Oscip E A Licitação – Questão Polêmica



*Kaio Murilo da Silva Zilli

As Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público advêm do chamado Terceiro Setor, que são entidades da sociedade civil que possuem fins públicos e não lucrativos, tendo como objetivo o desenvolvimento político, econômico, social e cultural, por meio de atividades complementares, ou suplementares à Administração Pública.

Precisamente pelo interesse público da atividade prestada, em muitos casos, tais entidades recebem certa proteção e/ou ajuda do Estado. Todavia, isto não as qualifica como entes estatais, porque não integram a Administração Pública, direta ou indireta, além de apresentarem um regime jurídico predominantemente de direito privado, porém parcialmente derrogado por normas de direito público.

A Lei Federal nº 9.790/99 institui e disciplina o regime das pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, consideradas OSCIP. Ainda, com base no art. 9 desta lei, tais entidades podem realizar Termo de Parceria com o Poder Público, para o fomento e execução de projetos públicos e sociais.

A partir dai, a grande discussão é sobre a obrigatoriedade ou não, de licitação para as contratações realizadas pelas OSCIPs com dinheiro público, repassado com base no Termo de Parceria firmado com a Administração Pública.

Neste momento, ressaltamos a imposição que a Constituição Federal em seu art. 37, inciso XXI faz à Administração Pública, qual seja, determinar a obrigatoriedade de licitação, ao tempo em que a excepciona desde que as hipóteses sejam previstas em legislação específica, tal como a Lei nº 8.666/93.

Com isso, se deve delinear a questão sobre dois princípios fundamentais, que caracterizam o regime jurídico administrativo, quais sejam[1]: supremacia do interesse público sobre o privado e indisponibilidade dos interesses públicos. A partir daí, entende-se que se a entidade privada que estiver realizando uma atividade de relevância social, de forma complementar à Administração Pública, tendo como apoio o financiamento feito da própria Administração, a sua postura perante a sociedade é de inteira integração as obrigatoriedades inerentes as atividades da Administração.

Desta forma, por mais que a Lei nº 9.790/99, em seu art. 14, deixar a cargo das OSCIPs adotar o procedimento pelo qual contratará serviços ou obras, com o emprego de recursos públicos, percebe-se a existência de conflito normativo e principiológico, pois a norma constitucional determina a obrigatoriedade da licitação, quando se tratar da Administração Pública e , quando utilizados recursos públicos entende-se que versa sobre interesse público indisponível, não podendo admitir o livre arbítrio do particular.

Tarso Cabral Violin[2]faz a seguinte consideração acerca do tema: "O art. 119 da Lei n.º 8.666/93 determina que as entidades da Administração indireta federal e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União editarão regulamentos próprios devidamente publicados, ficando sujeitas às disposições da Lei de Licitações. Diante deste dispositivo legal, entendemos que o regulamento próprio das OSs e OSCIPs para suas contratações deverá atender as normas gerais e princípios da Lei Nacional de Licitações, sob pena de ser considerado ilegal e até inconstitucional".

Diante disso, a obrigatoriedade de licitação se faz necessária devido a vinculação que a OSCIP passa a ter com o interesse público, ou seja, ao realizar atividades de extrema relevância social, utilizando recurso públicos, a entidade privada recebe praticamente o mesmo vinculo que a Administração Pública tem com as normas e os princípios que regem a atividade da Administração Pública.

Vale lembrar a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello[3] sobre a importância dos princípios nas questões que versam sobre o interesse público: "princípio é mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico".

Assim, ante a importância que a supremacia do interesse público tem sobre o privado e a indisponibilidade que o direito resguarda sobre os interesses públicos em detrimento ao particular, as OSCIPs, devem utilizar o procedimento licitatório, quando, com recursos advindos do erário público, realizar contratações com terceiros.

* O autor é acadêmico do Curso Direito, na Faculdade de Direito de Curitiba (UNICURITIBA) e estagiário do Popp & Nalin Advogados Associados.




Autor: Kaio Zilli


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