Na draga...



Na Draga...

Inclina-te um pouco e olha-me mesmo que com desdém,
já que onde estou tu não vens.
É o que me grita o negro dos santos sonhos, o breu da noite e esta cegueira que me arde os olhos áridos...
Quem se arrasta tateando a vala sabe que ainda não saiu do esgoto.
Inclina-te, porém, e eu verei luz; a dos teus olhos férteis.
E ainda que me vista com a picardia dos santos e a evanescência dos sonhos; retrato de minha alma atormentada, inclina-te!
Contudo, hoje eu quero me vestir de sol pois a tristeza gosta de sombras.
Falarei em tom maior; sem inversões na tônica, sem devaneios na terça nem floreios na quinta...
Serei seco, primitivo, natural.
Sangrarei meu orgulho precioso no compasso esquivo de uma rabeca rouca, e, que haja dança!
Uma lânguida dança...
Uma dança lânguida para os homens digladiarem-se pelos exergos que lhes podem trazer status.
E, porque pouco enxergam, lambuzarem-se voluptuosamente na penúria que lhes conferem os cargos.
Inclina-te que a hora é boa, e, em boa hora vou-me embora; e tu não choras...
E para ver que tu não choras falta-me também uma lágrima; aquela que me possa escorrer esta lama das vistas cansadas e traídas pela esperança que motivou o apelo esquecido: inclina-te!
Está frio, não há som, não há cor...
Não há nada, não há pulso, não há amor...
O céu que desfaz o brilho salpica gotas de escuridão.
Agora só envergo frangalhos ensolarados que não cobrem mais nada, mas, ainda escuto ao longe a rouca rabeca, gargalhadas loucas, e, sombras que dançam sonolentas.
Se enfim te inclinares, não mais te verei...





Autor: Manoel Florencio Leite Neto


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