MARTA
- O que tem hoje de almoço? Perguntou Rui, o irmão mais velho de Marta, ao chegar em casa.
- Arroz, feijão, salada de rúcula com cenoura ralada, carne ao molho pardo, creme de moranga e batata cozida no vapor. Respondeu Marta, arrumando a mesa para o almoço. Ela gostava de cozinhar e sentia-se vaidosa quando os irmãos elogiavam sua comida.
- Estou com uma fome de leão! Exclamou Reginaldo, o irmão mais moço, surgindo logo depois de Rui. Rui era proprietário de uma oficina mecânica, Reginaldo trabalhava com ele. Ricardo e Mariana os outros dois irmãos de Marta trabalhavam no centro da cidade e não tinham tempo de almoçar em casa. Rui era desquitado, Ricardo estava noivo assim como Mariana. Reginaldo, o irmão caçula, era solteiro.
Alguns anos atrás, Marta estava noiva e pronta para casar quando descobriu que o noivo tinha outra mulher. A decepção foi muito grande, tanto que ela teve um ataque de nervos.
Depois que a mãe morreu, o pai já era falecido, ela passou a cuidar da casa e dos irmãos. Chocada com os acontecimentos que culminaram no fim de seu noivado, Marta não saiu de dentro de casa por vários dias. Os irmãos passaram a dar tudo que ela precisava, inclusive compraram um aparelho de televisão e um DVD para o quarto dela.
Decepcionada e desiludida com a vida social, Marta abandonou o emprego, os passeios, os amigos e passou a trabalhar em casa, cozinhando e lavando roupas para os irmãos. Assim se passaram quinze anos.
Mas, a solidão e a falta de um amor era algo que incomodava
Marta e ela começou sentir desilusão pela própria vida. Mariana havia se casado e foi morar num apartamento, Ricardo logo também casaria, depois chegaria a vez de Reginaldo e Rui estava namorando outra vez. Marta imaginava que iria ficar sozinha, velha e solitária. Se a sua vida tinha que ser assim, pensava ela, precisava se conformar.
Julio, o balconista do mercado onde Marta fazia compras, amigo da família, sabia o que havia se passado com ela. Ele gostava de Marta mas, como ela mantinha uma barreira diante de si, demonstrando frieza com os homens por achar que todos eram iguais, ele nunca demonstrou o seu amor por ela. Ela conversava com ele apenas o necessário, mas um dia Julio criou coragem para falar e dizer o que pensava.
- Eu sei que você se desiludiu com os homens, mas pense bem, você perdeu tempo achando que todos são iguais, não se deu a chance de tentar novamente.
- Eu tenho meus irmãos para cuidar....
- Seus irmãos são maiores de idade e estão formando família. Mariana casou. Rui vai casar novamente e você vai ficar sozinha! Eles gostam de você, é claro, mas com você em casa eles não precisam pagar uma empregada para cozinhar e lavar roupas deles! Quando algo de ruim acontece conosco temos que superar a nossa dor, se fortificar e não perder a chance de ser feliz....
- Não se meta com minha vida! Seu besta! Exclamou Marta e saiu furiosa. Ela ficou chateada com as palavras de Julio, mas naquela noite deitada em sua cama para dormir, ao refletir sobre o assunto, reconheceu que ele tinha razão. Seus irmãos podiam se virar sozinho, ainda havia chance de ser feliz. Na manhã seguinte ao ir ao mercado, pediu desculpas a Julio.
- Eu ando meio irritada. Acrescentou ela e completou: - Acho que estou precisando me distrair. Não quer me levar ao cinema?
- Claro que levo. Quer mesmo?
- Está pronta a janta? Perguntou Rui, entrando em casa.
- Marta saiu. Respondeu Reginaldo mostrando um bilhete sobre a mesa.
- Não tem janta. Disse Ricardo.
Rui pegou o bilhete e leu: " Fui ao cinema com meu namorado."
- Foi ao cinema com quem? Que namorado? Indagou Rui, surpreso.
- E agora o que vamos comer? Perguntou Reginaldo.
- Vou pedir uma pizza. Disse Ricardo pegando o telefone.
- Peça duas. Recomendou Rui e leu o bilhete novamente.
FIM
Autor: Antonio Stegues Batista
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