Reconstruindo tecnologias tradicionais e o ensino e aprendizagem de fisica



Introducao

Com a finalidade de apreender as experiências na construção de armadilhas e das técnicas de caça iniciamos de Maio a Novembro de 1994 várias deslocações ao distrito de Boane e realizamos várias entrevistas com um caçador residente naquela região do país. O senhor Amós Baskete Fumo, nascido em 1936 que foi caçador desde 1960 e reside em Boane na localidade de Mabandja onde vem praticando a caça. As entrevistas foram conduzidas por mim e por Alberto Felisberto Cupane na altura estudante de Física e Matemática da Faculdade de Ciências Naturais e Matemáticas da Universidade Pedagógica. Posteriormente, em Julho de 1995 iniciámos novas expedições à província de Tete nos distritos de Changara desta vez conduzidas por José Jota Cumpeu falante da língua Nhúnguè e também por Alberto Felisberto Cupane. Ambos eram ainda estudantes na Universidade Pedagógica. Em Tete as entrevistas foram realizadas com os caçadores Felix Salanhar Semo e Luís Weta residentes na localidade Vuzi-Mazoe. Nesse mesmo ano, com o apoio de Anacleto Anselmo Senalo também estudante até ao ano de 2006 na Universidade Pedagógica retomamos os trabalhos de armadilhas de caça. Anacleto Anselmo Senalo aprendeu as tecnicas de caça partir dos 10 anos de idade do seu pai Mário Paulo. O senhor Mário Paulo praticava a caça de animais típicos daquela zona (ratos, gazelas e coelhos) no distrito de Boroma e trabalhava numa direcção distrital de agricultura no sector de Veterinária; assim nos seus tempos livres ocupava-se com a caça de animais, usando tanto as armas de fogo ? caçadeiras mas também aplicando os métodos tradicionais de caça.

Partindo da descrição de casos específicos de algumas armadilhas tradicionais conhecidas localmente em Maputo por Lithaka, Nxthamu e Nteve e outros da província de Tete, como Ukonde, Cemphe, Cadandari, Mulapu, Diua, Tchinga, Cibambo e Ulimbo vamos procurar estabelecer uma analogia entre os modelos de ensino e aprendizagem das armadilhas de caça vistas aqui como "tecnologias indígenas/tradicionais" e as aplicações técnicas modernas vistas aqui como "tecnologias modernas". Assim, constitui objectivo deste trabalho explorar e mostrar as possibilidades metodológicas da utilização da "tecnologia tradicional" para a introdução e desenvolvimento de novas tecnologias no ensino. Este procedimento poderá constituir-se como método auxiliar de ensino e aprendizagem na abordagem e compreensão de conteúdos específicos ligados à tecnologia moderna. Assim, uma relação didáctica específica poderia ser estabelecida entre ambos processos.

Neste contexto foram construídos modelos de aparelhos usando recursos simples e materiais de baixo custo. Propõe-se futuramente a utilização destes modelos numa experimentação pedagógica na forma de projectos de ensino na sala de aulas em Moçambique.


A técnica de armadilhar na província de Tete com instrumentos de caça DIUA e MULAPU

Figura 1: Diua armadilha tradicional da província de Tete - distrito de Borona, 2006

DIUA, é um instrumento tradicional usado para a caça de animais de pequeno porte (ratos, passarinhos, esquilos, perdizes). O DIUA consiste:
i) Numa pedra mais ou menos lisa cuja face, perfaz uma área aproximadamente de 300 cm2. Esta área é importante pelo espaço necessário que oferece para prender o animal. A pedra é suportada numa das suas extremidades pela alavanva (ntanda) enquanto a outra parte está encostada no chão.
ii) Numa forquilha (m`phanda) de 25 a 30 cm de comprimento, que geralmente é espetada no chão, possui numa das suas extremidade livres na forma de uma fenda em forma de V.
iii) Na forquilha que serve de suporte a alavanca interfixa (ntanda) de 25 a 30 cm de comprimento.
iv) Num pauzinho (mpiniguiro) que é fixo no chão e encostado perpendicularmente à forquilha. O sistema forquilha, mpiniguiro e o chão formam aproximadamente um triângulo isósceles.
v) No braço maior da alavanca (ntanda) onde amarra-se um fio que vai dar a um pequeno pauzinho de 2 a 3 cm de comprimento que serve de gatilho.
vi) A forquilha e o pauzinho mpiniguiro servem de suporte para um outro pauzinho chamado n`ziquiro. A isca (nhambo) é fixa no n`ziquiro. O n`ziquiro contendo a isca (farelo assado, bolo de amendoim pilado ou maçanica) é posicionado situado por debaixo da pedra.


MULAPU é um instrumento usado para a caça de animais de grande porte gazelas, coelhos, cabritos do mato (cassenhe). O MULAPU consiste:

i) num ramo flexível duma árvore (n`tongolo ou n`dodo) de 2 a 3 metros de comprimento que é fixo no chão. O ramo é vergado (kukota), através duma corda e fixo pelo gatilho no gancho. O ramo tem a função de levantar o animal quando apanhado pelo laço.
ii) Numa corda tecida (kupossa) apartir de fibras da àrvore de embondeiro de igual comprimento (2 - 3 m) ao ramo que é amarrada na extremidade livre do mesmo ramo. A corda de 4 a 8 mm de diâmetro ramifica-se em duas partes com funções distintas: uma das partes da corda serve para formar um laço enquanto a outra parte fixa o gatilho. Como veremos mais adiante o gatilho é fixo num gancho. A abertura do laço depende das dimensões da cabeça do animal pretendido.
iii) De vários pauzinhos (n`kokhos), também colocados circularmente na superfície do chão.
iv) Num pau com gancho (n`kokhos imuna) enterrado na superfície do chão à uma pequena distância do círculo formado pelos pauzinhos n`kokhos.
v) Um pauzinho (n?ziquiro) onde se coloca a isca (nhambo). Este pauzinho é suspenso no gancho pelo gatilho e penetra até ao centro do círculo dos pauzinhos n`kokhos onde se situa a isca.

A técnica de armadilhar

A caça dos animais usando os instrumentos atrás referidos, começa com a identificação das condições da zona, obedecendo os seguintes passos:

o Identificação de tipo de animais existentes na zona
o Quantificação dos animais existentes na zona
o Identificação do período de caça

A identificação do tipo de animais existentes na zona é feita a partir da pegadas do animal e das suas fezes. O que significa que o caçador deve, obrigatoriamente, conhecer as marcas (pegadas) ou fezes de diferentes tipos de animais, principalmente as dos que pretende caçar. Por ex: as pegadas da gazela assemelham-se com as do cabrito, só que são mais finas. As pegadas do coelho assemelham-se as do gato. As fezes da gazela são semelhantes as do cabrito, só são mais finas e compridas; As fezes do coelho tem a forma de pequenos comprimidos de forma arredondada. A família dos ratos e das ratazanas diferencia-se quanto ao caminho usado. As ratazanas e os ratos selvagens usam um caminho próprio chamado micondo

A estimação da quantidade de animais existentes na zona, também é feita mediante a

o Quantidade das pegadas salientes no chão
o Quantidade de fezes
o Da existência de tipo de alimentos preferido pelos animais numa determinada zona e pelas condições habitacionais preferenciais mesmos. Por ex: os coelhos gostam de habitar em arbustos, nos vales de riachos onde sempre há capim fresco ou verde. A gazela gosta de zonas montanhosas e pedregosas, ambos animais têm como alimento preferido uma fruta chamada maçanica (para o caso da zona em referência Boroma).

A identificação do período de caça dá-se pela observação do período do aparecimento de frutas na mata. É o período seco. Neste período aparece um tipo de alimento (p.ex: maçanica) preferido pelos animais (gazelas, coelhos, ratos) durante as colheitas; assim pode-se determinar o período de maior circulação dos animais nas matas. Pelo que basta colocar várias armadilhas nas redondezas dessas árvores de frutas para armadilhar muitos destes animais antes dos animais chegarem às machambas.

A frescura ou não das fezes, a frescura das pegadas pode servir de medição do tempo em que esses animais circulam. Por ex: o grau de frescura das fezes do animal pode ser determinante para se saber, se os animais circulam de madrugada ou às altas horas da noite etc.
As pegadas permitem inferir também sobre o tempo decorrido. Para o caso da zona em questão, importa dizer que o período favorável vai de Maio a Agosto. Alguns animais são caçados no período diurno (p.ex: aves) outros são caçados no período nocturno (gazelas, coelhos, ratos etc).
As armadilhas de Mulapu permanecem geralmente nas montadas apenas durante a noite. No período diurno são desmontadas para evitar armadilhar animais domésticos, como por ex: cabrito que gosta paralelamente do mesmo alimento que serve de isca no Mulapu. No caso de Diua, sendo um instrumento de pequenas dimensões, sem grandes perigos, permanece montado tempo necessário até que o rato seja armadilhado.




Autor: Mario Suarte Baloi


Artigos Relacionados


Notrevew O Velho E Sábio Papagaio Dourado I - Conto 30.08.10

RaÇas...

Sua Conta De água Aumentou? Aconselhamos Chamar Um Serviço Especializado De Caça Vazamento

Tigres De Bengala

Vida Animal: Amado Pela Natureza E Odiado Pelo Homem

Rastros E VestÍgios, Uma Forma Interessante De Como Conhecer A Fauna De Um Determinado Local.

Orientações Para Atendimento Veterinário De Pets Silvestres