LIBRAS no ensino superior: Futuras pedagogas numa aprendizagem viso/espacial




UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
MESTRADO EM LETRAS





LIBRAS no ensino superior
Futuras pedagogas numa aprendizagem viso/espacial









Trabalho apresentado por Carla Rejane de P. B. Caetano, Matr. 41529, à professora Adriana, como parte das exigências da disciplina LET 616 ? Aspectos do ensino e aprendizagem de línguas.




INTRODUÇÃO:
O presente artigo pretende, mais especificamente, Verificar a importância disciplina Língua Brasileira de Sinais(LIBRAS) na formação e prática cotidiana do(as) alunos(as) do curso de pedagogia, e sua colaboração para mudança de postura em relação ao surdo, dentro ou fora do ambiente escolar. Reconhecendo ainda:
? Alunos(as) da disciplina DPE 462 Língua Brasileira de Sinais, que atuam direta ou indiretamente com surdos na escola regular;
? Os reflexos da disciplina na comunicação e atuação com surdos;
? O grau de satisfação em relação à proposta da disciplina e as necessidades diárias de comunicação com surdos
? As contribuições da disciplina para o futuro discente.
? A freqüência de utilização dos sinais apresentados na disciplina.
O tema proposto se justifica pelo fato de que estudos e pesquisas vêm enfatizando amplamente a utilização da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) na educação de crianças surdas, uma vez que a realidade tem demonstrado que as tentativas educacionais desenvolvidas durante muitos anos não têm sido suficientes para que crianças adolescentes surdos alcancem o mesmo desempenho acadêmico, social e profissional que ouvintes da mesma faixa etária ou do mesmo grau escolar. No Brasil a proposta defendida e difundida atualmente, no que tange a educação de surdos, é o bilingüismo, uma vez que se trata da utilização de duas línguas no contexto escolar. LIBRAS como L1 e Língua Portuguesa como L2.
A língua de sinais faz-se necessária em todas as situações, para o aprendizado do português, em sua modalidade escrita. O letramento bilíngüe (LIBRAS-português), poderá levar a criança surda a reconhecer as peculiaridades da língua portuguesa, alcançando êxito nas demais disciplinas, cujo aprendizado é mediado pela capacidade de ler.
Em minha experiência e tenho observado que as condições do atendimento ao surdo estão muito aquém do que se diz inclusão. Observando-se um percentual limitado de professores capacitados para acolher o surdo numa perspectiva inclusiva, bem como uma carência em relação ao conhecimento da LIBRAS. O que tem levado à dificuldade de comunicação em sala e ao prejuízo no processo de ensino/aprendizagem. Onde, na maioria das vezes, o método oral acaba sendo a única forma de ensino, não há presença de intérprete em sala de aula, há surdos que não tem uma língua de sinais bem desenvolvida, e raramente nota-se a existência de educadores bilíngües. O que se constitui em um grande empecilho para desenvolvimento pleno do aluno surdo frente a atividade de ensino e diante das exigência de uma sociedade letrada.
Ao considerar a LIBRAS ? Língua Brasileira de Sinais - como base para o ensino da língua portuguesa, torna-se imprescindível, a compreensão de que a experiência de ensino aprendizagem para o surdo ocorrerá de forma visual e que neste processo, mesmo com a presença do intérprete, o papel do professor é fundamental para que criança surda desenvolva e utilize sua língua de forma natural e constitua seu conhecimento de mundo, sendo possível, desta forma, o entendimento dos conteúdos escolares, e uma aprendizagem significativa. O que se percebe na seguinte afirmação de (BAKHTIN, 1995, p. 112, In MACIEL e BRANDÃO, 2010;
"Em relação à criança surda usuária da língua de sinais, torna-se necessário considerar que essa língua assuma a mediação entre os interlocutores e funda o processo de construção do conhecimento (como por exemplo, dos conceitos escolares), pois tal processo não acontece fora da linguagem: "não existe atividade mental sem expressão, mas, ao contrario, é a expressão que organiza a atividade mental, que a modela e determina a sua orientação".


De acordo com o decreto 5626/2005, a disciplina de Libras, enquanto disciplina curricular, passa a ser obrigatória em cursos de licenciatura. E ainda de acordo com o mesmo decreto, a "As instituições de educação superior devem incluir a Libras como objeto de ensino, pesquisa e extensão..." O que favorece o uso e difusão desta língua e compactua com uma proposta de educação bilíngüe e com um projeto de inclusão escolar e social.

ASSERÇÕES E BUSCA DOS DADOS:

Asserções
- A maioria dos(as) alunos(as) do curso de pedagogia que já atuam na escola regular ainda não tiveram contato com alunos surdos pois muitos destes não estão incluídos;
- A utilização da Língua Brasileira de Sinais tem se dado esporadicamente e na maioria das vezes entre ouvintes;
- Os(as) alunos(as) do curso de pedagogia vêem valorizam a inclusão da disciplina DPE 462, Língua Brasileira de Sinais, na grade do curso por acreditarem que quando tiverem alunos surdos incluídos poderá ser útil, mas reconhecem que um semestre não é suficiente para aprender e posteriormente utilizar desta língua no contexto da sala de aula.
No intuito de aprofundar os estudos sobre o tema proposto, este projeto foi desenvolvido e fundamentado na abordagem de pesquisa qualiquantitativa. A abordagem qualitativa, segundo OLIVEIRA, (2010), possibilita captar o fenômeno em toda sua extensão, levantando possíveis variáveis existentes e na sua interação o verdadeiro significado da questão. Possibilitando a coleta de informações e exame de cada caso e a construção de um quadro teórico geral. Já a pesquisa quantitativa permite estabelecer relações de causa e efeito, medir e examinar hipóteses. Por isso a pesquisa numa abordagem qualiquantitativa apresentou-se como a mais apropriada para investigar e compreender o tema que proposto.

Contexto da pesquisa
A população estudada foi constituída por 30 alunos matriculados na disciplina Língua Brasileira de Sinais, de uma faculdade local, no ano de 2010. E a unidade de observação foi a sala de aula onde a disciplina é ministrada.
Para se alcançar os objetivos propostos foram utilizados os seguintes procedimentos de coleta de dados no desenvolvimento da pesquisa;
-Pesquisa documental, recorrendo-se a fontes bibliográficas relacionadas ao tema, para que levantar os conhecimentos produzidos, relativos à questão de investigação;
-Levantamento através da aplicação de questionários, a serem analisados, um vez que este recurso permite medir as informações coletadas e ao mesmo tempo refletir sobre as mesmas.

Referencial teórico
A HISTÓRIA, OS FATOS E OS CUMPRIMENTOS LEGAIS:

Se nos remetermos ao código civil brasileiro, de 1916, veremos avanços significativos na concepção de surdo e consequentemente na importância dada a este no contexto social e educativo. Na época em questão os surdos eram considerados incapazes de exercer os atos da vida civil e entre alguns dirigentes de institutos de surdos predominava a opinião de que seria um desperdício alfabetizar surdos num país de tantos ouvintes analfabetos. Voltando um pouco mais no passado temos o marco inicial da educação de surdos no Brasil, que é a fundação do atual Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), no Rio de Janeiro. Foi neste instituto que a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) começou a se padronizar. Foi lá também que o processo educacional de surdos teve início formalmente em nosso país.
Atualmente podemos vislumbrar diversas ações que levam à possibilidade da inclusão do surdo no contexto escolar e consequentemente social. Tais como, a lei 10.436/2002, que reconhece, legitima e identifica a LIBRAS como língua oficial da comunidade surda, e em seu Art. 4º trata da garantia da LIBRAS nos curso de educação especial, cursos de fonoaudiologia e de magistério, nos níveis médio e superior e o decreto 5626/2005, que trata da inclusão da LIBRAS como disciplina obrigatória nos curso de licenciatura e demais áreas e do uso e da difusão da LIBRAS para o acesso das pessoas surdas à educação e também aos demais espaços sociais, dentre outros. E, como reflexo destas, há iniciativas como o Prolibras e os cursos de letras-libras. São ações um tanto quanto inovadoras, todavia sua repercussão no ambiente escolar não se dá de forma espontânea. Requerendo então diversos ajustes e posicionamentos para que a acessibilidade e inclusão do aluno surdo se tornem visíveis no cotidiano escolar. Uma vez que segundo ( Lacerda, 2006) " A não partilha de uma língua comum impede a participação em eventos discursivos que são fundamentais para a constituição plena dos sujeitos" Em relação ao decreto Nº 5626/2005 Pinheiro (2010, p. 149) afirma que:
A inclusão de Libras como disciplina curricular, torna-se um ponto extremamente relevante, em face da necessidade crucial de termos profissionais capacitados em Libras para o ensino, atendimento e interpretação da Libras e vice-versa, objetivando promover a inclusão efetiva do surdo na sociedade."

Para alguns pesquisadores há uma estratégia, por parte de instancias governamentais de usar a LIBRAS para, segundo Lopes (In: Lucas e Madeira 2010) incutir na "alma" brasileira que somos um país bilíngüe e que vivemos sem barreiras de acessibilidade. Há portanto, autores que receiam que a LIBRAS esteja sendo uma ferramenta política que está sendo usada contra os próprios surdos. Uma vez que pelo fato de a LIBRAS, através do decreto Nº 5626/2005, se constituir em disciplina obrigatória nos cursos de licenciatura, com carga horária geralmente de 40h/a, pode parecer suficiente para a formação de professores com conhecimento da singularidade lingüística do surdo, o que está longe de ser. Como pode ser observado na constatação de que mais de 90% dos preenchentes do questionário afirmaram sentir necessidade de dar continuidade à disciplina com mais um semestre. Como podemos observar nos comentários acerca da necessidade de dar continuidade à disciplina em mais um semestre. Comentários do tipo:
" Gostaria de aprender mais, me formar uma educadora completa e fazer a diferença."
" É muito pouco só um período de aula, seria necessário mais aulas"
" Como futura educadora quero estar apta a trabalhar com os surdos."
"tenho desejo de me aprimorar na LIBRAS e conseguir me comunicar com os surdos."
O que fica ilustrado nos exemplos a seguir:



Nota-se com estes comentários uma preocupação com a aprendizagem dos sinais, com o treino dos mesmos e com seu aprimoramento. Todavia, nota-se também a presença da preocupação com o processo de inclusão do aluno "em todas as ações em sala de aula". O que mostra que a disciplina também tem colaborado para uma reflexão em relação à educação inclusiva, e em relação a postura do professor diante deste processo.
No Art. 5º do capítulo III decreto 5626/2005 lê-se que:
A formação de docentes para o ensino da Libras na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental deve ser realizada em curso de pedagogia ou curso normal superior, em que Libras e Língua Portuguesa escrita tenham constituído línguas de instrução, viabilizando a formação bilíngüe.
O que não parece se configurar de fato, com a inclusão da Libras num curso para formação de professores, tal como o objeto deste artigo. Uma vez que conforme os relatos apresentados 40 horas/aula mostra-se insuficiente para resultar em um professor bilíngüe tal como a legislação prevê para a educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental
Mesmo diante da constatação de que quase uma maioria absoluta afirmou não está satisfeito com o período curto de oferecimento da disciplina, pode-se observar que para muitos dos alunos questionados a disciplina mudou-lhes o comportamento em relação ao sujeito surdo. Conforme as declarações seguintes:


O que fica evidente nas colocações acima, é que de algum modo a disciplina de Libras, tem colaborado com uma visão diferenciada em relação à comunicação com surdos, isto mesmo sem dar conta, por uma questão de tempo, de trabalhar todo o universo de léxico da língua de sinais.
Algumas considerações, mas não finais
Com relação às dificuldades apresentadas pelos alunos, além da questão do tempo da disciplina destaca-se a teoria da LIBRAS, onde um dos aspectos apontado foi em relação à complexidade e a forma de exposição, dizendo-se ser cansativo e extenso. Também, em relação à aula prática destacaram-se a velocidade em que os sinais são apresentados e a necessidade de uma carga horária maior para treino dos sinais. No entanto, nenhum respondente se mostrou insatisfeito com a disciplina, sendo que uma média de 23,4% dos respondentes disse estar plenamente satisfeitos com a disciplina, 68% disseram estar satisfeitos e apenas 10% afirmaram estar razoavelmente satisfeitos com a disciplina.Conforme diagrama:









OBS: Não houve insatisfeitos

Dos 30 alunos(as) que responderam o questionário, 16 são do 1º período de pedagogia e 14 são do 8º período do mesmo curso. A maioria destes ainda não atua na educação básica e muitos afirmaram nunca usare-se dos sinais apresentados na disciplina, por não terem conato com surdos ou por ainda não darem aula. E apenas 10% afirmaram usar eventualmente os sinais, sendo que mesmo não dando aula, utiliza-se dos sinais com filhos ou irmãos ouvintes e amigos. No total 0% dos alunos(as) respondentes afirmaram se utilizar frequentemente a língua de sinais.
O que provavelmente colaborou para com algumas insatisfações foi o espaço curto de um semestre. Principalmente numa turma com quase 50% de formandos, que na maior parte das vezes se ausentavam ou tinha dificuldade em se reunirem para realização de trabalho, como contação de histórias em LIBRAS, onde ter-se-ia a oportunidade de aprender a língua por meio de um discurso situado. E se tivesse sido possível uma maior interatividade, é provável que deixar-se-ia de lado uma pedagogia centrada no código, que conforme GAGNÉ, 2002( In: Bagno, 2002) o foco está na qualidade da língua normativa e frequentemente purista, para uma pedagogia centrada no uso do código, onde numa perspectiva sociolingüística admite-se o caráter arbitrário de todo código lingüístico, ( o que é muito comum na LIBRAS) e coexistência de variedades de uso. Todavia o ensino teórico da Libras, dentro de uma abordagem reflexiva, possibilita, conforme Gimenez, In: Freire(2005), possibilita a articulação teórica-prática. Onde ( PIMENTA, 2002: 26) In: Freire (2005: 193), ressalta que:
O papel da teoria é oferecer aos professores perspectivas de análise para compreenderem os processos históricos, sociais, culturais, organizacionais e si mesmos como profissionais, nos quais se dá sua atividade docente, para neles interferir, transformando-os...
O que contribuiria, sobremodo, para criar entre os profissionais um fluxo de conhecimentos científicos e práticos.
Dentre os alunos que se mostraram apenas razoavelmente satisfeitos com a disciplina alguns se disseram descontentes com a parte teórica da disciplina, dizendo-a complexa e que o tempo de um semestre é curto para o conteúdo programado. Como nos exemplos a seguir:


Percebe-se que a dificuldade encontrada em relação à teoria da Libras, advém de um estranhamento em relação aos conceitos apresentados, em função da falta de conhecimento prévio sobre os tópicos da disciplina. O que, muito provavelmente não seria uma queixa freqüente no caso de um segundo módulo da disciplina. Todavia, para tal constatação não é ainda possível no presente tempo e espaço, mas somente numa situação de continuidade da disciplina oferecida.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
- GAGNÉ, Gilles. A norma e o ensino da língua materna. In: BAGNO, Marcos. Língua materna, letramento, variação e ensino. São Paulo. PARÁBOLA Editorial, 2002;

- BRASIL. Decreto Nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Presidência da República. Regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais ? Libras, e o art. 18 da Lei nº 10.098, de dezenove de dezembro de 2000. Brasília, DF;
- BRASIL. Lei 10.436, de 24 de abril de 2002. Presidência da República. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais ? Libras e dá outras providências. Brasília, DF;
- GIMENEZ, Telma. Desafios contemporâneos na formação de Professores de línguas: Contribuições da lingüística aplicada. In: FREIRE, Maximina.(Org.) Lingüística aplicada e contemporaneidade. São Paulo. Pontes Editores, 2005
- LACERDA, Cristina Broglia Feitosa de. A inclusão escolar de alunos surdos: O que dizem alunos, professores e intérpretes sobre esta experiência. Cad. CEDES v. 26 n. 69, Campinas Maio/ago. 2006;
- LUCAS, Regiane. MADEIRA, Diogo. Educação de surdos: Em repúdio às declarações do Mec, pesquisadores defendem bilingüismo e pedagogia surda. Revista da Feneis, Belo Horizonte, Nº 41, Setembro/Novembro de 2010;
- MACIEL, Miriam de Oliveira;BRANDÃO, Caroline da Silva. A Ação Pedagógica na Educação de Surdos: O Bilinguismo e seus benefícios para a aprendizagem. Revista P@rtes (São Paulo). V 00. P.eletrônica. Maio de 2010. ISSN 1678-8419. Disponível em . Acesso em 21/10/2010.
- OLIVEIRA, Nádia de Fátima. Metodologia da pesquisa científica. São Paulo: Know How, 2010;





Autor: Carla Rejane De Paula Barros Caetano


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