O tugurium romano de Atalaia, Louriçal (Pombal) - Nota Preliminar



Introdução

O sítio arqueológico da "Atalaia" foi identificado pela equipa responsável pelo acompanhamento arqueológico em curso no projecto de construção da A17 ? Marinha Grande/Mira, Sublanço Monte Redondo/Louriçal ? Lote 4, ao PK 10+575.
Aí foram observados, à superfície do terreno, materiais de construção de cronologia romana (tegulae e imbrices), bem assim como fragmentos de material pertencente a dolia, e um peso de tear.
Como medidas de minimização foi proposta a realização de sondagens arqueológicas, através de meios mecânicos. Assim, foram abertas 3 valas de 4x2 mts, tendo-se observado grande quantidade de tegulae, imbrices e dolia, assim como alguns fragmentos de cerâmica doméstica de cronologia coeva.
Após visita ao local pela Técnica do Instituto Português de Arqueologia ? Extensão de Pombal, Drª Helena Moura, foi preconizado o alargamento das valas de sondagem; sobre o seu resultado nos debruçaremos em capítulo próprio.
Os trabalhos arqueológicos foram da responsabilidade da arqueóloga signatária, tendo seguido as metodologias propostas por P. Barker e E. Harris.

Metodologia

Foram, inicialmente, realizadas 3 sondagens de 4x2 mts, abertas através de meios mecânicos, localizadas nas áreas de maior dispersão dos materiais à superfície do terreno (Janeiro, 2006).
Posteriormente, tendo-se verificado a necessidade do alargamento da zona escavada, foram abertas mais 8 áreas de sondagem, num total de 94 mts2, visando unir as valas anteriormente abertas, de forma a obter uma melhor leitura da informação contextual. Uma das valas de sondagem (de 15x2 mts) foi aberta até à zona de expropriação, de forma a permitir conhecer a área de extensão do sítio.
As metodologias utilizadas seguiram as propostas de P. Barker e de E. Harris, tendo-se a escavação realizado através da definição e registo de Unidades Estratigráficas (UE), cuja correlação permite ler e interpretar as várias sequências estratigráficas.
Relativamente ao material exumado, este foi sendo sistematicamente registado por UE's, e por quadrículas de proveniência, sendo acondicionado conforme os procedimentos usuais.

Enquadramento

O sítio arqueológico da "Atalaia" situa-se, administrativamente, na Freguesia do Louriçal, Concelho de Pombal, Distrito de Leiria.
As suas coordenadas são GAUSS M838.5; P197.9 (C.M.P., 1:25000, fl. 262).
O sítio arqueológico localiza-se na área da "Fonte da Pedra", junto ao Outeiro do Louriçal, em zona de relevo recortado, entre vales e outeiros.
A sua localização física insere-se no cimo de pequenas elevações, junto à Ribeira da Mecha, em zona de colina alta sendo, portanto, local privilegiado de fixação, dado o domínio da paisagem e a abundância "campesina", perspectivada por pequeno bosque, evidenciando carácter rústico e agrícola. A presença da água, através da proximidade com a Ribeira da Mecha, seria origem de sedentarização e povoação no local.
Do ponto-de-vista pedogénico, insere-se em zona cujas camadas se caracterizam por areias de coloração amarela, com seixos à mistura. Aqui foram, desde há alguns anos a esta parte, plantadas florestas compostas, essencialmente, por eucaliptos e pinheiros.

Sondagens Arqueológicas. Resultados Preliminares

Já como atrás referimos, o sítio arqueológico da "Atalaia" foi identificado pela equipa responsável pelo acompanhamento arqueológico em curso no projecto de construção da A17 ? Marinha Grande/Mira, Sublanço Monte Redondo/Louriçal ? Lote 4, ao PK 10+575.
Durante os trabalhos de prospecção arqueológica desenvolvidos no âmbito do acompanhamento da referida empreitada, foram reconhecidos, à superfície do terreno, materiais de cronologia romana compostos, essencialmente, por material de construção (tegulae e imbrices), assim como fragmentos pertencentes a dolia e um peso de tear.
Como medidas de minimização foi proposta a realização de sondagens arqueológicas, através de meios mecânicos. Os trabalhos decorreram no mês de Janeiro de 2006, sob responsabilidade da arqueóloga signatária deste relatório preliminar.
Assim, foram abertas 3 valas de 4x2 mts (sond. 1, 2 e 3), tendo-se observado grande quantidade de tegulae, imbrices e dolia, assim como alguns fragmentos de cerâmica doméstica de cronologia coeva. Das 3 sondagens mecânicas efectuadas apenas 2 revelaram contexto arqueológico, sendo que uma delas (sond. 2) se apresentou estéril de vestígios de ocupação humana.
A sondagem 1 permitiu observar um nível arqueológico (UE 2), caracterizado, essencialmente, por fragmentos de tegulae, fragmentos de dolia e fragmentos de cerâmica comum. O nível arqueológico foi observado por baixo de uma camada com cerca de 60/80 cm de potência estratigráfica, de terra revolvida pelo cultivo de eucaliptos e pinheiros, de coloração castanha escura, com seixos à mistura (UE 1). Nessa UE 1 foram observados fragmentos de tegulae e imbrices. No interface das duas UE's foi observado um pequeno derrube de tegulae e alguns fragmentos de dolia.
Posteriormente, de maneira a melhor observar o nível arqueológico, sub-dividiu-se a sond. 1, em sond. 1-A e sond. 1-B. Aí foram rebaixados cerca de 30 cm da camada de superfície, atingindo-se um nível de tegulae, completamente revolvido. A camada equivale à UE 1. Do ponto-de-vista material recolheu-se tegulae e fragmentos de dolia.
A sondagem 2 revelou-se arqueologicamente estéril. A sondagem 3 apenas revelou material arqueológico no corte Este (fragmentos de tegulae).
Desta forma, e após visita ao local pela Drª Helena Moura (Instituto Português de Arqueologia ? Extensão de Pombal), foi preconizado o alargamento das valas de sondagem; de forma a obtermos um conhecimento mais alargado do sítio, permitindo a sua interpretação.
Assim, tendo-se verificado a necessidade do alargamento da zona escavada, foram abertas mais 8 áreas de sondagem, num total de 94 mts2, visando unir as valas anteriormente abertas, de forma a obter uma melhor leitura da informação contextual. Uma das valas de sondagem (de 15x2 mts) foi aberta até à zona de expropriação, de forma a permitir conhecer a área de extensão do sítio.
As metodologias utilizadas seguiram as propostas de P. Barker e de E. Harris, tendo-se a escavação realizado através da definição e registo de Unidades Estratigráficas (UE), cuja correlação permite ler e interpretar as várias sequências estratigráficas. Relativamente ao material exumado, este foi sendo sistematicamente registado por UE's, e por quadrículas de proveniência, sendo acondicionado conforme os procedimentos usuais.
O alargamento da área de sondagem permitiu atingir um nível arqueológico, bastante revolvido, e com várias inclusões de raízes, a cerca de 60/80 cm de profundidade, onde se verifica uma enorme quantidade de material de construção de cronologia romana (tegulae e imbrices). Alguns dos fragmentos de tegulae apresentam decoração digitada, de ondulados e/ou serpenteados. As pastas são de coloração laranja.
Apesar de ter sido recolhida grande quantidade de material de construção em toda a área da escavação, foi na área dos quadrados A2/A3/A4/B2/B3/B4/C1/C2/C3/C4/D1/D2 que essa se revelou mais profícua.
Foi, também, possível identificar um pequeno aglomerado de seixos (UE 2), sugerindo forma semi-circular, que identificamos como um possível enrocamento de uma estrutura existente. Este aglomerado de seixos foi observado nos quadrados A3/A4/B3/B4. Aqui foi observada uma correlação entre o aglomerado dos seixos e o material de construção, uma vez que se encontravam associados entre si.
Foi exactamente na área desses referidos quadrados que foram exumados dois pregos, em bronze.
Também alguns dos seixos e telhas apresentavam restos de uma argamassa, bastante rude, quase se desfazendo ao simples toque manual.
A par destes elementos que nos remetem para uma possível estrutura com enrocamento feito em seixos, de madeira, cuja cobertura seria assegurada por telhas, exumámos fragmentos de dolia e fragmentos de cerâmica comum, maioritariamente de armazenamento. As pastas são de coloração vermelha e alaranjada.
Num dos quadrados (D3) foi identificado um vaso em cerâmica, completo, em posição invertida.
Os trabalhos arqueológicos perspectivaram a escavação geral do local, até à camada estéril, uma vez que o local será intervencionado até cerca dos 10 mts de profundidade pela construção.
O nível arqueológico foi identificado numa camada arenosa, de coloração amarela, apresentando-se bastante revolvido, possivelmente pelo cultivo de eucaliptos e pinheiros no local.

Conclusões Preliminares

Os trabalhos arqueológicos desenvolvidos ao PK 10+57 da construção da futura A17 ? Marinha Grande/Mira, Sublanço Monte Redondo/Louriçal ? Lote 4, no sítio da "Atalaia", permitiram observar um nível de ocupação humana, ainda que bastante revolvido pelos trabalhos de cultivo de eucaliptos e pinheiros a que toda aquela área tem vindo a ser sujeita desde há alguns anos a esta parte.
A interpretação obtida não passará agora de uma mera conjectura, uma vez que há ainda que levar a cabo o estudo dos materiais exumados, por ora em estado precoce. Contudo, podemos afirmar que o espólio nos remete para a romanização deste território, tratando-se de materiais de cronologia romana-Alto Medieval, encontrando-se a estação inscrita no seio de uma paisagem rural.
Trata-se do primeiro sítio arqueológico desta cronologia identificado nesta área. Por isso, é-nos, ainda, mais árdua a tentativa de o integrar no âmbito do povoamento romano da região, dado que não existem quaisquer documentações. Mesmo relativamente a sítios arqueológicos de outras cronologias, a bibliografia é escassa, para não incorrer o risco de dizer praticamente inexistente. A falta de estudos sistemáticos nesta região deixa-nos num quase total desconhecimento de como se processou a evolução da ocupação humana neste espaço geográfico.
A interpretação dos dados aquando da escavação permitiu-nos aferir estarmos perante uma possível estrutura cujo enrocamento foi feito à base de seixos (matéria existente na região), elevada em madeira, sendo a sua cobertura conseguida com tegulae e imbrices (telhas), da qual escavámos o derrube.
Atendendo ao tipo de material existente (rara cerâmica doméstica; grande quantidade de fragmentos pertencentes a recipientes de armazenamento, a par da cerâmica construtiva), e à dimensão do sítio arqueológico (balizando-se cerca dos 100-120 mts), estamos em crer poder tratar-se de um tugurium ou capanna (ALARCÃO, 1998). De facto, a sua reduzida dimensão, e a tipologia do material exumado, remete-nos para um pequeno anexo, um pequeno armazém onde se guardariam alguns mantimentos obtidos nos campos agrícolas, ou quiçá uma cabana de lenhador/pastor. Neste tipo de edificações os achados reduzem-se a tegulae, imbrices e cerâmica comum. É o caso da "Atalaia".
No entanto, o topónimo "Atalaia" levou-nos, também, a ponderar a existência de um pequeno posto de vigia. Existente a estrutura com enrocamento em seixo, elevariam o prédio em madeira, cobrindo-o com telhas. Apenas precisariam de levar alguns recipientes com mantimentos para os dias que aí estivessem (1/2 homens).
Contudo, parece-nos mais plausível a hipótese da existência de um tugurium ou de uma capanna naquele espaço rural. Apenas o estudo dos materiais nos poderá permitir obter dados para uma interpretação mais fidedigna para aquele sítio, bem como sobre a sua funcionalidade.

Bibliografia

ALARCÃO, Adília Moutinho, A Cerâmica Romana em Portugal ? Reflexões sobre o seu estudo e publicação, Centro Juvenil de Arqueologia e Etnografia de Viseu, Viseu, 1981.
ALARCÃO, Jorge de, Portugal Romano, Verbo, Lisboa, 1973.
ALARCÃO, Jorge de, "A tecnologia agrária romana", in Portugal romano. A exploração dos recursos naturais, Lisboa, 1997, pp. 137-148.
ALARCÃO, Jorge de, "A Paisagem Rural Romana e Alto-Medieval em Portugal", in Conimbriga, 37, 1998, pp. 89-119.
ALARCÃO, Jorge de, "Três níveis de aglomerados populacionais romanos", in O Arqueólogo Português, série IV, 16, 1998, pp. 175-180.
ALARCÃO, Jorge de, "Os arredores das cidades romanas de Portugal", in Archivo Español de Arqueologia, 72, 1999, pp. 31-37.
ALARCÃO, Jorge de, "Sobre as raízes históricas da paisagem portuguesa", in Actas do I Congresso da Associação Portuguesa de Estudos Clássicos, Coimbra, 1999, pp. 17-32.
ALARCÃO, Jorge de, O Domínio Romano em Portugal, «Forum da História», Publicações Europa-América, Mem Martins, 4ª Ed., 2002.
BARKER, P., Techniques of Archaeological Excavation, London, B. T. Batsford Ltd., 2ª Ed., 1982.
BORDET, Marcel, Síntese de História Romana, «Textos de Apoio», Edições Asa, Lisboa, 1995.
CARVALHO, Pedro C., "Sobre o processo de identificação e classificação de sítios rurais no Portugal romano", in O Passado em cena. Narrativas e fragmentos (coord. Maria Conceição Lopes e Raquel Vilaça), Coimbra/Porto, 2004, pp. 121-140.
HARRIS, E., Principles of Archaeological Stratigraphy, London, Academic Press, 2ª Ed., 1989.

NOTA: Estes dados fazem parte integrante do Relatório Preliminar da Intervenção Arqueológica, o qual se encontra aprovado pelo IGESPAR.
Autor: Raquel Caçote Raposo


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