Criminalizar a Pornografia?



Um dos fenômenos sociais trazidos pela internet foi a explosão da pornografia. O tema é antigo, data pelo menos das pinturas de Pompéia, mas a rede mundial impôs novo fôlego ao obsceno, popularizando devassidão para bem além da nudez renascentista.
A internet é um território sem fronteiras, mas não sem leis. A pornografia infantil é - e nem poderia deixar de ser ? reconhecida incontroversamente como um crime, assim como o uso indevido da rede em ambiente de trabalho. Mas isso ainda diz pouco sobre o tema.
Segundo a empresa norte-americana N2H2, produtora de programas-filtros para controle de acesso ao uso da internet, em seis anos a pornografia na rede cresceu 18 vezes.
Para a professora de Direito da Universidade de Michigan Catharine MacKinnon esse é um tema jurídico por excelência. Pioneira na construção do conceito legal de assédio sexual, tornando criminalizável uma agressão até então despercebida, defende que a pornografia agride duplamente às mulheres, quando se faz e quando se vê. "A realização de material pornográfico degrada e violenta", diz MacKinnon, "e a sua distribuição induz à violência, sendo causa até de mortes de mulheres". Ela e a feminista Andrea Dworkin criaram um movimento que defende ser a pornografia não apenas sórdida, mas uma agressão a direitos fundamentais.
A Igreja Católica, também reconhece divulgações pornográficas como reduções da pessoa a objeto anônimo. Contudo, não impõe proibição por reconhecer que "uma atitude de pura restrição ou de censura por parte da Igreja diante destes meios não resulta nem suficiente nem apropriada".
Por outro lado, o professor de economia Todd D. Kendall, pensa bem diferente, para ele a pornografia tem um papel social. Em seu "Pornography, Rape, and the Internet" concluiu que o aumento da disponibilidade de pornografia tornou menor a ocorrência de estupros. Chegando a números: 10% mais de internet implica em queda de 7,3% na incidência de violência sexual!
Claro que a análise matemática não consegue revelar todas as relações de causalidade que necessariamente definem o agir das pessoas, de explicar o "manual" de funcionamento das engrenagens do mecanismo social, de desenhar a racionalidade - supondo existir alguma - que orienta e move os fenômenos humanos.
Mas, de toda sorte, para o filósofo brasileiro Paulo Ghiraldelli Jr, as feministas estão mesmo erradas. Para ele o libertino objetiva dominar, ter, possuir o corpo da parceira, mas é a razão que faz a corte, é a razão que monta o ritual da posse, posse que busca apenas o prazer que nega a razão. Esse conflito prazer/razão é vencido, segundo Ghiraldelli, pelo prazer, que não tem governo e nem nunca terá, e levará ao amor.
Há, ainda, quem simplesmente negue a existência da pornografia, como Henry Miller num ensaio escrito por ocasião da proibição de seu "Trópico de Câncer", anos 30. Nele, o escritor observa que "não é possível encontrar a obscenidade em qualquer livro, em qualquer quadro, pois ela é tão-somente uma qualidade do espírito daquele que lê, ou daquele que olha".
De fato, pornografia não é sexo: sexo é biologia, pornografia é fenômeno cultural. Entre animais há sexo, mas não há pornografia.
Talvez a pornografia apenas escancare uma questão ainda maior: o fato dos ambientes de trabalhos estarem estruturados na negação do humano.
Exigir postura profissional é proibir atitudes humanas. Ser profissional é não responder a ofensas, é fingir tolerar o intolerável. Reinventar-se nada mais é do que se negar para mimetizar-se ao serviço. A hipocrisia surge como uma competência inata do bom profissional.
No competitivo mercado de trabalho atual, sucesso profissional é adaptação ao sistema de castas coorporativas, ao modelo hierárquico no qual a patente fala e as pessoa obedecem.
O historiador Eric Hobsbawm assinala como os homens que administravam os trens nazistas de extermínio, que jamais perpassariam com um sabre o ventre de uma mulher grávida, cuidavam escrupulosamente dos trens, que saiam no horário. Não eram assassinos, eram assessores. Não produziam mortos, mas estatísticas.
A pornografia, de fato, não se afasta tanto dos demais modos profissionais de conformar pessoas, de negar o humano, de aviltar. Não merecendo, portanto, atenção particular. A intimidade revelada apenas acentua o paradoxo de serem e, ao mesmo tempo, não serem pessoas. Cria perplexidade ao embaralhar público e privado. Mas apenas acentua, ainda que escandalosamente, um desrespeito estrutural que lhe é maior.
Autor: João Aurélio Mendes Braga De Sousa


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