VARIAÇÃO LINGUÍSTICA ENTRE SEXOS / GÊNEROS NA REDE SOCIAL





VARIAÇÃO LINGUÍSTICA ENTRE SEXOS / GÊNEROS NA REDE SOCIAL
Vânia Carvalho de Castro (UFPI)

Resumo
Este artigo apresenta resultados de uma análise da variação lingüística em textos de homens e mulheres na categoria humor na rede social Twitter. Sabendo que no mundo virtual, vive-se uma grande variação e expansão linguística nas interações sociais, o presente trabalho buscará enfatizar as possíveis diferenças na linguagem praticada pelos comediantes. Para melhor qualificar essa pesquisa, foram coletados 60 "tweets", que são os textos, que tem a função de permitir aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de outros contatos, entre os gêneros / sexos, sendo 30 de comediantes de "stand up" do sexo feminino e 30 do sexo masculino observado as possíveis variações nas publicações utilizadas pelos usuários.
Palavras-chaves: Variação, rede social, homens e mulheres.
Abstract
This paper presents results of an analysis of linguistic variation in texts by men and women in the humor category of the social network Twitter. As we have been undergoing a huge expansion and linguistic variation in social interactions in the virtual world, the goal of this research is to emphasize the possible differences in language used by comedians. It was collect 60 tweets for the research, between the genders it was analyzed 30 tweets of stand-up female comedians and 30 tweets of males to observe the potential variations in text published by users on Twitter.
Keywords: Variation, social network, men and women.

1. Introdução
Mediante o avanço e a expansão do mundo virtual, vive-se uma grande variação e expansão linguística nas interações sociais. Além disso, pode-se observar no âmbito tecnológico, algumas variações/ mudanças na escolha lexical e outras elegidas por homens e mulheres que utilizam a linguagem escrita na categoria "humor" na informativa rede social, Twitter.
Tomando como elemento balizador, os "tweets", como são nomeados tais textos, que tem a função de permitir aos usuários enviar e receber atualizações postadas de outros contatos com no máximo 140 caracteres, foram utilizados como objeto de estudo para a análise da pesquisa. Labov (2001), que trata do tema discursivo entre homens e mulheres, partindo da premissa que há variações linguísticas em diversos grupos sociais.
Orientando-se pela a proposta historiográfica de Bortoni-Ricardo (2004), Marchuschi (2002), Labov (2008) e outros importantes teóricos da área, o artigo buscará tecer considerações e esboçar reflexões da variação linguística em língua materna observando a variação diastrática nas possíveis singularidades e similaridades na linguagem masculina e feminina praticada na da rede social Twitter, tais como, a utilização ou não do "internetês", incluindo formas exageradas de expressão, gírias e as formas de menor prestígio (nesse caso palavrões), o uso de diminutivos e aumentativos, utilização de letras maiúsculas, o uso de marcadores conversacionais, a mudança e monitoração estilística nas diversas formas de expressão na categoria humor.
O gênero escolhido para análise foram os tweets, onde os usuários proporcionam um ambiente diversificado e rico em relação à comunicação livre e espontânea, e para isso tive como base o conceito de escrita de Marchuschi (1995), que seria além de uma tecnologia de representação abstrata da própria fala, um modo de produção textual-discursiva com suas próprias especialidades.

2. O Twitter e a Diversidade Linguística entre homens e mulheres

Em um sentindo bem amplo, podemos seguramente afirmar que as línguas variam bastante em todo mundo, e sendo mais específica, essa mudança ocorre também dentro de um país em uma mesma língua, mas não impedindo a compreensão entre os falantes. O Brasil possui uma grande diversidade linguística e acontece de época para época, de região para região (variação diatópica), de classe social para classe social (variação diastrática), acorre entre faixas etárias, na escola, na Internet, e assim por diante. Essa pluralidade linguistica existe dependendo da situação, do lugar e da época que o falante se encontra.
Segundo Bortoni-Ricardo (2004, p.25) há diferenças relacionadas a papéis sociais, sendo que ocorre com mais freqüência em alguns domínios do que em outros e essa variação é inerente á própria comunidade linguistíca. Podemos perceber diferenças lexicais em regiões onde ocorre uma cultura mais forte e assim pode ser que um falante não saiba que "jerimum", palavra utilizada na Bahia, seria o mesmo que "abóbora", termo usado em outras regiões do Brasil como o Sul e o Sudeste, um réptil chamado "osga" na região Norte, em também chamado de "briba" no Nordeste, e "lagartixa" no Centro-Sul.
Homens e mulheres não falam da mesma maneira, e o estudo dessa diferença é objeto de permanente discussão na Sociolingüística. A pesquisadora Maria da Conceição Paiva observou em seu estudo sobre a variável gênero/sexo que apesar de nas sociedades ocidentais a diferença entre o vocábulo masculino e feminino esta diminuindo, ainda se pode afirmar que determinadas palavras se situam melhor na boca de homens que de mulheres.
Segundo teóricos da área, essa diferença ocorre devido à heterogeneidade linguística. Para o lingüista americano Labov, o gênero é visto como um fator biológico. Já para outros linguísticas, o gênero é visto como uma categoria que engloba muitos fatores interligados na sociedade. De acordo com Yonne Leite e Dina Callau (2002, p.38) a generalização que se pode fazer sobre as diferenças existentes entre a linguagem masculina e feminina é a de que a identidade homem/mulher interage com outras identidades culturais, não podendo ser vista isoladamente, e sim em conjunto com outros fatores.
A variação linguística existente entre os gêneros/sexos proveem de uma construção cultural, social e histórica segundo mostram a extensa bibliográfica da área. Alem disso as diferenças linguisticas em função dos sexos se situam mais no plano lexical e surgem porque a língua está ligada a comportamentos e atitudes sociais. Homens e mulheres são socialmente diferentes, pois a sociedade lhes estabelecem papeis distintos e devido a isso se espera que utilizem padrões de comportamentos diferentes.
Espera-se que os homens usem mais variantes de menor prestigio e que a mulher utilize as formas gramaticais corretas. Isso já é uma situação bem antiga, pois há muito tempo atrás, devido a fatores sócios históricos a sociedade burguesa estabeleceu que a mulher usasse linguagem mais polida e elegante.





3. Análise de dados

O Twitter é um software social na qual ocorrem trocas de mensagens curtas e espontâneas, os tweets, e com as suas ferramentas se tornou uma poderosa rede social.
Segundo MOLLICA, M. C. & BRAGA, M. L. (2004 p.35) a análise da correlação entre gênero/sexo e a variação linguística tem de, necessariamente fazer referência não só ao prestigio atribuído pela comunidade às variantes linguisticas como também à forma de organização social de uma dada comunidade de fala.
Na abordagem de Labov (2008) sobre as variações linguisticas existentes em grupos sociais, diz que o discurso cuidado, que é aquele que apresenta maior grau de formalidade que em outras conversações, as mulheres apresentam menos variantes estigmatizadas do que os homens e parecem ser mais sensíveis nos valores sociais que condicionam o uso da língua.
A partir da análise acerca das variações lingüísticas presentes em textos de homens e mulheres na categoria humor na rede social Twitter, foram constatados que conforme demonstram os estudos sistematizados de variação linguística em língua materna de Bortoni-Ricardo (2004), as mulheres usaram mais diminutivos como "selinho", "ladinho" e "quilinhos" e marcadores conversacionais, que são as partículas que cumprem varias funções na linguagem, como "né" e "tá". Já os homens apresentaram um índice baixo do uso dessas partículas, na coleta houve apenas um tweet de stand-up masculino com o uso da partícula "tá".
No entanto, apresentou ? se uma realidade diferente quando se trata de palavrões e gírias. O estereótipo de que as mulheres são mais polidas e conservadas que os homens não se concretizaram no quesito humor nos "tweets" postados na rede social Twitter. Pois ambos os sexos utilizaram esses vocábulos / expressões na mesma intensidade. De acordo com muitos estudos sociolinguísticos, tais como os do lingüista Labov (2001), as mulheres usam de preferência mais variantes de prestigio que os homens. Porém, nos "tweets" os homens engajaram em estilos mais monitorados que as mulheres, levando em conta que essas variações estão relacionadas ao ambiente que os usuários se encontram. O que se pôde perceber é que há uma tendência forte de inversão do quadro, pois as mulheres estão preferindo uma implementação da língua mais inovadora mesmo que seja menos prestigiada. Também pode ser explicado devido a certas interações na questão do humor nos stand-up. Sobre o uso de monitoração estilística, não foram encontradas postagens na coleta dos textos. Os comediantes optaram por utilizar apenas estilos mais coloquiais. Isso pode ser explicado devido ao Twitter ser uma rede onde ocorre uma comunicação mais descontraída e no quesito humor os usuários utilizam interações mais densas. De acordo com os estudos da linguista britânica Lesley Milroy (1987) em Belfast, ele percebeu nos grupos, que as mulheres apresentavam variáveis mais próximas do vernáculo do que os homens, o que foi explicado pelo fato dessas mulheres pertencerem a redes densas. Outra observação a ser feita em seus estudos, é que devido ao alto índice de desemprego ocorrido há varias décadas, as mulheres tiveram de deixar de serem somente donas de casa e começar a ingressar no mercado de trabalho e assim elas começaram a usar variantes mais diversificadas.
Em relação ao uso do "internetês", que é uma forma específica de se comunicar, cuja característica principal é a simplificação de palavras, as mulheres usaram em quantidade muito maior que os homens, foi constatado que as mulheres utilizaram em 14 tweets expressões como: "kkk", "AHUAHA", "rsrsr", "Ôpa!", "vc" etc. e também formas exageradas de expressão: "obaaaaaa", "não!!!!!!!!!!", "Boa noite!!!!!", entre outras. Vejamos alguns exemplos em tweets de algumas comediantes stand-up feminino:
Usuário1: amigo gordines é aquele que quando vc fala no twitter que está comendo, seu tel toca e ele fala que está com saudade e vai te visitar...

Usuário2: É tão fácil começar a fazer besteira e tão difícil parar a descida da ladeira depois. Tô sem breque...

Usuário3: AHHHH!!!! O Twitter diz que eu sou similar ao Sérgio Malandro e ao Paulo Coelho!!!!!!!! NÃO!!!!!!!!! POR QUÊ?????????

Usuário4: Ganhei quatro amendoins no voo da Gol...Mais cinco voos ja vira meio pacote e aí da pra comer. Legal né?

Os homens também utilizaram essas formas, contudo em menor quantidade, apenas em um tweet a forma exagerada: "OIEEE" e sete com uso de "internetês": "vc", "p/", "mto", "hj", "n", "q" e "haha". Sobre o uso de letras maiúsculas as comediantes femininas usaram em maior freqüência que os homens. Vejamos alguns exemplos:
Usuário1: O último a ler a coluna do Marcelo Paiva hj no Estadão é mulher do padre. Sensacional!

Usuário2: Fazer o Bozo foi divertidissimo!!"Ta feliz? Entao da uma bitoca no meu nariz!"

Usuário3: Gravando o Vale a Pena Ver Direito deste sabado! Melancia e Piu Piu mostrando o tchuplec tchupli! OEEEE!


4. Considerações Finais

Sob o ponto de vista lexical, podemos dizer que algumas palavras ou expressões se encaixam melhor no discurso masculino e outras próprias são do linguajar feminino. Essas diferenças sociolinguisticas também ocorrem na Internet, na qual presenciamos uma explosão de novos gêneros e novas formas de comunicação entre os sexos, particularmente na escrita.
Partindo dessa premissa, constatamos que a variação/mudança linguística, em vários níveis no ato da escrita em tweets de homens e mulheres na classificação humor, continua a avançar segundo as evidências apresentadas em tempo real, embora de forma lenta.
Os diferentes estudos mostram que as diversidades linguisticas refletem segundo MOLLICA, M. C. & BRAGA, M. L. (2004) muito mais que diferenças biológicas, diferenças no processo de socialização e nos papeis que cada comunidade atribui a homens e mulheres. A análise de conversações espontâneas tem permitido mostrar diferenças significativas na forma como homens e mulheres conduzem a interação verbal.
Considerando que a língua é dinâmica, essa pesquisa, a qual não tem o intuito de ser conclusiva, tem como objetivo principal instigar os estudiosos de linguagens, áreas afins e outros a dar continuidade a pesquisas sobre as variações linguísticas sob a luz da sociolingüística.
5. Referências

BORTONI-RICARDO, S. M. Educação em língua materna: a sociolinguística em sala de aula. SP: Parábola, 2006.
CALVET, Louis-Jean. Sociolínguística: uma introdução crítica. São Paulo: Parábola, 2002.
COSCARELLI, C.; RIBEIRO, A. E. (Org.) Letramento Digital: aspectos sociais e possibilidades pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
FIORIN, José Luiz (Org.). Introdução à Linguística: I.Objetivos teóricos. São Paulo: Contexto, 2006.

LABOV, William. Padrões Sociolinguísticos. Trad.: M. Bagno, M. M. P. Scherre, C. R. Cardoso. São Paulo, Parábola, 2008.

LEITE, Yonne; CALLOU, Dianh. Como Falam os Brasileiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2002.
MACUSCHI, L.A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola, 2008.

MOLLICA, M. C. & BRAGA, M. L. (orgs.) Introdução à Sociolinguística: o tratamento da variação. São Paulo: Contexto. 2004.
PAULIUKONIS, M. A. L.; GAVAZZI, S. Da língua ao discurso: reflexões para o ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.
RIBEIRO, Branca Telles; GARCEZ, Pedro M. Sociolinguística Interacional: humanística. São Paulo: Loyola, 2002.
http://educacao.uol.com.br/portugues/ult1693u60.jhtm Acesso em: 16/04/2011
http://acd.ufrj.br/~pead/tema01/variacao.html Acesso em: 16/04/2011
http://www.twitter.com Acesso em: 20/11/2010

Autor: Vania Castro


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