Reflexões Sobre o Ensino de Literatura



Reflexões Sobre o Ensino de Literartura

RESUMO
A escola tem um papel fundamental na nossa sociedade, pois tem a nobre missão de ajudar a formar e preparar as novas gerações para enfrentarem de forma autônoma, criativa e crítica os desafios da vida cotidiana. A literatura é a ponte que nos liga ao mundo das artes e nos ensina a pensar em torno da realidade e do ideal que temos de vida e sociedade, permitindo que possamos repensar atitudes e crenças.

PALAVRAS ? CHAVES: LITERATURA, LEITURA, ENSINO, PROFESSOR, ALUNOS, ESCOLA.

INTRODUÇÃO

Como formar leitores críticos a partir do ensino da literatura? Que textos literários devemos adotar para despertar nos alunos o interesse pela leitura? Que parâmetros são usados para classificar um leitor como crítico ou não crítico? Estas e outras questões serão discutidas neste artigo, embora que sinteticamente, mas pretendemos fazer algumas reflexões em torno destas indagações e da temática do ensino da literatura com o foco na formação de leitores críticos.
A escola tem um papel fundamental na nossa sociedade, pois tem a nobre incumbência de formar e preparar as novas gerações para enfrentarem de forma autônoma, criativa e crítica os desafios da vida cotidiana. Conforme Silva, "através da docência a escola tem por responsabilidade proporcionar condições para que seus alunos conheçam e ou recriem o conhecimento já existente em diferentes áreas (...)" É através da escola principalmente que as novas gerações vão se apropriar do aparato de conhecimentos já produzido e acumulado ao longo da história da humanidade e de forma dialógica construir e reconstruir o seu próprio conhecimento ou o conhecimento novo.
Para que a sociedade e a humanidade continuem evoluindo, é importante formarmos cidadãos íntegros, críticos, inconformados com os problemas do seu tempo, criativos e inovadores para encontrarem soluções para os problemas das suas realidades. Neste processo, a educação é um instrumento indispensável para formar estes cidadãos que queremos, e em especial o ensino de leitura da literatura, porque a partir deste ensino temos a possibilidade de despertar a criticidade, o potencial criador dos alunos e o principal, levá-los a pensar sobre o mundo em que vivem, compreendendo o entorno sociocultural ao qual estão inseridos e interligá-lo de forma sistêmica à sociedade nacional e global com discernimento para opinar, propor mudanças e desenvolver o senso de pertencer a um complexo social maior e diverso do que aquele em que vivem. Silva afirma que "o processo de educação como o de leitura, quando criticamente levado a efeito, indicam um movimento dos sujeitos (envolvidos naqueles processos) de um lugar para outro, procurando compreender e conhecer a razão de ser das coisas". Então, é este conhecimento e compreensão clara da razão de ser daquilo que fazemos, é que vai nos transportar para o lugar e estágio que almejamos se acreditarmos realmente na razão de ser do que realizamos.

Há fórmulas previamente prontas para o ensino de literatura?

Certamente não existe uma fórmula pronta para que professores se utilizem para formar leitores críticos. Este caminho precisa ser trilhado e recriado constantemente, pois as nossas metodologias de ensino precisam ser reinventadas continuamente mesmo as que forem consideradas eficientes, porque cada classe de alunos e cada escola têm necessidades diferentes e realidades diferentes. Não precisamos nos apegar às metodologias como um fenômeno fixo e inalterado. Neste movimento todo na tentativa de formar leitores críticos temos que voar até os ensinamentos de Paulo Freire e lembrar o seguinte:

"Toda leitura da palavra pressupõe uma leitura anterior do mundo, e toda leitura da palavra implica a volta sobre a leitura do mundo, de tal maneira que ler 'ler mundo' e ' ler palavra', no fundo, para mim, implicam 'reescrever' o mundo. Reescrever com aspas, quer dizer, transformá-lo. A leitura da palavra deve ser inserida na compreensão da transformação do mundo, que provoca a leitura e deve remeter ? nos, sempre, à leitura do novo mundo."

Ou seja, precisamos entender a leitura como algo dinâmico e transformador, mas não precisamos de práticas mecânicas em que a decodificação dos símbolos escritos é o que prevalece. Precisamos de um ponto de partida para trabalhar o ensino de literatura sem causar nos alunos desinteresse pelo estudo desta disciplina que certamente pode possibilitar aos professores ensinarem os seus alunos a pensarem melhor.
Este ponto de partida é o mundo do aluno e levar a compreensão deste mundo para a compreensão da leitura, e a compreensão da leitura para compreender este mundo vivencial, num movimento dialógico que vai ampliando este conhecimento de mundo. A partir dos conhecimentos vivenciais que os discentes têm da realidade, inseri-los nos contextos mais teóricos e mais complexos dos textos de forma integrada e contextualizada levando à construção de um conhecimento novo e transformador do entendimento de mundo e da realidade vivida, podendo possibilitar a este uma intervenção consciente nesta realidade.
Para isso, mais do que lamentar das condições reais que temos de enfrentar no cotidiano das nossas escolas da rede pública, precisamos de entusiasmo e muita disposição por parte dos nossos educadores para acreditarmos que é possível construir uma nova realidade. Não estamos dizendo para nos conformar com a realidade, pois defendemos que precisamos sim, reclamar e criticar a realidade e cobrar das pessoas que têm o poder e o dever de fazer e mudar as regras vigentes e que não mudam, mas só reclamar não vai mudar significativamente a situação atual. Duarte e Werneck dizem que "o professor encontra-se diante de uma realidade educacional que não permite em termos de estrutura, um trabalho diversificado em suas aulas. Para criar e inovar o professor precisa investir em sua formação continuada e em uma constante atualização". Por isso, é fundamental estudarmos continuamente para termos mais ideias e embasamento para planejarmos bem e melhor as nossas aulas e nos mantermos sempre atualizados das transformações, mesmo aqueles ou aquelas que já estão na carreira do magistério há muitos anos precisam de uma formação contínua, porque a experiência prática é um fator fundamental para o exercício do magistério, mas precisa de planejamento e muito embasamento teórico para dar legitimidade a estas experiências e estimular a criatividade e o potencial inovador que é uma característica que precisamos desenvolver permanentemente principalmente nos dias atuais onde as mudanças são cada vez mais aceleradas contínuas.

Que textos trabalhar em sala de aula e quem deve escolhê-los?

Fixar quais textos se deve trabalhar em sala de aula, é outro ponto que no nosso entendimento não deve ser imposto. O professor é quem deve escolher os textos a serem trabalhados com os seus alunos, pois é este quem mais do que ninguém conhece as necessidades e o perfil das suas classes escolares. Os textos propostos pelos manuais são subsídios aos professores, mas não quer dizer que temos que nos prender somente a eles, embora muitas secretarias municipais de educação recomendem aos professores que se utilizem os textos dos manuais nas aulas de literatura e leitura, mas o professor não deve abrir mão da autonomia de escolher que textos são apropriados à sua turma. No espaço físico da sala de aula o professor tem autonomia para construir a sua metodologia pautada nos conteúdos que julgar importante para o seu alunado.
Acreditamos também que não são os textos que vão fazer com que os alunos tenham interesse pelas aulas de leitura e literatura, mas a metodologia utilizada, que precisa ser inovadora, criativa e acima de tudo atrativas e significativas para a vida dos alunos, os textos podem contribuir para este fim, mas não são os únicos responsáveis por isto. O ponto crucial é a utilidade e a significância que estas aulas terão na vida prática destes alunos, e eles precisam perceber isto, para poderem construir a interligação do contexto textual com o contexto real vivido por eles.
Quando o aluno não enxerga finalidade nas atividades que realiza, que significado e que valor este ou aquele assunto tem e terá na sua vida, fica complicado cobrarmos dedicação e empenho dele nas atividades. Por isso, o educador sempre precisa saber o que se pretende quando se vai trabalhar determinado conteúdo. Por isso, Duarte e Werneck dizem que "o ensino de leitura sempre pressupõe três fatores: as finalidades, os conteúdos (textos), as pessoas envolvidas no processo (...) sem a presença desses três fatores, o trabalho com leitura/literatura corre o risco de se tornar vazio ou um ?receituário? em que se repetem esquemas já prontos". Por isso, que o professor é quem deve na medida do possível ser o responsável em escolher os textos que vai trabalhar com os alunos, mas para isto, é necessário ter clareza das finalidades do seu trabalho e conhecer o perfil do seu alunado.
Nas nossas unidades de ensino não temos meios de classificar os leitores como críticos e não críticos. Certamente precisamos criar formas de mensurar se é que isto é possível, o quanto um leitor é crítico ou não. O que temos de concreto é que comprovamos isto nas provas ou avaliações quando os alunos se vêem diante de textos que ao lerem não conseguem fazer a interpretação e têm grandes dificuldades de fazer relações daquilo que está escrito com a sua própria realidade. E isto nos indica que algo está errado e temos a convicção que não é o aluno, este por sua vez não pode ser responsabilizado pela ineficiência ou inadequação do nosso ensino, acreditamos que o aluno é vítima de todo este processo.

Para o professor de literatura a leitura não pode ser obrigatória tem que ser um hábito

Outro aspecto a ser discutido é o perfil do docente que leciona literatura. É alguém que gosta de lê e de literatura? Pois acreditamos que todo educador ou educadora deve ter o hábito de lê, principalmente o professor de literatura este precisa não só ter o hábito da leitura, mas precisa ter paixão pela leitura e demonstrar essa paixão para seus alunos. "Despertar esta paixão pela literatura é uma tarefa árdua, mas não impossível! Um caminho precisa ser reconstruído, ?métodos de sedução? precisam ser criados para que o interesse possa ressurgir". Pois quanto mais obras o professor conhecer maior serão as chances de escolher um material adequado para seus alunos.
A leitura de textos literários ajuda numa das tarefas que consideramos das mais nobres da educação escolar que é ensinar a pensar crítica e autonomamente. Porque, "conhecer obras literárias é conhecer o mundo. Permitir ao aluno o acesso às diversas manifestações culturais que se ?desdobram? da literatura, é instruí-lo não só sobre um determinado saber, mas sobre um saber de ?si mesmo? e do mundo. É instruí-lo de forma definitiva e libertária". A leitura dos textos literários precisa ser bem explorada e contextualizada, ou seja, sem deixar de valorizar a época em que a obra foi escrita o estilo literário utilizado e as informações biográficas do autor, mas ir muito além disso, buscando compreender as transformações ocorridas ao decorrer do tempo quais elos interligam uma época à outra. Tudo precisa e dever ser feito com criatividade pedagógica e muita interação com o aluno inserindo-o na construção do seu próprio saber.
Um fundamento importante que deve ser levado em consideração é a compreensão do ensino da leitura não como um treino mecanizado de decodificação de letras em sons, que visa treinar o aluno para decifrar os códigos sem ter a preocupação de levá-lo a entender a significação daquilo que está lendo. Duarte e Werneck afirmam que "o trabalho com a leitura ainda está centrado em habilidades mecânicas de decodificação da escrita, muitas vezes sem reflexão, sem diálogo com o texto". Sem diálogo com texto e o contexto, assim não há transformação e nem a formação do cidadão crítico. O que há é uma reprodução mecânica que contribui para que os alunos tenham aversão à escola e ao estudo de literatura e de língua portuguesa. Por quê? Porque atividades que se preocupam apenas com o conteúdo que trabalhado de forma mecânica sem significação para a vida prática do aluno e não viabiliza a discussão e a reflexão em torno do texto e o contexto, gera no mínimo cansaço e desinteresse por estas aulas que com o mínimo de criatividade poderiam ser as mais prazerosas e transformadoras para a vida dos nossos discentes.

Conclusão
A literatura é uma disciplina importante para o desenvolvimento humano e da sociedade, pois à medida que temos a oportunidade de trabalhar o nosso senso crítico e de nossos alunos e torná-los autônomos nas suas escolhas e capazes de intervirem na transformação e construção da realidade que desejam. Cândido, afirma que "a literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante". Vivemos em época onde o ritmo das pessoas e de quase tudo a nossa volta é muito frenético, temos a sensação de estarmos em uma maratona permanente. A literatura acompanhada da leitura permite que façamos uma breve pausa para refletir sobre o mundo em nossa volta, nos relembra que somos humanos que temos sonhos e necessidades que precisamos suprir as nossas necessidades e construir um caminho para irmos na busca dos nossos ideais. A literatura é uma ramificação do caminho para o conhecimento, mas que pode nos abrir novos horizontes e nos possibilitar ver novas perspectivas.
Certamente não temos em nossas escolas as condições que gostaríamos para se trabalhar com a literatura. Só para exemplificar, tempo reduzido, materiais impostos e inadequados, falta de interesse dos professores e dos alunos, falta de modernização tecnológica e adequação física da escola, etc. Porém isso tudo são os desafios que precisamos transpor para termos as condições que queremos e precisamos. Atualmente não temos as condições que queremos, mas temos as que precisamos. Então, vamos sair da zona das lamentações e das desculpas e vamos buscar as mudanças e transformações que almejamos.
A literatura é a ponte que nos liga ao mundo das artes e nos ensina a pensar em torno da realidade e do ideal que temos de vida e sociedade, permitindo que possamos repensar atitudes e crenças. De acordo com Cândido, "(...) a literatura aparece claramente como manifestação universal de todos os homens em todos os tempos. Não há povo e não há homem que possa viver sem ela, isto é, sem possibilidade de entrar em contato com alguma espécie de fabulação". Porque todo ser humano e toda sociedade tem a necessidade de ter ideais e sonhos, não importa se sejam conscientes ou inconscientes.

Referências Bibliográficas
A Literatura e o Ensino de Leitura para o Público Juvenil. Disponível em WWW,filologia.org.br/ixcnlf acessado em 05.02.2010;
A Leitura, O Leitor e o Ensino ? Aprendizagem: Um Viés. Disponível http://recantodasletras.uaol.com.br/artigos/117664. Acessado em 20.04.2010
CÂNDIDO, Antonio. Literatura e Subdesenvolvimento. In: A educação pela Noite e outros Ensaios. 2ª. Ed. São Paulo: Ática, 1989, p. 140-162.
FREIRE, Paulo e BETTO, Frei; Essa Escola Chamada Vida. Ed. Ática, São Paulo;
SILVA, Ezequiel T. da. Elementos da Pedagogia da Leitura. 3ª. Ed. São Paulo: Fontes, 1998.
Autor: Francisco Cleber Rodrigues Silva


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