em psicanálise, o diagnóstico é estrutural, haja vista basear-se no que o paciente diz, onde o analista se inclui a partir da transferência; portanto, existe apenas a estrutura da linguagem provocando diferentes efeitos no sujeito; quanto ao sintoma seria uma modalidade de amarração por onde o sujeito situa-se na estrutura. Sendo assim, para realizar um diagnóstico diferencial entre as estruturas clínicas, é necessário o conhecimento das possíveis formas de amarração na estrutura, que seriam o recalque, a foraclusão e a renegação.
Assim, a depressão por si mesma não é uma estrutura, é mais um fenômeno ou um estado, podendo apresentar-se em sujeitos neuróticos e psicóticos.
Em psicanálise, principalmente na perspectiva estrutural - é impossível falar em "a depressão", pois o que se encontra na clínica, de acordo com QUINET: são os "estados depressivos", que ocorrem em algum momento na vida de um sujeito e apresentam uma história subjetiva precisa.
Para Freud, a depressão apresentando-se como um sintoma em que o sujeito se interroga, seria um fenômeno analisável, podendo aparecer tanto na neurose, quanto na psicose, estando ligada a um momento significativo para o sujeito.
Sabendo-se que o fenômeno da depressão pode remeter a uma determinada estrutura clínica, a partir da neurose apresentada em um agente penitenciário - refém de uma rebelião de grande monta, associada à depressão - deu-se início ao presente trabalho.
O termo depressão, embora originário da psiquiatria, se destaca de forma impositiva com a psicanálise, haja vista esta privilegiar a escuta através do discurso do sujeito.
A psiquiatria, intencionalmente enfatiza as classificações psicopatológicas e psiquiátricas, visando explicitar a orientação geral da tradição psiquiátrica. São várias as classificações, destacando-se a de Dalgalarrondo, o CID 10 e o DSM IV.
O elemento central nas síndromes depressivas é o "humor triste". Segundo dados da OMS (Organização Mundial de Saúde) a "depressão maior" é a primeira causa de incapacitações e afeta por volta de cinqüenta milhões de pessoas no mundo, tratando-se, portanto, de um problema prioritário de saúde pública.
A seguir a classificação de DALGALARRONDO (2000):
1) episódio ou fase depressiva e transtorno depressivo recorrente;
2) distimia;
3) depressão atípica;
4) depressão tipo melancólica ou endógena;
5) depressão psicótica;
6) estupor depressivo;
7) depressão agitada ou ansiosa e;
8) depressão secundária.
Os elementos desta classificação, de forma geral, explicitam-se da seguinte forma:
1) - episódio ou fase depressiva e transtorno depressivo recorrente: nestes, os sintomas depressivos são evidentes, com destaque para o "humor deprimido, anedonia (ausência de vontade), fadigabilidade, diminuição da concentração e da auto-estima, idéias de culpa, de inutilidade e transtornos do sono e do apetite", devendo estar tais sintomas, presentes por, pelo menos, duas semanas e não mais do que dois anos, de forma ininterrupta; os episódios ou fases depressivas duram, geralmente, entre três a doze meses, sendo classificados em leve, moderado ou grave, de acordo com o número, intensidade e importância clínica dos sintomas, enquanto que o transtorno depressivo recorrente - se destaca pela apresentação de vários episódios depressivos, nunca intercalados por episódios maníacos. "Síndromes" segundo DALGALARRONDO (2000), são: "agrupamentos relativamente constantes e estáveis de determinados sinais e sintomas; é uma definição puramente descritiva de um conjunto momentâneo e recorrente de sinais e sintomas", p 21;
2) - distimia: trata-se de uma depressão crônica, em geral de leve intensidade e de longa duração, instalando-se no início da vida adulta e persistindo por muitos anos, cujos sintomas mais evidenciados são a diminuição da auto-estima, fadigabilidade aumentada, dificuldades em tomar decisões ou se concentrar, mau humor crônico, irritabilidade e sentimentos de desesperança - devendo estar presentes, ininterruptamente, por pelo menos dois anos;
3) - depressão atípica: considerada um subtipo de depressão, podendo ocorrer em episódios depressivos, cuja intensidade vai de leve a grave, ocorrendo também no transtorno unipolar ou bipolar; além dos sintomas depressivos gerais, podem ocorrer "aumento de apetite, hipersonia, sensação de corpo muito pesado, sensibilidade exacerbada a indicativos de rejeição, reatividade do humor aumentada, fobias e aspecto histriônico ? teatralidade";
4) - depressão tipo melancólica ou endógena: trata-se de um subtipo, com predominância dos sintomas classicamente endógenos; estes possuem a natureza de serem mais independentes dos fatores psicológicos, predominando o fator neurobiológico, cujos sintomas típicos são "anedonia, hiporreatividade geral, tristeza vital, lentificação psicomotora, perda do apetite e de peso corporal, depressão pior pela manhã, insônia terminal, diminuição da latência do sono REM (rapid eye movement ? traduzido como movimento rápido dos olhos) e ideação de culpa";
5) - depressão psicótica: trata-se de um tipo grave, onde associados aos sintomas depressivos, ocorrem sintomas psicóticos, como "delírio de ruína ou culpa, delírio hipocondríaco ou de negação de órgãos e alucinações com conteúdos depressivos";
6) - estupor depressivo: estado depressivo grave, onde por dias, o paciente assume uma postura imóvel e rígida, ficando em estado de mutismo, recusando alimentos, apresentando um negativismo e ausência de respostas aos estímulos ambientais;
7) - depressão agitada ou ansiosa: síndrome com forte componente de ansiedade e inquietação psicomotora, associado aos sintomas depressivos, podendo o paciente apresentar queixas de uma "angústia intensa" - havendo aí uma forte propensão ao suicídio e;
8) - depressão secundária: síndrome depressiva causada ou fortemente associada a uma doença ou quadro clínico somático, podendo ser primariamente cerebral ou sistêmico; frequentemente vem acompanhada de outras síndromes e doenças, a exemplo do hipo ou hipertireoidismo, lúpus eritematoso sistêmico, doença de Parkinson e AVC (acidente vascular cerebral).
Já na classificação da CID 10, encontramos os "transtornos do humor ou afetivos", destacando-se:
1) transtorno afetivo bipolar;
2) episódio depressivo;
3) transtorno depressivo recorrente;
4) transtornos persistentes do humor (afetivos) ? ciclotimia, distimia, entre outros e;
5) outros transtornos do humor (afetivos).
Na classificação do DSM IV, "os transtornos depressivos" são assim listados:
1) transtorno maior (depressão maior);
2) transtorno dístímico (distimia) e;
3) transtorno depressivo, sem outra especificação.
Foram necessários os esclarecimentos acima, acerca das classificações, uma vez que permitem uma melhor visualização da forma como a psiquiatria trabalha com a depressão. Assim, possibilitam o diálogo com a psicanálise, mediante interação entre os discursos do mestre e do analista. Para tanto, o presente estudo pautou-se pela exploração da classificação psicopatológica de Dalgalarrondo.
Para a realização do diagnóstico, psicanalistas e psiquiatras se utilizam da anamnese, mas o psicanalista não faz interpretações já a partir desta, uma vez que ainda não serve de parâmetro, ao passo que o psiquiatra já realiza um diagnóstico diferencial e, não raramente, dá início ao tratamento medicamentoso.
A anamnese, de acordo com DALGALARRONDO (2000), é definida como:

"histórico de sinais e sintomas apresentados ao longo da vida, antecedentes pessoais e familiares, assim como os do meio social. Inclui: identificação do paciente, queixa principal e história da doença atual, sintomas, antecedentes mórbidos pessoais, hábitos, antecedentes familiares, relacionamento e dinâmica familiar, exame físico, exame neurológico, exame psíquico, história de vida e resultado das avaliações complementares", p.45.

O diagnóstico do psicanalista é baseado na escuta, de forma que através do discurso do sujeito, o sentido do sintoma é decifrado, enquanto que na psiquiatria a orientação se dá por um conjunto de sinais e sintomas observáveis que se agrupam em um quadro psiquiátrico.
É importante destacar, que a psicanálise observa nos casos de depressão, um excesso de indicação de medicamentos por parte dos psiquiatras, o que de certa forma, inviabiliza o tratamento psicanalítico, haja vista tal procedimento facilitar o tamponamento do sintoma, já que a dor do paciente é calada e, sendo assim, age sintomaticamente, portanto, não age na causa.
Dessa forma, a psiquiatria, após detectar os sinais e sintomas, indica os antidepressivos e, em contrapartida, no entender de grande parte de seus profissionais, no que diz respeito ao tratamento psicanalítico, seria um coadjuvante, cuja indicação se daria conforme a necessidade.
Quanto ao parágrafo acima, fica a pergunta: Será? É sabido que a psicanálise trabalha na dimensão subjetiva, utilizando-se do inconsciente como via de operação, uma vez que através da participação ativa do paciente, mediante seu discurso, é que o psicanalista, se utilizando da escuta, decifra o sentido apresentado no sintoma, sendo este questionado na proporção ao modo como é apontado para o sujeito. Assim, a via de operação da psicanálise é o inconsciente. A esse respeito, ensina FIGUEIREDO (2000), que "o analista deve escutar o seu paciente, sendo chamado a cada intervenção, a cada movimento, a decidir sobre a destinação e, conseqüentemente, sobre o rumo das produções discursivas que acolhe". Dessa forma, a escuta psicanalítica não se destina à coleta de dados, envolvimento emocional, mas sim a orientar o diagnóstico clínico. Assim, conforme SIQUEIRA (2006): é com a "atenção ao nível sempre igual (ou flutuante) ? que Freud procurava seguir a via do inconsciente, aquela que só se ouve e só se acompanha entre linhas". São quatro as condições para a realização de uma análise: o tratamento de ensaio, o uso do divã, a questão do tempo e a questão do dinheiro. Portanto, são "condições" e não regras, uma vez que Freud estabeleceu apenas uma - a da "associação livre", esclarecendo que esta consiste em deixar o sujeito falar tudo aquilo que lhe vier à cabeça, já que através dessa livre associação podemos ter acesso ao inconsciente. Em seu trabalho clínico, Freud conforme menciona SIQUEIRA (2006):

"começou a perceber que precisava deixar seus pacientes falarem, sem fazer-lhes muitas indagações ou interpretá-los a todo instante. Freud, ao indagar a sua paciente Emmy Von N. sobre a origem de suas dores gástricas, ela retrucou que ele não deveria perguntar tanto de onde provinha isso ou aquilo, mas que a deixasse contar o que tinha a dizer e a partir de então, Freud começou a perceber que era importante e fundamental deixar os seus pacientes associarem livremente, expressando tudo aquilo que quisessem, pois tal expressão estava sujeita à influência do inconsciente".
Assim, Sigmund Freud ao iniciar o tratamento, pedia a seus pacientes que dissessem tudo que lhe passasse pela mente, dizendo, apud SIQUEIRA (2006):

"Aja como se, por exemplo, você fosse um viajante sentado à janela de um vagão ferroviário, a descrever para alguém que se encontra dentro, as vistas cambiantes do que vê lá fora. Finalmente, jamais esqueça que prometeu ser absolutamente honesto e nunca deixar nada de fora, porque, por uma razão ou outra, é desagradável dizê-lo".

Diante do exposto na citação acima, fica claro, que uma regra fundamental da clínica psicanalítica, é deixar o paciente falar tudo que lhe ocorrer, sem qualquer julgamento de valor. Portanto, é a partir da afloração da subjetividade do sujeito, através de sua fala, que se pode supor um diagnóstico, uma vez que a instauração de um trabalho psicanalítico se dá quando o paciente começa a trazer o inconsciente na superfície do discurso, a exemplo de relatar seus sonhos. Já os tropeços e atos falhos apontam para a presentificação do inconsciente, constituindo suas formações. Freud (1901), em seu texto "Sobre a Psicopatologia da vida cotidiana", segundo SIQUEIRA (2006), afirma que os ?tropeços? e os ?atos falhos? irrompem, quando o sujeito, ao falar, percebe que algo saiu sem que ele tivesse percebido, soando como algo estranho, não pensado. Portanto, é a partir desta percepção do analisando, que lhe permite começar a se questionar e a trabalhar em análise.
A partir da interpretação da pluralidade de sentidos, trazidas pelo discurso do sujeito, é possível chegar-se aos significantes, ressalvando-se que não há apenas um significante em condições de representar o sujeito, mas vários, que se associam à cadeia simbólica, produzindo novos significantes. Assim, conforme DOR (1993), "é no desdobramento do dizer que se manifestam essas referências diagnósticas estruturais, tais quais incisões significativas do desejo que se exprimem naquele que fala". Tais referências diagnósticas, conforme o autor, seriam codificadas pelos traços da estrutura; portanto, semelhantes trajetórias estereotipadas, que se apresentam como sendo testemunhas da economia do desejo do sujeito, havendo então, uma relação do sujeito com o seu desejo, numa perspectiva de que ao final do trabalho psicanalítico, este sujeito esteja em condições de se deparar com a falta e fazer algo a partir dela, ocorrendo uma perda de gozo na análise.
O que habilita o psicanalista a formular um diagnóstico estrutural é a transferência ocorrida no processo psicanalítico, quando o sujeito, pela fala introduz o investimento libidinal parcialmente insatisfeito em uma de suas séries psíquicas. Portanto, a via de operação do psicanalista é a transferência. Nesse sentido, a operação não se dá pela leitura dos fenômenos, mas sim nomeando o modo de incidência do sujeito na linguagem, caracterizando o diagnóstico como estrutural, diferentemente da psiquiatria que se utiliza do diagnóstico fenomenológico. O diagnóstico estrutural, nas palavras de FIGUEIREDO (2000), deve ser entendido, como um "diagnóstico que se dá a partir da fala dirigida ao analista, logo, sob transferência, na qual os fenômenos vão se orientar com referência ao analista como um operador e não como pessoa".
Sendo assim, a idéia diagnóstica pode ser formulada pelo analista na transferência, havendo um desdobramento da estrutura da fala, pois é aí que ocorre uma atualização do modo de relação do sujeito com o seu desejo, possibilitando ao operador psicanalítico direcionar o percurso de seu trabalho. Portanto, ao iniciar uma análise, a instalação da transferência deve ser facilitada e acolhida pelo psicanalista, propiciando uma suposição diagnóstica.
Entretanto, essa transferência nem sempre se instala com facilidade, haja vista ser subjetiva, sendo necessário um tempo, o qual antecede ao processo psicanalítico, podendo variar de acordo com o analisando. Assim, haverá necessidade da queixa inicialmente trazida, transformar-se em uma demanda ao psicanalista. Esse tempo foi denominado por Freud de "tratamento de ensaio" e, posteriormente, denominado por Lacan, de "entrevistas preliminares".
Estando a transferência em processo de instauração, o diagnóstico permanece em aberto nas entrevistas preliminares, uma vez que sem transferência não há diagnóstico. Nesse sentido DOR (1993) se manifesta dizendo que:

"O ato diagnóstico é necessariamente, de partida, um ato deliberadamente posto em suspenso e relegado a um devir. É quase impossível determinar, com segurança, uma avaliação diagnóstica sem o apoio de um certo tempo de análise. Mas, é preciso, no entanto, circunscrever, o mais rápido possível, uma posição diagnóstica para decidir quanto à orientação da cura."

Face ao apresentado, é de se acreditar que em psicanálise, a realização de um diagnóstico se dá somente após a instauração da transferência e, esta deve acontecer o mais breve possível, haja vista permitir ao inconsciente emergir na própria atualidade da sessão, onde é demonstrada a forma de relação do sujeito com o seu desejo.


CAPÍTULO 2
OS DISCURSOS DA PSICANÁLISE E DA PSIQUIATRIA

Afirmou Lacan, que "a Psicanálise é o avesso da Medicina", uma vez que o médico após ouvir descarta a fala do sujeito, valendo-se apenas de seus próprios elementos, eliminando tudo que não possa se inscrever. Dessa forma, o discurso médico reduz o sentido de tudo que é dito pelo paciente a somente o que pode ser inscrito. Assim, por exemplo, uma "falta de ar", associada a uma "dor no peito" e "uma angústia interna", podem ser reduzidos ao sinal clínico da dispnéia. Da mesma maneira, "um peso na cabeça", "uma ardência na testa e um latejamento na cabeça" e "um pensamento constante", são reduzidos ao sinal clínico da cefaléia.
Segundo Jorge (1983), há, no discurso médico, uma objetividade científica que exclui a subjetividade do sujeito, tanto daquele que o enuncia como daquele que o escuta. Afirmava Lacan, conforme escritos de SIQUEIRA (2006) que:

"Não existe ?relação médico-doente?, pois, assim como o doente é definido, no discurso médico, como ?homem + doença?, o homem torna-se o ?doente ? doença?; aliás, não haveria, nem mesmo, a ?relação médico ? doença?. Apenas seria possível a ?relação instituição médica ? doença?, na medida em que médico e doente são destituídos de sua subjetividade. A instituição médica ? lugar da totalidade do discurso médico ? prevalece sobre a figura do médico, que é apenas seu anônimo representante, bem como a doença ? objeto constituído pelo discurso médico ?, enquanto o homem seria, unicamente, o ?anônimo terreno no qual a doença se instala?. Dessa forma, o médico não se dirige ao doente, mas ao homem presumidamente ?normal? e ?são? que ele era e que deve voltar a ser".

Uma vez que a medicina desconsidera a subjetividade, a pessoa do médico torna-se apenas um instrumento do discurso médico, só existindo, portanto, em sua referência constante ao saber médico e à instituição médica. Enquanto sujeito, o médico fica anulado diante da exigência de objetividade científica, na qual só se autoriza, conforme JORGE (1983), apud SIQUEIRA (2006), por ser "ele próprio o menos possível".
Assim, é possível perceber-se que, na lógica institucional, no caso da psiquiatria, o estilo das observações no prontuário do doente é impessoal, denotando ausência da subjetividade do médico, já que não depende da pessoa responsável pela entrevista. Tal dessubjetivação fica também evidenciada no fato de o paciente ficar sob os cuidados de uma equipe e não de um profissional.
É claro que o que se pretende aqui é enfatizar a oposição radical entre os discursos do mestre e do analista, já que entre os médicos psiquiatras, existem os que agem de outra forma, mesmo porque, o discurso do mestre é mais comum entre os médicos cientificistas; portanto, necessariamente, não há equivalência entre o discurso do mestre e o do psiquiatra, embora aquele, no lugar de agente, adota a posição de mestria frente a este, sendo, portanto, dominante ? uma vez que do outro se utiliza para impor-se.
É justamente nesse ponto, que a distinção radical entre a psicanálise e a psiquiatria fica evidenciada, uma vez que a psicanálise não decide ou impõe o que é melhor para cada sujeito em particular - pelo contrário, questiona o princípio superegóico que o médico psiquiatra assume, de sujeito que sabe e a ele tanto os poderes públicos, quanto a cura individual deve se curvar, caracterizando o discurso de mestria, base da sugestão hipnótica.
A sugestão hipnótica deixou de ser utilizada na psicanálise, a partir do momento em que Freud passou a valorizar a escuta do sujeito, através da regra fundamental da psicanálise, a "associação livre". Nesse sentido, é a passagem do "sujeito que sabe", própria do médico, para a do sujeito suposto saber, lugar do psicanalista, ou seja, a compreensão dá lugar à interpretação. O sujeito suposto saber é definido, por Lacan, de acordo com Quinet, apud SIQUEIRA (2006), "como uma subjetividade correlata ao saber como efeito constituinte de uma transferência estabelecida". Assim, é possível depreender-se que o sujeito suposto saber, na suposição do analisando, é aquele que tudo sabe, mas seria um equívoco o psicanalista identificar-se como tal, haja vista para a psicanálise, o que importa é a singularidade, devendo a queixa de "depressão" ser escutada em sua dimensão significante. Em contra partida, o discurso médico está próximo do discurso do mestre. Nas palavras de Lacan, segundo CLAVREUL (1983):

"Configurando a produção de um discurso totalitário, exclui a diferença, único modo pelo qual a subjetividade pode se manifestar. Por meio de um vocabulário ao qual o doente não tem acesso, o discurso médico opera reduzindo o sentido dos diferentes ditos do sujeito àquilo que é passível de ser inscrito no mesmo. Tal operação visa estabelecer uma identidade e podemos pensar no quanto o discurso em torno da ?depressão? apaga as diferenças entre sujeitos, englobando-os em uma mesma categoria ? ?deprimidos? ?, que deve ser tratada da mesma forma".

O que interessa para a psicanálise é a alteridade, independentemente de quem ou do que seja, uma vez que o sujeito está sempre na relação com o Outro, portanto a psicanálise privilegia a pluralidade de sentido.
É importante ressaltar, que O Outro é um termo utilizado por Lacan, tendo como propósito designar um lugar simbólico ? o significante, a lei, a linguagem, o inconsciente ? que determina o sujeito, ora de maneira externa a ele, ora de maneira intrasubjetiva em sua relação com o desejo. O Outro, com letra maiúscula, é o grande Outro (A), opondo-se ao pequeno outro (a), lugar da alteridade especular, referindo-se, portanto, ao outro imaginário.
Já o discurso médico/psiquiátrico, em oposição ao discurso do psicanalista, baseia-se em uma compreensão unívoca, uma vez que a medicina tem como característica utilizar-se de signos, ou seja, daquilo que representa alguma coisa para alguém que saiba fazer a leitura. Nesse sentido, o médico para compreender faz a relação com um código, cujos sinais e sintomas apenas ele sabe ler, olhar e decodificar o que significam.
É importante compreender-se bem, tanto o discurso do psicanalista, quanto o do psiquiatra. Para tanto, necessário se faz uma visita à contribuição de Lacan contida no Seminário 17, onde o autor formaliza a "teoria dos quatro discursos" ? como reguladores do laço social, quais sejam: 1) discurso do mestre; 2) discurso da histérica; 3) discurso da universidade; e 4) discurso do analista.
De acordo com ALBERTI (2000), "com essa formulação, o psicanalista tem ao seu alcance um importante referencial com consistência teórica e que lhe permite, de dentro de seu próprio campo, examinar e dialetizar sua função no campo social". Dessa forma, existe uma verdade sustentando o agente em cada discurso, cujos lugares assim se distribuem: _ agente _ outro _ verdade _ produto. Assim, tendo o agente seu lugar em cada um dos discursos, de forma a levar um outro a agir por aquele, tendo como resultado o produto. Portanto, já que o resultado é o produto, nessa produção se perde o gozo (objeto a).
Sendo assim, com base em Lacan, na realidade existem dezesseis posições que o sujeito pode tomá-las nos diferentes laços sociais, já que pode estar em qualquer uma das posições de cada discurso.
Face ao até aqui exposto, importante se faz uma análise, mesmo que sucinta, dos discursos do mestre e do analista, bem como da depressão frente ao discurso capitalista, propiciando uma melhor compreensão de suas associações com a psiquiatria e a psicanálise.


2.1 O discurso do mestre

De acordo com a teoria lacaniana, estando o mestre falando no lugar do agente (S1), precisa do outro (S2), do escravo (Hegel) ? detentor do saber sobre sua produção, necessária para produzir a mais-valia (Marx) ? o objeto a, o resto, ou o gozo retirado pelo mestre do trabalho do outro. Sendo assim, depreende-se ao visitar a obra de Alberti, que a identificação com o lugar do outro, seria o lugar do escravo, já que detendo o saber, trabalha e estuda para o mestre. Então, no lugar da verdade aparece o sujeito, mas do sujeito barrado, dividido. Dessa forma, no discurso do mestre, o sujeito, por definição barrado, tem como lugar da verdade o laço social; verdade esta, surgida no ato em que desaparece um intervalo de significantes (S1 ? S2); portanto, não é uma verdade única. Lacan se utiliza muito da noção de sujeito barrado, fendido ou dividido, sendo o sujeito sua própria divisão. Nesse sentido, Freud introduziu em 1927 o termo clivagem do eu, para designar um fenômeno próprio do fetichismo e da psicose; sendo a coexistência de duas atitudes contraditórias no eu, ou seja: uma que considera a realidade e, outra que a nega - onde a produção do desejo é colocada em seu lugar. Assim, o sujeito é o desejo quando é determinado pelos próprios desejos, pelo inconsciente, fundado pelo Outro. Para Lacan, o sujeito encontra-se no pequeno espaço entre o S1 e o S2; portanto, no intervalo entre dois significantes, sendo impossível destacar apenas um significante que o determine.
Diante do exposto, foi possível apreender-se, que em muitos casos, existe uma identificação do psiquiatra com esse lugar de saber e de poder absoluto, tal como o agente do discurso do mestre apresentado por Lacan, ou seja, é justamente essa tomada de posição de mestria do médico psiquiatra que o aproxima ao discurso do mestre.


2.2 O discurso do analista

O discurso do analista na concepção lacaniana é o avesso do discurso do mestre, ressaltando-se que avesso, não deve ser imediatamente identificado como oposto, haja vista também incluir a noção de adverso, parte oposta à principal, oculta, tratando-se conforme Lacan, de uma retomada pelo avesso. Assim, enquanto o avesso do discurso do mestre, o discurso do analista evidencia, exibe, recupera a falha, opera com o fracasso que aparece como resto, como perda de gozo no discurso do mestre. Dessa forma quem opera no discurso do analista é o objeto a ? o objeto da pulsão, que opera enquanto negatividade, ou seja, apresentando-se como vazio, diferença, efeito de um encontro fracassado.
O objeto a, está na posição de agente no discurso do analista, definindo-se como perda de gozo ? o objeto perdido ? a partir do discurso matriz, que é o discurso do mestre. Sendo assim, o analista instiga o sujeito barrado a falar, ou seja, a produzir um discurso - significantes mestres (S1) - apoiado em um saber (S2), que está no lugar da verdade, embora parcial - já que as palavras sempre faltam.
É importante esclarecer que o lugar da verdade é o lugar marcado pelo real e que "falta-a-ser" é o lugar ético (desejo do analista, implicando que sempre há algo a saber). Quanto ao objeto a, segundo o próprio Lacan, foi sua única e verdadeira invenção; como primeira letra do alfabeto, portanto, nomeação mínima que se pode dar a algo, trata-se de objeto pertencente ao real, essencialmente perdido e que não pode ser simbolizado.
Segundo Alberti, apud SIQUEIRA (2006), ao situar o saber no lugar da verdade, no discurso do analista, Lacan coloca que:

"este saber tem a estrutura da ficção, como toda e qualquer verdade, pois o saber que efetivamente está em jogo é o discurso do analista, que é o saber do próprio sujeito, que questionado, fabrica o produto: significantes seus, próprios, que no percurso vai deixando cair".

Dessa forma, a psicanálise é aplicada através da fala, uma vez que supõe o sujeito falante. Assim, o analista fica no lugar de objeto causa do desejo, pois se ocupa do objeto a, sendo o paciente, o verdadeiro sujeito da operação.
De acordo com Alberti, apud SIQUEIRA (2006) "o desejo do analista é exclusivamente o de fazer com que a análise se produza, tal como um artista que, através de sua obra, quer produzir efeitos em seu leitor ou observador". O desejo do analista implica que sempre há um saber a ser construído pelo sujeito.
Entre S1 e S2, não há uma relação necessária, nem tampouco a articulação entre eles diz respeito à produção de significados, mas sim de gozo.
Conforme MILNER (1996), apud SIQUEIRA (2006): "a primazia da estrutura é deslocada e a ênfase recai sobre o significante enquanto letra" (p.98). Lacan, no Seminário 20, passa a falar que o interlocutor privilegiado é a ciência enquanto práxis que opera com letras, que exibe a face simbólico-real do significante; portanto, estando o objeto a no lugar de agente, é parte da substância gozante. Como diz LACAN (1985), "é parte do corpo vivo, habitado por um gozo, ou seja, enquanto discurso", p.36. Assim, o aparelhamento do gozo nos corpos é o discurso. É importante frisar que, ainda de acordo com LACAN (1985), "a função da linguagem não é produzir significação, mas laços sociais", p. 28. A única referência do significante é o discurso e referir-se a este é simplesmente tomar aquele como uma letra que produz gozo. Desse modo, conforme SANTOS (2001), apud SIQUEIRA (2006): "o campo do significante é, portanto, inaugurado pela ciência moderna. Trata-se de um campo exterior aos sentidos coletivos, às crenças, à doxa, à opinião". Assim, para constituir-se, o discurso analítico pressupõe o discurso da ciência; funciona apenas no que funciona como fala, sendo esta o campo onde o discurso analítico é definido e, aí a dimensão da escrita é introduzida pela função do significante enquanto letra.
No centro da questão do gozo está o objeto perdido, uma vez que em conformidade com Lacan, é em razão de haver uma perda que há um gozo a repetir, uma diferença a recuperar, que é o mais-de-gozar. A repetição está na dimensão da experiência humana, implicando a conquista, a estruturação do mundo num esforço de trabalho. Assim, de acordo com LACAN (1992):

"Na medida em que o que se apresenta a ele só coincide parcialmente com aquilo que lhe proporcionou satisfação, o sujeito se põe em busca e repete indefinidamente sua procura até reencontrar este objeto. O objeto se encontra e se estrutura pela via da repetição ? reencontrar o objeto, repetir o objeto. Só que nunca é o mesmo objeto que o sujeito encontra", p.131/132.

De acordo com SANTOS (2001), apud SIQUEIRA (2006): "o gozo em Lacan, é o gozo com a falta e o mais-de-gozar é o lucro, a mais-valia obtida a partir dessa falta, dessa perda", p. 242. Freud evidencia o mais-de-gozar pelas pulsões parciais, portanto, pela identificação do sujeito à posição de objeto do Outro. Assim, as pulsões parciais articuladas à fantasia fundamental são modos de inventar, de fixar um objeto ao qual o sujeito se identifica e, organizar, aparelhar um modo de gozar no mundo.
Sendo, conforme escreveu Lacan, "da falta que o desejo pode advir", o objeto passa a ser a causa do desejo, pois é esta a criadora do desejo no ser humano.
O analista na relação com o paciente, exerce a função de a, objeto da pulsão, sendo a função impossível. Nesse engajamento necessário do analista na relação com o paciente, Freud chamou de transferência e, nesse sentido, o campo da transferência aparece como efeito de um ato do analista, ou seja, um efeito espontâneo existente nas relações humanas, utilizado de modo particular pela psicanálise.
O amor do analisando é de transferência pelo fato de não haver reciprocidade por parte do analista; portanto, não é um falso amor ou uma ilusão. Segundo LACAN (1992): "Ele se produz a partir do ato do analista em recusar-se a se fazer amar", p.197. Numa análise o que opera no lugar do amor é o desejo do analista, onde este desejo tem relação com a pulsão de morte, definida como repetição, o gozo com o fracasso do encontro com o objeto.
Por ocasião da análise, é possibilitado ao sujeito, descobrir a forma como ele se oferece como objeto para ser amado pelo Outro, identificando-se enquanto objeto do Outro e, nessa identificação, o seu sintoma é sustentado, na condição de invenção particular, operando como uma suplência diante de um objeto impossível.
A função silenciosa do analista promove a fala do sujeito, não constituindo em obstáculo à emergência do desejo, já que o sujeito é instigado a produzir suas associações, sendo o desejo a via de operação. Assim sendo, o discurso do analista é o avesso do discurso do mestre, ou seja, a psicanálise é, antes, o avesso da medicina, mas não somente pelas suas posições avessas nos discursos, mas devido à produção de resultados divergentes e opostos, com a ressalta de que os dois discursos têm suas importâncias e não se esquecendo que a psicanálise nasceu da medicina. A esse respeito afirmava LACAN (1992):

"Freud pensava que ele fazia ciência. Ele não fazia ciência, ele estava produzindo certa prática que pode ser caracterizada como a última flor da medicina. Essa última flor encontrou refúgio aqui porque a medicina tinha tantos meios de operar. inteiramente repertoriados de saída, regrados, que ela teve que se encontrar com o fato de que havia sintomas que não tinham nada a ver com o corpo, mas somente com o fato de que o ser humano é afligido, se eu posso dizer, pela linguagem", p.9.

Assim, a psicanálise nasce com a falta de respostas da medicina, a exemplo do sintoma histérico delimitado posteriormente por Freud como psíquico e ligado ao mecanismo da conversão.
Lacan entende que o sujeito suposto saber estaria na suposição de saber, como efeito da instalação da ciência, uma vez que a suposição do saber inconsciente do analista leva o analisando a descobrir a verdade de como ele ama e, sendo assim, operando na posição de saber, torna-se impossível dizer que o discurso do analista está em oposição à ciência.
Freud (1915), afirma no texto "Nossa atitude para com a morte" que, cada um em seu inconsciente, está convencido de sua imortalidade; assim, o comportamento do sujeito é o de que não acredita na própria morte. É interessante que somente na condição de expectador se pode imaginar algo em relação à própria morte, pois nosso desejo habita no inconsciente, lócus onde inexiste uma representação simbólica da morte; daí a crença do sujeito, agindo como se fosse imortal.
De acordo com o postulado psicanalítico do inconsciente, tanto a idade cronológica, quanto a idade para o desejo - são inexistentes. Dessa forma, basta haver desejo para a psicanálise ser viável, uma vez que o sujeito é o desejo. Assim, quando o sujeito desiste de desejar, surge o que chamamos de depressão, que na concepção lacaniana, trata-se de uma "covardia moral" e, esse estado de covardia moral, não escolhe idade, podendo ocorrer até mesmo em sujeitos muito jovens.


2.3 A depressão frente ao discurso capitalista

Segundo explicações de Mucida (2004) acerca de observações de Lacan em relação à ciência, esta, para ele, simplesmente silencia o real, escamoteando o impossível, o traumático e o inassimilável, ao invés de tratá-los. A esse respeito, Lacan contribui propondo além dos quatro discursos: do mestre, da histérica, do analista e do universitário - o discurso capitalista, surgido a partir de uma modificação do discurso do mestre.
Dessa forma, o sujeito ocupa o lugar do agente e o S1 (significante mestre) ocupa o lugar da verdade. Nesse sentido, o sujeito só é agente sob a forma semblante e não é o operador do discurso, assim como explica ALBERTI (2000), "o lugar de agente do sujeito envolve, no caso, um ledo engano".
No discurso capitalista inexiste o laço social, não havendo relação alguma entre o agente e o outro, ficando o sujeito fixado no lugar que o S1 determina e, a castração foracluída. Nesse discurso o sujeito é determinado e influenciado pelos pequenos objetos, ou seja, há um desvanecimento do mestre, um declínio dos significantes mestres em prol dos objetos. O discurso instiga a pulsão, impondo ao sujeito relações com a demanda e, este não percebe que sustenta a pulsão de morte. Esses objetos de consumo são governados pelo discurso capitalista, cuja produção tem como intuito a atração do desejo, ou seja, o sujeito sente que somente pode ser feliz com a obtenção desses objetos. Nesse sentido, o sujeito confunde o desejo com a demanda, acreditando que ao ter tal objeto será mais feliz, ou seja, o ter se confunde com o ser, como se fosse preciso ter para ser. Para Lacan, o desejo nasce da demanda e, mais particularmente, da demanda do Outro.
Na ótica lacaniana existe uma relação intrínseca entre a falta e o desejo, de forma que para que o desejo possa existir a falta se faz necessária.
Em muitos casos, a depressão tem se tornado objeto de consumo, onde os sujeitos que a possuem se calam, como se a palavra fosse um objeto que lhes tamponam o vazio da boca e ao dizerem "estou deprimido" tudo dizem, sem nada dizerem, no entanto. Assim, o silêncio na clínica da depressão, na verdade é um "silêncio vão", é como se o sujeito não tivesse mais nada a dizer além de que está deprimido.
Com o surgimento dos antidepressivos, muitas pessoas passaram a dizer que se sentem deprimidas, sendo interessante notar a observação de Mucida (2004), segundo a qual, não são raros os diagnósticos voltados para a oferta de objetos fabricados pela ciência e pelo capitalismo moderno.
Sabe-se que o discurso do analista pode levar o sujeito a produzir outros significantes. Sendo assim, diante da fala sintomática do sujeito ao dizer "tenho depressão", cabe ao analista investigar as particularidades de cada sujeito, abrindo espaço para este questionar sobre sua identificação com tal significante, seja pedindo para que fale a respeito, ou perguntando o que é a depressão. Conforme Alberti, apud SIQUEIRA (2006):

"o discurso do psicanalista é o único que dá lugar de sujeito ao outro - o sujeito está na posição do outro e o analista é o mero objeto a. E é essa posição do psicanalista como agente do discurso que subverte e barra o discurso do capitalista, no qual o sujeito se crê agente sem se dar conta de que age somente a partir dos significantes mestres que o comandam, e que, no discurso do capitalista, estão no lugar da verdade".

O discurso médico ao considerar a depressão como uma resposta do sujeito ao mal-estar na cultura, a tem como o "mal do século". A psicanálise, no entanto, entende que o sintoma trata-se de uma resposta particular ao imperativo universal, surgindo diante de perdas reais ou não, sendo uma das figuras presentes na inibição, tendo como característica um sujeito imerso no gozo.
Dessa maneira, o trabalho analítico deve caminhar no sentido de promover o sujeito a encontrar novas roupagens para o desejo, independentemente da idade do analisando, haja vista a psicanálise oferecer uma escuta dirigida ao sujeito do desejo em sua singularidade. Portanto, basta a existência de um desejo.
Ainda em 1920, Abraham em seu texto "O prognóstico do tratamento psicanalítico para os sujeitos de determinada idade", citado por SIQUEIRA (2006), já tinha posição favorável ao atendimento psicanalítico a pessoas de qualquer idade, refutando a inicial assertiva freudiana de que a idade avançada seria um limite à eficácia da análise; afirmava ainda ser a idade da neurose, mais importante que a idade do neurótico.
É claro, que o sujeito do inconsciente não envelhece, mas com o passar dos anos ocorrem inevitavelmente modificações e perdas, trazendo efeitos sobre o trinômio "eu - corpo - laços sociais", podendo necessitar de tratamento e, assim sendo, acarretaria ajustamentos em sua condução.



CAPÍTULO 3
DEPRESSÃO, LUTO, MELANCOLIA E A NEUROSE OBSESSIVA

3.1O luto e a melancolia

Apesar de não ser uma estrutura clínica, a depressão foi referenciada várias vezes por Freud. Em sua obra, na maioria das vezes, o termo é empregado como sinônimo de melancolia, compondo inclusive diversas expressões, tais como: "depressão melancólica, depressão narcísica, depressão neurótica, depressão psicótica, psicose melancólica, melancolia neurótica, melancolia psicótica, histeria melancólica, depressão histérica, depressão endógena".
Freud inicia o tema a partir de uma consideração sobre o luto, afirmando ser a melancolia uma doença do afeto - uma perda na vida pulsional. Seria a perda do prazer com o predomínio da pulsão de morte. Conforme depreendido da obra de Alberti, na palavra perda (Verlust) está incluída uma disjunção entre o sujeito e o prazer da libido. Assim, o luto seria o afeto correspondente a tal disjunção e a melancolia constituiria o luto pela Verlust da libido.
Ao iniciar seus escritos em 1895, Freud faz a aproximação da melancolia à esfera sexual, afirmando uma relação muito próxima entre aquela e a perda de apetite sexual do melancólico.
Freud estabeleceu uma aproximação entre os termos luto e melancolia, demarcando algumas distinções fundamentais. Para ele, o luto não se trata de um processo patológico, uma vez que após sua realização é esperado que o sujeito possa investir em outros objetos, embora as pessoas nunca, de bom grado, abandonam uma posição libidinal, demandando um tempo específico, subjetivo e particular a cada sujeito. Para FREUD (1917 [1915]):

"São executadas pouco a pouco, com grande dispêndio de tempo e de energia catexial, prolongando-se psiquicamente, nesse meio tempo, a existência do objeto perdido. Cada uma das lembranças e expectativas isoladas, através das quais a libido está vinculada ao objeto, é evocada e hipercatexizada e, o desligamento da libido se realiza em relação a cada uma delas. (...) Contudo, o fato é que, quando o trabalho de luto se conclui, o eu fica outra vez livre e desinibido".
Ainda no texto "Luto e melancolia", o termo luto é definido como "uma reação à perda de um ente querido, à perda de uma abstração que a represente, como a pátria, a liberdade ou ideal de alguém, e assim por diante" FREUD (1917 [1915]).
O luto é um trabalho que possui início, meio e fim, cujo tempo necessário para realizá-lo depende de cada sujeito e da relação deste com o objeto perdido. Para Freud, o tempo normal é aquele entre um a dois anos no máximo, embora se saiba ser impossível delimitar o que seria considerado "luto normal" e "luto patológico". É certo, porém, a existência de uma disposição patológica em algumas pessoas diante de uma perda importante, cujo resultado seria uma melancolia, ao invés de um luto.
Pode a definição de melancolia, assumir diferentes formas clínicas, variando inclusive na psiquiatria descritiva, sendo que algumas de suas formas sugerem afecções mais somáticas do que psicogênicas.
A melancolia traz enormes perdas à pessoa, deixando o sujeito profundamente desanimado e sem nenhum interesse pelo mundo externo; além disso, a capacidade para amar, capacidade produtiva e sentimentos de auto-estima ficam seriamente comprometidas. Assim, o sujeito passa para um estado de auto-recriminação e a auto degrada-se e, consequentemente, adquire uma expectativa delirante de punição.
São várias as manifestações similares à melancolia, a exemplo do luto profundo, com o diferencial de que neste a perda do objeto é consciente, ocorrendo de maneira efetiva, enquanto que naquela, o sujeito sabe quem perdeu, mas não sabe o que perdeu nesse alguém. Trata-se de uma perda desconhecida e inconsciente.
Segundo Freud, "no luto, é o mundo que se torna pobre e vazio; na melancolia, é o próprio eu". Dessa maneira, no luto a perda é objetal e na melancolia ocorre uma transformação da perda objetal em uma perda relativa ao eu.
Existe por parte do melancólico uma forte insatisfação com o próprio eu, estando presentes a auto-repreensão, a tendência a se degradar frente aos outros, além da perda dos sentimentos de vergonha, encontrando satisfação em ser desmascarado.
O melancólico se identifica com o objeto de forma narcísica, cuja identificação traduz-se na etapa preliminar da escolha objetal, onde o eu escolhe um objeto, desejando incorporá-lo e devorá-lo. Em função desta identificação narcísica com o objeto, o sujeito passa a degradar-se, sentindo ódio por si mesmo.
Segundo CASTRO (2002):

"no trabalho do luto, o trabalho é para que o eu desista do objeto, passando a depreciá-lo e denegri-lo a partir do sentimento de ódio em relação ao objeto; na melancolia, o eu é engolfado pelo objeto e alterado pela identificação, o que permite que o eu venha a ser tratado como objeto, de tal forma que o sujeito escolhe a si mesmo como objeto de sua hostilidade, ficando o Outro livre desse ?ataque?".

Face ao exposto, à medida que o sujeito dirige contra si a hostilidade relacionada com o objeto, pode-se entender a tendência ao suicídio, na melancolia. Conforme Freud, a análise da melancolia mostra que o eu só pode se matar, se, em virtude do retorno do investimento objetal, puder tratar a si mesmo como objeto - se for capaz de dirigir contra si mesmo a hostilidade relacionada a um objeto, o que representa a reação original do eu para com os objetos do mundo exterior.
Em relação ao objeto deste estudo, é de se pensar que a fala de ASP, descrita na apresentação do caso clínico, no capítulo 8 do trabalho em destaque, estaria apontando para uma identificação narcísica com o objeto perdido, uma vez que na frase: "preciso acabar com este sofrimento, senão ele vai acabar comigo", ao buscar a própria morte, estaria, na verdade, buscando atingir o acontecimento fatídico. A questão foi então, sobre a existência ou não de uma demanda endereçada ao Outro.
Na melancolia ocorrem sentimentos opostos de amor e ódio em relação ao objeto, onde uma parte do eu se coloca em litígio com a outra. Desta ambivalência ocasiona conflitos, que não devem ser desprezados como condição que predispõe à melancolia.
Estando a melancolia numa condição de autotortura, se aproxima da neurose obsessiva, uma vez que nesta, relacionadas a um objeto, existe uma satisfação das tendências do sadismo e do ódio, que retornaram ao próprio eu do indivíduo. Assim, o conflito empresta um "cunho patológico ao luto".
São três pré-condições da melancolia, de acordo com a obra freudiana, ou seja: "perda do objeto, ambivalência e regressão da libido ao eu". Destas, a perda do objeto e a ambivalência também se fazem presentes nas auto-recriminações obsessivas, surgidas após uma morte, em razão do inconsciente desejo de morte. Já a regressão da libido ao eu, em função do retorno à primeira etapa de identificação narcísica, seria peculiar à melancolia.
Assim, em relação a seu objeto, o investimento erótico do portador de melancolia sofreu uma "dupla vicissitude", ou seja, uma parte influenciada pelo conflito retrocedeu à etapa de sadismo e, a outra parte voltou à identificação.
Muitas vezes, a melancolia, assim como o luto, são "reações" a uma perda, com o diferencial de que naquela, existe uma diminuição da auto-estima e, assim, o sujeito passa a recriminar e degradar a si próprio, culminando em uma expectativa delirante de punição, além das características semelhantes ao luto, tais como o desânimo profundamente penoso, a cessação de interesse pelo mundo externo e a perda da capacidade de amar. Já no luto, existe a possibilidade da perda ser elaborada mediante um trabalho com início, meio e fim, onde o eu ao final novamente se libera, podendo investir libidinalmente em outros objetos.
O trabalho de luto é longo, penoso e retira o sujeito do meio social; isto porque a energia psíquica é temporariamente diminuída para investir libidinalmente em outros objetos. Segundo JORGE (2003) "é a tentativa de recompor a homeostase psíquica através da recomposição do simbólico e do imaginário, das palavras e imagens, para aquilo que ficou completamente despedaçado". Para o autor, o sujeito, no caso do luto, precisa refazer a janela de defesa, ou seja, a fantasia - que foi dilacerada pela perda. Já na melancolia, essa fantasia fica impossibilitada de ser refeita pelo sujeito.
Através da prática clínica, foi evidenciado que a culpa na melancolia aparece de forma exacerbada, mas também teria uma função no trabalho de luto, só que em sujeitos que estejam elaborando um luto, aparece de maneira mais tênue. Assim observou JORGE (2003), apud SIQUEIRA (2006):

"Ambos os casos me fizeram indagar se a culpa não é algo que surge quase que invariavelmente no trabalho de luto, seja como forma de o supereu atacar o mundo como sendo a fonte de tanto sofrimento e da perda de um ente querido, seja como forma de atacar o eu que se presta em grande número de vezes a ser alvo das condenações e recriminações".

Em face da angústia decorrente da perda ser muito grande, em alguns casos, na tentativa de contornar o furo produzido no real, inassimilável - é preferível a culpa, já que teria a função de dar sentido, imaginarizar - encontrar um "possível culpado".
Numa situação traumática, para que o sujeito possa sair da angústia e dar conta do real, a culpa é necessária e, como tentativa de elaborá-la diante de uma perda, o trabalho de análise identificar-se-ia ao próprio trabalho de luto, tornando-se de grande importância.

3.2 A melancolia e a neurose obsessiva

A diferença primordial entre a melancolia e a neurose obsessiva é a forma de reação do eu às acusações a ele dirigidas. Em "O eu e o isso" FREUD (1923) destaca que na melancolia: "seu eu é um eu todo culpado, ele eqüivale ao objeto estranho para o supereu e por ele criticado". Já na neurose obsessiva, contra as auto-acusações ocorre uma rebelião do eu. Em ambos os casos o conflito da ambivalência se faz presente. Dessa forma, na melancolia a ambivalência aparece em relação ao objeto; assim, sentimentos de amor e ódio encontram-se presentes no eu, sendo uma parte tomada como objeto de crítica, cuja introjeção se dá pela identificação, deixando ambivalente o próprio eu. O objeto ao qual se dirige a ira do supereu está incluído no eu através da identificação.
Na neurose obsessiva, amor e ódio transformam-se rapidamente e a ambivalência vai diretamente de encontro ao objeto externo. O que parece estar em questão são os impulsos censuráveis que permanecem fora do eu - no isso.
De acordo com Freud (1923), a análise de formas de neurose obsessiva, onde o sentimento de culpa é ruidoso - mas não pode ser justificado diante do eu, demonstra que há uma influência do supereu por impulsos recalcados. Há por parte do eu, uma constante tentativa de anulação dos desejos inconscientes e os impulsos mortíferos do isso. Por essa razão, as tendências agressivas acabam alcançando seu objeto interno - "autopunição eterna".
Na melancolia, de forma violenta, o supereu chama para si a consciência, dando forte impressão de que aquele obteve um ponto de apoio nesta. Dessa maneira, sem qualquer objeção, o eu não contradiz o supereu, reconhece-se culpado e submete-se aos castigos.
O eu do melancólico na espera de ser punido repreende e envilece a si mesmo, uma vez que é desprovido de valor para o sujeito; portanto, moralmente desprezível e nada consegue realizar. Assim, uma vez que o eu se satisfaz em desmascarar-se, o sentimento de vergonha se perde. Dessa forma, originalmente, as auto-recriminações são dirigidas ao objeto, mas redirecionadas ao eu através da identificação.
Diferentemente da melancolia, na neurose obsessiva predominam os fenômenos de formação reativa, tendo a finalidade de suprir as pulsões responsáveis pelo desprazer, surgindo diques psíquicos, como asco, vergonha e moral. Dessa forma, fica evidente o sentimento de vergonha em relação aos atos e pensamentos e o sentimento de culpa é ocultado. A esse respeito, pondera Freud, apud SIQUEIRA (2006):

"a questão primordial está centrada no ideal do eu, que, em ambas as patologias, é extremamente severo. O sentimento de culpa é a percepção do eu, decorrente do supereu rígido e severo, que dirige sua ira e sadismo com violência para o eu. Assim, o componente destrutivo do supereu volta-se contra o eu".

Tanto na melancolia, quanto na neurose obsessiva, o sentimento de culpa diferencia-se pela forma de reação do eu. Assim, na melancolia ocorre um apoderamento da consciência pelo supereu, levando o eu a assumir a culpa e submeter-se ao castigo, ao passo que na neurose obsessiva, ocorre uma rebelião do eu contra as acusações e os impulsos.
Contrariamente à melancolia, na neurose obsessiva inexiste a transformação do humor, ao passo que naquela, face à influência sofrida pelo supereu, existe uma tendência a transformar-se em mania ou hipomania, podendo ser lenta em alguns casos, mas ocorrer em outros, de forma abrupta, o que torna preocupante o manejo da indicação medicamentosa. Assim, a melhoria súbita constitui alívio, mas uma mudança repentina do melancólico torna-se extremamente preocupante, haja vista a possibilidade de suicídio, uma vez que envolve maior disposição física. Para COTTET (1985), citado por ALBERTI (1999), apud SIQUEIRA (2006):

"A tentativa de suicídio do neurótico privilegia a via da alienação, na qual o neurótico solicita o Outro no ponto em que ele exige ser sustentado ? demanda de amor endereçada ao Outro. A tentativa de suicídio do melancólico, por não possuir a inscrição do Nome-do-Pai, implica uma despedida definitiva da cadeia significante pela via da separação".

Dessa forma, para Cottet, citado ALBERTI (1999), apud SIQUEIRA (2006): "o suicídio do neurótico é conseqüência da operação de alienação, uma vez que este procura seu ?verdadeiro eu?. Na alienação, o sujeito só aparece na divisão, seja do lado do sentido produzido pelo Outro, seja do outro lado, como afânise". Destaca-se que afânise, em termos lacanianos, significa "a petrificação do sujeito sem saída, petrificação ante sua representação por outro significante, o que demarca seu caráter letal".
Quanto ao suicídio do melancólico, é conseqüência da operação de separação, ocorrendo segundo ALBERTI (1999), apud SIQUEIRA (2006), "quando o sujeito sai de cena" (p. 89). Segundo LAURENT (1988), apud.SIQUEIRA (2006):

"O suicídio melancólico é um ato fatal que, sem apelo, barra o gozo do Outro, o próprio sujeito, no lugar de objeto, paga com sua vida. Portanto, não deixa de ser uma tentativa de cura, ali onde a função paterna faltou para sustentar o sujeito".

De acordo com ALBERTI (1999), apud SIQUEIRA (2006), "onde não há o Nome-do-Pai, o Outro não barrado não é senão o supereu que exige um gozo do sujeito, um gozo imperativo que retorna no ponto em que falta um gozo fálico".

3.3 A pulsão de morte

Freud em sua primeira tópica, estabeleceu que a composição do dualismo, acontecia por pulsões do eu (ou de autoconservação) e pulsões sexuais. Somente a partir de 1920, em sua segunda tópica, que as pulsões de vida passam a ser abordadas, onde são incluídas as pulsões sexuais, do eu e a pulsão de morte.
Em Freud (1920), no texto "Mais além do princípio de prazer", é comentado um novo dualismo pulsional: pulsões de vida (eros) e pulsão de morte (tanatos). Assim, remetendo ao que une, liga e conserva, estão as pulsões de vida, enquanto ligando-se ao que desliga e destrói encontra-se a pulsão de morte, sendo esta silenciosa - só se podendo saber algo a respeito dela quando atrelada à pulsão de vida, não havendo como referir-se a uma sem incluir a outra; daí a explicação para o fato de as pulsões estarem sempre fusionadas entre si.
Sãos duas as formas possíveis para que apareça a pulsão de morte, seja sob a forma de pulsão de destruição (destrutividade) ou de agressão (agressividade), não sendo silenciosa quando dirigida para o mundo externo, tendo como tarefa primordial ? o retrocesso da vida orgânica ao estado inanimado ou inorgânico.
O conceito de pulsão sexual, apesar de ser abordado por Freud ainda em 1905, só recebe seu verdadeiro estatuto, o de "uma força constante na direção da satisfação, do gozo absoluto" somente com o advento da pulsão de morte, em 1920. O autor observa, a partir da clínica, a compulsão à repetição - uma inclinação do sujeito na busca pela repetição de situações que conduzem ao desprazer. Até então, o desprazer estava ligado a um excesso de tensão e o prazer a uma descarga de tensão sexual. A partir daí, Freud passa a cogitar a vigência de um elemento que vai além do princípio do prazer, que seria a "pulsão de morte", estabelecendo assim, a íntima relação entre pulsão de morte e compulsão à repetição. Existe uma tendência, conforme afirmou Freud, de todas as pulsões - à restauração de um estado anterior de coisas.
De acordo com JORGE (2003), apud SIQUEIRA (2006): "a pulsão é imperiosa, ela exige, a todo custo, a satisfação que almeja, é imperiosa, é de uma exigência radical". Tendo um caráter conservador tende a retornar ao estado inorgânico, de onde advém o ser vivo.
Para se compreender a forma de operação da pulsão de morte na melancolia e na neurose obsessiva, é necessário que se correlacione a atuação do supereu com elas. Segundo observações de Rudge, apud SIQUEIRA (2006):

"a questão sobre como se constitui e atua essa força constante que ?empurra? o homem para a dor e para o mal, continuou a ser tema central de formulações posteriores, já que a idéia de uma força biológica que levaria à extinção da vida não é considerada suficiente para lidar com os fenômenos apresentados na clínica".

Tanto na melancolia, quanto na neurose obsessiva, há uma prevalência da pulsão de morte sobre as pulsões de vida. Naquela, o grau de severidade e crueldade na relação estabelecida entre o eu e o supereu é altíssimo e, nesta, o supereu é menos cruel.

3.4 A depressão e a melancolia

Para se saber quando se deu a primeira relação do uso dos termos depressão e melancolia no âmbito da psicanálise, faz-se necessário um estudo da obra freudiana. No texto "Inibições, sintomas e angústia", FREUD (1926 [1925]), ensina que:

"quando o eu se vê envolvido em uma tarefa psíquica particularmente difícil, como ocorre no luto, ou quando se verifica uma tremenda supressão de afeto, ou quando um fluxo contínuo de fantasias sexuais tem de ser mantido sob controle, ele perde uma quantidade tão grande de energia à sua disposição que tem de reduzir o dispêndio da mesma em muitos pontos ao mesmo tempo" (...) "Temos aqui um ponto a partir do qual deve ser possível chegar a uma compreensão da condição geral que caracteriza estados de depressão, inclusive a mais grave de suas formas, a melancolia".

Diante do exposto, ficou patente, tratar-se a depressão, de um fenômeno capaz de remeter a uma determinada estrutura, mas que não se trata de uma estrutura clínica.
Conforme previsão da Organização Mundial de Saúde, a depressão em termos de saúde pública, fica abaixo somente das doenças cardiovasculares, com possibilidades de ultrapassá-la, já sendo considerada a quarta causa mundial de deficiência - estaria vinculada à cultura atual. Conforme Peres, apud SIQUEIRA (2006), "a depressão estaria ligada a um ?vazio da existência?, a uma perda de sentido da vida diante de uma homogeneização da cultura, na qual a singularidade do sujeito encontra pouco espaço de sobrevivência". A abordagem da autora, acerca do tema, se dá a partir da psicanálise e da psiquiatria biológica; enquanto para a psicanálise, só pode ser entendida mediante a história de vida contada pelo sujeito que a vivencia, girando, portanto, em torno da relação do sujeito com a perda e com a falta - vazio estrutural do ser humano, para a psiquiatria a explicação é biológica, ou seja, ligada a um déficit neuro-hormonal, somente devendo ser tratada com antidepressivos.
A psicanálise entende que diante de uma perda, a depressão pode se manifestar tanto em neuróticos, como psicóticos.
Freud, em seus textos, dá a entender que os termos depressão e melancolia são sinônimos, tanto que ao longo de sua obra integra diferentes expressões, a exemplo de "depressão melancólica, depressão narcísica, depressão neurótica, depressão psicótica, psicose melancólica", dentre outras. No texto intitulado "Uma neurose demoníaca do séc. XVII" Freud (1923), apud SIQUEIRA (2006):

"faz considerações sobre a depressão melancólica do pintor Christoph Haizmann, que apresentava convulsões assustadoras, uma inibição em seu trabalho e temores justificados quanto ao futuro. Após a morte do pai, o pintor, que havia caído em um estado de melancolia, estabelece um pacto com o demônio, que lhe prometera auxiliá-lo de todas as maneiras possíveis. Assim, o pintor deseja ser libertado de seu estado de depressão melancólica".

A melancolia no passado, segundo a literatura, de acordo com SIQUEIRA (2006):

"decorreria de um excesso do elemento frio e seco no organismo, a bílis negra. A teoria dos humores (de Hipócrates), que predominava na época, dividia a humanidade em quatro humores: o melancólico (bílis negra), o colérico (bílis amarela), o sangüíneo (sangue) e o fleumático (água). A melancolia seria, portanto, decorrente de uma predisposição natural do organismo, não sendo vista como uma doença e sim inserida na própria natureza do sujeito. A concepção de saúde na visão hipocrática era associada à combinação da natureza com o sistema de humores e a doença era o desequilíbrio dessa combinação. A própria etimologia da palavra melancolia vem do grego ? melankholia, melas = preto + kholé = bílis".

Em Aristóteles, ainda conforme SIQUEIRA (2006):

"Problemata -, a quem foi atribuído o primeiro tratado sobre a melancolia, que prevalece por toda a Antiguidade. Este tratado fala da relação entre genialidade e loucura. A melancolia é considerada como condição de genialidade, concepção que alguns defendem até os dias atuais. Não é vista como doença, mas como a natureza dos filósofos e poetas (ethos); muitos poetas e homens ilustres eram melancólicos, entre estes Sócrates e Platão. Seria uma visão romântica da melancolia, atrelada à idéia de que ?o homem triste é também o homem profundo?".

Dessa forma, pode-se depreender que para Aristótoles, a melancolia seria parte constituinte do ser e da inquietação humana. Assim, a melancolia do passado, passa a ser ocupada nos dias atuais pela depressão, sendo vista mais como uma doença, que implica em diminuição, déficit e inibição. Para CASTRO (2002):

"A melancolia é um termo bastante utilizado no mundo grego e também pelos autores clássicos da psiquiatria. Já o termo depressão se impõe mais tarde, juntamente com a psiquiatria clássica alemã, advinda do francês a partir do latim. A etimologia da palavra depressão, de acordo com Hipócrates, remete a ?pressionar para baixo? ?, que poderíamos remeter a um certo tamponamento do desejo".

O termo melancolia foi substituído por depressão a partir de 1913, com Emil Kraepelin, chegando quase a desaparecer na psiquiatria contemporânea.
Nas descrições do CID 10 e do DSM IV, o termo melancolia está ligado a uma síndrome, enquanto o termo depressão é utilizado de diversas maneiras, ocupando maior espaço.
Cabe aqui uma ressalva, o fato de atualmente a mera tristeza ser chamada de depressão, devendo ser devidamente tratada. Desse modo, a perda do sentido da vida pode associar-se a diferentes situações, remetendo o sujeito ao desamparo e à sensação de abandono, a exemplo de uma perda amorosa, de uma decepção no trabalho, entre outras.
O sentimento de desamparo, acentuado pelas inúmeras mudanças na cultura atual, definido como fortemente depressor, seria o responsável por uma verdadeira epidemia dos tempos atuais, onde conquistando a liberdade para tornar-se artífice de seu próprio destino, o sujeito passa a se sentir inseguro e desamparado, culminando com a culpa pelo insucesso, passando o sujeito a se auto-recriminar - ponto nuclear do estado depressivo.
Há que se considerar, de acordo com escritos de Peres, dois pontos importantes: um - que o excesso de medicalização é provocado pelo crescente mal estar da civilização e, o outro ? que a força publicitária dos grandes laboratórios e do mercado dos psicofármacos atuam como fortes elementos propiciadores da transmissão de um mal estar psíquico.
Enquanto o deprimido sabe da origem de seu mal estar e procura superação, o melancólico se sentindo preso à fatalidade de um destino, acredita que fazer algo, é da ordem da impossibilidade. Dessa forma, frente ao vazio da existência e da falta de sentido, surge a epidemia da depressão, considerada o mal do século, mas que oferece importantes pontos de apoio para uma reflexão da atualidade.


CAPÍTULO 4
A DEPRESSÃO: COVARDIA MORAL E AS RELAÇÕES EXISTENTES

A depressão foi nomeada por Lacan (1974) como "covardia moral". De acordo com o autor, apud SIQUEIRA (2006):

"A tristeza, por exemplo, é qualificada de depressão ao lhe conferir como suporte a alma; ou a tensão psicológica do filósofo Pierre Janet. Não se trata, porém, de um estado d?alma, é simplesmente uma falta moral, como se expressa Dante e até mesmo Espinosa: um pecado, o que quer dizer, covardia moral, que só se situa, em última instância, a partir do pensamento, ou seja, do dever de bem-dizer ou de orientar-se no inconsciente, na estrutura".

Dessa forma, se tomarmos a palavra covardia à luz do Dicionário Aurélio, a entenderemos como "falta de coragem, medo, timidez, fraqueza de ânimo".
De acordo com a psicanálise a depressão seria uma perda libidinal, ou ainda, perda na vida pulsional ? Verlust. Portanto, a depressão aparece quando o sujeito abre mão de seu desejo, se acovardando. Assim, a depressão é uma reação do eu, que estando inchado, recusa o que vem do inconsciente.
A angústia e a depressão são dois tipos de afeto destacados por Lacan no Seminário 10, fazendo uma correlação com a inibição tratada por Freud no texto "Inibições, sintomas e angústia" (1926 [1925]), em cujo, a palavra inibição, apud SIQUEIRA (2006):

"é utilizada por Freud quando há uma redução da função, o que ele contrapõe ao sintoma que, na verdade, acrescenta uma nova manifestação da função. A inibição seria, ainda, a expressão da restrição de uma função do eu, através da qual este evita entrar em conflito com o isso, ou seja, com algo que lhe escapa".

Sendo assim, funcionalmente há um empobrecimento do eu, embora sua supremacia sobre o recalque seja mantida. Já na inibição, o sujeito tenta se antecipar frente ao perigo da castração, sentindo-se aterrorizado - paralisando-se.
Freud acreditava ser possível compreender-se a condição geral que caracteriza os estados de depressão, inclusive a melancolia, a forma mais grave. Segundo o autor, apud SIQUEIRA (2006):

"Quando o eu se vê envolvido em uma tarefa psíquica particularmente difícil, como ocorre no luto, ou quando se verifica uma tremenda supressão de afeto, ou quando um fluxo contínuo de fantasias sexuais tem de ser mantido sob controle, ele perde uma quantidade tão grande de energia à sua disposição que tem de reduzir o dispêndio da mesma em muitos pontos ao mesmo tempo".

Dessa forma, para Freud, a depressão é uma inibição generalizada, onde ocorre uma evitação do eu em relação ao conflito, tratando-se, portanto, de um estado ou um fenômeno vinculado a uma determinada estrutura clínica. Assim, está associada à inibição, uma vez que tanto esta, quanto a depressão são geradas pelo eu - reações do eu.
A depressão, em conformidade com Alberti (1990), citado por Siqueira (2006), é um afeto que aparece no momento em que o eu evita a sua determinação inconsciente. Por essa razão Lacan (1974), fundamentado em Espinosa, a considera como uma "covardia moral". Ainda de acordo com Lacan, no texto Televisão, apud SIQUEIRA (2006), "a depressão é um afeto normal porque ele reenvia ao fato de estrutura de que nos furtamos de bem dizer nossa relação ao gozo - ao inverso do sintoma, novamente, que surge para dizê-la de alguma forma".
Com base em Jorge, citado por Siqueira (2006), pode-se dizer acerca do Seminário R.S.I. de Lacan, que com o estabelecimento do sentido unívoco há na inibição, uma invasão do imaginário sobre o simbólico, portanto, uma redução do duplo-sentido e da ambigüidade.
É possível afirmar que a depressão trata-se de um afeto surgido quando o sujeito evita sua própria determinação do inconsciente, abrindo mão de seu desejo, tratando-se de uma covardia moral, conforme afirma Lacan em Televisão. O afeto da depressão, no caso, é a tristeza - assumida pelo eu para não correr o risco de se deparar com a castração; seria uma baixa de energia psíquica, uma perda da libido, implicando em perda de prazer.
De acordo com SOLER (1997), citado por ALBERTI (1990), apud SIQUEIRA (2006):
"aquele que realmente assume esta inconsistência - ou seja, por que o sujeito precisa ficar doente para se dar conta da enorme verdade de sua inconsistência? ?, como se assume a castração, o afeto decorrente não é o de tristeza, pois o encontro com a castração é um horror de tal ordem que não pode provocar como efeito senão o entusiasmo".

Para a psicanálise, o desejo tem uma significação única e particular. Assim, o ato de o sujeito ceder seu desejo, é traduzido como uma covardia moral (depressão) e, corrobora com a afirmação de ser o discurso do analista, um valioso auxiliar para o sujeito no processo de resgate de seu desejo, uma vez que o analista ocupa o lugar de objeto a - causa de desejo.
Após os esclarecimentos até aqui realizados, faz-se necessário neste ponto, uma abordagem acerca da relação entre o desejo, a falta e a lei, tendo em vista para a psicanálise, o desejo ter uma significação única e particular.


4.1 A relação entre o desejo e a lei

Enquanto articulador de uma verdade, em "Totem e tabu", considerado o mito fundamental da psicanálise, texto escrito por Freud em 1913, foi possível a apreensão de que o Direito e as leis surgiram através de cultos religiosos primitivos e não em decorrência da justiça ou injustiça. Assim, a passagem da natureza para a cultura foi possibilitada pela crença religiosa aplicada nas inter-relações humanas.
O texto "Totem e tabu" supõe uma tribo primitiva, da qual o pai detém o poder de posse de todas as mulheres; o pai todo-poderoso - Urvater - ciumento, violento, onipotente e temível, em que todos da tribo são tidos como seus filhos e a ele devem obediência, não devendo contrariá-lo.
O Urvater impõe, mas não se submete à lei e, ao ditá-la para os outros - a ela se iguala, sendo, portanto, a "lei fora-da-lei", ou seja, a castração para os outros e o gozo para ele.
Certo dia, com a revolta dos filhos, o pai é assassinado, se instalando a partir daí o caos, uma vez que a sobrevivência torna-se insustentável, haja vista a inexistência de lei. Assim, os filhos erigem um totem, que tanto pode representar um "animal (comível e inofensivo, ou perigoso e temido), quanto, embora raramente - um vegetal ou um fenômeno natural que tenha relação peculiar com todo o clã" - que não podem comer ou destruir.
A função do totem seria substituir o pai morto, simbolizando-o, de forma que sua presença se marca justamente pela ausência, ou seja, a morte da coisa se faz presente.
Dessa forma, a convivência social se restabelece; o significante nomeia e interdita - seria o denominado pai simbólico, ou ainda, o Nome-do-Pai - significante primordial, o primeiro da cadeia de significantes - produtor da amarração simbólica, que permite a identificação para o sujeito.
Representando a função paterna, o acesso ao gozo da mãe com o filho é barrado pelo significante, delimitando uma lei subtraidora do gozo, propiciando ao sujeito a partir de então, ser marcado pela falta, pela impossibilidade de ter tudo e de gozar de tudo.
É essa falta que viabiliza o acesso ao desejo, haja vista este advir como uma possibilidade, justamente quando falta algo ao sujeito. Nesse sentido, o desejo, a falta e, consequentemente a lei, estão intrinsecamente relacionados.
A função paterna é uma lei fundante e estrutural - sustenta o direito de desejar; trata-se do significante articulador da identificação para o sujeito - marca uma interdição e, ao mesmo tempo, uma possibilidade. Assim, referir-se ao Nome-do-Pai, é o mesmo que se referir à inscrição da lei simbólica.
Em retomada ao mito, a partir de então, instauram-se dois tabus fundamentais: o parricídio e a proibição do incesto. Dessa forma, o tabu está ligado a algo proibido, mas sem saber a razão dessa proibição. De acordo com explicações de Lacan, no seminário "A ética da psicanálise", apud SIQUEIRA (2006), "o assassinato do pai não abre a via para o gozo que a sua presença era suposta interditar, mas vem a reforçar a sua interdição. O mito da origem da Lei se encarna, portanto, no assassinato do pai". Dessa forma, o surgimento de uma lei decorre da prática de um ato destituidor da ordem anterior; portanto, a função da lei, seria resgatar a ordem perdida.
Em face de tanto a lei, quanto o espólio, como o assassinato do pai, estarem entrelaçados no paradoxo estrutural da humanidade, assiste-se constantemente a uma repetição do assassinato primevo, fazendo com que haja um retorno da humanidade à sua origem, marcando a natureza humana pela culpa e pelo luto.
A proibição de algo está diretamente relacionada com aquilo que é desejado. Em "Totem e tabu", ressalta FREUD (1913[1912-13]), que:

"onde existe uma proibição tem de haver um desejo subjacente... afinal de contas, não há necessidade de se proibir algo que ninguém deseja fazer e uma coisa que é proibida com a maior ênfase (o incesto) deve ser algo que é desejado".

Lacan sob influência de Lévi-Strauss, conforme SIQUEIRA (2006), "situa a interdição do incesto como a lei primordial que se encontra no limiar da cultura e identifica o incesto como sendo o desejo mais fundamental".
Segundo RINALDI (1996) "o desejo está inextricavelmente vinculado à Lei que institui o simbólico, ainda que para o primeiro esta Lei indique mais do que uma proibição, a presença de uma impossibilidade". No entanto, a impossibilidade, através da proibição, é encoberta pela lei, de forma que existe um desejo contrapondo-se a toda lei. Portanto, não havendo uma lei sustentando um desejo, este inexiste, no sentido que ao demarcar o que não pode ser feito, a lei proíbe. Dessa forma, há uma falta estrutural, onde o sujeito para conviver socialmente, precisa renunciar seu desejo.
Seria a interdição do incesto, uma limitação estrutural de gozo, uma subtração do mesmo, marcando a falta de algo ao sujeito, que submetido à castração simbólica não pode gozar de tudo.
O desejo, enquanto verdade parcial - onde inexiste um objeto absoluto, se ordena pela lei da castração, na qual está demarcado uma distância irredutível entre o sujeito e o objeto de seu desejo, impossibilitando a satisfação completa do desejo - caracterizando-se aí a primeira Lei fundante e estruturante do sujeito.
O incesto, antes de ser uma proibição, é uma impossibilidade; assim sendo, o primeiro objeto de desejo do bebê é a mãe - uma impossibilidade e não uma proibição, tratando-se aí da verdadeira castração - a proibição edípica. Dessa forma a lei da castração é a lei constitutiva do desejo, estando inscrita na fala, e não na proibição presente na tragédia de Édipo.
O mito psicanalítico para Alberti (1999), apud SIQUEIRA (2006), refere-se à explicação de que se alguém não pode gozar da forma que deseja, se goza mal ou insuficientemente, decorre de lhe ter sido interditada a plena satisfação, em Nome-do-Pai.
O impossível presente na sexualidade humana foi nomeado pela cultura de "tabu do incesto". É possível pensar que se o incesto for visto como proibido e não impossível, haverá uma tentativa do sujeito em reencontrar o objeto fundamentalmente perdido, como se isso fosse possível. Conforme afirmava LACAN (1959-60), "a função do princípio de prazer é fazer com que o homem busque sempre aquilo que ele deve reencontrar, mas que não poderá atingir". Aí reside, no entender de SIQUEIRA (2006) "a própria interdição do incesto, que remete à impossibilidade estrutural, presente para todos, desde sempre". Dando prosseguimento, diz Lacan, segundo a autora acima: "o desejo e a lei são a mesma coisa no sentido de que seu objeto lhes é comum", (SIQUEIRA 2006).
Pelo mito edípico, uma vez a mãe interditada de tomar a criança como objeto de seu desejo, é possível depreender-se que a lei é criada pelo desejo do pai. Assim, observa-se a estreita relação existente entre o desejo e a lei, uma vez que o caminho do desejo somente pode ser traçado pela função da lei. Portanto, o desejo é a lei e, esta buscando refrear o gozo, detém o sujeito no caminho deste, abrindo a via do desejo.
É evidente a necessidade da lei para o neurótico, uma vez que só ela pode sustentar seu desejo.
De acordo com os esclarecimentos acima, ficou evidente a existência de uma relação intrínseca entre o desejo e a lei, cuja conseqüência é a falta. Dessa forma, enquanto o desejo se apresenta como desejo insatisfeito para a histérica, é impossível para o obsessivo. A lei é a referência na perversão, mesmo esta apontando para uma subversão daquela.


4.2 A relação entre o desejo e a falta

Para se compreender a relação entre o desejo e a falta, é necessário que se parta da castração, visto ser esta uma função simbólica que encaminha o sujeito na direção de seu desejo. Assim, existe uma relação intrínseca entre o desejo e a falta, já que o sujeito deseja, porque algo está lhe faltando.
Para Lacan a organização da estrutura se dá a partir da castração. Dessa forma, para abordar a castração simbólica, o autor se fundamenta em Freud, propondo os três tempos do Édipo. No primeiro tempo o sujeito se identifica especularmente com aquilo que é objeto do desejo de sua mãe; no segundo tempo, o pai onipotente - é aquele que priva a mãe e; no terceiro tempo, o pai intervém como real e potente, revelando-se como aquele que tem.
Diante da temática do presente estudo, será tomado o segundo tempo, uma vez que nele o pai aparece como onipotente - aquele que regula a relação da mãe com a criança, privando aquela de tomar esta, como objeto de seu desejo. O discurso da mãe mostra a lei do pai de forma semivelada - estádio nodal do Édipo.
No exercício de sua função o Nome-do-Pai barra o desejo da mãe e ocorre a referência fálica, resultando na operação simbólica entre o Nome-do-Pai (NP), desejo da mãe (DM) e a criança (x) - metáfora paterna. Após isso, como sendo determinado pela significação fálica, o Outro, que é o significante do desejo da mãe, é regulado pelo Nome-do-Pai. Dessa forma, na metáfora paterna, é a partir do Nome-do-Pai que o gozo fálico se constitui. Assim sendo, é possível a afirmação de que o Nome-do-Pai está foracluído no psicótico, faltando-lhe o gozo fálico. Portanto, o Nome-do-Pai exerce na constituição do desejo, uma função fundamental, uma vez que a castração (inscrição simbólica) marca o sujeito.
O sujeito do desejo, na concepção de Alberti, decorre da própria falta, razão pela qual, de acordo com Lacan, apud SIQUEIRA (2006):

"O Pai (com P maiúsculo) nunca é apenas um pai, mas, antes, um pai simbólico, portador de um significante (S1), que autoriza e fundamenta todo o sistema de significantes. É unicamente no nível do Outro da lei (Nome-do-Pai) que o mundo humano pode adquirir sua própria dimensão e o sujeito se constituir como tal. Para Lacan, ?a verdadeira função do Pai é essencialmente unir (e não opor) um desejo à Lei?. Ou seja, é a função paterna, mais especificamente o Nome-do-Pai, significante primordial, que instaura a lei e abre a via desejante. Metáfora paterna ? operação simbólica entre o Nome-do-pai (NP) e o desejo da mãe (DM), em que o significante pai vem no lugar da mãe, interditando a mãe, de tomar a criança como seu objeto de desejo".

É interessante um conhecimento acerca da operação simbólica da castração e a referência fálica em sua articulação com a falta, o que possibilita melhor compreensão no tocante à observação de que através do Nome-do-Pai, a referência do desejo do homem à lei é instituída pelo princípio edípico. Para tanto, faz-se necessário uma abordagem do grafo do desejo. Assim, com fundamento em Lacan, as siglas são:
S - sujeito barrado;
i(a) ? eu ideal;
A ? grande Outro, Outro da linguagem, tesouro dos significantes (simbólico);
d ? desejo;
S Ê D ? relação do sujeito barrado com as demandas (do Outro) ? fórmula da pulsão;
S(A) ? significante do Outro barrado (castração);
S Ê a - matema da fantasia; lê-se: S barrado - punção pequeno a;
s(A) ? lugar da mensagem, pontuação da cadeia significante; é o significado vindo do Outro (sintoma);
m ? eu (moi);
I(A) ? ideal do eu; significante do ideal em relação ao qual se organiza a demanda de amor.
A partir da pergunta: Che vuoi (O que queres de mim? Ou: o que o Outro quer de mim?) dirigida ao grande Outro, a relação do sujeito com o seu desejo é indicada pelo grafo do desejo. Assim, surge a angústia pela ausência de uma resposta do grande Outro. Diante de uma resposta insuportável: "eu não sei o que o Outro quer de mim", a castração do Outro (desejante) é introduzida. O aparecimento da fantasia ocorre como suporte do desejo, como forma de obturar a castração, essa falta no Outro.
Na parte de baixo do grafo, o A - grande Outro, Outro da linguagem - inicialmente aparecendo como a mãe, interpreta nomeando para a criança o seu desejo, o que vem a produzir valor de significado - s(A) é o significado vindo do Outro (sintoma).
Sendo o Outro que inicialmente interpreta o seu desejo para o sujeito, onde sua própria mensagem é devolvida de forma invertida, o desejo se constitui como desejo do Outro.
Através do significante do Outro barrado ? S (A), no segundo andar do grafo encontra-se a operação da castração; assim, introduzindo algo novo, marcando uma barra no grande Outro (A) - castração simbólica, aparece o falo como significante fundamental - razão pela qual o desejo é marcado como "não-todo". Dessa forma, o desejo do sujeito decorre da falta estrutural, sendo a operação realizada pelo falo - o significante do outro barrado (o S maiúsculo do A barrado).
O significante de A barrado remete à própria noção do sujeito como dividido, barrado (Ichspaltung), através da qual o sujeito se estrutura e quando reconhece essa Ichspaltun é porque , de acordo com Lacan, apud SIQUEIRA (2006):

"já foi marcado pelo efeito de significante que é significado pelo significante falo. Ele é o A, portanto, na medida em que o falo é barrado, é elevado ao estado de significante. Esse Outro como castrado é representado aqui no lugar de mensagem ? do desejo".
Dessa forma, quando o desejo é marcado como "não-todo", impossibilitado de se realizar completamente, o sujeito passa a demandar algo do outro, indo além do desejo, ou seja, o sujeito passa pela demanda. O significante da falta ? "falta-a-ser" seria o falo, que na ordem dos significantes representa o que é marcado pelo próprio significante. Então o significante da falta é o falo, que por conseqüência, também é significante do desejo. De acordo com Lacan, apud SIQUEIRA (2006):

"É o desejo do sujeito, sem dúvida; mas, na medida em que o próprio sujeito recebeu sua significação, ele tem que extrair seu poder de sujeito de um signo, e esse signo, ele só obtém ao se mutilar de alguma coisa por cuja falta tudo será valorizado".

O advento do desejo só é possível quando a falta estrutural do sujeito se instaura, o que somente acontece quando o Outro é barrado, haja vista tudo passar a ser desejado. Assim, o falo está intrinsecamente ligado ao desejo, uma vez que seria o objeto de desejo por excelência, já que o sujeito passa a desejar o que não tem ? o falo. Este falo, em conformidade com a teoria psicanalítica, é sempre algo que se quer ter; portanto, efetivamente, nem o homem e nem a mulher o detém.
Lembrando Sócrates em O banquete, Alberti, apud SIQUEIRA (2006) observa que: "jamais é possível ter o que se deseja, razão pela qual o homem sempre escolhe novos objetos de desejo. Basta chegar perto de um para que o outro seja eleito". Ainda conforme Alberti, apud SIQUEIRA (2006):

"Essa busca incessante da satisfação em torno de novos objetos remete à pulsão, ou seja, a uma força interna constante que move e impulsiona o sujeito, e que, no entanto, não se satisfaz jamais. Insatisfeita por definição, torna a busca incessante ? revelando que a satisfação absoluta é da ordem da impossibilidade".
De acordo com Lacan, em A significação do falo, apud SIQUEIRA (2006): "o falo é o significante, um significante cuja função, na economia intra-subjetiva da análise, levanta, quem sabe, o véu daquela que ele mantinha envolto em seus mistérios".
O fato de Lacan em sua análise definir a função do falo como significante, decorre de sua fundamentação em Freud, já que para este, a função do falo não é uma fantasia, nem um objeto e muito menos o órgão sexual (pênis). Portando, para Lacan, sendo o falo um significante, o acesso a este se dá através do Outro e é o pai quem exerce a função de ter o falo, fazendo com que o sujeito busque a sua referência fálica no Outro. Assim, em relação ao desejo desse Outro, dando prosseguimento, de acordo com Lacan, apud SIQUEIRA (2006): "(...) e como razão do desejo do Outro, é esse desejo do Outro como tal que impõe ao sujeito reconhecer, isto é, o outro enquanto ele mesmo é um sujeito dividido pela Spaltung significante".
É em decorrência do falo que a dialética do ser e do ter aparece para o sujeito e, é somente quando a mãe é barrada pelo Nome-do-Pai que ocorre a referência fálica, pois esta não ocorre enquanto a criança é uma incógnita no desejo da mãe. Dessa forma, o complexo de castração, de acordo com Lacan, apud SIQUEIRA (2006):

"apresenta uma função de nó, que determinará não apenas as diferentes estruturas clínicas, mas as diversas posições subjetivas da relação do sujeito com o seu desejo e com o falo. Seja pela ameaça da castração nos meninos, seja pela perda de amor nas meninas, o falo exerce uma função fundamental, pois, ao instaurar a falta, abre a via para o desejo. Logo, há sempre uma dialética entre o ser e o ter, da mesma maneira que há a dialética entre o desejo e a demanda".

Dessa maneira, uma vez que o falo instaura uma falta, trata-se, pois, de um significante fundamental, haja vista ser a falta uma marca sempre presente, que jamais poderá ser apagada, constituindo o sujeito desejante.


4.3 A demanda e o desejo na obra lacaniana

Para um melhor entendimento acerca da demanda e o desejo, necessário se faz um retorno ao grafo do desejo. Dessa forma, a partir do primeiro andar, onde o sujeito completamente desamparado, com seu caminho atravessado pelo Outro - é possível a compreensão de como se funda o sujeito do desejo, a partir do Outro (A), que é quem nomeia/interpreta para o sujeito sua própria mensagem de forma invertida, a exemplo do seio que é oferecido pela mãe quando o bebê chora e assim, aliviando seu desconforto, este entende que seu choro foi de fome.
Assim, o significado s(A) - é o significado que o Outro nomeia para o sujeito - adquirindo valor de mensagem. Portanto, o desejo do sujeito não é um desejo puro e estará sempre nessa relação com o outro, sendo inicialmente, nomeado pelo Outro. Para Lacan (1957-58):

"A mãe aparece aqui como um primeiro objeto simbolizado, já que sua ausência ou sua presença se tornarão, para o sujeito, o signo do desejo ao qual se agarrará o desejo dele próprio, uma vez que fará ou não dele não apenas uma criança satisfeita ou insatisfeita, mas uma criança desejada ou não desejada".

Desse modo, o desejo da criança é constituído a partir do desejo da mãe (DM), onde aquela tenta responder às suas demandas, a fim de ser seu objeto de desejo - lugar que futuramente identificará ao do falo, de forma que inicialmente, aparece como x, incógnita no desejo da mãe. Dessa maneira, haverá sempre uma dialética entre o desejo e a demanda, uma vez que a demanda do sujeito nasce do desejo do Outro, da mesma forma que o desejo do sujeito, das demandas do Outro. Portanto, a demanda nasce a partir do desejo, sendo sempre, em última instância, demanda de amor, de ser amado e reconhecido pelo Outro, não se podendo falar em desejo sem referir-se às demandas do Outro. De acordo com ALBERTI (2000)

"No momento em que à demanda do sujeito nada responde, o círculo do desejo pode aparecer, deixando vazio, desvelado, o objeto. Isso não deixa de corresponder ao que ocorre ao sujeito quando encontra um analista, que em momento algum responde a uma demanda do sujeito, que não à demanda de análise. E em troca, oferece algo: o desejo do analista", p. 194.
Dessa forma, o analista não deve responder às demandas do sujeito para que o desejo possa advir, uma vez que em última instância são sempre demandas de amor.


4.4 A depressão e o desejo frente ao discurso capitalista

Uma vez que a depressão se trata de uma "covardia moral", refere-se, portanto, à evitação do sujeito em lidar com a falta estrutural, própria a todo ser falante. Dessa forma de acordo com o LACAN (1974):

"a depressão seria um afeto, uma falta moral, ou ainda, uma ?covardia moral?, já que o sujeito deprimido recua diante do dever ético de bem-dizer o seu desejo. Podemos considerar que o sujeito deprimido maldiz o desejo, ou nada diz, não quer saber de seu desejo, como se isso fosse possível".
Dessa forma, conforme ensina QUINET (2002):
"O desejo, para Lacan, se constitui como sendo a essência do homem, vinculando-se ao pensamento consciente para Espinosa e ao pensamento inconsciente para Lacan. Encontrando-se no fundamento da ética da psicanálise, o dever ético de bem-dizer é tributário da orientação do sujeito em relação ao desejo inconsciente, e orientar-se no inconsciente significa saber quais são as cadeias significantes e os significantes primordiais que determinam suas ações, fantasias e sintomas".

A depressão, na medida em que o desejo constitui-se a partir da falta, quando o sujeito cede de seu desejo evitando lidar com a falta, não estaria situada no grafo do desejo, pois ela "abafa" o inconsciente e "não quer saber" da castração.
Para a psicanálise, a depressão é vista como uma perda libidinal, ou ainda, perda na vida pulsional ? Verlust, ao passo que para o leigo é entendida como uma "fraqueza de ânimo". Conforme JIMENEZ & MOTTA (1999):

"Renunciar ao desejo tem um preço, ainda mais caro: implica ficar triste, sem apetite e, ainda pior, esta renúncia é a causa última das auto-recriminações, já que aquilo de que o sujeito se sente realmente culpado é de haver cedido em seu desejo" p. 202.

Dessa forma, a culpa advém da renúncia ao desejo, não querendo o deprimido saber da falta, uma vez que esta é estrutural e é apontada pelo desejo.
Conforme comentários de QUINET (2002):

"A perda da pessoa amada ou de um ideal remete ao significante ligado ao Ideal do eu ? I (A) ?, lugar de onde o sujeito se vê como amável" (...) "o Ideal do eu é o traço do Outro, ou melhor, a insígnia do Outro que situa o eu ideal para o sujeito ? i(a), como aquele objeto imaginário, amado pelo Outro, com o qual o sujeito se identifica. O eu ideal é, portanto, construído a partir das insígnias do ideal do eu, que é sempre ideal do Outro. Logo, tanto no caso do melancólico, e também no caso do deprimido, é o ideal do eu que é abalado: sua sustentação é perdida. Como conseqüência, há um abalo do eu ideal, a perda narcísica." , p. 132.

A depressão nos dias atuais é uma forma desesperada de pedir a reintrodução da falta e de salvar alguma coisa, assim como diz JIMENEZ & MOTTA(1999) "se tudo é permitido, nada é permitido" p. 205. Dessa forma, esse "tudo é permitido" na atualidade, estaria relacionado ao pai assassinado em "totem e tabu", surgindo o caos, já que tudo passando a ser permitido - "nada é permitido" e, também à falência da função paterna, uma vez que esta sustenta a lei do desejo para o sujeito e, uma vez ocorrendo, a referência à lei fica prejudicada e, por conseqüência, o desejo do sujeito; isso decorre da mudança da estrutura social ocorrida a partir do século XVIII. Para QUINET (2002), "se a depressão é uma falta moral que não cumpre o dever ético de bem-dizer, o mal-dizer corresponderia ao calar-se, ao refugiar-se no silêncio e no isolamento". Assim sendo, o sujeito triste pensa com dificuldade - fica sem ação.
Vive-se atualmente numa época de demanda universal, onde o sujeito é empurrado a gozar de qualquer preço e, diante de tantas ofertas de latousas (objetos pequenos) feitos para causar, ao ser capturado, o sujeito acredita que a felicidade será maior adquirindo tais objetos, confundindo o desejo com a demanda. Menciona BAUDRILLARD (1974), segundo Quinet (2002):

"que vivemos em uma espécie de evidência do consumo e da abundância, criada justamente pela multiplicação dos objetos (latousas). Feitos para causar, não causam desejo e sim demanda. Há uma deterioração dos laços sociais, já que os sujeitos se cercam de objetos - carros, televisões, computadores, lap tops, fax, mp3, pen drive, celulares etc (gadgets) -, e não de outras pessoas, havendo o empuxo ao prazer solitário. O desemprego e a competitividade crescentes, em um mercado cada vez mais feroz, associados ao imperativo do gozo de uma cultura produtora de gadgets (que acenam com a promessa de satisfazer o desejo e de felicidade total) podem contribuir para o estado depressivo de um sujeito desorientado em relação a seu desejo, perdido de seus ideais" p. 189.

Assim, os sujeitos são tomados por um sentimento de desamparo causado pelas crises econômicas e mudanças culturais, ocorrendo uma verdadeira epidemia de depressão. Dessa forma, o que gera insegurança e desamparo é o fato de, para tornar-se dono do próprio destino, o sujeito busca conquistar sua liberdade. Dessa maneira, além da desorientação do sujeito em relação a seu desejo, existe ainda uma corrida ao uso dos medicamentos antidepressivos, o que criaria uma demanda da depressão, caracterizando esta como uma doença dos tempos modernos, um subproduto da cultura. No entender de Cottet, apud SIQUEIRA (2006), "a promoção médica e farmacológica da entidade vem de fato ao encontro de uma demanda social que de modo espontâneo não está absolutamente decidida a incluir a responsabilidade do sujeito no mal-estar que o agita".
Os estados depressivos sempre existiram, mas a patologia "depressão" - como entidade própria, não passa de um "subproduto" da contemporaneidade, difundida com a promessa de "pseudo-felicidade" ocorrida com a proliferação dos medicamentos antidepressivos, que na verdade tamponam a dor do sujeito; dor esta associada ao vazio da existência e, por consequência à "falta-a-ser". Conforme acrescenta QUINET (2002), não deve haver uma generalização ? "Todos deprimidos!" -, nem um combate à depressão - "Abaixo os deprimidos!" -, porque esta contraria os ideais de produtividade e o imperativo da saúde. Diz o autor: "O discurso contemporâneo não gosta da depressão, ele que dela tanto fala".
Dessa forma, a cultura fabrica sujeitos deprimidos, encaixando-os no significante "depressão", mas ao mesmo tempo os exclui, de modo que o discurso capitalista inclui para excluir. De acordo com observações de BARROS (2003):

"Eles (deprimidos) dispõem de um significante-mestre no qual se reconhecem e que lhes fornece uma inscrição coletiva: cada deprimido sabe que pertence ao importante grupo dos deprimidos. Cada um deles reconhece esse significante que, ao mesmo tempo em que lhe dá um lugar, indica o universo em relação ao qual está marginalizado ou excluído".

Essa é a única maneira do sujeito se excluir dessa cultura maníaca e onipotente e, ao mesmo tempo, sentir-se incluído e "protegido", através desse significante, como se fosse possível sair dessa cultura que renega a falta, encontrando assim, uma "desculpa" para se ausentar da produção e do trabalho, ou mesmo dormir o dia inteiro. É interessante destacar que na concepção de Siqueira (2006), na palavra desculpar está implícito o desculpabilizar, ou seja, tirar a culpa, se ver livre da mesma. Para Freud, o sentimento de culpa está presente na humanidade - estaria relacionado a uma perda de felicidade - seria o preço de viver em uma cultura, tão comum nos melancólicos.


4.5 A psicanálise e o desejo

É propósito da psicanálise "Bem-dizer" a relação do sujeito com o seu desejo, onde a partir dos significantes mestres produzidos pela associação livre do analisando, o saber aparece como verdade e, o analista, como sujeito suposto saber. Comenta Soller (1997), haver uma distinção entre o bem-dizer e o dizer bem. Assim, Freud, ao apontar o sentido sexual dos sintomas, estaria mais próximo do dizer bem, enquanto Lacan, com a fórmula "não há relação sexual", que condensa a própria elaboração freudiana, mais próximo do bem-dizer. No entender de ALVARENGA (1996):

"O discurso analítico apresenta o imperativo de dizer, pois, ao convidar o sujeito a falar, promove o cogito analisante, que pode ser formulado em termos de ?eu digo, então sou?...?O dever de dizer é um dever de produzir ditos, aleatoriamente, e o paradoxo é que com isso se possa chegar ao bemdizer?", p. 27.

Não há como dizer bem o desejo, uma vez que este remete ao impossível, ao real. Assim, para a psicanálise, não existindo o objeto absoluto do desejo - não há um bem a ser atingido. Os analistas entendem que cada um em sua singularidade deve buscar seu caminho desejante ? tratando-se a psicanálise de uma "ética do bem dizer" e não um idealismo, não propondo qualquer forma de universalização moral.
Ao analista é recomendável não responder às demandas do sujeito, devendo oferecer sua escuta atenciosa e intervenções necessárias, propiciando o aparecimento do desejo, uma vez que estando no lugar de objeto a, deve causar desejo ? instigar o desejo do sujeito, caso contrário inviabilizaria o tratamento analítico.
Dessa forma, diante de um sujeito que se diz deprimido, o analista não deve responder suas demandas, devendo primeiramente instigar o sujeito a falar, fazendo-o perceber como foi atrelado a esse significante, bem como isso remete na sua história subjetiva, dando espaço para novas significações, permitindo ao sujeito resgatar o seu desejo, mesmo tendo que pagar um preço, ou seja, lidar com a falta.
Uma vez que a psicanálise opera com o diagnóstico estrutural, é importante o analista se atentar para a estrutura apresentada na clínica, pois a depressão se trata de um fenômeno que remete a determinada estrutura clínica, não sendo uma estrutura.
Seria o discurso do psicanalista, em conformidade com a teoria lacaniana, a única saída para a ausência de saída do discurso capitalista, sendo o único que dá lugar de sujeito ao outro. Assim como observa ALBERTI (2000):

"É essa posição do psicanalista como agente do discurso que subverte e barra o discurso do capitalista no qual o sujeito se crê agente sem se dar conta de que age somente a partir de significantes mestres que o comandam e que, no discurso do capitalista, estão no lugar da verdade", p.46.

Mesmo tendo a função de propiciar ao sujeito um melhor manejo de seu desejo, mediante a lida da castração como falta estrutural, a análise favorece, de certo modo, um "efeito depressor", um momento de "não querer saber disso", de lidar com a falta. Segundo ALVARENGA (1996), "a questão da depressão faz parte do cotidiano da clínica analítica, ela pode ser a posição do sujeito que chega, daquele que entra em análise e daquele que está prestes a terminar". Dessa forma, o final da análise é vivido como luto. Sendo a análise e o luto simbolizações da experiência da perda originária do objeto - estão muito próximos. Seria, conforme observações de Jorge, apud SIQUEIRA (2006):

"Como se a análise fosse, no fundo, um luto, mas sem o impacto traumatizante causado pela perda de objeto. Como se o trabalho de análise fosse o mesmo trabalho efetuado no trabalho de luto, apenas num período de tempo mais longo e sem a dor tão intensa da perda do objeto amado", p.25.

A via do desejo, para a psicanálise, - é a única possível; trata-se de um caminho que parte da "dor de existir", tendo como direção a alegria de viver. Nesse sentido, a análise é guiada pelo sujeito e o analista se ocupando do objeto a, é um simples objeto. Assim, de acordo com Quinet. Apud SIQUEIRA (2006):

"A via de saída da dor, longe de ser a abolição do desejo, que corresponde ao culto à pulsão de morte, é precisamente o seu oposto, ou seja, a saída por meio da conjunção da ?sede? com a ?ignorância?, cujo produto é o desejo de saber", p. 93.

Dessa forma, é preciso que o sujeito tenha coragem de se confrontar com a dor, a fim de fazer da falta que dói a falta constitutiva do desejo, uma vez que o discurso analítico é apoiado pela ética de bem-dizer a relação do sujeito com o seu desejo, sendo necessário que o sujeito "queira saber" e que pague um preço pelo seu desejo. Enquanto o discurso capitalista exclui o desejo e a falta e, consequentemente o sujeito, o discurso do analista trabalha com a perspectiva da inclusão.


CAPÍTULO 5
MELANIE KLEIN E A POSIÇÃO DEPRESSIVA

Tendo em vista o foco do tema do presente estudo ser a depressão, seria interessante uma correlação com a posição depressiva postulada por Melanie Klein, para quem existem duas posições fundamentais no desenvolvimento psíquico: a posição esquizo-paranóide e a posição depressiva.
A primeira se estabelece quando o ego ainda não está integrado, não se diferenciando do objeto externo, entre os três e quatro meses de vida, sendo uma relação parcial em que os aspectos positivos e negativos aparecem separados. Já a segunda posição - a depressiva, merecerá melhor aprofundamento no presente trabalho. Nela o ego se integra de forma mais ampla, reconhecendo o outro como objeto total e, sua instauração, se dá entre os quatro e seis meses de vida.
É importante esclarecer, que para Melanie Klein, o ego se faz presente desde o nascimento, sendo suficiente para experimentar angústia, usar mecanismos de defesa e formar relações de objeto primitivas na fantasia e na realidade; entretanto, se transforma com o desenvolvimento da pessoa. Dessa forma, embora possuindo uma tendência à integração, que se estabelece ao longo do tempo, o ego primitivo é amplamente desorganizado.
Segundo a autora, a partir de quando a criança conseguir reconhecer um objeto como uma totalidade corpórea e com ele se relacionar, se instaura a posição depressiva, podendo o objeto ser simultaneamente amado e odiado. Assim, o bebê reconhece que a figura materna pode lhe propiciar experiências agradáveis e desagradáveis, abrindo possibilidades de relacionamento e experiências no mundo, uma vez que passa a perceber que sua mãe é uma pessoa separada dele, além de descobrir o seu próprio desamparo.
No momento que o bebê descobre a possibilidade de amar e odiar uma mesma pessoa, inicialmente a mãe, portanto uma percepção mais próxima da realidade, menos deformada - a ambivalência e novos conflitos relacionados são gerados.
Com a ambivalência surgem novas angústias, destacando-se o temor de que o objeto amado e do qual a criança depende, tenham sido destruídos ou lesados pelos seus próprios impulsos.
O bebê terá uma nova experiência em relação à posição esquizo-paranóide, quando se integrar melhor e, mesmo sentindo ódio, será capaz de lembrar e reter o amor pelo objeto bom.
A sensação de perda do objeto devido aos impulsos e fantasias de destruição, leva o bebê a se sentir fortemente culpado e, consequentemente, a ter uma experiência depressiva. Dessa forma, o desejo pela reparação dos objetos destruídos fica paralisado pelos sentimentos característicos da experiência depressiva. Assim, a reparação é a principal defesa da posição depressiva.
Acreditando que seus objetos foram lesados por ocasião de seus impulsos destrutivos, o bebê vislumbra a possibilidade de recuperá-los, lançando mão de seu amor e cuidado. Dessa forma, o bebê amando e odiando o mesmo objeto, está em conflito, experimentando a ambivalência, de forma que aquele decorre dos impulsos reparadores e da luta constante entre a sua destrutividade e o seu amor.
Com a elaboração da posição depressiva, ocorre uma alteração profunda da visão de realidade, bem como da capacidade de reconhecimento da realidade psíquica pelo ego, caracterizando uma etapa importante no desenvolvimento do bebê. Dessa maneira, ele torna-se consciente de si e de seus objetos como entidades separadas, passando a discriminar seus próprios impulsos e fantasias, além de descobrir o outro como uma totalidade. Isso porque se dando conta de seus impulsos, estando na posição depressiva, sua preocupação é em relação aos impactos de suas ações sobre seu objeto.
Diante do acima exposto, depreende-se que é a relação do bebê com a realidade que marca a posição depressiva e, em razão disso, segundo a teoria de Klein, uma vez rompendo com a realidade, o psicótico não chega bem a essa posição. Nesse sentido, a doença psicótica estaria no predomínio da posição esquizo-paranóide. Já ao alcançar a posição depressiva e, ao menos de forma parcial a elaborar, as dificuldades posteriores do sujeito serão de natureza neurótica.
A base da criatividade e da sublimação é o sofrimento do luto, associado aos impulsos reparadores de objetos amados, sendo o sofrimento do luto, importante e fundamental aspecto da posição depressiva.
De acordo com Klein, a posição depressiva nunca é plenamente elaborada, uma vez que em decorrência da ambivalência e da culpa persistem angústias e, ainda, as novas perdas facultam ao ego, a revivencia de experiências ou lembranças depressivas anteriores.
Assim, a maneira de elaboração de um luto diante de uma perda, é determinada pela forma pela qual o sujeito passa pela posição depressiva. Segundo KLEIN, apud SIQUEIRA (2006):

"um dos fatores fundamentais que determina se a perda de um objeto amado (por morte ou outras causas) conduzirá à doença maníaco-depressiva ou se será normalmente superada é, de acordo com a minha experiência, a medida em que, no primeiro ano de vida, a posição depressiva for resolvida com êxito e os objetos amados e introjetados se estabelecerem internamente e com segurança".

Após esses esclarecimentos, é de se acreditar que o trabalho de luto não é patológico, sendo de fundamental importância para investimentos em outros objetos; assim, ao luto, se aproxima a posição depressiva.


CAPÍTULO 6
A PSICOSSOMÁTICA

6.1 Origem

Ao ver a convocação de civis para a primeira guerra mundial, Freud (1919) faz comentários acerca do despreparo desta população em enfrentar os horrores de uma guerra, haja vista não saber e nem ter sido treinada para matar semelhantes, mesmo porque tal prática contrariava os princípios morais e religiosos então vigentes. Em decorrência desse despreparo, acontecia, que grande parte dos soldados, na tentativa de minimizar o sofrimento psíquico ficavam doentes. Este fato foi confirmado por Freud (1920), conforme seus escritos em "Além do Princípio de Prazer", onde o autor menciona que para evitar um sofrimento psíquico insuportável o indivíduo adoece, de forma que o trauma por ser intolerável no psiquismo, atuaria no corpo.
Os médicos militares não tinham suficiente preparo para o alívio dos sintomas que os soldados apresentavam, uma vez que não correspondiam a uma causa orgânica e, diante da falta de conhecimento para a condução de um tratamento adequado, como forma de minimizar o sofrimento, aplicavam choque elétrico.
É certo que muitos soldados melhoravam enquanto estavam afastados para tratamento, mas por ocasião de seus retornos à ativa, reaparecia o conjunto de sintomas; esse quadro patológico foi denominado, a posteriori, de "neurose de guerra", originando a medicina psicossomática. Nesse sentido, era como se o sujeito estivesse dividido em dois "eus", ou seja, um pacífico e outro guerreiro. Do conflito desses "eus", tinha como conseqüência o surgimento dos sintomas da neurose de guerra.
A expressão psicossomática foi criada em 1918 pelo psiquiatra alemão Heinroth. Embora seu surgimento tenha sido entre os anos de 1914 a 1918, por ocasião da Primeira grande guerra, ganhou destaque em 1925 em Chicago, com os pesquisadores Franz Alexander e Dunker. Heinroth, acima mencionado, ainda criou a expressão somatopsíquica, no ano de 1928.
A psicossomática foi mencionada por Freud uma única vez, em 16 de outubro 1932, quando endereçou uma carta ao Dr. Victor von Weizsäecker, professor de neurologia e psicoterapia, da Universidade de Heidelberg, após este ter-lhe enviado o artigo: "O que sucede no corpo e na neurose", em cujas conclusões do trabalho assemelhavam-se muito à psicanálise de Freud, notadamente quando ele diz, conforme escritos em FREUD (1932) que: "o processo corporal pode ser substituído pelo anímico e vice-versa", p. 37. Von Weizsäecker enfatizava a anamnese e valorizava os aspectos psicossomáticos dos pacientes, contrariando a prática médica da época, que se baseava nos fatores orgânicos. Concordando com Weizsäecker quanto à relação das enfermidades psíquicas e orgânicas, na correspondência acima mencionada diz FREUD (1932):

"A outra parte de seu artigo, na qual se trata de determinar seu trabalho com enfermidades psíquicas e orgânicas, chamou-nos a atenção justamente porque temos nos aproximado através de observações casuais deste campo não explorado", p.46.

Freud sempre se interessou pelo tema, nunca deixando de procurar explicações psíquicas para as doenças orgânicas.
Os estudos freudianos definiam o corpo a partir de sua organização libidinal e, mesmo reconhecendo a existência de fatores psíquicos nas doenças, Freud se concentrou nas psiconeuroses, se utilizando da hipnose e a sugestão até o surgimento da noção de defesa. Depois, com a descoberta do inconsciente - surgia a clínica psicanalítica, tendo como pacientes as histéricas.
Os horrores de uma guerra alcançaram seu ponto mais alto por ocasião da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), onde feitos bichos, sem nenhum respeito humano, os judeus foram tratados como coisas, pragas ou raças inferiores nos campos de concentração nazistas. Perdendo seus nomes, eram considerados apenas como números; foram escravizados, torturados, tornados cobaias de experimentos e exterminados nas câmeras de gás. Eram crimes em massa, cometidos com muita crueldade.


6.2 A ciência moderna

O sistema dualístico divide o homem em corpo e pensamento - em duas entidades separadas. Assim, postulou Descartes, que seu corpo era uma substância material e sua alma uma substância pensante, de forma que aquele seria a máquina que se move e esta a mecânica, aquilo que pensa. Ao dizer: "Sou eu". "Cogito, ergo sum", "Penso, logo existo" ? estaria conduzindo o ceticismo a uma certeza: "Eu existo", "Sou aquilo que duvida", "Sou uma coisa pensante", ou seja, "um espírito".
A medicina clássica tem a visão de "homens-máquinas", contribuindo para o aumento das doenças psicossomáticas na clínica. Dessa forma, os sistemas de saúde pública não levam em conta a subjetividade dos sujeitos, tratando-os de maneira uniforme, com base em um modelo exclusivamente biológico, havendo aí um excesso medicamentoso, de forma que a psicanálise poderia ser de grande utilidade nesse processo.


6.3 As contribuições de Freud

Inicialmente, Freud trabalhou tanto no campo da pesquisa, quanto da clínica e, antes de cursar psiquiatria, foi cirurgião e clínico geral, dedicando-se posteriormente à neurologia. Após descobrir que havia cometido um erro ao diagnosticar como meningite crônica localizada - as dores de cabeça de um paciente - o que seria um caso de neurose, sua carreira tomou nova direção. Como se interessava muito pelos aspectos psicológicos das doenças nervosas, conseguiu uma bolsa para aperfeiçoamento com o neurologista francês Jean Charcot, que utilizava a hipnose no atendimento às pacientes histéricas e seguiu para Paris, abandonando o cargo de professor na Universidade de Viena.
Passando a dedicar-se à histeria, doença da época, classificada por Charcot como doença nervosa, hereditária, autônoma, funcional e sem lesão, Freud aproximou-se de Josef Breuer, que utilizava o método catártico, com quem desenvolveu várias pesquisas, publicando juntos os "Estudos sobre a Histeria" (1893-1895).
Breuer tratava seus pacientes, fazendo-os retroagir à cena do surgimento do sintoma, de forma que ao localizar a cena traumática, o curso psíquico dos acontecimentos produtores do sintoma, por sugestão seriam corrigidos. Segundo FREUD (1893-1895) "os histéricos sofrem principalmente de reminiscências", p.43. Fundamentado em Breuer, FREUD (1896) afirma que: "os sintomas da histeria são determinados por experiências traumáticas que se reproduzem na vida psíquica do paciente sob a forma de símbolos mnêmicos", p.190.
Acerca das neuroses, no início Freud fazia distinção entre as chamadas neuroses atuais (a neurastenia e a neurose de angústia) e as psiconeuroses (histeria e neurose obsessiva), introduzindo em 1914 uma terceira modalidade de neurose atual - a hipocondria, conceito esse gradativamente deixado de aparecer em seus trabalhos. Em 1898, no artigo "A etiologia das neuroses", o autor se utiliza pela primeira vez a expressão "neurose atual". Nesse artigo, é afirmado aquilo que se tornou a pedra fundamental para a estruturação da teoria psicanalítica, ou seja - que os fatores causais da neurose pertenciam à vida sexual do paciente ? ressaltando a importância de se examinar criteriosamente a sintomatologia antes de proferir um diagnóstico, uma vez que o papel da sexualidade variava muito de caso para caso. Consta no artigo, que as neuroses deveriam ser classificadas em dois grandes grupos: o das neuroses atuais e o das psiconeuroses, mas que muito frequentemente, ocorria num mesmo paciente, sintomas de ambos os grupos.
Freud para justificar o que ocorria no aspecto fisiológico, procurava encontrar subsídios no psiquismo, correlacionando uma dor fisiológica já existente ao momento em que surge um trauma psíquico, mas reconhecia que mesmo vinculadas ao psíquico, algumas dores tinham causas orgânicas, não sendo exclusivas da histeria.
Freud entendia que nos casos de psiconeuroses, uma anamnese detalhada era insuficiente para se chegar à etiologia, pois mesmo que o fator etiológico estivesse vinculado à vida sexual, o recalcamento estaria encarregado de defender o sujeito contra a representação intolerável. Já para os casos de neurastenia, a partir da anamnese seria possível a descoberta do fator etiológico originário, uma vez que este deveria fazer parte da sexualidade atual ou do período posterior à maturidade sexual do paciente. Nas palavras de FREUD (1898):

"a neurastenia pode ser sempre reportada a um estado do sistema nervoso, tal como adquirido por masturbação excessiva ou tal como procedente espontaneamente de emissões frequentes; a neurose de angústia revela influências sexuais que têm em comum o fator da continência ou da satisfação incompleta - tal como o coito interrompido, a abstinência juntamente a uma libido viva, a chamada excitação não consumada e outros", p. 255.
Existem muitas coincidências entre os aspectos característicos das neuroses atuais que Freud descreveu e a medicina psicossomática. Segundo FREUD (1905): "um sintoma histérico não pode ocorrer sem a presença de uma certa complacência somática fornecida por algum processo normal ou patológico no interior de um órgão do corpo ou com ele relacionado", p.47.
De acordo com a obra freudiana, na complacência somática o corpo aceita a carga que deveria ser psíquica e o órgão que apresenta a doença seria o órgão complacente.
Para Freud, sempre que a excitação sexual, independentemente do motivo, não for descarregada, ocorre uma irrupção de angústia, com sintomas corporais, ressaltando-se que a angústia seria uma reação a uma situação de perigo, uma defesa do eu frente a alguma situação ameaçadora.
Quanto às neuroses traumáticas, traduzem-se como uma fuga iminente do medo da morte, em que o sujeito procura afastar de sua mente a castração e as relações dependentes do eu.
No artigo "O mal estar na civilização", Freud (1930 [1929]) destaca que na ilusão de uma felicidade eterna, os homens se esforçam visando os aspectos da ausência de sofrimento e desprazer e, experiências de intenso prazer. Somos ameaçados pelo sofrimento em três direções: do próprio corpo, do mundo externo e do relacionamento com os outros homens - destacando-se a última direção como mais ameaçadora de sofrimento. Assim, para conviverem, os homens estabeleceram regulamentos de proteção e benefícios, construindo as regras sociais, mas mesmo assim não evitaram o sofrimento, de maneira que segundo o entender freudiano é de que seriamos muito mais felizes caso abandonássemos esse conjunto de regras imposto e retornássemos às condições primitivas. Dessa forma, o princípio do prazer sob a influência do mundo externo, se transforma em princípio da realidade, uma vez que antes da obtenção de prazer, em primeiro plano procura-se evitar o sofrimento e, pela incapacidade de tolerar as frustrações impostas pela sociedade, os sujeitos se tornam neuróticos.
O homem possui, de acordo com Freud (1933), uma tendência à autodestruição, de forma que não podendo ser expressa no ambiente social, a agressividade seria contida e retornaria ao próprio eu, podendo inclusive dar origem a doenças orgânicas. Foi ressaltado ainda, que a ação da pulsão de morte é silenciosa no organismo - tentando destruí-lo.
É certo que embora Freud não tenha se utilizado da expressão psicossomática, esta se utilizou dos conceitos da neurose de angústia, da neurose traumática, da neurose de guerra, da complacência somática e das considerações teóricas no tocante à diferenciação das neuroses atuais das psiconeuroses, que foram apresentados na obra freudiana, servindo de alicerce para que outros autores avançassem no estudo.


6.4 As teorias psicossomáticas

O marco da psicossomática é a obra do médico alemão Georg Groddeck, para quem, uma vez sendo a essência humana psicossomática, a psicanálise pode compreender e tratar as doenças orgânicas. Segundo o autor, todo tratamento envolve ao mesmo tempo o ser humano e seus sintomas, onde a doença seria uma criação carregada de finalidade, sentido e função expressiva. Sustenta Groddeck, que a partir de um desejo, se originariam todas as doenças orgânicas, razão pela qual a psicanálise seria eficaz no tratamento. Para ele, o adoecimento seria simultaneamente do corpo e da alma, não existindo, portanto, doenças orgânicas ou doenças psíquicas. O autor introduziu a expressão "linguagem de órgão". Assim, para se entender a causalidade psíquica, um câncer de colo de útero - por exemplo, pode expressar o desejo de uma mulher em ter um filho.
Apesar das divergências existentes entre Groddeck e Freud, este muito se utilizou das concepções daquele, notadamente nas relações entre o funcionamento psíquico e o orgânico.
A noção de neurose vegetativa, em que os afetos agiriam diretamente sobre o corpo, foi introduzida pelo médico e psicanalista húngaro Franz Alexander, precursor da Escola de Psicossomática de Chicago. Através das entrevistas clínicas, Alexander e outros médicos estudaram sete patologias específicas, classificadas como doenças psicossomáticas, por estarem associadas a conflitos psíquicos específicos. São elas: úlcera péptica, colite ulcerativa, hipertensão essencial, artrite reumatóide, asma brônquica, neurodermatite e doença de Graves.
A doença seria a conseqüência de emoções, impulsões não satisfeitas, desviadas e reprimidas. De acordo com Alexander (1994), diante de situações de perigo o homem ataca ou foge, de forma que em qualquer dessas atitudes resulta da atividade do sistema nervoso autônomo. Assim, quando essas duas tendências básicas são bloqueadas, o sistema nervoso neurovegetativo se desequilibra.
Buscando explicar as lesões corporais classificadas como psicossomáticas, o termo conversão somática foi utilizado por Melanie Klein e seus seguidores. Segundo Valas (2003), essas lesões relacionam-se a fases primitivas do psiquismo, seriam consequências de conflitos anteriores ao período edipiano. Conforme o autor, fundamentado nessa corrente, o sintoma psicossomático corresponderia a uma estrutura particular de personalidade, de forma que cada doença seria determinada por fatores psíquicos específicos.
A conversão somática seria uma ação do recalcamento e ocorreria por mecanismos de regressão e de fixação no curso do processo do período de castração.
Os franceses Marty e M?uzan, ainda de acordo com Valas (2003), partindo de estudos de Fain e David, acerca da vida onírica, observaram que os pacientes psicossomáticos possuíam um mundo interno pobre e dependiam muito da realidade externa, a exemplo de investirem intensamente no trabalho quando acometidos de algum problema existencial. Ainda segundo o autor, conforme o autor americano Sífneos, portadores de doenças psicossomáticas apresentavam dificuldade em descrever suas emoções, até mesmo de senti-las. Sífneos criou o termo alexitimia (do grego a = sem, lexis = palavra, thumus = ânimo ou afetividade), significando "ausência de palavras para nomear as emoções". Dessa maneira, os termos alexitimia e pensamento operatório possuem ampla utilização no campo da psicossomática.
Outra corrente da psicossomática apresenta como destaque o autor Valabrega, que estende a noção de conversão histérica para uma conversão psicossomática, mas esse processo de conversão é explicado, segundo Vallas (2003), de forma confusa, sem muita compreensão para o leitor. Valabrega fala de fantasmas que estariam inscritos na corporeidade do doente, entendendo que existe diferença entre o fantasma psicossomático do fantasma do neurótico, sendo que naquele, o fantasma estaria no corpo do paciente, que poderá não reconhecê-lo, de forma que esse desconhecimento faz com que o sujeito até mesmo nunca fale, utilizando a vida dupla, seria como se a manifestação psicossomática fosse estranha à vida do sujeito.
A utilização da psicoterapia para Valabrega não teria como objetivo atingir a profundeza dos conflitos, visaria oferecer segurança ao doente, na tentativa de restituir suas relações com o mundo. Assim, conforme VALLAS (2003): "os fenômenos psicossomáticos têm sentido próximo da conversão histérica, mas não totalmente", p.75.


6.5 A depressão essencial

Na França, o médico e psicanalista Pierre Marty, desenvolveu os conceitos de mentalização, pensamento operatório e depressão essencial ? base da teoria sobre pacientes psicossomáticos. Para Marth (1993), a mentalização diz respeito à quantidade e à qualidade de representações psíquicas em um dado indivíduo.
De acordo com a escola francesa, os relatos dos pacientes portadores de sintomatologia psicossomática, ocorrem de forma seca, sendo considerados apenas os fatos patológicos, suas datas e opiniões de médicos anteriores, ao passo que no discurso do neurótico, os fatos vêm associados aos acontecimentos afetivos das épocas em questão. Dessa forma, as falhas no funcionamento psíquico, divergem entre os portadores de doenças psicossomáticas e os clássicos neuróticos da psicanálise.
A partir das pesquisas realizadas nessa base teórica, conforme MARTY (1993), "a reconhecida insuficiência do funcionamento mental", p. 16 - o autor juntamente com M?uzan criaram em 1962 os conceitos de "pensamento operatório" e, em 1966 os conceitos de "depressão essencial".
O pensamento operatório é um modo de funcionamento psíquico sem nenhuma afetividade e de pouca energia libidinal. Nele, há uma total desconsideração da imaginação e das expressões simbólicas, sendo levados em conta o concreto e o material; portanto, inexistem as atividades fantasmáticas e oníricas, de forma que seria um processo consciente, onde as relações interpessoais são vazias e indiferentes.
Posteriormente Marty substituiu o pensamento operatório pela noção de "vida operatória", que ligada à depressão essencial constituem-se repletas de incidentes ou acidentes somáticos, em cujas poucas representações existentes são muito pobres, repetitivas e marcadas pelo atual e factual.
O autor mencionado considera que em decorrência das inadequações do sujeito às suas condições de vida, ocorre o adoecimento. Para ele, as más mentalizações na infância, são nefastas e constituem-se fatores de risco para o aparecimento de doenças graves, sendo de suma importância a qualidade da mentalização. Dessa forma, com um psiquismo mal desenvolvido, as características sensório-motoras podem predominar, dando ao psiquismo um aspecto operatório.
É característico do pensamento operatório, ser consciente e não ter relações significativas com movimentos representativos apreciáveis; nessas condições, a agressividade do sujeito nem sempre se exterioriza, havendo um empobrecimento na organização do "eu".
Em substituição à expressão "depressão psicossomática", Marty criou a depressão essencial. De acordo com o autor, neste tipo de depressão, ocorre uma baixa de investimento libidinal que interfere na dinâmica psíquica do sujeito, reduzindo a energia vital do doente, favorecendo a prevalência da pulsão de morte na vida do sujeito.
Em sua obra L?ordre Psychosomatique, MARTY (1980) acrescenta que: "a depressão essencial se estabelece quando os eventos traumáticos desorganizam um certo número de funções psíquicas das quais transbordam as capacidades de elaboração", p.59 ? melhor descrevendo a depressão essencial e sua sintomatologia. Para o autor, o quadro de depressão essencial é precedido de "angústias difusas", onde o eu submerso e desorganizado, precariamente cumpre suas funções de ligação, distribuição e de defesa, uma vez que a angústia seria o próprio alarme e não o sinal deste, reproduzindo então um estado arcaico de transbordamento, apagando a dinâmica dos processos psíquicos.
Para o diagnóstico da depressão essencial é importante observar aspectos como: perda do interesse pelo passado e futuro ? diminuição dos relacionamentos interpessoais ? desaparecimento dos sentimentos inconscientes de culpa e da expressão de desejo - fala limitada aos aspectos objetivos e concretos e, desprovida de afetividade. Assim, na clínica desses pacientes não se estabelece uma relação afetiva, de transferência com o outro, nem mesmo com o analista, supondo que este mediante a articulação de seus problemas com os fatos concretos, irá resolvê-los.


CAPÍTULO 7
APRESENTAÇÃO DO CASO CLÍNICO

O caso clínico em destaque motivou a redação do presente trabalho, cujo início se deu um ano atrás, a partir da intensificação das visitas recebidas pelo autor, de um dos reféns da série de rebeliões de presos comandada pelo crime organizado, ocorrida nos presídios do estado de São Paulo, durante o mês maio de 2006.
A vítima (visitante) é Agente de Segurança Penitenciária do quadro de servidores da Secretaria de Administração Penitenciária do estado de São Paulo, possui entre 40 e 50 anos de idade e, aqui, estando aqui na condição de analisando, é chamada pelo nome fictício de ASP.
Quanto ao autor, estando aqui na condição de analista, conhece os detalhes do fatídico acontecimento, estando em condições de não somente reconhecer e tratar psicanaliticamente os sintomas apresentados por ASP, mas de saber o que realmente o analisando "sente". Isso, em decorrência de também ser servidor da Secretaria de Administração Penitenciária do estado de São Paulo e, na ocasião da série de acontecimentos que culminou com simultâneas rebeliões em várias unidades penitenciárias, também fora feito refém. Vale lembrar, que coincidentemente, ambos, analisando e analista, no tempo em que estiveram em poder dos sentenciados, sofreram intensa tortura psíquica e foram incontavelmente ameaçados de morte, sendo que os rebelados eram mais de 1000 criminosos fortemente armados com submetralhadoras, revólveres, facas e barras de ferro.
Ressalta-se que foi no dia 10 do mês e ano anteriormente mencionados, por ocasião da rebelião na Penitenciária de Valparaíso, onde a série de acontecimentos violentos começou e, a partir do dia 12, se espalhou por todo o estado, tendo até o dia vinte do mesmo mês uma sucessão de rebeliões, num total de 73 unidades prisionais, além de ataques extra-muralhas, que culminou com a morte de muitos agentes de segurança penitenciária, policiais civis e militares e, até mesmo de pessoas sem nenhuma aparente ligação com o fato. Conforme ADORNO E SALLA (2007), apud LOURENÇO (2010):

"Entre 12 e vinte de maio de 2006, 439 pessoas foram mortas por armas de fogo, no estado de São Paulo, conforme laudos necroscópicos elaborados por 23 Institutos Médicos-Legais, os quais foram examinados pelo Conselho Regional de Medicina. Comparativamente a igual período em anos anteriores, bem como às semanas anteriores e posteriores a esse período, o volume de mortes é bastante elevado, sugerindo um cenário de excepcionalidade. Essas mortes foram acompanhadas de ondas de violência, como rebeliões em 73 presídios do estado, agressões e ataques contra agentes públicos, sobretudo policiais e agentes penitenciários; contra civis, contra prédios privados, como bancos, e públicos, como postos policiais; além de incêndio de veículos de transporte público como ônibus", p. 7.

O trabalho do Agente de Segurança Penitenciária se dá de forma contraditória, uma vez que esse profissional, ao mesmo tempo em que tem de garantir a ordem e a segurança no interior das unidades prisionais, busca ressocializar o indivíduo apenado, ou seja, tem que ser "Deus e Diabo" ao mesmo tempo. A esse respeito, conforme o posicionamento de LOPES (1998), apud LOURENÇO (2010):

"Os guardas invariavelmente sentem-se em uma posição desconfortável. É difícil coordenar ações de naturezas diversas: coação de presos à obediência e impressão de estar-lhes dando um tratamento humanitário; autoritarismo da custódia e princípios de tratamento individual. Esse antagonismo permanente se dá pela dupla visão que se tem do preso. Se esse, por um lado, é uma pessoa em tratamento, por outro é um violador da lei e necessita, pois de controle", p. 71.

Na correlação de forças existentes entre grupos antagônicos, no caso presente entre "presos e agentes penitenciários", notadamente por parte daqueles, que em virtude de estarem impedidos de se locomoverem livremente por força da lei, portanto em nome da ordem e da segurança - obrigados à obediência, uma vez que em caso contrário a punição é certa - qualquer acontecimento que os contrariem, pode levá-los a ir represando energias, digamos "negativas" que vão se juntando a outras, uma vez que "impedidos", não podem liberá-las. Assim, por ocasião das rebeliões, eventos propícios à liberação de ressentimentos guardados, aproveitam e não raramente, disparam a carga de agressividade armazenada (às vezes por anos) em seus reféns. Sabendo-se dessa possibilidade, os agentes penitenciários exercem suas funções num clima de muita tensão. De maneira geral, estão muito expostos a diferentes situações geradoras de estresse, seja pelas constantes ameaças e intimidações que sofrem por parte dos sentenciados, seja pelo risco iminente de estourar uma rebelião e serem tornados reféns, ou ainda pela possibilidade de se contaminarem por doenças infecto-contagiosas, muito frequentes na população carcerária. Conforme recorte publicado em março de 1998, pelo SIFUSPESP, no Jornal "UNIÃO PRISIONAL", apud LOURENÇO (2010):

"Além dos riscos de contaminação por doenças infecto-contagiosas, mais prevalente em populações reclusas e confinadas, os funcionários daquela instituição sofriam, dentre outras enfermidades, de alexitimia, ou incapacidade de discriminar e manifestar emoções, de estresse, com todas as suas repercussões somáticas, de disfunção pós traumática (PTSP) e até Síndrome da Fadiga Crônica".

Em decorrência da diversidade de formas de violência apresentada na rotina desse profissional, o agente vive e trabalha num clima de constante medo, até mesmo da morte. Segundo a assistente social que exercia atividades profissionais em unidades prisionais do Rio de Janeiro, VASCONCELOS (2000), apud LOURENÇO (2010): "(...) a violência ocupa espaços diferenciados na vida desse trabalhador, e deixa de ser excepcional para tornar-se uma marca do cotidiano", p. 62. E nessa situação obscura de incertezas, com a iminente possibilidade de a qualquer momento terem suas vidas ameaçadas, torna-se muito difícil para esses profissionais planejarem suas vidas. De acordo com LEWIN (1978), apud LOURENÇO (2010) "(...) esta falta de clareza da situação, esta incerteza quanto ao terreno que (se) está pisando leva geralmente à incerteza no comportamento", p 161. Assim se expressa CHIES (2008), apud LOURENÇO (2010): "(...) No ambiente carcerário o tempo assume especiais aspectos de temporalização, influindo em dimensões psíquicas e sociais das pessoas e dos grupos que ali se encontram", p. 51.
Acrescenta-se ao mencionado acima, a afirmação de ADORNO (1998),apud LOURENÇO (2010), quando diz que:

"(...) Certamente, o despreparo e a formação direta no mundo da violência, baixos salários, péssimas condições de trabalho, inexistência de carreiras que permitam ascensão na escala funcional, número insuficiente de pessoal comparativamente ao tamanho da população prisional, regime de trabalho estafante e estimulante do descontrole emocional, contribuem para perpetuar e recrudescer esse círculo de violência que faz do guarda de presídio agente destacado", p. 1023.

Importante ainda é considerar a corroboração contida nas palavras de LOPES (1998), apud LOURENÇO (2010):

"(...) Se incontestável que as prisões são atualmente depósitos humanos, verdadeiras escolas de criminalidade e violência, estando, portanto, muito distantes do ?sonho? dos cientistas penitenciários do início do século XX, não é menos verdade que as pessoas que lá trabalham também estão expostas a uma série de tensões e riscos. Todos os funcionários que trabalham em penitenciária vivem em um permanente clima de tensão, e quanto maior é a convivência direta com os sentenciados, maior é a exposição a riscos nos momentos críticos. Nas unidades prisionais, a categoria funcional que tem o contato mais freqüente com os sentenciados é o de agente de segurança penitenciária", p. 06.

Ao se tornarem muito freqüentes as visitas de ASP ao autor da dissertação em destaque, há um ano, ficou subentendido, que na realidade, o que o visitante estava procurando era atendimento psicanalítico. Assim, uma vez que apresentava demanda de atendimento individual, considerou-se para efeito de análise, como sendo o primeiro dia, aquele em que ASP fala de sua história de vida e da razão que o levou a aceitar a ajuda, que ao mesmo tempo ele considerava uma parceria, uma vez que pelo fato ter também ter sido refém de rebelião de presos, o autor estaria em condições de saber o que realmente sentia. Mesmo com esta fala, na concepção do analista, ainda não indicava endereçamento ao trabalho analítico.
Conta que vem se sentindo "deprimido", como já havia feito outras vezes, que não tem vontade de fazer nada e, que há muito tempo perdeu a razão de viver, estando muito "desanimado" e sem disposição - desde o fatídico acidente.
ASP fala do dia em que foi feito refém por mais de mil presos, quando honradamente defendia os interesses do estado, zelando pela ordem e segurança no interior de uma penitenciária. Faz referência ao fatídico acidente, culpando a negligência do Estado, em não oferecer segurança suficiente e necessária a seus funcionários e, que desde então, lhe é muito doloroso, fazendo com que tenha constantes crises de choro.
As queixas trazidas por ASP, nas conversas então consideradas preliminares, referiam-se a uma falta de vontade de viver, a um desânimo permanente, que fora por ele nomeado de "depressão".
Inicialmente, a "depressão" constitui-se como uma queixa sintomática, diante da qual o paciente não se implica subjetivamente. É um sintoma que incomoda o sujeito, fazendo com que se "sinta mal" e querendo eliminá-lo, sem saber por que se sente assim.
ASP, em certa ocasião, diz ao analista: "te considero a única pessoa com quem posso falar o que sinto", indicando a possibilidade de um endereçamento ao trabalho analítico, apesar de ainda não existir uma demanda de análise. Nesse momento, as visitas de ASP, sobretudo, tinham como foco as queixas, não se implicando ainda no que era trazido. O analisando fazia sérias críticas pela negligencia do estado, que em momento algum se prontificou a ajudá-lo, já que enquanto funcionário se acidentou no exercício de suas funções. Até então, ainda não havia se instalado a relação de transferência, sendo a partir dela que se inicia o trabalho da análise, uma vez que atualiza o modo de relação do sujeito com o seu desejo.
Ao longo do percurso clínico, foram imergindo questões importantes no discurso de ASP, possibilitando a instauração do trabalho analítico. Um momento marcante foi quando em uma de suas falas exclamou: "preciso acabar com este sofrimento, senão ele vai acabar comigo". Nesse instante, começou a chorar, dizendo se sentir "sufocado" por não conseguir, até hoje, tanto tempo depois, criar condições para retornar às suas atividades.
A frase acima mencionada pelo analisando no parágrafo anterior, inicialmente dá indícios de uma identificação narcísica com a atividade laboral: ao se acabar (matar), poderia acabar (matar) o seu sofrimento, bem como tudo que estava ligado (o trabalho).
ASP diz que por inúmeras vezes pensou em por um fim a isso tudo (suicídio), acreditando ser a única forma de eliminar seu sofrimento.
Uma reflexão acerca do risco de suicídio, remetendo a uma possível gravidade do caso, era preocupante e instigante, ao ponto de deixar dúvidas se o risco de suicídio contraporia a possibilidade de uma mudança de posição através de um trabalho pela palavra. Constantemente ASP perguntava se a gravidade do seu caso, causava preocupação ao analista.
Diante da presença constante do tema suicídio nas falas de ASP, sugeriu-se uma estrutura neurótica histérica e, considerando-se a gravidade de seu sofrimento, aliada ao risco de suicídio ? foi-lhe oferecida escuta, deixando suspensas as questões relacionadas ao tema.
Se, no início de seu tratamento, ASP apenas afirmava "estou deprimido", "sem vontade de fazer nada" e, que há muito tempo perdeu "a razão de viver", sem implicação subjetiva, progressivamente começa a perguntar sobre a razão de sua depressão. Reconhecia que mesmo tendo de tempos em tempos suas licenças convertidas em acidente de trabalho, o que lhe possibilitava recebimento integral de seus proventos atrasados, proporcionando-lhe conforme suas palavras "sair do sufoco" (problemas financeiros), continuava a se sentir "deprimido". Com tal questionamento inicia-se a abertura de espaço ao trabalho analítico. Assim, ASP passa a questionar a razão pela qual se sente "deprimido" - mudança que lhe empurra ao trabalho psicanalítico.
Ao falar da falta de vontade de viver, de sua "revolta" com a rebelião dos presos ? na qual foi vítima, ASP esboçava um sorriso misterioso, irônico, aparentando estar com gozação, mas ao longo do trabalho analítico, aos poucos foi sendo esclarecido, uma vez que ele começa a perguntar a razão de seu sorriso, quando é difícil falar.
Certa vez ASP falou que em certos momentos, tentando fugir de si mesmo ? sorria, já que sua própria presença lhe era muito difícil. Disse que acreditava na vida e, que as pessoas, mesmo estando mal, como forma de proteção, devem mostrar aparência de fortes. Assim, associando livremente, seu discurso vai crescendo e tornando-se importantíssimo.
Foi dito pelo analisando, que em sua casa, lhe exigem que seja, conforme suas palavras, "um pau p?ra toda obra" e que seu trabalho sempre fora "o esteio" da família, vindo sempre em primeiro lugar.
ASP questiona: "E agora, quem é meu esteio?". Essa pergunta revela o lugar do analista na transferência, desejando que o lugar de esteio viesse a ser ocupado por ele. É importante ressaltar que não cabe ao analista, o oferecimento de respostas ou garantias, devendo somente acolher a fala e dar prosseguimento ao trabalho analítico.
Certa vez o analisando falou que todo mundo tem problemas e, sendo assim, logicamente, o analista também teria seus sofrimentos, acreditando que escutar lamentações alheias deveria ser muito difícil quando também se tem o que reclamar, mesmo porque, sabia que assim como ele, o analista também fora refém de rebelião. Estaria o analista aberto a escutar aquilo? Eis a questão!
De início, a resistência revelava-se um tanto quanto irônica, uma vez havia, de certo modo, uma dúvida em acreditar que alguém que tivesse passado pelo mesmo problema pudesse tratá-lo, embora, anteriormente, ASP já tivesse dito ao analista que o considerava a única pessoa com quem podia falar o que sentia.
Durante um determinado período, o analista reservou expectativas no sentido de que o analisando renunciasse a idéia de suicídio, uma vez que tinha a preocupação de salvar o analisando. Enquanto estes aspectos foram sendo trabalhados, o trabalho analítico carreou para outras questões até então não faladas e saindo da esfera do suicídio.
Por ocasião de um momento delicado, quando ASP enfatiza seu discurso em torno do tema suicídio, afirmando que quer por um fim em tudo e acabar com seu sofrimento, o analista reforça a importância de o analisando levar muito a sério o tratamento psiquiátrico, que já vem sendo realizado desde a época do evento traumático, há quatro anos e, que deverá ser mantido ao longo de seu percurso analítico.
Acerca de suas consultas psiquiátricas, o analisando falou que o psiquiatra lhe dissera que ele ainda não havia se desligado de suas funções laborais e que isso era importante. Emocionando-se ASP diz que o médico estava certo, que precisava esquecer mesmo. Trazendo a questão para sua análise, questiona-se a razão de não conseguir "esquecer" do trabalho.
É importante ressaltar, que o analisando considera que suas visitas ao psiquiatra são importantes e necessárias, uma vez que além de ser acolhido, lhe é oferecida uma resposta medicamentosa. Diante disso, é possível afirmar que nesse caso, diferentemente do que era de se esperar, o discurso usado pelo psiquiatra não foi o do mestre, mas o do analista, já que instigou e causou desejo, ressaltando-se, porém, que o discurso do mestre, responde ao "mal-estar" do sujeito tentando tamponá-lo, através de medicamentos.
No caso de ASP, havia uma enorme dificuldade na elaboração do acidente, uma vez que embora com sucessivas crises de choro, estava muitas vezes com um sorriso irônico, escondendo a face mais fraca e triste. Mesmo quando passou a chorar nas sessões psicanalíticas, enxugava as lágrimas e se dizia estar bem.
Se, no princípio, ASP insistia em falar de suicídio, como tentativa de eliminar seu sofrimento, ao longo do trabalho ele deixa de falar em "ter sido torturado", passando a utilizar a palavra "esquecer" ? esquecer da rebelião, demonstrando a árdua tarefa de elaboração de um luto mediante diferentes posições do sujeito.
Passando da tortura para o esquecimento, fica clara a entrada de ASP em um trabalho de luto, e, a partir de então, é mudado seu discurso em relação a quando se sentia deprimido e chorava muito.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final do presente estudo, onde através de uma diversidade de possibilidades e articulações, foi possível o aprofundamento de um caso de depressão pós-traumática, instalada em um dos reféns da rebelião de presos comandada pelo crime organizado em maio de 2006, nos presídios do estado de São Paulo.
É importante lembrar, que a intenção do autor, foi destacar o caminho percorrido e, não esgotar o tema, haja vista ser da ordem da impossibilidade. Destaca-se que em virtude da complexidade do assunto, muitos questionamentos não foram abordados e ou suficientemente aprofundados, os quais poderão constar oportunamente em trabalhos posteriores.
Diante do caso clínico apresentado e, em virtude da inseparabilidade existente entre a teoria e a clínica, partiu-se à busca de subsídios na teoria psicanalítica. Dessa forma, em face do objeto da pesquisa em destaque ser um sujeito que se dizia estar "deprimido", iniciou-se o estudo, procurando-se a definição da "depressão", mediante pesquisas de obras de vários autores, a exemplo de Freud, Lacan, Klein - dentre outros.
Observou-se que a depressão é inegavelmente a doença do momento, tratando-se de um fenômeno da cultura contemporânea, cada vez mais evidenciado pela clínica e, que ninguém, nem mesmo o psicanalista ou o médico, podem entender quais os reais sentimentos do deprimido, mesmo estando em condições de reconhecer e tratar os sintomas, uma vez que só o portador de depressão conhece seu sofrimento.
Ao se estudar a depressão pós-traumática, foi possível depreender que na grande maioria dos trabalhos acerca da doença após evento traumático, esta surge depois do indivíduo contrair o TEPT (Transtornos do Estresse Pós Traumático), sugerindo-se que em havendo comorbidade, os sintomas depressivos apresentam-se de forma mais intensa, sendo de se supor a existência de uma estreita relação entre a depressão maior e o TEPT, mas cada caso, em decorrência da complexidade dessa relação, deve ser analisado em separado.
Após a verificação das formas possíveis de tratamento da depressão, inclusive do ponto de vista da psiquiatria, passou-se ao aprofundamento do tema trauma e psicanálise, onde foi notado o quanto é difusa a literatura freudiana quanto às exposições traumáticas, estando reportadas à histeria e às neuroses de guerra e, que no geral, o trauma está relacionado à falta de preparo do sujeito em absorver ou integrar uma excitação psicossexual.
Verificou-se ainda, que os conceitos freudianos podem ser transportados para a atualidade. Assim, a "histeria traumática" descrita por Freud compara-se ao TEPT atual. Desse modo, em ambos os casos, a causa provém da emoção e do susto sofrido, não decorrendo de danos físicos, já que estes operam contra o desenvolvimento de uma neurose.
Foi visto que ao receber uma vítima de TEPT, o psicanalista deve considerar, além do conteúdo manifesto, as questões latentes do indivíduo, bem como questões afloradas pelo trauma - responsáveis pela desestabilização do equilíbrio anterior.
Quando nos reportamos aos discursos da psicanálise e da psiquiatria, ficou evidente que aquela se vincula ao discurso do psicanalista e esta ao discurso do mestre. Assim, operando com a escuta, a psicanálise oferece a possibilidade de através da palavra, o sujeito aliviar seu sofrimento, enquanto que a psiquiatria opera com o olhar clínico e provoca o tamponamento da dor do paciente, oferecendo-lhe medicamentos.
Após a verificação de que a depressão se trata de um fenômeno que pode apontar para a neurose ou a psicose, partiu-se para o estudo dos quatro discursos de Lacan, além de sua quinta proposição: o discurso capitalista.
Por ocasião das considerações e comparações acerca da depressão, do luto, da melancolia e da neurose obsessiva, constatou-se, que em relação ao luto e à melancolia, se aquele, diante de uma perda, implica um trabalho de elaboração, inicialmente não sendo patológico, nesta a possibilidade de uma simbolização da perda é inexistente. Aprofundando o estudo acerca da melancolia, passou-se a distingui-la da neurose obsessiva, culminando com observações sobre a pulsão de morte.
Foi visto que o discurso acerca da depressão, no início do século passado, não tinha a conotação dos tempos atuais, ao passo que o termo melancolia já era muito usado, desde a antiguidade, bem como tempos depois entre os autores da psiquiatria clássica.
Vimos que ao abordar a depressão, Lacan a considerou como uma covardia moral, não se tratando, pois, de um estado d?alma, mas simplesmente de uma falta moral, que aparece quando o sujeito cede de seu desejo, se acovardando. Assim, a depressão é uma reação do eu, que estando inchado, recusa o que vem do inconsciente. Na seqüência estudamos a intrínseca relação existente entre o desejo, a falta e a lei, sendo possível apreensão de que a castração é o ponto de partida da organização da estrutura.
Ficou claro, que a depressão não é simplesmente um produto da cultura, tratando-se, pois, sobretudo, de um meio que o sujeito encontra para não lidar com o desejo.
Interessante também foi estudar a correlação com a posição depressiva postulada por Melanie Klein, para quem existem duas posições fundamentais no desenvolvimento psíquico: a posição esquizo-paranóide e a posição depressiva, merecendo destaque a segunda, na qual ficou entendido que a integração do ego se dá de forma mais ampla, onde o outro é reconhecido como objeto total. Ficou claro após os esclarecimentos de Klein, que o trabalho de luto se aproxima à posição depressiva, não sendo patológico, mas de grande importância para investimentos em outros objetos.
Foi efetuada ainda, uma incursão pela psicossomática, destacando-se a origem, a ciência moderna e as contribuições freudianas, ficando patente a existência de muitas coincidências entre os aspectos característicos das neuroses atuais descritas por Freud e a medicina psicossomática. Quanto a esta, apreendemos que seu marco é a obra do médico alemão Georg Groddeck, para quem uma vez que a essência humana é psicossomática, a psicanálise pode compreender e tratar as doenças orgânicas. Observamos que apesar das divergências existentes entre Groddeck e Freud, este muito se utilizou das concepções daquele, notadamente nas relações entre o funcionamento psíquico e o orgânico. Aprofundamos ainda, dentro desta temática, estudos dos conceitos de Pierre Marty, constatando que a base da teoria sobre pacientes psicossomáticos é o conceito de depressão essencial e, que na clínica desses pacientes, não se estabelece uma relação afetiva, de transferência, nem mesmo com o analista, supondo que este mediante a articulação de seus problemas com os fatos concretos, irá resolvê-los.
Ao final do trabalho foi apresentado o caso clínico, ressaltando-se inicialmente, a ocorrência do evento traumático, bem como a ação e o trabalho do agente de segurança penitenciária, sendo explorada a diversidade de formas de violência apresentadas na rotina desse profissional e, por fim o caso propriamente dito, sendo relatadas as falas importantes do analisando e, quanto ao analista, ficou claro, que sua função fundamental é a instigação do desejo.


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Autor: José Manoel De Souza Rodrigues


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