Uma reflexão sobre a Didática e a formação do professor



Uma reflexão sobre a Didática e a formação do professor Cleyde Anne Souza Lucival Fraga dos Santos A didática constitui-se em uma área de estudo de fundamental importância à formação de educadores, visto que ela possibilita fornecer bases teóricas para que estes possam atuar diante das mais diversas situações práticas de ensino, correspondendo assim uma dos pilares básicos para á prática docente. As primeiras abordagens a cerca da didática surgem quando Comenius escreveu a Didática Magna, instituindo-a como "arte de ensinar tudo a todos", na tentativa de propor reflexões e métodos que auxiliassem no processo de ensino e aprendizagem. Mas, o que de fato caracteriza e /ou define a Didática? Dentre as várias definições existentes, convém citar Libâneo (2002), que define a didática como uma disciplina que estuda o processo de ensino no seu conjunto, no qual os objetivos, conteúdos, métodos e formas organizativas da aula se relacionam entre si de modo a criar as condições e os modos de garantir aos alunos uma aprendizagem significativa. Contudo, numa perspectiva histórica, houve uma diversidade de tipos de mediação didática que caracterizou cada uma das tendências pedagógicas, entendendo a didática como a "área que cuida dos objetivos, condições e modos de realização do processo de ensino"(LIBÂNEO, 2002). A Tendência Tradicional jesuítica, por exemplo, a primeira que se estabeleceu no Brasil, tinha como base a transmissão de conhecimentos, concebendo alunos (as) como seres passivos e o professor como figura básica do processo ensino-aprendizagem. A partir dessa, outras tendências foram se constituindo, embora muito ainda se perceba dessa no cenário educacional atual. A tendência escola-novista representou significativa influencia nos rumos da educação, ao considerar o professor como um orientador da aprendizagem, deixando assim de ser o detentor do saber, sob intenção de uma relação mais dialética entre professor e alunos, na qual a criança passa a ser o centro do ensino, ao passo que é considerada um ser ativo no processo de ensino. Em outro momento, nasce a tendência tecnicista que reduz o ensino à tarefa de instrução, ou seja, busca-se ajustar os objetivos de ensino às exigências do sistema, dando ênfase aos meios para garantir os resultados e conteúdos desvinculados de contexto. Paulo Freire abriu espaço para a identificação de uma mediação didática em que, no processo de ensino e aprendizagem, fossem privilegiadas ativas discussões, a partir de temas geradores, voltando à ação pratica para a reflexão a respeito da realidade social imediata, bem como valorizando os relatos de experiências vividas. A palavra chave dessa Tendência Libertadora é diálogo e, se contrapõe à cultura pedagógica verbalista da tendência tradicional, a qual denominou de "educação bancária" ? deposito de conteúdos para posterior saque. Em oposição às tendências tradicionais acima descritas, surge à tendência critico social dos conteúdos, a qual teve como alguns dos seus sistematizadores Derneval Saviani e José Carlos Libâneo. Conforme esta tendência cabe à escola cumprir sua função social e política de assegurar a difusão dos conhecimentos sistematizados para tornar efetiva participação do povo nas lutas sociais. Porém, havia a ênfase na contextualização, ou seja, selecionavam-se os conteúdos conforme sua utilidade para orientar o aluno (a) à aplicabilidade na vida prática. A crítica que se tem a cerca dessa tendência é a supervalorização da importância da transmissão do conteúdo sistematizado. Assim, é possível perceber que para cada momento, novas propostas de mediação didática emergiram, percorrendo a didática assim, um longo e diferenciado contexto histórico que, inclusive, sempre esteve relacionada ao modelo econômico vigente. Na verdade, de todas as tendências pedagógicas que foram surgindo, apenas a escolanovista levou um pouco em consideração os processos cognitivos do educando e tentava compreender o processo de aprendizagem, ao voltar à atenção para uma aprendizagem mais significativa e ter o professor como mediador dos saberes. Então, só após o surgimento das teorias construtivista e sociointeracionista a mediação didática recebe um novo direcionamento, ainda assim, suscetível aos equívocos pedagógicos. Em um dado momento histórico educacional, a didática foi instituída como curso e disciplina essencial à formação docente, porém seu foco sempre esteve voltado às técnicas e métodos. É sabido que, na formação dos educadores, a didática deve ser uma disciplina que vise estudar os aspectos que fazem parte do processo de ensino aprendizagem e seus determinantes, levando em consideração, finalidades, conteúdos, métodos, avaliação e outros elementos, em outras palavras a didática estabelece a mediação entre o que e a quem ensinar, como e para que ensinar, provendo-os assim, de conhecimentos específicos necessários à ação docente. Contudo mesmo com o passar dos anos, nota-se ainda a não obtenção de sucesso com a disciplina e, sim, um acentuado distanciamento entre teoria e pratica. Na atualidade, autores como Vera M. Candau e Ilma P. A. Veiga discutem a "fragmentada" formação que muitos professores têm recebido, na qual se percebe que professores não possuem os conhecimentos necessários para a sua atuação profissional, pelo fato de não compreenderem a importancia da didática, bem como dos conteúdos e sua aplicabilidade no espaço formal. Dessa forma, a necessidade real é possibilitar maior aproximação entre teoria e pratica, de forma que os cursos de formação de educadores repensem o repertorio de conhecimentos, baseando-se no estudo dos saberes profissionais dos mesmos, pois conforme Veiga (2006a) "há um reducionismo técnico da didática orientada pelos documentos legais que norteiam a formação de professores". Como afirma Tardif (2000), os saberes profissionais, na ação, assumem significado e utilidade, além de possuírem algumas características, ou melhor, considera-os: Temporais ? adquiridos através do tempo; plurais e heterogêneos ? não formam um repertorio de conhecimentos unificados e a ação e orientada por objetivos diversos; personalizados e situados ? os saberes são subjetivados, o que implica a dificuldade de dissociação da pessoa de sua experiência. Além disso, o referido autor aponta possíveis motivos para a crise do profissionalismo: crise da pericia (técnicas, estratégias) profissional, impacto na formação, crise do poder profissional e da confiança do público e crise da ética profissional. Aspectos relacionados à crise da qual Tardif (2000) se refere é perceptível, no contexto contemporâneo, principalmente, quando diante dos novos desafios que são propostos à escola, não é sabido como lidar nem o que fazer. Alguns temas e algumas situações exigem dos docentes diferenciadas posturas e habilidades, mas então nos questionamos: Até que ponto a formação desses docentes tem contemplado o que de fato se necessita na prática? Como associar teoria e prática, se os conhecimentos universitários encontram-se distanciados dos saberes profissionais? Por que um estagiário ou mesmo um recém-egresso da universidade ao se deparar com o espaço formal de ensino percebem que muitos desses conhecimentos não se aplicam bem na ação cotidiana? Como exemplo, é plausível citar um episódio em que uma professora de 3ª serie, atual 4º ano da escola municipal Pedra que brilha, chegou até a coordenação da escola angustiada porque precisava trabalhar expressão numérica com os alunos, mas ela sempre teve dificuldades para lidar com este conteúdo e facilitar a compreensão pelos mesmos. Diante dessa situação, lhe foi sugerida uma atividade, na qual se desenvolvia um jogo da tabuada com a turma dividida em dois grupos, e para cada acerto o aluno ganhava uma cédula de dinheirinho (poderia combinar os valores por rodada). A final problematizar: O que fazer para descobrir com quantos R$ cada grupo ficou? À professora caberia estimular os alunos a perceberem que poderiam identificar quantas cédulas de cada valor tinham para multiplicar e somar os resultados, sempre provocando reflexões. A proposta, em si, era para que os alunos percebessem a expressão numérica como um conjunto de operações e que precisa ser resolvida por etapas. Após aplicação da atividade, a professora em um encontro com a coordenação pedagógica relatou que ela havia aprendido o que nunca aprendera antes: como ensinar expressões numéricas. Ações como esta se transformam em saberes profissionais! Atualmente, é possível "identificar dois fatores que representam enormes desafios tanto para a didática quanto para o sistema de ensino, a legislação educacional brasileira e a política neoliberal", (BARADEL, 2007). A politica neoliberal influencia diretamente no sistema educacional, pois falta uma preocupação com a formação critica e contextualizada e, por isso, dá-se continuidade à formação docente desvinculada do contexto social e sob caráter meramente técnico, através da inculcação de ideologias e não da reflexão critica que possibilite a transformação e, ao mesmo tempo, proporcione o dialogo entre teoria e pratica. Cabe aos educadores, assumir-se profissionalmente tendo clareza da sua função, contribuindo para uma possível melhoria da qualidade de ensino. Neste sentido, é necessário que o professor tenha em sua formação profissional as duas dimensões para o trabalho em sala de aula definidas por Libâneo como "teórico-cientifica e a prática docente". Portanto, a didática oferece subsídios importantes ao se constituir como mediadora no espaço acadêmico entre o saber construído na universidade e o saber profissional construído no espaço escolar com a atuação docente. O grande desafio dos professores seja no espaço de formação, seja no espaço de atuação profissional, é compreender a Didática como base do fazer pedagógico. Não se pode negar que muitos docentes buscam melhorar seus métodos e práticas pedagógicas para alcançar resultados satisfatórios, porém, muitas vezes essa mudança não acontece, pois não há conexão entre os conhecimentos teórico-científicos e a prática docente, uma vez que muitas lacunas são deixadas durante a formação. Luckesi (2004, p.32) faz uma crítica ao modo como à Didática vem sendo ensinada "acentua o ?senso comum ideológico dominante? que perpassa a nossa prática educacional diária, seja por um descuido de uma compreensão filosófica do mundo e do educando, seja pela não compreensão de uma teoria do conhecimento norteador da prática educativa, seja pelo mal entendimento de um material didático, que, de subsidiário do ensino e da aprendizagem, passa a ocupar um papel central e transmissor de conteúdos e, implicitamente, de ideologias oficiais" Concluindo, faz-se necessário um novo olhar sobre a Didática, entendendo-a como uma ponte que liga a teoria a prática, algumas reflexões sobre o papel das instituições de formação dos educadores e o papel do professor no espaço de sua atuação profissional. É importante que o professor se reconheça como um profissional da educação e busque sua formação continuada, não apenas para obter certificados ou títulos, mas com o intuito de didaticamente avaliar e resignificar os conhecimentos teórico-científicos e aplicá-los na sua prática pedagógica. Referencias ARRUDA, Robson Lima de. Didática E Formação Docente: Algumas Reflexões. Disponível em: http://www.artigonal.com/educacao-artigos/didatica-e-formacao-docente-algumas-reflexoes-1410775.html Acesso em 05 de abril de 2011. CANDAU, Vera Maria (Org.). Rumo a uma nova Didática. In: A Revisão da Didática. 12 edição. Editora Vozes. 1988 ______. A Didática em Questão. In: LUCKESI, Cipriano Carlos. O papel da didática na formação do educador. 20 edição. Editora Vozes. BARADEL, Carina de Barros. Didática: contribuições teóricas e concepções de professores. BAURU, 2007 LIBÂNEO. José Carlos. Didática: velhos e novos temas. Edição do Autor: 2002. Disponível em Acesso em 27 De março de 2011. VEIGA, I.P. A. Repensando a Didática. 23. ed. Campinas, Papirus, 2006 a. TARDIF, Maurice. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários - Elementos para uma epistemologia da prática Profissional dos professores e suas consequências em relação à formação para o magistério. Disponivel em Acesso em 05 de abril de 2011.
Autor: Cleyde Anne De Almeida Souza


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