A abstratividade no processo de controle concreto de constitucionalidade



A Jurisdição Constitucional Brasileira ao abordar o controle de constitucionalidade e os efeitos das decisões prestigiam as características de generalidade e abstração, em razão de certa desconfiança das decisões Poder Judiciário, nesta seara, sob o enfoque da norma fundamental de separação de poderes e supremacia do parlamento.
Além do mais, esta tendência se justifica em face da ampla gama de relações jurídicas idênticas, característico de sociedade de massa imponha ao sistema judiciário sobrecarregado a resolução de questões idênticas influindo diretamente no direito acesso à justiça e, portanto a efetividade da prestação jurisdicional por meio da razoável tramitação do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF), se manifestando no controle concentrado de constitucionalidade. Vejamos:

BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade: inviabilidade: ato normativo de efeitos concretos. 1. O Decreto Legislativo 121/98, da Assembléia Legislativa do Estado do Piauí, impugnado, impõe a reintegração de servidores, que teriam aderido ao Programa de Incentivo ao Desligamento Voluntário do Servidor Público Estadual (L. est. 4.865/96). 2. O edito questionado, que, a pretexto de sustá-los, anula atos administrativos concretos - quais os que atingiram os servidores nominalmente relacionados - não é um ato normativo, mas ato que, não obstante de alcance plural, é tão concreto quanto aqueles que susta ou torna sem efeito. 3. É da jurisprudência do Supremo Tribunal que só constitui ato normativo idôneo a submeter-se ao controle abstrato da ação direta aquele dotado de um coeficiente mínimo de abstração ou, pelo menos, de generalidade. 4. Precedentes (vg. ADIn 767, Rezek, de 26.8.92, RTJ 146/483; ADIn 842, Celso, DJ 14.05.93). (ADI-MC-QO 1937 / PI ? Piauí Questão de Ordem na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, Julgamento: 20/06/2007, Órgão Julgador: Tribunal Pleno) (grifo nosso)

Vale dizer que o nosso sistema também adota o modelo de controle difuso na análise do caso concreto, tal como o judicial review americano que o inspirou, não apresentando efeito vinculante.
Convém salientar a convergência do uso do efeito vinculante geral na jurisdição constitucional, no quanto tenha de abstração como na declaração da constitucionalidade e/ou inconstitucionalidade propriamente, em sede de controle difuso, pelo Supremo Tribunal Federal, tendo em vista a sua competência precípua no entendimento neoconstitucional de que cabe ao Judiciário não só aplicar a lei emanada do parlamento, mas também e principalmente exercer uma análise prévia de sua conformidade à Constituição e interpretá-la de acordo com a norma superior.
Neste viés, ponderando que cabe ao Supremo Tribunal Federal exercer esse poder/função, fazendo a julgamento de conformidade ? seja pela via direta ou pela via de exceção ?, os demais órgãos que lhe são funcionalmente inferiores devem acatar a interpretação dada pelo órgão superior.
Essa é a razão para a defesa do efeito geral e obrigatório de submissão ao preceito abstrato proferido em controle de constitucionalidade, quer se trate de jurisdição exercida de forma concreta, quer abstrata. E, em se referindo a efeito geral ou abstrato, há que se referir a uma necessária uniformidade, ainda que impositiva, de entendimentos exigindo-se o coeficiente mínimo de abstração do ano normativo impugnado.
Em sede de controle difuso impede ressaltar o julgamento do HC 82.959 de 23/06/2006 o qual considerou inconstitucional a progressão de regime no caso de crimes hediondos, impondo a aplicação da regra do art. 112 da LEP, o qual possibilitou a progressão de regime após o cumprimento de 1/6 da pena, em face da interpretação constitucional do princípio da individualização da pena, superando os precedentes e transformando as situações jurídicas consolidadas, ocorrendo o denominado overruling retrospectivo.
Finalmente, salienta-se o exame do RE 197.917/SP de 06/06/2002 que declarou a incosntitucionalidade incidenter tantum do art. 27 da Lei Municipal nº 9.868/99 ponderando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade reconhecendo, portanto o excesso de poder de legislar reconheceu, excepcionalmente, a possibilidade de proceder à modulação ou limitação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, mesmo quando proferida pela corte do STF, em sede de controle difuso, em homenagem ao princípio da segurança jurídica e do interesse público.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MUNICÍPIOS. CÂMARA DE VEREADORES. COMPOSIÇÃO. AUTONOMIA MUNICIPAL. LIMITES CONSTITUCIONAIS. NÚMERO DE VEREADORES PROPORCIONAL À POPULAÇÃO. CF, ARTIGO 29, IV. APLICAÇÃO DE CRITÉRIO ARITMÉTICO RÍGIDO. INVOCAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA RAZOABILIDADE. INCOMPATIBILIDADE ENTRE A POPULAÇÃO E O NÚMERO DE VEREADORES. INCONSTITUCIONALIDADE, INCIDENTER TANTUM, DA NORMA MUNICIPAL. EFEITOS PARA O FUTURO. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. (...) 7. Inconstitucionalidade, incidenter tantun, da lei local que fixou em 11 (onze) o número de Vereadores, dado que sua população de pouco mais de 2600 habitantes somente comporta 09 representantes. 8. Efeitos. Princípio da segurança jurídica. Situação excepcional em que a declaração de nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente. Prevalência do interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos pro futuro à declaração incidental de inconstitucionalidade. Recurso extraordinário conhecido e em parte provido. (RE 197917/SP - São Paulo, Recurso Extraordinário, Relator: Min. Maurício Corrêa, Julgamento: 06/06/2002, Órgão Julgador: Tribunal Pleno)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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___________. NBR 10520. Informação e documentação ? Apresentação de citações em documentos: Regras gerais. 2001.

___________. NBR 14724. Informação e documentação ? Trabalhos acadêmicos ? Apresentação: Informações pré-textuais ? Informações textuais ? Informações pós-textuais ? Formas de apresentação. 2001.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Almedina. Coimbra, 2003.

FAIDIGA, Daniel Bijos. Abstrativização dos efeitos da declaração incidental de inconstitucionalidade e estabilidade da jurisdição constitucional a partir do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: . Acesso em: 22 jun. 2008.

FERREIRA, Olavo A. V. Alves. Controle de constitucionalidade e seus efeitos. Método. São Paulo. 2005.

Autor: Charlei Gomes De Souza Miranda


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