Nietzsche X Saramago: uma analogia



Nietzsche X Saramago: uma analogia


Alessandra Garuzzi (UEPA)



Resumo
Neste artigo pretendeu-se identificar pensamentos semelhantes a respeito do Cristianismo e mesmo sobre a existência ou não de Jesus Cristo nas obras O Evangelho Segundo Jesus Cristo, de José Saramago, e O Anticristo, de Nietzsche. Ressalta-se o fato de que esses autores viveram em épocas distintas e, consequentemente, em situações sociais da mesma forma diferentes, algo que poderia fazê-los divergir em suas opiniões sobre temas semelhantes.

Palavras-chave: Cristianismo, Jesus Cristo, Nietzsche, Saramago.


Introdução
Na ocasião de haver estudado Literatura Portuguesa, tive a oportunidade de desenvolver um trabalho de análise da obra O Evangelho Segundo Jesus Cristo, de José Saramago. Foi no decorrer da execução do trabalho que pude ter conhecimento da existência de inúmeras obras anticristãs e mesmo de obras cujos autores negam a existência de Deus.
A apartir disso quis então escolher uma obra que pudesse ser utilizada para fazer uma analogia. A obra em questão acabou por ser O Anticristo, de Friedrich Nietzsche, que possui o mesmo tema central de O Evangelho (?).
Neste trabalho, apontarei algumas semelhanças e também diferenças entre as duas obras citadas, ressaltando o fato de que seus autores viveram em épocas diferentes e bem distantes uma da outra, o que poderia acarretar seres humanos com pensamentos completamente diferentes sobre o mesmo assunto.


Capítulo 1
Dos Objetos Estudados
Os Autores
Friedrich Nietzsche

Muitas vezes mal interpretado como filósofo, ora em função de seu estilo poético, ora devido à exploração pelo nazismo de certos aspectos de seu pensamento, Nietzsche, na verdade, foi um dos críticos mais agudos da religião, da moral e da tradição filosófica do Ocidente. Nessa condição, influenciou filósofos, teólogos, psicólogos e escritores do século XX.
Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu em 15 de outubro de 1844 em Röcken, na Saxônia prussiana. Filho e neto de pastores protestantes, Nietzsche perdeu prematuramente o pai em 1849 e ficou aos cuidados da mãe, da avó e da irmã mais velha. Em 1858 obteve uma bolsa de estudos para a escola de Pforta e em 1864 ingressou na Universidade de Bonn, para estudar teologia e filologia. Transferiu-se, em 1865, para a Universidade de Leipzig, por indicação do mestre Friedrich Wilhelm Ritschl, graças a quem, ainda aos 25 anos, Nietzsche foi contratado pela Universidade de Basiléia como catedrático de filologia clássica.
Nessa fase, compôs obras musicais à maneira de Schumann, fez amizade com Richard Wagner e conheceu a filosofia de Schopenhauer. Em 1870, durante a guerra franco-prussiana, Nietzsche serviu como enfermeiro voluntário e um mês depois, muito doente, teve de voltar a dar aulas. Em 1872 publicou Die Geburt der Tragödie aus dem Geiste der Musik (O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música), que antecipa as linhas essenciais de seu pensamento e tornou-se um clássico na história da estética. Nesse livro, Nietzsche sustenta que a tragédia grega teria surgido da fusão de dois componentes: o apolíneo, que representava a medida e a ordem, e o dionisíaco, símbolo da paixão vital e da intuição. Sócrates, ao impor o ideal racionalista apolíneo, teria causado a morte da tragédia e a progressiva separação entre pensamento e vida. As dez últimas sessões constituem uma rapsódia sobre o renascimento da tragédia a partir do espírito da música de Wagner.
Em suas obras seguintes, como Unzeitgemässe Betrachtungen (1873-1874; Considerações Inatuais), em que exalta o pessimismo de Schopenhauer, e Menschliches, Allzumenschliches (1878; Humano, Demasiado Humano), em que se mostra convertido ao Iluminismo e faz os primeiros ataques à moral cristã, Nietzsche expõe algumas de suas ideias mais contundentes, desenvolvidas ainda em Die Fröliche Wissenschaft (1882; A Gaia Ciência), Jenseits Von Gut und Böse (1886; Para Além do Bem e do Mal) e Zur Genealogie der Moral (1887; Sobre a Genealogia da Moral), em aforismos brilhantes e demolidores.
Com frequentes e fortes dores de cabeça, enxergando pouco, o filósofo foi obrigado a aposentar-se. Daí em diante levou a vida itinerante e de isolamento crescente na Suíça, na Itália e na Riviera Francesa. De 1883 a 1891 publicou as quatro partes de sua obra principal, Also Sprach Zarathustra (Assim Falou Zaratustra), de estilo bíblico e poético, entre o dos pré-socráticos e o dos profetas hebraicos. Sob a máscara do lendário sábio persa, anuncia a filosofia do eterno retorno e do super-homem, que derrotariam a moral cristã e o asceticismo servil. O livro póstumo Der Wille zur Macht (A Vontade de Potência) organizado pela irmã Elizabeth Förster Nietzsche, reúne arbitrariamente notas e rascunhos, nem sempre fiéis às ideias do autor. É autêntica, porém, a autobiografia espiritual Ecce Homo, escrita em 1888.
O vigoroso espírito crítico de Nietzsche incidiu especialmente sobre a ética cristã: para esta, o bom é o humilde, pacífico, adaptável; e o mal é o forte, enérgico e altivo. Para Nietzsche, essa é a moralidade tanto de senhores quanto de escravos. O valor supremo que deve nortear o critério do que é bom, verdadeiro e belo é a vontade de potência, é mau o que vem da fraqueza. O homem aspira a imortalidade, mas esse conceito nada significa, já que a realidade se repete a si mesma num devir que constitui o eterno retorno. O homem só se salva com a aceitação da finitude, pois se converte em dono do seu destino, se liberta do desespero para afirmar-se no gozo e na dor de existir. O futuro da humanidade depende dos super-homens, capazes de se sobrepor à fraqueza, e não da integração destes ao rebanho.
Em janeiro de 1889, Nietzsche sofreu um grave colapso nas ruas de Turin e perdeu definitivamente a razão. Ao ser internado em Basiléia, diagnosticou-se uma "paralisia progressiva", provavelmente em consequência de infecção sifilítica contraída na juventude. Passou os últimos dez anos de vida na casa d mãe e, com a morte desta, na da irmã. Nacionalista alemã fanática, Elizabeth escreveu volumosa biografia sobre o irmão em que, a serviço dos ideais chauvinistas, lhe deturpou os fatos biográficos e as opiniões políticas, atribuindo caráter nacionalista às investidas de Nietzsche contra os valores cristãos e seus conceitos de vontade de poder e super-homem. Nietzsche, na verdade adversário do nacionalismo e do antissemitismo, morreu em Weimar, em 25 de agosto de 1900.


José de Sousa Saramago

Nascido no ano de 1922, em 16 de novembro, em Azinhaga, José de Sousa Saramago foi registrado por seu pai como tendo nascido dois dias depois, ou seja, dia 18 de novembro. Para que não precisasse pagar uma multa, José de Sousa precisou dar outra data de nascimento ao registrar o filho. Outra situação inusitada na vida de Saramago é a origem de seu sobrenome, o apelido pelo qual o pai era conhecido, uma espécie de alcunha de família associada a uma planta silvestre. Saramago recebeu este sobrenome do funcionário do cartório, que, por conta própria, acrescentou ao nome o apelido da família. O pai, José de Sousa, só teria percebido o engano sete anos depois do nascimento do filho ao matriculá-lo na escola primária em Lisboa (CALBUCCI, 1999).
José Saramago estudou em Lisboa até os dezessete anos, onde, por questões financeiras, fez apenas cursos técnicos, período no qual começou a interessar-se por literatura. Entretanto, exerceu vários ofícios antes de dedicar-se de fato a ela: foi serralheiro mecânico, desenhista, empregado do comércio, jornalista e editor. Foi trabalhando como editor dos Estúdios Cor que Saramago começou a envolver-se com a literatura e pôde então viver dos livros e para eles (FLORY, 1997).
Sua carreira literária iniciou-se modestamente com a publicação de Terra do Pecado, em 1947. No entanto, foi em 1980, com o lançamento de Levantado do Chão, que Saramago surpreendeu a todos com uma escrita irreverente. Nesta obra Saramago reinventou sua forma de escrever ao narrar a saga de uma família de trabalhadores rurais da região do Alentejo, ao sul de Portugal. Por meio desta obra o autor foi agraciado em 1981 com o "Prêmio Cidade de Lisboa" (FLORY, 1997, p. 93).
Foi a partir de então que a escrita de Saramago adquiriu um ritmo muito particular. Sua pontuação atravessou, então, o tradicional reinventando a escrita e combinando características do discurso literário com o discurso oral de modo a construir uma cumplicidade entre narrador e narratário. Em seus textos o autor transpõe sinais de pontuação, como dois-pontos, travessões, interrogações, exclamações etc., utilizando apenas a vírgula e o ponto.
No entanto, foi ao lançar a obra O Evangelho Segundo Jesus Cristo em 1991, que obteve o auge de sua polêmica vida de escritor. Retratar Jesus Cristo de um modo tão humano, fazendo-o capaz de errar e mesmo sentir amor carnal, o autor traz contra si não apenas os líderes da Igreja Católica, mas também políticos e toda uma população religiosa. Em virtude do conteúdo do livro, o governo de Portugal o impede de concorrer ao Prémio Literário Europeu daquele ano alegando que sua obra ofendia os católicos. A partir de então, Saramago, como protesto, decide isolar-se na ilha de Lanzarote, pertencente à Espanha.
No entanto a vida de Saramago não se resume aos livros editados. Acreditando que o romance deve visar à expressão total e abrir-se a toda forma de inspiração literária, José Saramago renovou a prosa da ficção portuguesa ao criar um estilo que associa história e fantasia. Ficou conhecido como o responsável reconhecimento internacional da prosa em Língua Portuguesa, por também polemizar sempre: por ser um ateu declarado, ter se casado aos 63 anos com uma mulher de 35, por criticar a veracidade dos fatos históricos e também os bíblicos.
Considerado um comunista convicto e um mestre no tratamento da Língua Portuguesa, sendo assim um marco na Literatura contemporânea ocidental, José de Sousa Saramago, para a tristeza de muitos, faleceu aos 87 anos, em 18 de junho deste ano de 2010, em sua casa, na ilha de Lanzarote.


As Obras
O Anticristo

O Anticristo é um ensaio sobre uma crítica ao cristianismo, no qual o autor refuta os preceitos de uma igreja dominadora que, por meio daquilo que chama "vontade de Deus", transforma o homem em um ser submisso, dependente que só pode merecer a felicidade mediante o sofrimento, o controle de suas vontades e o arrependimento de seus pecados.


O Evangelho Segundo Jesus Cristo

Trata-se esta obra de uma ficção, cujo objetivo é mostrar humanidade em personagens sacros. Além disso, mostra ao leitor a necessidade de questionar verdades absolutas ao invés de aceitá-las mansamente, como é o caso das verdades absolutas contidas na Bíblia relativas a Jesus, que há dois mil anos vêem sendo impostas aos homens com total aceitabilidade e nenhum questionamento pela maioria dos chamados cristãos.


Capítulo II
Da Análise das Obras
De Como os Autores Tratam a Santidade

Em ambas as obras, os autores abominam a santidade. Em O Anticristo, Nietzsche afirma que a santidade "causou muito mais danos à vida que quaisquer outros horrores e vícios". Cria-se um conceito de santidade e a ela se atribiu um poder incomensurável, quase absoluto.
Já em O Evangelho (?), Saramago demonstra isso nos colocando diante de um Cristo assustadoramente humano e de um Deus que parece relacionar-se muito bem com o Diabo, mantendo ambos um conveniente convívio. Uma vez que ambos são sabedores de que o bem precisa do mal para existir e vice-versa, considerar santo um deus que permite que a humanidade mate e morre em seu nome é minimamente estranho.


De Como os Autores Tratam Jesus

Em O anticristo, Nietzsche afirma ser Jesus um deus niilista, decadente, justamente por considerá-lo um pregador rejeitado pelos judeus e um líder popular que nada conseguiu contra os romanos, não triunfou em vida nem na política nem na religião, se deixou ser preso sem resistência vendo o povo voltar-se contra ele e seus seguidores fugirem assustados, para depois ser executado de forma humilhante.
Em O evangelho (?), Saramago apresenta um Jesus submisso. Alguém que não encontra outra alternativa que não seja obedecer a Deus, ainda que não concorde com seus métodos. Um homem indeciso, inseguro, tornando-se, segundo o autor, um decadente.

De como os Autores Tratam a Compaixão
No sétimo capítulo de O Anticristo, Nietzsche (1994) afirma que:
"Chama-se cristianismo a religião da compaixão. ? A compaixão está em oposição a todas as paixões tônicas que aumentam a intensidade do sentimento vital: tem ação depressora. O homem perde poder quando se compadece. Através da perda de força causada pela compaixão o sofrimento acaba por multiplicar-se. O sofrimento torna-se contagioso através da compaixão; sob certas circunstâncias pode levar a um total sacrifício da vida e da energia vital ? uma perda totalmente desproporcional à magnitude da causa (o caso da morte de Nazareno)".

Para Nietzsche, a compaixão não pode ser considerada uma virtude. É um sentimento que impede o homem de crescer, evoluir, de concretizar suas vontades.

Em O Evangelho (?) (1991), Deus lista para Jesus os nomes das pessoas e de como se deram suas mortes em causa dele, Deus. A lista já está na letra R quando Deus pergunta a Jesus: "ainda não estás farto, perguntou Deus a Jesus, e Jesus respondeu, Essa pergunta devias fazê-la a ti próprio, continua, e Deus continuou".
Para Saramago, não havia compaixão em Deus, pois, se o houvesse, este não concretizaria planos como matar o próprio filho, dizimar cidades, testar fiéis, inundar o planeta, fazer acordos com o Diabo...


De Como os Autores Tratam o Poder da Palavra

Em O Evangelho (?) (1991), podemos ler:
"Parece-me claro e óbvio que não tens culpa, e, quanto ao temor de que te atirem com as responsabilidades, responderás que Diabo, sendo mentira, nunca poderia criar a verdade que Deus é, Mas então, perguntou Pastor, quem vai criar o Deus inimigo. Jesus não sabia responder, Deus, se calado estava, calado ficou, porém do nevoeiro desceu uma voz que disse, Talvez este Deus e o que há de vir não sejam mais do que heterônimos, De quem, de quê, perguntou, curiosa, outra voz, De Pessoa, foi o que se percebeu, mas também podia ter sido, Da Pessoa. Jesus, Deus e o Diabo começaram por fazer de conta que não tinham ouvido, mas logo a seguir entreolharam-se com susto, o medo comum é assim, une facilmente as diferenças".

A quarta voz no texto é do próprio autor que, interferindo na conversa entre Deus, Jesus e o Diabo, torna-se mais poderoso que o próprio Deus através da sua palavra. Se o autor pôde interferir dessa forma na obra, quem nos garante que não houve interferências desse tipo nas transcrições e traduções da Bíblia?
Em O Anticristo, Nietzsche (Grifo meu. 1994) afirma:

"[...] Leiam os Evangelhos como o livro da sedução usando a moral como recurso: a moral foi coberta com uma capa por essa gentinha, eles conhecem a importância da moral! Através da moral conduz-se a humanidade mais facilmente pelo bico! [...] colocaram definitivamente a ?comunidade?, os ?bons? e os ?justos?, de um só lado, do lado da ?verdade?, e o resto, o ?mundo?, do outro lado [...] uma pequena multidão disforme de hipócritas e mentirosos começou a monopolizar os conceitos de ?Deus?, ?verdade?, ?luz?, ?espírito?, ?amor?, ?sabedoria?, ?vida?, como se fossem seus sinônimos, para com isso delimitar o ?mundo? [...]".

Ambos os autores propõem que através da palavra, considerada arma humana, pode-se transformar uma mentira bem contada numa verdade absoluta. Através de um discurso persuasivo, é possível convencer de qualquer coisa um povo desesperado por justiça.


O Cristianismo nas Obras

Nietzsche, ao emparelhar budismo e cristianismo, afirma ser o primeiro a única religião verdadeiramente positiva, pois luta contra o sofrimento, enquanto o cristianismo luta contra o pecado. Saramago, no entanto, sustenta um Jesus encurralado: se de um lado precisa satisfazer as vontades de Deus, de outro não consegue amenizar os sofrimentos da humanidade.

Em O Anticristo, a negação do cristianismo é vista sob uma ótica política e social. Há uma preocupação do autor em mostrar que o cristianismo foi usado como uma forma das classes dominantes continuarem tripudiando sobre o povo. Isso tudo baseado no fato de que ser cristão significa aceitar a vontade de Deus, uma vez que há a crença de que não há nada que aconteça no mundo que não tenha a permissão divina.
Nietzsche repudia o cristão a ponto de, no terceiro capítulo de sua obra aqui analisada, afirmar que o cristão é o tipo errado de homem a ser criado, chegando a chamá-lo "doentia besta humana". Já para Saramago, o poder do Cristianismo impera com tamanha força na sociedade ocidental que as pessoas são dominadas por ele mesmo não seguindo uma religião cristã.
Desmistificando a história oficial, em O Evangelho (?), o autor busca mostrar o lado humano de um homem considerado filho direto de Deus e, portanto, também divino, levantando a contenda de que não há como sentir as mazelas humanas sendo divino. Tal atitude só seria possível se Jesus viesse como um ser humano comum, com todos os anseios e privações de um homem comum. Caso contrário, ele não teria como saber nossas humanas necessidades.
O sofrimento de Jesus se dá justamente por este não poder portar-se como um deus. Deste modo, aparenta ser um fraco aos seus seguidores que, com sua humilhante morte, sentem-se em pior situação. Daí a necessidade de santificá-lo por meio da ressurreição, a qual inexiste em O Evangelho (?). No final do livro, Jesus simplesmente morre. Como se Saramago quisesse dessa forma impedir o surgimento do Cristianismo e da religião tão desastrosa para a humanidade.


Capítulo III
Considerações Finais
O fato de terem existido em épocas diferentes não foi motivo para que Nietzsche e Saramago pensassem diferente sobre o mesmo assunto. Ambos os autores criticam duramente o Cristianismo em suas obras, sendo suas opiniões muito semelhantes.
A interrogação ao passado também é feita pelos dois autores e, ao fazê-lo, ambos têm a preocupação em sair das cercaduras estereotipadas do Cristianismo, percorrendo o caminho do processo histórico. Dessa forma, fazendo surgir diversas outras possibilidades além daquelas que, convenientemente, nos são apresentadas.
A construção deste artigo só foi possível em virtude do trabalho acadêmico de análise literária de O Evangelho (?), o qual, na ocasião, foi coordenado pelo Mestre em Literatura Portuguesa Augusto Sarmento-Pantoja.
A experiência de entrar em contato com obras e autores tão geniais é inenarrável, pois ambos tratam, sem medo, de assuntos ditos sagrados, com o escopo único de buscar por verdade histórica. Verdade esta que ainda hoje pode ser camuflada e tornada inacessível à maioria de nós.
Ao contrário do que pode parecer, em virtude dos títulos das obras, não há nestas uma crítica a Jesus de Nazaré, mas ao Cristianismo torto criado após a morte do Nazareno para tão somente manipular e submeter a massa em prol do poder absoluto, tanto religioso quanto político.
Obviamente que as vendas a serem retiradas de nossos olhos são inúmeras. E é preciso haver consciência até para percebermos a existência delas. No entanto, enveredarmo-nos pelos caminhos da leitura pode não ser apenas uma experiência fascinante, mas também depressiva e mesmo assustadora. Pode nos abrir os olhos e não nos permitir nunca mais fechá-los, pode nos conceder mais informação do que gostaríamos de ter: e ter em nós mais do que somos nem sempre é uma carga muito fácil de carregar. Pode nos modificar pra sempre.
Embrenharmo-nos pelo mundo da leitura acarreta-nos uma série de consequências que nem sempre estamos preparados pra enfrentar. Pois, o excesso de conhecimento muitas vezes mais nos fará calar do que enfrentar controvérsias. E isso pode nos obrigar a assistir à distância o mundo que passa diante de nossos olhos. E em silêncio? em completo silêncio.





Referencial Bibliográfico
CALBUCCI, Eduardo. Saramago: um roteiro para os romances. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 1999.
FLORY, Suely Fadul Villibor. O leitor e o Labirinto. São Paulo: Arte & Ciência, 1997.
NITZSCHE, Friedrich Wilhelm. O Anticristo. Portugal: Europa-América, 1994.
SARAMAGO, José de Sousa. O Evangelho Segundo Jesus Cristo. São Paulo: Cia das Letras, 1991.


Autor: Alessandra Pereira Garuzzi


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