Transacao Penal nos Juizados Especiais Criminais



CENTRO UNIVERSITÁRIO DA CIDADE
ESCOLA DE CIÊNCIAS JURÍDICAS






PAULO AMAZONAS CUNHA DE ALCANTARA







A Transação Penal nos Juizados Especiais Criminais






Rio de Janeiro
2006
PAULO AMAZONAS CUNHA DE ALCANTARA


TRANSAÇÃO PENAL NOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS







Rio de Janeiro
2006

PAULO AMAZONAS CUNHA DE ALCANTARA


TRANSAÇÃO PENAL NOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS







Rio de Janeiro


2006

































Dedico o presente trabalho primeiramente a Deus que nos momentos difíceis me deu ânimo para continuar, ao meu falecido querido pai Santino que me ensinou a lutar com perseverança nas batalhas da vida, minha mãe Ana Lucia que sempre acreditou no meu sucesso, minha esposa Viviane por sua paciência e compreensão, minhas irmãs Janaina e Luciana e a meus filhos Thaís, Douglas, Alexandre e Nicholas, que mesmo sem saber são o motivo desta conquista.

















AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço a Univercidade por me proporcionar a realização deste sonho. Agradeço aos professores de primeira linha, os quais foram a base de nossa formação jurídica, Prof.ª Claudia Aguiar, Prof.ª Patrícia Sanches, Prof. Marcelo Baez, Prof.ª Jaqueline Sarmento, dentre outros, que nos lecionaram com tanta dedicação e empenho, durante estes cinco anos. Por fim, agradeço toda a equipe da Univercidade-Aeroporto, em especial à Gisele, que sempre demonstrou boa vontade para nos atender e o Professor Maurício Galvão que tanto tem se empenhado para nos ajudar na realização deste projeto.




























"Para que o mal triunfe, basta que os homens de bem não façam nada".
EDMUND BURKE

RESUMO


Versa o presente trabalho sobre um tema bastante discutido nos últimos anos, sobretudo após a Lei 9.099/95, que dispôs sobre a criação e funcionamento dos Juizados Especiais em âmbito estadual e federal. O foco central do trabalho, entretanto, é a chamada transação penal e a atuação do Ministério Público no sentido de sua efetivação. Por outro lado, buscou-se trazer à baila determinadas questões entorno das quais paira ainda nos dias atuais, certa controvérsia doutrinária, como acontece, por exemplo, em relação à expressão "autoridade policial" a que se refere o artigo 69 da Lei em foco, no que tange à lavratura do termo circunstanciado ou ainda em relação ao oferecimento de ofício da transação penal pelo Juiz, face a recusa do Ministério Público quando atendidos os requisitos de seu oferecimento. Outrossim, fizemos um apanhado geral sobre os princípios, a composição entre as partes e como se realiza a citação nos juizados especiais criminais. Por fim, deu-se atenção ao direito comparado, notadamente no que concerne ao Juizado Especial Norte-Americano, bem como a transação penal deste país, chamada de plea bargaining.







ABSTRACT

The present essay is about a much discussed theme in the latest years, especially after the law nº 9.099/95, which established on the subject of the conception and operation of the Small Claims Court on state and federal range. The main focus of this work, however, is the plea bargaining and the prosecution behavior related to its effectiveness. On the other hand, we brought into discussion subjects which still have today, doctrinaire controversies, as for instance, the expression "Police authority", related to the article 69 of the referred law, concerning who is supposed to fill out the "Circumstantial Term" and also with reference to the proposition of the plea bargaining on the part of the judge, just in case the prosecution refuses to do it, even though, there are all the requisites to its proposition. It was given a general view over the principles, the composition between the plaintiff and the defendant, and how the citation takes part in the Brazilian Small Claims Court. At last, we drew the attention to the common law, especially regarding the North-American Small Claims Court, as well as, the plea bargaining of this country.











SUMÁRIO
RESUMO 7
ABSTRACT 8
INTRODUÇÃO 11
1 - JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS 13
1.1 - EVOLUÇÃO HISTÓRICA 13
1.2 - PRINCIPIOS PROCESSUAIS 14
1.2.1 - CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES 14
1.2.2 - PRINCÍPIO DA ORALIDADE 15
1.2.3 - PRINCÍPIO DA SIMPLICIDADE 15
1.2.4 - PRINCÍPIO DA INFORMALIDADE 16
1.2.5 - PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL 17
1.2.6 - PRINCÍPIO DA CELERIDADE PROCESSUAL 18
1.3 - PROCEDIMENTO E AMPLA DEFESA 18
1.4 - CRIAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS 19
1.4.1 - OBJETIVO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS 21
1.4.2 - CRIAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS FEDERAIS 22
1.5 - JUÍZES TOGADOS E LEIGOS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS 22
1.6 - INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO 23
1.6.1 - CONCEITO DE INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO 23
1.6.2 - AS INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO E O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA 27
1.7 - CITAÇÃO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS 27
1.7.1 - POSSIBILIDADE DE CITAÇÃO POR EDITAL NO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL 29
1.8 ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 11.313/06 29
1.9 - ALTERAÇÕES DE COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS 31
1.9.1 - LEI MARIA DA PENHA ? LEI 11.340/06 31
1.9.2 -NOVA LEI DE TÓXICOS ? LEI 11.343/06 32
2 - TRANSAÇÃO PENAL 34
2.1 - CONCEITO DE TRANSAÇÃO PENAL 34
2.2 - NATUREZA JURÍDICA DA TRANSAÇÃO PENAL 34
2.3 - COMPOSIÇÃO DE DANOS ANTES DA PROPOSTA DE TRANSAÇÃO PENAL 35
2.3.1 - ACORDO CIVIL 35
2.3.2 - A LEI 9.099 E O PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE 36
2.4 - PROPOSTA DE TRANSAÇÃO PENAL 37
2.4.1 - CONCURSO DE PESSOAS NA PROPOSTA DE TRANSAÇÃO PENAL E A INDIVISIBILIDADE 39
2.5 - RECUSA DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA PROPOSTA DE TRANSAÇÃO 40
2.6 - POSSIBILIDADE DE OFERECIMENTO "EX OFFICIO" PELO JUIZ 41
2.7 - TRANSAÇÃO PENAL ? CESTAS BÁSICAS 42
2.8 - CONVERSÃO DE PENAS 43
2.8.1- NÃO-CUMPRIMENTO DA PENA DE MULTA 43
2.9 - TRANSAÇÃO PENAL E SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO 44
2.9.1 - NATUREZA JURÍDICA DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO 46
2.9.2 ? CONCURSO DE AGENTES NA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO 47
2.9.3 - CONCURSO DE CRIMES NA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO...............................46
3 - TERMO CIRCUNSTANCIADO DA LEI 9.099/95 48
3.1 - CONCEITO DE TERMO CIRCUNSTANCIADO 48
3.2 - CONTROVÉRSIAS SOBRE A EXPRESSÃO "AUTORIDADE POLICIAL" 49
3.3 - ELABORAÇÃO DO TERMO CIRCUNSTANCIADO 52
3.4 - ARQUIVAMENTO DO TERMO CIRCUNSTANCIADO 52
3.5 - PRINCÍPIO DA ORALIDADE NO TERMO CIRCUNSTANCIADO 54
4 - JUIZADO ESPECIAL NORTE-AMERICANO 55
4.1 - SMALL CLAIMS COURT (JUIZADO ESPECIAL NORTE-AMERICANO) 55
4.2 - TRANSAÇÃO PENAL NORTE-AMERICANA - "PLEA BARGAINING" 56
4.3.1 - DIFERENÇA ENTRE A TRANSAÇÃO PENAL E O PLEA BARGAINING 57
4.4 - DIREITO COMPARADO 58
4.4.1 - ALEMANHA 58
4.4.2 PORTUGAL 58
4.4.3 ITÁLIA 58
CONCLUSÃO 59
BIBLIOGRAFIA 62
ANEXO A ..............................................................................................................................64



INTRODUÇÃO

A necessidade de soluções rápidas para a composição dos conflitos de interesse em uma perspectiva de razoabilidade de tempo para o desfecho da causa, dentro e fora do Estado, mobilizou jurista e legisladores na busca de um instrumento de realização da Justiça, dentro de um razoável lapso temporal.
Destarte, criaram-se os juizados especiais, como órgãos oficiais que buscam prioritariamente a pacificação como um dos caminhos para a concretização da promessa do efetivo acesso à Justiça.
Assim é que se buscou, neste trabalho, demonstrar a importância dos juizados especiais para o ordenamento jurídico brasileiro, especialmente no que concerne a celeridade do procedimento, baseado nos seus princípios norteadores, quais sejam, oralidade, informalidade, simplicidade, celeridade processual e economia processual.
Embora se discorrerá, ainda que superficialmente, sobre o os juizados especiais de um modo geral, nosso enfoque primordial será a transação penal.
O Direito comparado será subsidiário de nossa pesquisa, especialmente o norte-americano, fazendo-se um comparativo com o nosso juizado especial.
Importa dizer, também, que nos deteremos amiúde na questão relativa à transação penal, onde ainda hoje se verifica certa discussão doutrinária.
Ainda, pretende-se demonstrar que com o advento dos Juizados Especiais Criminais, especialmente no que se refere à parte que será detalhadamente estudada neste trabalho, ou seja, a transação penal como forma de despenalização, houve uma mudança na política criminal, a qual se tornou mais humanista, afastando a aplicação de pena aos delitos de menor potencial ofensivo e mantendo-a nas infrações mais graves.
É importante observar que os juizados são relativamente novos, com somente onze anos de existência completados no último me de setembro e já são considerados órgãos confiáveis e segue um rápido caminho ao amplo reconhecimento popular.
O objetivo principal, entretanto, é trazer a debate as questões polêmicas onde a doutrina e jurisprudências pátrias divergem, sobretudo no que se refere ao fato de ser ou não direito subjetivo da parte. Em outras palavras, estando preenchidos os requisitos para oferecimento da transação penal e recusando-se o membro do Ministério Público, poderá a parte requerer ou até mesmo se poderá o juiz oferecê-la de ofício.
Traremos também, neste trabalho, algumas alterações recentes de leis que anteriormente eram de competência dos juizados especiais criminais, como por exemplo, a Lei Maria da Penha ? Lei 11.340/06, e a nova lei de tóxicos ? 11.343/06, que passa a dar tratamento diferenciado ao usuário de droga.
Após a Constituição de 1988, houve uma redescoberta da justiça por parte do cidadão brasileiro. Atualmente mais de oito milhões de causas por ano ingressam nos juizados brasileiros sem que o judiciário esteja estruturado para recepcioná-las
Finalizando esta parte da exposição, trouxemos à colação frase do jurista Roberto Portugal Bacellar, onde, de forma lapidar, resume o sucedido após o advento dos juizados especiais:
"Abriram-se as portas da justiça. Houve esquecimento, entretanto, de que era preciso também ampliar os instrumentos de saída da justiça"



1 - JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

1.1 - EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Os antigos Juizados de Pequenas Causas foram inspirados na experiência norte-americana bem sucedida do Small Claims Court de Nova Iorque, que representa um exemplo de efetividade a ser seguido.
Em 1982, o então Ministro Hélio Beltrão que coordenava o Projeto Nacional de Desburocratização, percebeu que o judiciário brasileiro não estava preparado para a assistência jurisdicional às causas de menor valor.
Embora essas causas fossem em grande número, as mesmas não eram pleiteadas, face à ausência de previsão legal.
Neste mesmo ano, o Ministro Hélio Beltrão preparou e publicou o esboço do anteprojeto, depois de uma consulta popular dando origem à lei dos Juizados de Pequenas Causas.
No Brasil, mesmo antes do surgimento destes juizados, os Tribunais de Justiça dos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Bahia já faziam a composição de litígios de menor valor através de Conselhos de Conciliação e Arbitramento.
Com a Lei 7.244/84, o então experimental Conselho de Conciliação e Arbitramento foi denominado Juizado de Pequenas Causas, sendo reconhecido o seu sucesso na composição de litígios das causas de menor valor. Iniciava-se, com isso, a solidificação de um procedimento célere, simples, econômico e que garantiria o devido processo legal em todas as suas fases.

Com a Lei 7.244/84 o então experimental Conselho de Conciliação e Arbitramento foi rebatizado como Juizados de Pequenas Causas, sendo reconhecido o seu sucesso na composição de litígios de menor valor.
De acordo com registros, Antônio Guilherme Targer Jardim na Comarca do Rio Grande do Sul, Celso Rotoli de Macedo na Comarca de Curitiba-PR e José Luiz Pessoa Cardoso na Comarca de Barreiras-BA foram os primeiros juízes dos novos Juizados de Pequenas Causas em seus respectivos estados. Luiz Carlos Saldanha Rodrigues, de Campo Grande-MS, foi o primeiro juiz de Juizados Especiais Criminais.
Roberto Portugal Barcellar delimita bem o objetivo dos juizados, quando assim preleciona sobre o tema:
Os Juizados de Pequenas Causas, historicamente, foram fundamentais para "bater o pó" dos tradicionais autos do processo e fazer vislumbrar um novo semblante para a Justiça, obscurecida pela falta de indignação, iniciativa e criatividade dos até então acomodados Legisladores e juristas.




1.2 - PRINCÍPIOS PROCESSUAIS

1.2.1 - Considerações preliminares

Com a adoção dos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade aos procedimentos que estão previstos na lei 9.099/95, esta se cumprindo o dispositivo constitucional que prevê um "procedimento oral e sumaríssimo" em seu Artigo 98, I. Segundo Damásio de Jesus , todas as regras da referida lei, deverão ser interpretadas visando a garantir esses princípios.
Busca-se na lei, a harmonização do procedimento sumário, inclusive em nível transacional, com as garantias do devido processo legal.

1.2.2 - Princípio da oralidade

O Princípio da oralidade tem como base a forma oral no tratamento da causa, ou seja, a afirmação de que as declarações elaboradas oralmente possuem mais eficácia. Na imposição deste critério, o legislador não quis referir-se a exclusão do procedimento escrito, e sim a superioridade da forma oral na condução do processo.
A experiência bem sucedida da forma oral demonstra que ela é a melhor de acordo com a natureza dos novos tempos. A forma escrita, de qualquer maneira não foi excluída conforme disposto no Artigo 65, §3º.


"Serão objeto de registro escrito exclusivamente os atos havidos por essenciais. Os atos realizados em audiência de instrução e julgamento poderão ser gravados em fita magnética ou equivalente." (grifo nosso)



Pelo princípio da oralidade, o que se vê é o predomínio da palavra falada sobre a escrita, sem que esta seja afastada.

1.2.3 - Princípio da simplicidade

Este princípio tem a missão de reduzir tanto quanto possível à quantidade de materiais que são juntados aos autos do processo, sem prejuízo do resultado da prestação jurisdicional, reunindo apenas os essenciais num todo harmônico.
Busca-se simplificar a aplicação do direito abstrato nos casos concretos, quer na quantidade, quer na qualidade dos meios empregados para a composição da lide, sem burocracia.
É valorada a independência do juiz na deliberação sobre as provas que serão produzidas, assim como em sua apreciação, valendo-se dos indícios e presunções legais, tomando como base a razão e a ética para o saneamento de possíveis imperfeições da lei ou até mesmo abrandando seu rigor.
Assim, esta prevista na lei a dispensa do inquérito policial no artigo 69 da referida lei (vide 3.1) e do exame de corpo de delito para o oferecimento da denúncia com admissão da prova de materialidade do crime por boletim médico ou prova equivalente, de acordo com o artigo77§1º.

Artigo 77 [...]
§1º "Para oferecimento da denúncia, que será elaborada com base no termo de ocorrência referido no Artigo 69 desta lei, com dispensa do inquérito policial, prescindir-se-á do exame do corpo de delito quando a materialidade do crime estiver aferida por boletim médico ou prova equivalente." (grifo nosso)



Por isso, a lei afasta do Juizado as causas mais complexas ou que exijam maiores investigações, como é o caso de remeter ao juízo comum os autos do processo, quando não for encontrado o autor para a citação pessoal.

1.2.4 - Princípio da informalidade

O princípio da informalidade revela a desnecessidade da adoção da rigidez formal no processo. Diz Mirabete que:

Embora os atos processuais devam realizar-se conforme a lei, em obediência ao fundamental princípio do devido processo legal, deve-se combater o excessivo formalismo em que prevalece a prática de atos solenes estéreis e sem sentido sobre o objetivo maior da realização da justiça



Não se podem afastar regras gerais do processo quanto a atos que possam ferir interesses da defesa ou da acusação ou causar confusão processual, dispondo a lei, que devem ser aplicadas subsidiariamente nos Juizados as disposições do CP e CPP nas que forem incompatíveis com ela, com dispõe o art. 92 do Código de Processo Penal.


Artigo 92 "Aplicam-se subsidiariamente as disposições dos códigos penal e processo penal, no que forem incompatíveis com esta lei."

O Juiz não esta isento de observar um mínimo de formalidades essenciais para a prática de determinados atos processuais. Não se trata da supressão de atos processuais, e sim da possibilidade de praticá-los de forma livre e plausível, desde que atinjam o seu objetivo.

1.2.5 - Princípio da economia processual

Através do princípio da economia processual entende-se que se deve escolher o caminho menos oneroso às partes e ao próprio Estado. Também são buscados o máximo resultado na utilização do direito com o mínimo possível de atos processuais, inclusive descartando os inúteis.
Desta forma, não significa que sejam suprimidos atos previstos no rito processual estabelecido na lei, mas sim a possibilidade de optar pela forma que causa menos encargos. Sendo assim, evita a repetição inconseqüente e inútil de atos processuais e concentra todos os atos em uma mesma oportunidade no qual é critério de economia processual.
Exemplos dessa orientação são a abolição do inquérito policial e a disposição que prevê a realização de toda a instrução e julgamento em única audiência, evitando-se tanto quanto possível sua pluralidade. Além disso, preconiza-se o aproveitamento dos atos processuais, poupando-se tempo tão precioso e escasso nas lides forenses.

1.2.6 - Princípio da celeridade processual

O princípio da celeridade processual diz respeito à necessidade de agilidade e rapidez no processo, com a finalidade de prestação jurisdicional no menor tempo possível. Nos JECRIMS, busca-se a redução do tempo entre a prática da infração penal e a solução jurisdicional, evitando a impunidade pela prescrição dando uma resposta rápida à sociedade na realização da Justiça Penal.
Por isso, prevê a lei que a autoridade policial, tomando conhecimento da ocorrência, deve lavrar o termo circunstanciado, remetendo-o com o autor do fato e a vítima, quando possível, ao Juizado. Estando presentes esses no Juizado, já se pode realizar a audiência preliminar, propondo-se a composição e em seguida, a transação, que obtidas, serão homologadas pelo juiz. (vide 2.3.1)

1.3 - PROCEDIMENTO E AMPLA DEFESA

A informalidade e a oralidade asseguram a necessária agilidade ao processo, visto que o procedimento escrito, exigido pelo artigo 9º do CPP, mostrou-se, aos menos no tocante as infrações de pequena monta, fonte inesgotável da pretensão punitiva, com altos custos sociais, diz Damásio de Jesus .
Na lei, embora se estabeleça um rito sumaríssimo e informal, a ampla defesa não foi deixada de lado, conciliando-a com a necessidade de maior eficiência na prestação jurisdicional. Por este motivo, a citação pessoal é obrigatória, sob pena de remessa dos autos ao juízo comum, com fulcro no artigo 66, parágrafo único do mesmo diploma legal.
Segundo Damásio de Jesus , justifica-se a regra, pois seria difícil conceber o exercício pleno da defesa técnica e da autodefesa num processo sumaríssimo em que o réu fosse revel.
Com essa atitude evita-se a argüição de inconstitucionalidade, por ferir o princípio da ampla defesa. O STF, em sua Súmula 523, consagrou o entendimento de que a ausência de defesa, no processo penal é causa geradora de nulidade absoluta do processo.

Súmula 523 "No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas sua deficiência só anulará se houver prova de prejuízo para o réu" (grifo nosso)



O rito sumaríssimo está previsto nos arts. 77 a 81 da Lei 9.099/95 e só ocorrerá caso não tenha sido realizada a transação na audiência preliminar, seja pela ausência do autor da infração, seja pela ausência dos requisitos para propositura ou por não ter o autor da infração aceitado a proposta de transação. Será oferecida denúncia, seguindo-se a audiência de instrução e julgamento.
Aberta a audiência será dada a palavra ao defensor para responder à acusação, antes da denúncia ou queixa ser recebida de acordo com o artigo 81 desta lei. Recebida a peça de acusação, o réu será interrogado após o encerramento da instrução. Deste modo, a ampla defesa é totalmente resguardada, assegurando-se o pleno exercício da defesa técnica, que atua antes mesmo do recebimento da denúncia.

1.4 - A CRIAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

A criação dos Juizados Especiais Criminais está previsto no art. 98, I da Constituição Federal da República e disciplinada no art. 60 do texto da lei 9.099/95, como disposto a seguir:

Artigo 60. "O Juizado Especial Criminal, providos por juízes togados ou togados e leigos tem competência para conciliação, o julgamento e a execução das infrações de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência."


Os Juizados Especiais Criminais foram um marco histórico, em um momento em que uma política criminal mais humanista era uma tendência mundial. O Brasil caminhava na contramão da história, aplicando leis mais severas, aumentando penas, restringindo benefícios a criminosos e ampliando as prisões preventivas.
Com o advento dos JECRIMS, como são conhecidos, houve uma revolução no sistema judiciário brasileiro com a extinção do inquérito policial, a implantação da transação penal, da suspensão condicional do processo, a ampliação das hipóteses de disponibilidade da ação penal e a aplicação de medidas alternativas.
Nos juizados Especiais criminais foi adotado um sistema de despenalização onde a criminalidade violenta continua recebendo tratamento punitivo proporcional, porém as infrações de pequeno potencial passam a ser mais bem tratadas sem aplicação de pena. Entende-se que com a aplicação deste novo sistema, não se pretende acabar com a criminalidade, e sim reduzi-las a níveis toleráveis.
É importante mencionar o programa adotado em Nova Iorque que é chamado de "Tolerância Zero", no qual a punição nos casos de pequenos delitos passou a inibir a ocorrência de crimes mais violentos.
Segundo Roberto Bacellar , a criminalidade em algumas capitais brasileiras está extrapolando os níveis sustentáveis e é necessário refletir sobre a importância do enfrentamento da criminalidade nesse preocupante universo.





1.4.1 - Objetivo dos juizados especiais criminais

A finalidade dos JECRIMS é sempre que possível, buscar a conciliação ou a transação penal. Assim sendo, seu objetivo basilar é alcançar a paz social com um mínimo de formalidades nos casos de infrações de menor gravidade.
Desta forma, se busca a composição de dano social, prevendo-se a reparação imediata do mesmo, através da composição ou a transação.
Tais medidas, antes vedadas na área criminal quanto às ações penais públicas, passaram a ser admitidas pela Constituição Federal nas causas de competência dos Juizados Especiais.
Com isso, de acordo com Mirabete , mitiga-se o princípio da obrigatoriedade, que era de aplicação absoluta nas ações penais pública. Possibilitando elas no bojo do procedimento, rápida solução do conflito de interesses, com a aceitação das partes envolvidas. Caso não seja obtida a composição dos danos civis, na audiência preliminar o ofendido ou seu representante legal pode oferecer a queixa, quando tiver elementos necessários à formação da culpa nos termos do artigo 77 § 3º.

Artigo 77[...] §3º "Na ação penal de iniciativa do ofendido poderá ser oferecida queixa oral, cabendo ao Juiz verificar se a complexidade e as circunstâncias do caso determinam a adoção das providências previstas no § único do artigo 66 desta lei.

Em relação aos danos sofridos pela vítima, quando o crime acarreta uma lesão real ou potencial, fica o autor do fato obrigado a reparar o dano, seja por dolo ou culpa.




1.4.2 - Criação dos juizados especiais criminais federais

Com a emenda constitucional 22 de 18 mar. 1999, o art. 98 da C.F, passou a contar com um parágrafo único, que permitiu a criação de juizados especiais criminais federais.

Art. 98 [...] parágrafo único. "Lei federal disporá sobre a criação de juizados especiais no âmbito da justiça federal" (grifo nosso)

Esta lei federal teve a colaboração de vários juristas brasileiros, a AJUFE (Associação dos juízes Federais do Brasil), por meio de seu presidente Tourinho Neto, constitui uma comissão integrada por juízes federais, que tinham o objetivo de buscar boas sugestões e idéias para nova lei.
Em 12 set. 2000. , o anteprojeto que instituiu os juizados especiais criminais e cíveis na justiça federal, foi aprovado pelo Supremo Tribunal de Justiça e encaminhado ao presidente da República. Com algumas restrições como a supressão da previsão de juiz leigo nos juizados federais, a comissão manifestou-se favorável aos termos do anteprojeto que convertido em projeto resultou na lei 10.259 de 12 jul. 2001.
Veremos adiante na subseção 1.6, que a lei 10.259/01, trouxe grandes mudanças e discussões no que concerne a definição de menor potencial ofensivo e alteração do seu artigo2º, pela lei 3.313/06.

1.5 - JUÍZES TOGADOS E LEIGOS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

O artigo 98, I da Constituição Federal, dispõe que os Juizados Especiais serão providos por Juízes togados e leigos, como podemos observar na redação deste diploma legal:

Artigo 98 [...] I ? "Juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, [...] "(grifo nosso)

É permitido ao legislador estadual que componha os JECRIMS apenas com Juízes togados, isto é, os pertencentes à Magistratura, ou estes e leigos.
Entretanto, por força de lei federal, os leigos serão apenas conciliadores que, auxiliares da justiça, estarão sob supervisão do Juiz, na forma que dispuser a lei que os criar. Em relação ao problema de jurisdição, não poderá o legislador estadual ao criar os JECRIMS estaduais, conceder aos leigos o poder de julgar, quebrando ou mitigando o monopólio estatal da jurisdição penal.
Para Ada Pellegrini Grinover , a atuação dos juízes leigos visa conceder maior celeridade e facilidade na conciliação, agindo como auxiliares da Justiça Criminal, função que pode ser exercida por pessoas que não pertencem aos seus quadros.
A homologação da composição dos danos e a aplicação de penas decorrentes da transação sempre serão incumbidas ao Juiz togado. Aos Juízes leigos, caberão tarefas que lhe forem atribuídas pela lei estadual, principalmente na condução no entendimento das partes visando à composição.

1.6 - INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

1.6.1 - Conceito de infrações de menor potencial ofensivo

Anterior a Lei 11.313/06, que trouxe alterações ao conceito de infrações de menor potencial ofensivo (vide 1.8), a Lei 9.099/95, deliberava em seu artigo 61, sobre o conceito desta espécie de crime, com a seguinte redação:

Artigo 61 "Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a um ano, excetuados os casos em que a lei preveja procedimento especial."
(grifo nosso)


Desde então, todas as infrações que possuíssem procedimento especial e com pena máxima superior a um ano, não seriam competência dos JECRIMS.
Houve várias críticas por parte de doutrinadores e estudiosos do Direito, que diziam que o legislador comum não poderia ter excetuado dos JECRIMS estaduais, os delitos que possuíssem procedimento especial e crimes que tivessem pena máxima superior a um ano, sob o argumento de que se feriria o Princípio da Igualdade, visto que estabelecia para delitos com mesmo limite de pena, foro diferenciado.
Bem antes, havia bastante discussão sobre qual seria o critério para definição de crimes de menor potencial ofensivo. Para alguns doutrinadores, deveria se levar em conta o limite da pena e para outros que deveria ser a insignificância da lesão ocasionada pelo autor do fato e enquanto para outros o mais importante seria o bem jurídico tutelado. No entanto, a Lei 9.099, fez opção pelo critério objetivo, ou seja, pena não superior a um ano.
Como pudemos observar as contravenções penais são de competência dos juizados especiais criminais na esfera estadual, independente da pena, contudo no âmbito federal não poderão ser julgadas, nos termos do artigo 109, IV, da CF:

Artigo 109 "Aos juízes federais compete processar e julgar:"
Inciso IV "Os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, [...], excluídas as contravenções e ressalvada a competência da justiça militar e da justiça eleitoral;" (grifo nosso)



Com a criação do Juizado Especial Federal Criminal através da Lei 10.259/01, como era previsto no § único do artigo 98 da Constituição Federal, houve uma grande mudança no conceito de crime de pequeno potencial ofensivo, pois em seu artigo 2º § único, delineava o seguinte:

Artigo 2º, § único "Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta lei, os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 anos, ou multa." (grifo nosso)


Deste modo, o fato do artigo 20 desta lei, prever expressamente a não aplicação dos seus dispositivos no Juizado Especial Estadual, causou no meio jurídico, diferentes correntes de pensamento, pois enquanto para uns a Lei 10.259/01 revogou o conceito de menor potencial ofensivo, previsto no art. 61 da Lei 9.099/95, para outros como Paulo Rangel , esta lei seria inconstitucional, pois trataria desigualmente os iguais, em afronta ao art. 5º, caput, da Constituição Federal.
Complementa Paulo Rangel que a referida Lei Federal somente estava autorizada a dispor sobre a criação dos Juizados Especiais Criminais no âmbito federal, sem alterar o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo, como fez.
Vejamos o exemplo, de uma pessoa que desacatasse um policial federal, ela seria julgada pelo Juizado federal com todos os benefícios (transação penal, rito sumaríssimo etc.), enquanto outra pessoa que desacatasse um policial estadual não teria este mesmo direito, visto que, o desacato tem pena máxima de dois anos. Este fato, claramente fere o princípio da igualdade.
Outra questão que merece destaque é que o legislador comum não previu, na Lei 9.099/95, se os crimes punidos com pena de multa de forma isolada, cumulativa ou alternativamente com a pena restritiva de liberdade, poderiam ou não ser considerados menor potencial ofensivo.
O entendimento que foi dado é que os crimes punidos somente com pena de multa seriam de menor potencial ofensivo, bem como, os crimes com até um ano de prisão cumulado com a pena de multa ou de forma alternativa com pena de multa.
A questão da competência dos JECRIMS em relação à conexão ou continência entre os crimes de menor potencial ofensivo, é também bastante controversa na jurisprudência e doutrina, tendo duas correntes: A primeira é que o juízo comum é competente para julgar ambos os crimes (corrente minoritária), e a segunda é que as infrações devem ser julgadas separadamente, uma pelo Juizado Especial e a outra pelo juízo comum (corrente majoritária). A primeira corrente se apresentou em face da interpretação do código de processo penal, quanto às regras de conexão em continência, que definem regras de modificação de competência. Tourinho Filho, define exatamente o conceito de conexão como:

Conexão existe quando duas ou mais infrações estiverem entrelaçadas por um vínculo, um nexo, um liame que aconselha a junção dos processos, propiciando, assim, ao julgador perfeita visão do quadro probatório e, de conseqüência, melhor conhecimento dos fatos, de molde a poder entregar a prestação jurisdicional com firmeza e justiça.


A continência ocorre quando um crime esta inserido no outro, presumindo-se somente uma única conduta, entretanto com mais de um resultado. Temos como exemplo o concurso formal de crimes, onde o agente pratica dois ou mais crimes, com uma só ação, idêntica ou não, como podemos ver no artigo 70 do Código Penal.





1.6.2 - As infrações de menor potencial ofensivo e o princípio da insignificância

Primeiramente, é importante definir que há diferença entre o crime de menor potencial ofensivo e o princípio da insignificância. Pois o princípio da insignificância exclui a tipicidade e o direito penal só vai até onde é necessária a proteção do bem jurídico.
Segundo Paulo Rangel , a tipicidade penal exige ofensa grave aos bens jurídicos penalmente protegidos para que possa caracterizar suficientemente o injusto penal. È indispensável uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se quer punir e a necessidade da intervenção estatal.
Embora, um funcionário público que tenha se apropriado de uma caneta de sua repartição, caracterizando crime tipificado no artigo 312 do CP (crime de peculato), não deve o Estado aplicar sanção àquele que o fez. Apesar de o fato exemplificado estar previsto no Código penal, não faz jus à atenção do Estado.
Os crimes de menor potencial ofensivo são aqueles que possuem potencialidade lesiva e merecem atenção do Estado, porém não devem ser punidos com pena privativa de liberdade, admitindo-se a transação penal.

1.7 - A CITAÇÃO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

Como é assegurado em nossa Carta Magna, pelo Princípio da Ampla Defesa, é imprescindível que os acusados sejam cientificados da existência do processo e de todo o seu desenvolvimento. Ninguém pode ser processado sem que tenha ciência da acusação que lhe faz, o que é feito por meio por meio de ato processual denominado citação.
Os JECRIMS, colocando em prática os Princípios da Informalidade, Simplicidade e Celeridade Processual, determinam que a citação seja efetuada no próprio Juizado, como disposto no artigo 66 da referida lei:


Artigo 66 "A citação será pessoal e far-se-á no próprio Juizado, sempre que possível, ou por mandado." (grifo nosso)


Caso o autor do fato tenha comparecido à audiência preliminar, ou porque foi encaminhado por autoridade policial, ou porque foi intimado do aditamento, quando se pode ser proposta a conciliação e posteriormente a transação, o autor pode ser citado pessoalmente em Juízo.
Se o autor da infração não comparecer na audiência preliminar, será feita uma tentativa de citação pessoal por mandado, o qual constará que deve comparecer em juízo com seu advogado, e que caso não tenha um advogado, será nomeado um defensor dativo.
Não havendo a composição ou transação se inicia o procedimento sumaríssimo e em seguida, estando o acusado presente, será ele citado no próprio Juízo com a entrega da cópia requisitória, e cientificado do dia e hora para a audiência de instrução e julgamento. No Juizado a citação é feita pelo próprio escrivão, medida que não é aceita no Juízo comum.



1.7.1 - Possibilidade de citação por edital no juizado especial criminal

Na tentativa de execução do mandado de citação, o oficial de justiça deve proceder às diligências necessárias a localização do autor do fato com o elemento fornecido nos autos que devem constar no mandado, sob pena de nulidade. É possível que expedido o mandado de citação, não seja o citando encontrado, nem haja outros elementos que possibilitem que o acusado seja cientificado pessoalmente.
Ao contrário do Juízo comum, em que se realiza a citação por edital, fica excluída essa possibilidade no Juizado Especial Criminal, pois esta modalidade de citação não é compatível com o rito célere adotado na Lei 9.099/95, determinando a lei que o Juiz deva encaminhar as peças ao Juízo comum para adoção do procedimento previsto no § único da artigo 66:
Artigo 66 [...] § único "Não encontrado o acusado para ser citado, o Juiz encaminhará as peças existentes ao Juízo comum para adoção do procedimento previsto em lei." (grifo nosso)


Segundo Paulo Rangel, trata-se de uma exceção ao disposto do § 1º do artigo 366 do CPP, que dispõe sobre a citação por edital no juízo comum.

1.8 ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 11.313/06

As alterações realizadas por esta lei, nos artigos 60 e 61 da Lei 9.099/95 e no artigo 2º da Lei 10.259/01, deram um novo conceito aos crimes de menor potencial ofensivo e competência nos casos de conexão e continência entre crimes de menor potencial ofensivo e delitos de competência de juízo comum.
As novas redações destes artigos ficaram desta forma:

Artigo 60 "O Juizado Especial Criminal, provido por Juízes togados ou togados e leigos, tem como competência para conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo respeitadas as regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos de transação penal e da composição dos danos civis". (grifo nosso)

Artigo 61 "Consideram-se as infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta lei, as contravenções penais e os crimes a que lei comine pena máxima não superior a dois anos, cumulada ou não com multa." (grifo nosso)

A nova redação do artigo 2º da Lei 10.259/01 ficou desta forma:

Artigo 2º "Compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os feitos de competência da Justiça federal relativo às infrações de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e competência". (grifo nosso)
§ único "Na reunião de processos, perante o juízo comum ou tribunal do júri, decorrente da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos de transação penal e da composição de dano." (grifo nosso)

A opinião de alguns doutrinadores é de que não havia necessidade das alterações nas respectivas leis, já que a doutrina e jurisprudência já estavam alinhavadas quanto à interpretação dos referidos diplomas legais. Segundo Valdinei Coimbra , o legislador foi óbvio quando dispôs que nos casos de reunião de processos no juízo comum ou no tribunal do júri, por força de conexão ou continência, deve ser observar a aplicação da transação penal e da composição de danos civis, previstos na Lei 9.099/95. Dessa forma, deverá o Ministério Público, nos casos de continência ou conexão, entre os delitos de menor potencial e os de competência do juízo comum, oferecer denúncia em relação a este e em relação ao crime de menor potencial propor a transação, com fulcro no artigo 76 desta lei.
Conclui Valdinei Coimbra, que as alterações promovidas pelo legislador, sobre o conceito de crime de menor potencial ofensivo, assim como, acerca da competência dos JECRIMS, sejam no âmbito federal ou estadual foram feitas de forma precipitada e sem necessidade.


1.9 - ALTERAÇÕES DE COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

1.9.1 - Lei Maria da Penha ? lei 11.340/06

No dia sete de agosto deste ano, o Presidente Luís Inácio Lula da Silva, sancionou a Lei 11.340/06, que foi batizada de Lei Maria da Penha. No dia 29 de maio de 1983, a biofarmacêutica Maria da Penha, foi vítima de violência doméstica pelo seu próprio marido, que atirou contra ela, enquanto ela dormia. Na época, a biofarmacêutica sofreu danos irreversíveis, ficando paraplégica. Este caso sensibilizou órgãos internacionais e provocou forte reação no Brasil em relação ao combate à violência doméstica contra a mulher.
De acordo com Fabrício da Mota Alves , houve grandes mudanças com esta Lei que é um verdadeiro estatuto no combate à violência doméstica e familiar. As mudanças foram, por exemplo, sobre os papeis da autoridade policial e do Ministério Público. Ocorreram também alterações no Código Penal, Código de Processo Penal, Lei de Execuções Penais e principalmente sobre sua competência que é o nosso foco principal neste capítulo.
Antes desta lei, o crime de violência doméstica era considerado crime de menor potencial ofensivo e de competência dos Juizados Especiais Criminais, pois o dispositivo afetado tratava de crime de lesão corporal leve, isto é, com pena de detenção de seis meses a um ano.
De acordo com o artigo 41 da nova Lei:

"Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei 9.099/95." (grifo nosso)

No entanto, os JECRIMS pareciam não solucionar este grave problema, tendo servido apenas como porta de entrada ao Judiciário para as mulheres vítimas desse tipo de violência, haja vista, a baixa repressão contra os agressores e a impunidade.
Era observado, que os réus, quando condenados, eram obrigados apenas a pagarem uma cesta básica ou prestar serviços comunitários, levando à banalização da violência doméstica e desestimulando as vítimas a denunciar esses crimes.
Esta lei, também se destaca pelo resgate do inquérito policial, anteriormente descartado pela lei 9.099/95, e substituído pelo termo circunstanciado, aplicável nos crimes de menor potencial ofensivo. Também a nova lei admiti a prisão em flagrante e prisão preventiva do agressor, assim como, o encaminhamento da vítima para exames de corpo de delito e outros exames periciais caso sejam necessários.
A nova lei em seu artigo 17 proíbe a aplicação de penas pecuniárias, além de vedar a aplicação isolada de multa em substituição às penas cominadas que o permitem.
O artigo 11 estabelece as condutas de proteção e de orientação da autoridade policial, como, por exemplo, garantir proteção e comunicação imediata ao MP e ao Poder Judiciário; encaminhamento da ofendida ao hospital e ao IML; fornecimento de transporte à ofendida e seus acompanhantes para abrigo ou local seguro, dentre outros.
A pena máxima que antes era de um ano passa para três anos e a pena mínima de seis meses passa a ser de três meses. Caso a vítima seja deficiente físico, a pena será aumentada em um terço.
1.9.2 - Nova Lei de Tóxicos ? Lei 11.343/06

A Lei 11.343 ? a nova Lei de tóxicos, sancionada no último dia 23 de agosto, criou o SISNAD (Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas), que tem como principal objetivo prescrever medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelecer normas para a repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas.
Esta nova lei revogou as leis 6.368/76 e 10.409/02, que versavam sobre o mesmo assunto. O principal avanço desta lei foi à eliminação da pena privativa de liberdade, a qual foi substituída por medidas sócio-educativas.
Antes, o indivíduo que não atendesse aos requisitos para beneficiar-se pela transação penal, seria processado, podendo ser condenado a pena privativa de liberdade. Hoje, embora possa ser processado, não mais sofrerá tal pena em razão de eventual condenação em processo criminal.
Por outro lado, o crime de tráfico de drogas, teve sua pena aumentada, a exemplo, a pena que anteriormente era de 3 a 5 anos passou a ser de 5 a 15 anos, além de 500 a 1.500 dias-multa.
O tráfico internacional continua sendo de competência da Justiça Federal. Pelas leis antigas, quando uma comarca não tivesse instalado uma Vara Federal em sua localidade, a Justiça Estadual julgaria o crime. Pela nova lei, será de competência da vara federal mais próxima para o julgamento dos delitos dessa natureza.


2 - TRANSAÇÃO PENAL

2.1 - O CONCEITO DE TRANSAÇÃO PENAL

Segundo a Escola Paulista do Ministério Público, a transação penal é um instituto jurídico novo, que atribui ao Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública, a capacidade de dispor, desde que atendidas às condições previstas na lei, propondo ao autor da infração de menor potencial ofensivo a aplicação, sem denúncia e instauração de processo, de pena não privativa de liberdade. Tal conceito de transação penal podemos encontrar em obra já citada de Mirabete .

2.2 - NATUREZA JURÍDICA DA TRANSAÇÃO PENAL

De acordo com Mario Antônio Lobato , a transação penal é um instituto decorrente do Princípio da Oportunidade de propositura de ação penal, a qual confere ao seu titular, o Ministério Público, a faculdade de dispor da ação penal, isto é, de promovê-la, sob certas condições, partindo-se do Princípio da discricionariedade regulada. O Ministério Público somente poderá dispor de ação penal nas hipóteses previstas legalmente, desde que exista a concordância do autor da infração e a homologação judicial.



2.3 - COMPOSIÇÕES DE DANOS ANTES DA PROPOSTA DE TRANSAÇÃO PENAL

2.3.1 - Acordo civil

Segundo Ada Pellegrini Grinover , a composição dos danos é uma forma de despenalização, visto que, na ação penal privada e na ação penal pública condicionada à representação, leva à extinção de punibilidade, como previsto no artigo 74 § único desta lei.


Artigo 74 § único: "Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação pública condicionada `a representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação." (grifo nosso)



Esta é uma importante inovação desta lei, pois até então, a renúncia era exclusividade da ação penal privada.
De acordo com Paulo Rangel, o escopo da lei 9.099/ 95, é tentar ao máximo o consenso, o acordo, a reparação dos danos sofridos pela vítima e aplicação da pena não privativa de liberdade.
Na ação pública condicionada, só na hipótese de não terem as partes se conciliado quanto aos danos civis, com a correspondente homologação do acordo, a audiência de conciliação prosseguirá, estabelecendo que a vítima ou seu representante legal exerça o direito de representação verbal na própria audiência. Desta forma, a representação será reduzida a termo, dando-se continuidade ao rito e verificando-se a possibilidade de transação penal.
Na ação penal privada, caso não seja realizada a composição civil, a queixa será oferecida, oralmente, na própria audiência preliminar. Neste caso, não é prevista em lei a possibilidade de transação penal, porém a grande parte dos autores entende ser possível sua aplicação, pois a Carta Magna previu o cabimento da transação aos crimes de menor potencial ofensivo, não constituindo qualquer distinção entre os crimes de ação pública ou privada.
Na ação pública incondicionada, o magistrado elucidará sobre a possibilidade de acordo civil e da proposta de transação. O juiz também explicará que a composição dos danos civis não impedirá a propositura da ação penal. Assim, iniciará a tentativa de conciliação, que será conduzida pelo juiz ou por conciliador. Realizada a composição, bem como, sua homologação, será reduzida a termo. Logo após, o MP poderá requerer o arquivamento do feito ou propor transação penal, caso esteja presente os requisitos legais. (vide 2.4).
O juiz ou conciliador poderá sugerir às partes o valor que lhe parecer justo e caso não ache justo os termos para a composição dos danos, não o homologará. Cabe o recurso de apelação, no caso do juiz reduzir ou ampliar os limites do acordo civil.
O acordo homologado pelo juiz togado mediante sentença, além de acarretar renúncia ao direito de queixa ou de representação na ação penal privada ou pública condicionada, é considerado um título executivo, podendo ser feita a execução civil do acordo no próprio juizado especial.
É importante notar que, é a homologação do acordo que extingue a punibilidade do autor e não o seu efetivo cumprimento.

2.3.2 - A Lei 9.099 e o princípio da indisponibilidade

No Juízo comum, uma vez a ação penal pública é proposta em face do autor do fato ilícito, não pode o Ministério Público mais desistir da lide, pois o direito de punir pertence ao Estado. Portanto o MP não pode dispor daquilo que não lhe pertence.
Nos Juizados Especiais Criminais, o princípio da indisponibilidade foi mitigado. Na Audiência de Instrução e Julgamento, antes do oferecimento da transação penal, haverá uma tentativa de composição civil dos danos. Ocorrendo a composição civil dos danos, homologada pelo Juiz e sendo o caso de ação penal pública condicionada a representação, haverá retratação da representação que acarretará a renúncia, não restando alternativa ao Ministério Público a não ser desistir da ação.
Em relação à suspensão condicional do processo, o Ministério Público ao oferecer denúncia e fazer a proposta de suspensão, que caso seja aceita pelo acusado e homologada pelo juiz, paralisa o processo e conseqüentemente extingue a punibilidade.
De acordo com Paulo Rangel , o princípio da indisponibilidade da ação penal sofreu estas duas exceções nos Juizados Especiais Criminais.

2.4 - A PROPOSTA DE TRANSAÇÃO PENAL

A proposta de transação penal é exclusiva dos Juizados Especiais Criminais quando se trata de infração de pequeno potencial ofensivo, isto é, de acordo com a nova redação do artigo 61 desta lei, crimes que a lei comine pena máxima não superior a 2 anos.
É realizada a proposta de transação quando existem elementos suficientes para a propositura da ação penal pública. Se for o caso de ação pública incondicionada, o Ministério Público pode propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa, tendo sido ou não realizada a composição dos danos sofridos pelo ofendido. Neste caso, vítima não interfere na proposta de transação, que se realiza independente de sua vontade.
Para a ação pública condicionada, bem como, para a ação privada, a homologação do acordo civil acarreta a renúncia tácita ao direito de representação ou queixa.
Ocorrendo a homologação do acordo, o juiz aplicará pena restritiva de direitos ou multa. No entanto, caso o magistrado entenda que a transação não é cabível, não homologará o acordo e enviará os autos ao procurador-geral de justiça, em aplicação analógica do art. 28 do CPP, podendo o procurador concordar com o juiz e determinar o oferecimento da denúncia ou insistir na proposta, hipótese em que o juiz será obrigado a homologá-lo.
De acordo com o Enunciado n° 2 do IV Encontro de Coordenadores de Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Brasil:

"O Ministério Público pode propor diretamente transação penal, independentemente de comparecimento da vítima à audiência preliminar, nos casos que independem de representação"


Segundo Mirabete , esta orientação deve ser estendida às hipóteses de ação penal pública condicionada, uma vez que há qualquer impedimento para transação nesse caso.
Não existe impedimento para que o autor da infração através de seu defensor apresente proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade, embora a lei se refira especificamente ao Ministério Público.
Para que a proposta de transação penal com fulcro no artigo 76 da lei 9.099/95 seja aceita, é necessário que o autor do fato não tenha sido condenado definitivamente por crime com pena privativa de liberdade; que ele não tenha sido beneficiado anteriormente num prazo de cinco anos pela transação penal e que os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como, os motivos e as circunstâncias, não indiquem ser medida necessária e suficiente.
O prazo de 5 anos, referido acima, conta-se da data em que foi realizada a primeira transação até a audiência preliminar referente ao segundo delito.
Na apreciação de Damásio de Jesus , não existe qualquer prejuízo a sociedade, no oferecimento ao infrator da transação penal, pois nas infrações de menor potencial ofensivo a possibilidade de imposição de pena privativa de liberdade é pequena.
Ficará a critério do autor da infração aceitar ou não a proposta feita pelo Ministério Público. Segundo Mário Antônio Lobato de Paiva :

"Embora a lei não faça menção poderá se efetuada uma contraproposta pelo autor do fato e seu defensor"


Se houver discordância entre o autor do fato e seu defensor à aceitação da proposta, visto que a transação é consensual e bilateral, esta não poderá ser apreciada pelo juiz, uma vez que o magistrado não poderá homologar a transação sem consenso das partes.
A proposta de transação penal somente ocorrerá depois de uma verificação por parte do Ministério Público, que não se trata de caso de arquivamento.

2.4.1 - Concurso de pessoas na proposta de transação penal e a indivisibilidade

Não está prevista nesta Lei, a proibição de que a proposta seja formulada, no caso de concurso de pessoas, à somente um dos co-autores. Também não existe impedimento que um aceite e o outro rejeite a proposta.
Diz Paulo Rangel , que ao permitir a transação, o legislador rompe com a indivisibilidade da ação penal. Ele cita o caso de três médicas que eram autoras de uma infração penal de menor potencial ofensivo (omissão de socorro), porém somente uma aceitou a transação, se livrando do processo. As outras duas prosseguiram com o processo e foram condenadas.
Desta forma o princípio da indivisibilidade da ação penal de iniciativa pública nas infrações de menor potencial ofensivo foi mitigado pelo legislador.
No caso de a proposta ser aceita, em relação a um dos autores, este pode ser arrolado como testemunha da acusação ou da defesa, inclusive em uma ação penal proposta posteriormente contra o outro, como pode ser visto no artigo 202 do Código de Processo Penal, "Toda pessoa pode ser testemunha"

2.5 - A RECUSA DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA PROPOSTA DE TRANSAÇÃO

Esta é uma das tantas controvérsias acerca dos limites da recusa do Ministério Público em apresentar a proposta de transação penal. Ou seja, preenchidos os requisitos pelo autor do fato para o oferecimento da transação penal, e, em se recusando o parquet em fazê-lo, poderia a parte requerer ao juiz que a conceda, ou ainda se este poderia oferecer de ofício.
A jurisprudência (Apelações Criminais # 973.693 e 968.325 do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo) refuta a idéia de que a proposta de transação penal seja faculdade do Ministério Público.
Comunga deste entendimento Damásio de Jesus que citado por Mário Antonio Lobato de Paiva, assim preleciona sobre o tema: "Desde que presentes as condições da transação, o Ministério Público está obrigado a fazer a proposta ao autuado". Assim, para Damásio de Jesus , presentes as condições, a transação penal é um direito subjetivo do autor do fato, sendo obrigado o Ministério Público à sua propositura.
Para Ada Pellegrini Grinover , a proposta de transação por parte do Ministério Público, não é uma faculdade, mas um poder-dever a ser exercido pelo acusador em todas as hipóteses que não configurar as condições do §2º no artigo 76 da referida lei.
Mirabete diz que não é possível, um instituto em que a proposta é facultativa ou discricionária do titular do direito de ação, constituir ao mesmo tempo, um direito subjetivo do autor da infração penal, de modo a possibilitar a proposta de transação penal por parte do magistrado. Seria uma contradição nos próprios termos. Também não há de se afirmar que se trata de um poder-dever do Ministério Público apresentar a proposta de transação. O que é uma faculdade, uma discricionariedade, não pode ser tida como dever.
Mauricio A. R. Lopes diz que: "Não está ao talante exclusivo do promotor de justiça, como se fosse soberano da discricionariedade". Este também é o entendimento de Cezar R. Bittencourt , bem como, a doutrina majoritária.

2.6 - A POSSIBILIDADE DE OFERECIMENTO "EX OFFICIO" PELO JUIZ

Segundo decisão no TACRIM (Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo), o juiz pode por iniciativa própria oferecer a proposta de transação, desde que silente o Ministério Público. Apesar de ser esta a interpretação veiculada pela cláusula 13 da notável Comissão Nacional, Mário Antônio Lobato Paiva diz que inexiste jurisdição sem provocação e esse principio não foi adotado pela lei, ou seja, se nem o Ministério Público nem o autor do fato se manifestam pela pena antecipada, o juiz não poderá por sua própria vontade, aplicar essa pena, pois ao mesmo tempo atuaria como acusador, defensor e julgador, o que inadmissível em nosso ordenamento jurídico. Mesmo que o juiz formule ex officio a proposta e caso o autor do fato aceite e o juiz a homologar, esta sentença homologatória deverá ser havida como inexistente, não produzindo qualquer efeito, uma vez que ela foi realizada sem concordância das partes, sem acordo, podendo ser atacada por mandato de segurança, que é o remédio constitucional para reparação do direito líquido e certo da acusação, conforme PAIVA, Mario Antonio Lobato. Juizados Especiais Criminais. P. 53 e 54.
No entanto, ao contrário do que se tem afirmado, Mirabete entende não ser a transação penal prevista no artigo 76, um direito subjetivo do autor do fato, de modo a possibilitar que seja apresentada contra a vontade do Ministério Público, quer por iniciativa do Juiz, quer por requerimento do interessado.
Cabe somente ao Promotor de Justiça optar pela apresentação de proposta ou oferecer a denúncia. Como expresso no artigo 129, I da Constituição Federal.


Artigo 129 "São funções institucionais do Ministério Público:"
I ? "Promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei." (grifo nosso)



No I Encontro de Coordenadores e Juízes das Turmas Recursais dos Juizados Especiais, decidiu-se, conforme o Enunciado Criminal nº 16 "O Juiz não pode apresentar proposta de Transação Penal em caso de inércia do Ministério Público"
Complementa Mirabete que cabe somente ao Ministério Público a parcela de soberania do Estado de promover a persecução Criminal, verificando se existem as condições necessárias para o inicio do devido processo legal, vedando-se ao Poder Judiciário, fora dos limites legais, discutir o mérito do ato discricionário do Parquet, violando o Princípio do Processo Legal.
Marcellus Pollastri Lima entende que o Juiz não pode agir de ofício, mesmo com a inércia do parquet. O Juiz quando toma a iniciativa da proposta atenta contra o Princípio da Imparcialidade e do sistema acusatório, sendo a atuação do Magistrado de ofício, incabível e inconstitucional.

2.7 - TRANSAÇÃO PENAL ? CESTAS BÁSICAS

Para os juristas mais conservadores, o fato do Estado propor este tipo de transação, é inaceitável, pois é defendida entre eles punição mais severa para os infratores.
O fato é que com a adoção de cestas básicas, na maioria das Comarcas como forma de prestação de serviços à comunidade, a Justiça Criminal vem prestando relevantes serviços à sociedade, que estão atribuindo ao Direito Penal uma função social importantíssima.
Esse procedimento, ainda que não previsto de forma explícita na lei e mesmo com a objeção de muitos, é aplicado em todas as Comarcas do Estado.
A resistência quanto à adoção de cestas básicas, tinha como argumento principal, a falta de previsão legal, a incompatibilidade com o ordenamento penal, porém depois da Lei nº 1.510/94, a polêmica sobre a possibilidade de estabelecer cestas básicas como condição da transação foi superada.

2.8 - A CONVERSÃO DE PENAS

2.8.1- Não-cumprimento da pena de multa

No tocante a transação penal, isto é, o acordo celebrado entre as partes, a lei é silente, expressando apenas no artigo 86 da referida lei que: "A execução das penas privativas de liberdade e restritiva de direito, ou multa cumulada com estas, será processada perante órgão competente, nos termos da lei".
O Princípio da Legalidade expresso no artigo 5º, XXXIX da Constituição Federal e no artigo 1º do Código Penal Brasileiro, é bem claro em estabelecer que: "Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal", levando-nos a conclusão que não é possível à aplicação de qualquer pena ao infrator que não esteja previamente prevista no nosso ordenamento jurídico.
Em relação à pena de multa aplicada em virtude de acordo, o artigo 85 da referida lei prevê expressamente, sanção por seu não cumprimento, ao expor que: "não efetuado o pagamento de multa, será feito a conversão em pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos, nos termos da lei.", porém este artigo foi revogado tacitamente pela Lei nº 9.268/95, que deu nova redação ao artigo 51 caput do Código Penal.
Era prevista esta conversão quando o condenado solvente não pagasse ou frustrasse sua execução, porém, a nova redação não prevê a conversão, tendo sido revogados o artigo 182 da LEP, que confirmava tal previsão.
Caso o infrator não efetue o pagamento na Secretaria do Juizado no prazo legal, transitado em julgado a sentença condenatória ou a homologação judicial, deve ser providenciada a execução da pena de multa.
Segundo Mirabete :

"Não se pode cogitar, de providências para instauração de ação penal por não-cumprimento de transação rescindindo-se a decisão irrecorrível"


2.9 - A TRANSAÇÃO PENAL E SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO

A transação penal é uma medida de despenalização, assim como a suspensão condicional do processo. A primeira dispõe sobre uma parcela de seus direitos e garantias e a segunda sobre o prosseguimento da persecução.
A suspensão condicional do processo esta prevista no artigo 89 desta lei como podemos ver na seguinte redação:

Artigo 89 "Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangida ou não por essa lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizam a suspensão condicional da pena. (artigo 77)" (grifo nosso)

Os requisitos subjetivos para a concessão de suspensão condicional do processo são os mesmos para a suspensão condicional da pena em seu artigo 77 do Código Penal, isto é, que o condenado não seja reincidente e que seus antecedentes, culpabilidade, conduta social e sua personalidade, assim como, os motivos e circunstâncias sejam levados em consideração para a concessão deste beneficio.
A suspensão condicional do processo, como reconheceu o STJ (HC 5.027-RJ, rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, DJU de 28-04.1997, p. 15.881):


"Se circunscreve no princípio da discricionariedade regulada, da vontade consciente do acusado e seu defensor, e da desnecessidade da aplicação da pena privativa de liberdade de curta duração, tendo em vista o menor potencial ofensivo da infração."


Diferentemente do critério para fixação da competência do Juizado Especial, ou de identificação dos delitos de menor potencial ofensivo, é considerado aqui a pena mínima e não a máxima cominada, como ocorre na transação.
Também esta expressa no dispositivo que o instituto se aplica aos crimes abrangidos ou não pela Lei 9.099/95, como bem elucida Marcellus Polastri Lima , a suspensão condicional do processo foi inserida na lei de forma oportunista, permitindo, assim, a aplicação imediata do instituto genérico, que já era previsto para vigorar na futura reforma processual penal.
Destarte, é necessário se fazer uma distinção entre estes dois institutos, que são aplicados em diferentes hipóteses.
A transação penal é realizada na fase preliminar do procedimento, sendo regida pelas infrações especificadas no artigo 61, as quais são as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, somente tendo aplicabilidade restrita a estas.
Em relação à suspensão condicional do processo, aplica-se a quaisquer crimes, cuja pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, independente de serem ou não abarcadas pela Lei 9.099, como podemos constatar na leitura do artigo 89 e parágrafos desta lei. Todavia, o art. 90-A, que foi inserido pela Lei nº 9.839/99, veda o emprego desse instituto aos crimes de competência da Justiça Militar.
A suspensão condicional também pode ser aplicada nos crimes de competência do Tribunal do Júri, uma vez, que não existe, nenhuma transgressão ao dispositivo constitucional que confere ao tribunal do júri competência para julgar os crimes dolosos contra a vida, visto que na suspensão condicional não é debatido o mérito da acusação.
O objetivo da suspensão condicional é não submeter pessoas que cometeram crimes de menor gravidade, ao convívio com perigosos marginais nesta verdadeira "escola do crime", que é o sistema prisional brasileiro, a fim de proporcionar a este infrator a ressocialização através deste período de prova e condições judiciais.
Na visão de Mirabete :

"... toda vez que essa recuperação pode ser obtida, mesmo fora das grades de um cárcere, recomendam a lógica e a melhor política criminal à liberdade sob condições, obrigando-se o condenado ao cumprimento de determinadas exigências."


2.9.1 - Natureza Jurídica da suspensão condicional do processo


A suspensão condicional do processo é uma forma de transação processual, o qual o titular da ação desiste de sua continuidade. Por outro lado o autor do fato não contesta sua culpabilidade pelo delito, submetendo-se, por um lapso de tempo, ao cumprimento de determinadas condições. Desta maneira, no fim de tal prazo, caso não tenha havido revogação, haverá a extinção da punibilidade.
De acordo com a subseção 2.3.2, este instituto é uma das exceções do princípio da indisponibilidade da ação pública, pois autoriza o Ministério Público propor a suspensão do processo.

2.9.2 ? Concurso de agentes na suspensão condicional do processo

No caso de duas ou mais pessoas acusadas da prática de um mesmo crime, é possível que apenas uma delas possa receber o benefício. É o que acontece, por exemplo, quando uma delas tem maus antecedentes ou é reincidente. Nesta hipótese, somente caberá a uma pessoa a proposta de suspensão condicional. Caso esta aceite, haverá um desmembramento do feito, para que a instrução prossiga em relação à outra.

2.9.3 ? Concurso de crimes na suspensão condicional do processo

No concurso material, a suspensão condicional somente será possível, caso a soma das penas mínimas não exceder 1 ano. No concurso formal e do crime continuado, a suspensão somente será cabível se o aumento mínimo, que é de 1/6, aposto sobre a pena mínima do crime mais gravoso, não sobrepor o limite de 1 ano.
Em um caso hipotético de concurso formal entre homicídio e lesão culposa, se levará em conta a pena mínima do homicídio culposo que é de 1 ano, porém com a incidência do aumento de 1/6 em relação ao concurso formal, será afastada a possibilidade de suspensão, visto que a pena mínima superará o limite de 1 ano. Nesse sentido, podemos citar a Súmula 243 do STJ:
"O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um ano."

3 - O TERMO CIRCUNSTANCIADO DA LEI 9.099/95

3.1 - O CONCEITO DE TERMO CIRCUNSTANCIADO

O termo circunstanciado esta elencado no artigo 69 da lei 9.099/95 e é um registro de ocorrência minucioso, detalhado, onde se qualificam as pessoas envolvidas. Porém, é realizado de maneira menos formal.
Após a lavratura do termo circunstanciado, o autor do fato é encaminhado imediatamente ao Juizado ou assume compromisso de a ele comparecer. Caso o autor não aceite comparecer ao Juizado Especial, será conduzido ao Distrito Policial para lavratura do auto de prisão em flagrante, como observado no artigo 69 § único:

Artigo 69 [...] "Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não imporá prisão em flagrante, [...]." (grifo nosso)




No § único do art. 69, determina que em caso de violência doméstica, o juiz deve, como medida de cautela, pedir o afastamento do marido do lar ou local de convivência com a vítima. Entretanto, após a Lei Maria da Penha ? Lei 11.340/06, a violência doméstica, não é mais de competência dos juizados especiais criminais. (vide 1.9.1).

Artigo 69 § único: "[...] Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima"



O procedimento investigatório preparatório da ação penal tem como objetivo a descoberta do autor do fato, assim como, as circunstâncias em que foi praticado o crime, contudo nos casos de crimes de menor potencial ofensivo o inquérito policial foi abolido, visando dar maior celeridade a esse procedimento.
Além de estar elencado no artigo 77 §1º, existe uma razão para a extinção do inquérito policial, pois os autores e vítimas, geralmente se encontram no local dos fatos, com materialidade e autoria bem definidas, não havendo necessidade de investigação para este fim.

Artigo 77 [...]
§ 1º "Para o oferecimento da denúncia, que será elaborada com base no termo de ocorrência referido no art. 69 desta lei, com dispensa do inquérito policial, [...]"


De acordo com Mirabete , coerente aos princípios de informalidade, simplicidade, oralidade e economia processual e celeridade que informam os Juizados Especiais Criminais, nas causas de sua competência, como regra deve-se substituir a lavratura do auto de prisão em flagrante e o inquérito policial, pela providência inicial de lavratura de termo circunstanciado.
Quando não for possível a identificação do autor do fato, se faz a instauração de inquérito policial para apuração da autoria do fato.
Exige a Lei dos juizados especiais criminais que o termo circunstanciado seja lavrado pela autoridade policial.

3.2 - CONTROVÉRSIAS SOBRE A EXPRESSÃO "AUTORIDADE POLICIAL"

Muito tem se debatido sobre a expressão "autoridade policial" em relação às infrações penais de menor potencial ofensivo.
Grande parte das doutrinas, afirmam que autoridade policial é todo aquele agente público que se encontre investido da função policial, ou seja, do poder de policia, podendo lavrar o termo circunstanciado ao tomar conhecimento do fato ocorrido.
Chegou-se a conclusão neste sentido no VII Encontro de Coordenadores de Juizados Especiais realizado no Espírito Santo, como pode ser visto no Enunciado a seguir.


Enunciado 34 "Atendidas às peculiaridades locais, o termo circunstanciado poderá ser lavrado pela Polícia Civil e Militar" (grifo nosso)


Em São Paulo, também foi baixado provimento pelo Conselho Superior de Magistratura, dando atribuição à Polícia Militar para a elaboração do termo circunstanciado.
A Comissão Nacional de Interpretação da Lei 9099/95 chegou ao consenso de que a expressão "autoridade policial" é quem se encontre investido em função policial, podendo a Secretaria de o Juizado proceder à lavratura de termo circunstanciado.
A Confederação Nacional do Ministério Público, também alcançou este mesmo entendimento, dizendo que autoridade policial abrange qualquer autoridade pública que tome conhecimento da infração penal no exercício do poder de polícia.
Damásio de Jesus tem este mesmo juízo, de que a expressão "autoridade policial" significa qualquer agente público regularmente investido na função de policiamento preventivo ou de polícia judiciária.
completa Damásio de Jesus :

A lei, em momento algum, conferiu exclusividade da lavratura do termo circunstanciado às autoridades policiais, em sentido estrito. Trata-se de um breve, embora circunstanciado, registro oficial de ocorrência, sem qualquer necessidade de tipificação legal do fato legal do fato, bastando a probabilidade de que constitua alguma infração penal, não sendo preciso qualquer tipo de formação técnico-jurídica para se efetuar esse relato


Contudo, o Promotor de Justiça Paulo Rangel entende, discordando de grande parte da doutrina, que a expressão autoridade policial refere-se, somente aos Delegados de Policia de carreira. O artigo 69 da referida lei mostra:

Art. 69: "A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança"

Diz Paulo Rangel, que basta examinarmos o artigo 144 §4º da Constituição Federal:


Art 144 [...] §4º "Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de atividade judiciária para a apuração de infrações penais, exceto militares." (grifo nosso)



Fica claro neste parágrafo que a autoridade policial é o Delegado de Polícia, não deixando margens a discussões acerca do assunto, define o Promotor de Justiça.
Julio Mirabete traz sua posição em ajuda a esta corrente, dizendo que esta interpretação não procede, pois o conceito de "autoridade" tem seus limites fixados no léxico e na própria legislação processual. A palavra "autoridade" significa poder, comando, direito e jurisdição, sendo largamente aplicadas na terminologia jurídica as expressões "poder de comando de uma pessoa", "poder de jurisdição", ou "direito que se assegura a outrem para praticar determinados atos relativos à pessoa, coisas ou atos."
Conclui Mirabete que é o servidor que exerce em nome próprio o poder do Estado, tomando decisões, impondo regras, dando ordens, restringindo bens jurídicos e direitos individuais, tudo nos limites da lei. Não tem esse poder, portanto, os agentes públicos que são investigadores, escrivães, policiais militares, subordinados que são às autoridades respectivas.



3.3 - A ELABORAÇÃO DO TERMO CIRCUNSTANCIADO

O termo circunstanciado deve conter os elementos necessários para a demonstração de existência de um ilícito penal, de suas circunstâncias e de autoria.
Deve-se citar de forma concisa, o fato, exatamente como chegou à autoridade policial, pela palavra da vítima, do autor, de testemunhas, de policiais, etc...
Em suma, Mirabete diz que devem ser respondidas as tradicionais questões: "Quem, Que meios? O quê? Por quê? Onde? e Quando?"
Hoje, em São Paulo existe um modelo padrão de termo circunstanciado, podendo ser preenchidos somente os espaços em branco, facilitando seu preenchimento e inclusive prevenindo omissão de informações.
Também, devem constar no termo, as diferentes versões do autor do fato, da vítima e de testemunhas. Deverão ser juntados ao termo, os documentos relacionados com a ocorrência e informações em relação aos antecedentes do autor do fato para fins do artigo 76 § 2º, I e II, isto é, os requisitos para concessão da transação penal, os quais são: O autor não ter sido condenado na prática de crime, à pena privativa de liberdade por sentença definitiva ou não ter sido beneficiado da transação anteriormente no prazo de cinco anos. (vide 2.4).

3.4 - O ARQUIVAMENTO DO TERMO CIRCUNSTANCIADO

Segundo o Artigo 76 da Lei 9.099/95, veremos que sendo caso de arquivamento, não haverá proposta de transação penal, e o mesmo deverá ser pleiteado ao juiz.

Artigo 76 "Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificado na proposta" (grifo nosso)

As hipóteses de arquivamento do termo circunstanciado não estão previstas expressamente na lei de Juizados Especiais Criminais, porém Paulo Rangel entende que são as mesmas que impedem o Ministério Público de propor ação penal, pois, como o autor do fato irá fazer uma transação penal de um fato que não é contrário a lei? A disciplina é a do artigo 43 do CPP, visto a contrário sensu e aplicado analogicamente.


Artigo 43 do CPP "A denúncia ou queixa será rejeitada quando:"
I ? O fato narrado evidentemente não constituir crime;
II ? Já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa;
III ? For manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal. (grifo nosso)


Assim, deve-se verificar se o fato citado como infração penal de menor potencial ofensivo, é típico, ilícito e culpável. Sendo, deve se verificar se é crime de ação penal pública condicionada e se há representação do ofendido. Caso contrário, deve ser arquivado o referido termo.
O pedido será feito pelo Ministério Público ao Juiz, e este, entendendo que as razões invocadas são improcedentes, deve submeter o termo circunstanciado ao Procurador-Geral, para que adote as providências do Artigo 28 do CPP, aplicado analogicamente. Do contrário, entendendo procedentes as razões invocadas, determina o arquivamento do termo circunstanciado. Respeitando o princípio da oralidade, o pedido de arquivamento será feito oralmente, na própria audiência, porém seguindo a regra geral, o pedido deverá ser fundamentado.
O juiz fiscaliza sobre o princípio da obrigatoriedade da transação penal, pois a discricionariedade do Ministério Público, no Artigo 76 da lei 9.099/95, é apenas para verificar se a hipótese é ou não de transação. Sendo deve fazê-la.

3.5 - O PRINCÍPIO DA ORALIDADE NO TERMO CIRCUNSTANCIADO

Segundo Mirabete , no Juizado Especial Criminal a elaboração do termo circunstanciado pela autoridade policial deverá conter breve resumo dos fatos, e esse relato evidentemente será fundado nas informações orais do autor, da vítima, das testemunhas e dos agentes policiais. Serão orais também os esclarecimentos que o juiz, na audiência preliminar deverá fazer às partes sobre a possibilidade de composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.
Outrossim, deverão ser feitas oralmente as propostas e a aceitação ou não da composição, reduzindo-se a termo seu resultado, a proposta pelo Ministério Público da transação e sua aceitação ou não, assim com, o oferecimento da queixa, defesa prévia, a oitiva da vítima e testemunhas, o interrogatório do acusado e os debates.













4 - O JUIZADO ESPECIAL NORTE-AMERICANO

4.1 - SMALL CLAIMS COURT (JUIZADO ESPECIAL NORTE-AMERICANO)

O Small Claims Court funciona com a parceria entre mecanismos extrajudiciais e judiciais no próprio ambiente do judiciário e a arbitragem é vinculada aos tribunais e a mediação judicial.
Também existe um grande número de auxiliares da justiça, como por exemplo: Conciliadores, árbitros e juízes leigos que em sua maior parte são advogados bastante experientes.
O Small Claims Court, bem como, o sistema judicial norte-americano em geral é conhecido pelo pragmatismo, a forma ágil e descomplicada com que o conflito é tratado. Nos Estados Unidos da América, o sistema jurídico oferece uma série de portas de acesso à justiça, além da oferta de inúmeros instrumentos privados de resolução de conflitos. Além do mais, seus cidadãos são incentivados a serem seus próprios advogados e a procurar seus direitos pessoalmente.
Citamos como exemplo as Cortes de Pequenas Causas da Florida nos Estados Unidos, as quais, os pedidos são de fácil preenchimento, inclusive podem ser formulados marcando "X" em um formulário padrão ou através de uma tecla do computador.
O autor indica o nome, endereço e o telefone dele e do réu, assinala o tipo de questão e em instantes o computador processa o dia e horário de comparecimento para a audiência, que são designados em um prazo de 15 a 20 dias. O autor também pode se encarregar de encaminhar a carta de citação ao réu, ou ele paga uma pequena taxa relativa à postagem da carta.
Em alguns estados norte-americanos é exigida a assinatura do réu para ser confirmado à revelia (default). Caso o réu não assine e não compareça, o réu é intimado pelo escritório Marshall, que é um serviço vinculado à prefeitura e que custa um pouco mais, porém este valor pode ser cobrado do réu caso o autor ganhe a causa.
De acordo com Roberto Portugal Bacellar , o que mais impressiona no Small Claims Court de Nova Iorque, é o grande número de conciliadores que se assemelham aos nossos juízes leigos dos Juizados Especiais, que podem chegar a 90% do efetivo. O atendimento no Small Claims Court inicia após as 18h00min horas, utilizando toda a estrutura da corte civil comum e às 18h30min as portas são fechadas não permitindo mais a entrada de nenhuma pessoa. Após uma breve preleção sobre a corte, acerca das vantagens de uma conciliação, os casos são encaminhados para as salas.

4.2 - TRANSAÇÃO PENAL NORTE-AMERICANA - "PLEA BARGAINING"

De acordo com Mario Antônio Paiva , a transação penal no sistema jurídico brasileiro em muito se assemelha ao instituto norte-americano do Plea Bargaining. O promotor de justiça americano detém o poder discricionário, podendo inclusive, deixar de intentá-la.
Este instituto consiste em uma verdadeira transação entre a acusação e a defesa e tem a finalidade de imposição de pena referente a delito de menor potencial ofensivo, diverso daquele que inicialmente foi imputado ao réu.
O plea bargaining representa a mais fiel expressão da discricionariedade do promotor americano, que consiste na barganha entre o Ministério Público e acusado, que objetiva uma confissão de culpa em troca de uma pena mais leve ou até por um número mais reduzido de crimes. Através do plea bargaining, 85% a 90 % dos crimes são solucionados.
Diz Figueiredo Dias que os argüidos que se recusam ao guilty plea, isto é admitir a defesa à imputação, são considerados incômodos e perturbadores e acabam por serem punidos com mais severidade. A pressão no sentido leading guilty pode implicar a condenação de inocentes, sobretudo dos mais inexperientes. Por outro lado, o sistema privilegia manifestantemente os delinqüentes com maior competência de ação, ou os mais experientes, que inclusive podem ser mais perigosos.

4.3.1 - Diferença entre a Transação Penal e o Plea Bargaining.

No plea bargaining vigora o princípio da oportunidade de ação penal pública, enquanto na transação penal o ministério Público não pode exercê-lo integralmente. Havendo concurso de crimes, no plea bargaining o ministério Público pode excluir da acusação algum ou alguns delitos, o que não ocorre na transação.
No plea bargaining o Ministério Público e a defesa podem transacionar amplamente sobre a conduta, fatos, adequação típica e pena, como, por exemplo, concordar sobre o tipo penal, se simples ou qualificado, o que não é permitido na proposta de transação penal.
A transação penal é aplicada em crimes de menor potencial ofensivo, isto é, os crimes que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ao contrário do que ocorre com a transação norte-americana, que poderá ser proposta para qualquer tipo de crime. No plea bargaining, o acordo pode ser feito fora da sala de audiência e a transação penal, somente em audiência.





4.4 - DIREITO COMPARADO

4.4.1 - Alemanha

O § 153 da Lei Processual Penal da Alemanha prevê a abstenção da persecução por delitos de menor potencial. Nos delitos punidos com penas privativas de liberdade inferior a um ano o Ministério Público tem a possibilidade de prescindir da acusação com autorização do Tribunal competente para a abertura do procedimento ordinário, sempre que não existir interesse público na persecução e a culpabilidade do autor for considerada insignificante.
4.4.2 Portugal

O Código de Processo Penal Português, adequando-se a nova concepção e dando ênfase aos novos institutos penais, foi recentemente alterado por lei e a nova redação do artigo 281 passa para 5 anos a possibilidade de suspensão do processo, desde que se verifiquem determinados pressupostos.
4.4.3 Itália

O novo Código de Processo Penal, em seu artigo 444, criou um procedimento alternativo ao ordinário, a aplicação da pena a pedido das partes, permitindo que o acusado e o MP solicitem ao juiz a aplicação de pena substitutiva, ou uma pena pecuniária diminuída em um terço, ou uma pena privativa de liberdade que, diminuída em um terço, não supere a dois anos. Conclui Paiva que esta solicitação pode produzir-se até o inicio da audiência principal, determinando uma simplificação do procedimento, através da fase de juízo oral.

CONCLUSÃO

O Direito Penal, conforme ensinamentos de grandes obras doutrinárias deve-se preocupar com aquilo que as demais áreas do Direito não foram capazes de solucionar. Porém, enquanto não avançamos para este modelo ideal, o legislador tenta dar ao Direito Penal, instrumentos menos severos para a punição daqueles que praticam crimes de menor potencial ofensivo. Assim aconteceu com os Juizados Especiais Criminais, pois como diz Paulo Rangel, é uma oportunidade dada ao acusado de se reintegrar, desde já, ao convívio social.
De fato, como vimos neste trabalho, o surgimento dos Juizados Especiais Criminais trouxe a tona uma nova política de repressão aos delitos que não agridem a sociedade de forma repulsiva, em que o Estado abdica de seu Ius Puniendi em prol da tentativa de reinserção social do transgressor ao invés de sua condenação em processo criminal.
Neste sentido, a Transação Penal mostra-se um instrumento bastante eficaz para atingir tal objetivo. Entretanto, observamos também, que ainda há algumas polêmicas em torno deste instrumento, notadamente no que se refere à possibilidade de oferecimento pelo Juiz de ofício ou a requerimento da parte, em casos de recusa do MP em oferecê-la quando atendidos os requisitos legais.
Os princípios não poderiam estar ausentes a um trabalho desta natureza se considerarmos que em muitos deles se assentam os fundamentos dos Juizados Especiais, como acontece, por exemplo, com os princípios da oralidade e da simplicidade. Por tal razão, é que dedicamos parte considerável deste trabalho ao estudo destes princípios.
Por outro lado, a Lei 9099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Criminais, é essencialmente procedimental. E ante esta constatação, fazia-se necessária uma incursão nesta área, a fim de verificarmos a existência de peculiaridades em comparação ao procedimento comum, destacando-as, como foi feito, por exemplo, em relação à citação.
As alterações legislativas ocorridas há pouco tempo que repercutiram em mudanças no sistema dos juizados especiais criminais não fugiram a nossa atenção, como, v.g, as verificadas com a promulgação da chamada Lei Maria da Penha (nº 11.340/06) nova Lei de Tóxicos (nº 11.343/06) e a Lei nº 11.313/06, que modificou o conceito de menor potencial ofensivo da Lei 9.099/95.
O Direito Comparado também nos forneceu elementos para a compreensão do tema e, por isso, é que se buscou no direito estrangeiro, sobretudo no norte-americano, a forma de atuação deste sistema alternativo de punição fora de nosso território, além dos modelos italiano, alemão e português sobre o tema, objeto, outrossim, de nossa atenção.
Concluímos este trabalho reiterando a importância dos Juizados Especiais para o nosso ordenamento jurídico, especialmente no que concerne à economia dos atos processuais e a simplicidade das formas empregadas, além da relevância social do instituto que iniciou um novo tratamento jurídico para os denominados crimes de menor potencial ofensivo.




BIBLIOGRAFIA



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Autor: Paulo Amazonas Alcantara


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